Capítulo 3: um sonho.

"A realidade te leva ao fundo, seus distúrbios chegam no limite quando toda a sua volta parece ser uma mera invenção. Vale mais a pena se afogar do que acreditar."

Retirando-se do breu Dylan acorda em sua cama, se sentando rapidamente ele observa os arredores, uma escrivaninha era iluminada pelo sol que adentrava a janela, as cortinas estavam sendo empurradas pela brisa fresca da manhã, "tudo aquilo foi um sonho?" perguntava sem cessar. Talvez ele só tenha dormido e perdido o evento que seu amigo planejou durante tanto tempo, mas isso seria imperdoável.

Olhando para si repara que não está usando pijama, aquela era a mesma roupa utilizada em seu possível sonho, seus tênis sujos de terra implantam uma suspeita em seu pensar, o que muda o andar da situação.

Enquanto a confusão tomava sua consciência, ele procurava um sentido, parecia ter se teletransportado de uma realidade obscura, ou então dormido além da conta, apenas uma coisa não tinha se modificado, como toda manhã Dylan sentiu a solidão o corromper lentamente, isso lhe deu uma razoável resposta, ele tinha que falar com seus amigos sobre o ocorrido, eles poderiam lhe dar perspectivas diferentes, até mesmo lhe contar a verdade.

Para se comunicar precisaria de seu celular, uma mensagem de texto seria o bastante para chamar a atenção, algo como "vocês viram o que aconteceu?" estava ótimo, e se fosse o caso já conseguiria enganchar uma simples desculpa por ter perdido o teste de coragem. Procurando em sua roupa o fracasso se manifestou, aquela era a sua única esperança por isso revirar o seu quarto não seria algo desagradavel, em baixo da cama só se tinha poeira, em sua mesa estavam seus livros que foram arremessados ao chão, no guarda roupa não se tinha nada além do seu vestuário isento de cor.

Pensando em seu futuro, ele andava de um lado a outro do quarto amassando papéis vazios, às vezes preenchidos por suas emoções, mas nada que o fizesse repensar a sua ação, ou ter uma ideia catastrófica. Percebendo que não o encontraria em lugar algum, Dylan se despi vestindo em seguida uma nova muda de roupas, desta vez ele decide trocar sua camiseta de caveira por uma preta lisa, seu short escuro também é alterado por uma calça jeans, o tênis continua o mesmo mas para incrementar um casaco cinza foi trajado.

Enquanto a ansiedade o esmagava ele abria a porta de seu quarto bruscamente, em sua frente o pequeno corredor estava cheio de lembranças em formato de fotografias, uma delas foi a última vez que Dylan viu o seu pai. Correndo para as escadas ele esperava que sua mãe já tivesse saído de casa, mas suas preces não foram atendidas, isso ficou explícito quando Dylan pisou no primeiro degrau da escada e avistou sua mãe em frente a porta frontal olhando através do olho mágico.

Se afastando na ponta dos pés o piso se tornou seu inimigo, o ranger se fez tão alto e demorado que era impossível ignorar, ao olhar para sua mãe percebe que Kathleen estava com uma expressão assustada, mas logo se modifica quando ela começa a falar:

— Dylan? — Kathleen pergunta, ela parecia estar confusa, talvez tamanha agitação pela manhã a tenha assustado.

— S-sim? — Ele responde se endireitando.

— Está tudo bem?

— É claro que sim! — Ele fala tentando disfarçar seu nervosismo, mas isso foi inútil à medida que sua voz desafinava.

— Você sabe que hoje não tem aula né?

— O que?

Com essa informação ele percebe que sua dedução estava certa, esse era o dia seguinte ao teste de coragem, o Halloween.

— Meu amor, você tem certeza que está tudo bem? — Ela fala se aproximando da escada — Se você quiser falar algo para mim você sabe que pode né?

— Sim. — Sua resposta saiu seca, não dava para confiar em sua mãe.

Kathleen lhe lança um sorriso enquanto se encosta na parede, Dylan retribui esse gesto com uma risada um pouco engasgada, ele não conseguia esconder o seu desconforto. Abaixando a cabeça ele anda calmamente para frente, sua mãe não lhe dirige uma palavra, ela provavelmente percebeu que o garoto não queria conversar, quando abre a porta de entrada ele olha o exterior, era tudo tão bonito, o céu azul claro parecia uma pintura que só os mais ricos teriam.

— Vê se não volta muito tarde, essa cidade está perdendo o bom senso.

— O que você quer dizer com isso?

— Você acredita que pisotearam as minhas Peônias? Sinceramente não sei qual tipo de louco invadiria a casa de outra pessoa somente para matar algumas plantas inocentes. — fazendo uma pausa ela organiza seu raciocínio — Certeza que foi coisa daquela adolescente mal cuidada!

Acompanhando a fala de Kathleen, Dylan deduz que a "adolescente mal cuidada" seria Ivy, aquela mesma garota que ele teria encontrado saindo da loja de conveniências, isso o deixou irritado, em qualquer situação sua mãe tentava colocar a culpa nela.

— Sei. — Amedrontado pelo ódio, ele decide esconder a verdade.

Começando a caminhar rapidamente para a calçada, o cheiro da grama adentra suas narinas, é então que ele percebe, o gramado verde e brilhante chamava bastante atenção, em todo o redor da casa flores diversas estavam plantadas e organizadas em canteiros coloridos, tudo obra de uma única pessoa, mesmo não concordando com sua mãe na maioria das vezes, ele tinha que admitir, ela fazia um ótimo trabalho em seu jardim.

Dylan não queria ter que visitar seus amigos, assim se esforçou ao máximo para lembrar de conversas antigas sobre seus planos naquele dia, acabou percebendo que não tinha uma relação tão próxima com eles, Dereck sempre ficava calado em sua presença, Adam quase nunca aparecia, somente Ethan sempre estava ao seu lado, um amigo de verdade.

"Ah, é mesmo." Pensou alegremente.

Naquele dia iriam ter dois eventos, um seria restrito a adultos, o outro seria uma festa típica de adolescentes, a escola estava responsável por ambos, por causa do nível de dificuldade para organizar as coisas, eles começaram a pedir ajuda de alguns alunos, Ethan uma vez reclamou que seus pais o obrigaram a participar dos orçamentos, assim ele certamente estará na escola.

Enquanto caminhava algo veio a sua mente, a rua estava totalmente deserta, era como se ele voltasse a dois anos atrás, quando sua rotina se resumia a ir para a escola observando as casas em seu redor, somente uma coisa se divergia, Ivy não estava a seu lado.

As ruas continuavam desocupadas a medida que avançava, ao menos na escola se tinham carros estacionados, em contra partido nem o segurança estava na porta, tudo aquilo lhe passava a impressão de que qualquer tipo de ser queria evitar o seu encontro, mas algo estupido assim só viria de sua imaginação.

Os corredores estavam mais vazios que nunca, a sua volta quase sempre parecia desaparecer, o garoto só continuava a andar pois tinha um objetivo claro em mente, a sala dos professores. Dylan achava que não teria nenhum tipo de companhia em sua caminhada, mas ele estava errado, ao virar para a esquerda ele finalmente encontra Ethan junto com uma surpresa, seu melhor amigo conversava com Ivy, ele ria enquanto a garota o observava confusa.

— Ethan? — Dylan diz parando no meio do corredor.

— Ah! Dylan, a quanto tempo meu velho amigo! — Ethan demonstra uma certa recusa a olhar na cara do seu "amigo". — Mas então Ivy, o que você acha da minha proposta?

— Nem fodendo. — Ela diz enquanto se afasta.

Os dois trocam olhares, o garoto estava confuso e ela aparentemente chateada, talvez ele tivesse feito algo de errado, mas não conseguiu descobrir o que antes de vê-la dobrar o corredor.

— Dylan, Dylan, Dylan… — Ethan se conduz ao seu lado, colocando uma mão sobre seu ombro. — Você sempre chega na hora errada, mas bom, não existe hora certa para você.

— Do que você… — Ele é interrompido.

— É melhor ficar longe daquela garota, entendeu? — Diz em um tom ameaçador, se virando para trás começa a andar calmamente.

Dylan não conseguia compreendê-lo, Ethan nunca agiu daquela forma.

— Ethan, o que aconteceu ontem?

Ele não podia perder a chance, por isso perguntou sem pensar, mas logo se arrependeu quando viu o seu amigo se virando lentamente e o olhando como um animal.

— O que aconteceu?! Foi tudo culpa sua, seu imbecil! Você é um demônio nojento, seu imundo!

— … — Dylan tentou se comunicar, mas as palavras não saiam.

— Não me venha com essa, eu sei quem você é de verdade! — Ele parecia uma criança birrenta gritando. — Tudo ficou claro quando eu vi que você não estava lá, você nunca está mesmo! Egoísta ridículo!

O destravar de uma arma ressoou em suas costas, de um segundo para o outro um barulho estrondoso foi escutado, Dylan não entendeu o que estava acontecendo até olhar em seu peito, ali jazia um buraco, a bala atravessou o seu toráx acertando o braço de Ethan, o mesmo sorria, parecia que a dor o fazia feliz.

Caindo ao chão a dor de ter o seu coração perfurado fazia suas veias se contorcerem, em poucos minutos o seu corpo não teria sangue o bastante para executar funções básicas, ele viu o seu ex melhor amigo conversando com Scarlett, a mesma acariciava o cabelo do garoto que morria rapidamente, manchando os ladrilhos brancos de vermelho, essa cor imunda sempre vai aparecer para atormentá-lo.

A morte o chama com uma voz tranquila, a tristeza o preenchia, mesmo se afogando com o próprio sangue ele não queria ir, por isso desejava insistentemente voltar aquela manhã, assim ele poderia consertar tudo.

Quando seus sentidos sumiram ele ouviu uma risada, em seu fundo se tinha o badalar de um relógio seguido por um tic tac, não se sabe quanto tempo se passou, Dylan simplesmente sentiu aquela mesma brisa fria da manhã, ao abrir os olhos ele se depara com a visão do alvorecer, o sol que adentrava a janela iluminava a sua escrivaninha, as cortinas dançavam ao vento, ele não conseguia entender se aquilo era uma segunda chance ou uma mera mentira, um sonho vívido que o enganou.