Escuridão
Na minha frente tudo que eu podia ver e sentir era a mais pura escuridão, era pior até do que as fotos do vácuo do espaço que eu vi na internet.
Parecia que a luz nunca tinha sequer existido neste local.
Se o que eu estou olhando é uma escuridão infinita no vazio ou uma simples parede, eu não saberia dizer.
"Onde eu estou?" Esse pensamento ecoou dentro da minha mente.
Era uma coisa que eu tinha ignorado pelo local onde eu estava, mas onde é aqui?
Era tão escuro, silencioso e pacífico, era uma sensação inexplicável de liberdade. Parecia que eu era a própria escuridão, me sentia livre e leve, livre de tudo.
Mas com o passar do tempo, minha consciência me puxou de volta para o que eu era, um humano com pés e mãos, com boca e olhos e com uma vida.
Foi quando uma torrente de memórias me invadiu, uma casa pequena e surrada, uma mulher com um sorriso gentil, um bar, risadas e um tiro…
A última coisa que eu me lembrava era do meu sangue quente escorrendo no chão da minha casa enquanto aquele homem apertava o gatilho.
"Então… eu… morri?" Eu murmurei ou pensei, eu não tinha certeza, parecia que a separação entre minha voz e meus pensamentos não existia mais.
Eu me desesperei com essa possibilidade. "N-Não, eu não posso ter morrido, não assim," eu murmurei com uma voz desolada e sem esperança.
"I-isso deve ser um sonho… sim!!, isso é um daqueles sonhos lúcidos que as pessoas têm," eu murmurei me agarrando ao menor fio de esperança que eu pude achar.
Numa tentativa desesperada, eu tentei morder minha língua para acordar, mas estranhamente eu não sentia nada. Então, tentei mexer o corpo, mas continuei sem sentir nada. Isso era muito diferente de uma paralisia do sono, nela eu pelo menos conseguia sentir meu corpo, mas aqui eu não era nada, não tinha corpo, era só um pensamento na escuridão.
Conforme o tempo passava nesse vazio, a realidade que eu queria tão desesperadamente negar me atingiu como um soco no estômago.
"Não… Eu- eu tinha tanto para fazer, minha pesquisa, minha promessa pra ela, eu prometi pra ela, prometi que ninguém mais iria ter que passar por aquilo novamente!!" eu gritei em fúria e desespero, minhas palavras ecoando na escuridão e ela vibrou em resposta à minha fúria.
"E agora? Tudo que eu sacrifiquei, tudo que eu fiz, foi tudo em vão?" Eu falei com a voz embargada de emoções.
* * * * * * * *
Minha mente ou alma, eu não sei, ficou vagando pela escuridão ou estava parada no mesmo lugar, eu não sei dizer, pelo que parecia uma eternidade.
Eu fiquei pensando o porquê de eu ter que morrer, pensei nas várias ameaças que eu recebi de diversas empresas por causa da minha pesquisa.
Pensei em cada pessoa que eu conheci que poderia querer minha morte, mas após um momento eu parei. "Do que isso adianta agora que eu estou morto?" Eu disse cansado.
Então, eu simplesmente existia naquele lugar, sozinho no escuro com meus pensamentos.
"Então o que vem agora?" Eu perguntei para mim mesmo após um momento de tempo desconhecido.
"Não vejo anjos com trombetas, nem lindas valquírias, nem demônios. É isso que nos espera após o fim de nossas vidas? Só um vazio escuro?" Eu refleti comigo mesmo, um tanto decepcionado. Eu não era a pessoa mais temente a Deus, mas eu acreditava que existia um lugar para onde as pessoas boas iam.
Mas se era isso para onde todos iriam no final, isso torna as coisas muito mais decepcionantes do que já eram.
Foi então que algo começou a acontecer, as trevas onde eu estava começaram a vibrar, eu podia sentir isso ao meu redor, o ambiente se movendo. Então, uma luz explodiu no escuro iluminando tudo ao seu redor, a luz me engolfou.
* * * * * * * * * * *
'Minha cabeça dói,' eu pensei fracamente. Meu corpo parecia estranho, errado…
'Peraí, corpo?'
"Eu não estou morto?"
Eu tentei abrir meus olhos, mas eles pareciam colados. Com muita dificuldade, eu consegui abri-los.
O local onde eu estava parecia um tanque cheio de um líquido roxo translúcido, eu estava cercado de tubos, uns entrando em meus braços e uma máscara que me permitia respirar no rosto.
Fora do tubo, eu podia ver uma espécie de sala branca com muitas cadeiras e mesas brancas.
Eu tentei me debater para poder sair do tubo, mas meu corpo parecia feito de chumbo, simplesmente não se movia do jeito que eu queria.
Após mais alguns minutos tentando sair, uma mudança aconteceu, o líquido do tubo começou a ser drenado.
Lentamente, minha visão clareou e eu pude ver com clareza a sala onde eu estava.
Parecia uma sala num formato quadrado.
Além das mesas e cadeiras, também havia inúmeras prateleiras vazias no local.
Quando meus pés tocaram o chão, meu corpo estremeceu de dor e eu caí impotente no chão molhado.
"Porra," eu praguejei.
Eu virei a cabeça para baixo, para ver como eu estava, mas a visão que me saudou me deixou mudo.
Meu corpo era de um homem de 27 anos. Eu não costumava ir à academia, mas como alguém que estuda saúde e o bem-estar, eu mantive uma rotina de calistenia para tentar.
Mas olhando para meu corpo agora, eu quase desmaiei.
Ele era pequeno como o de uma criança de 5 anos e extremamente desnutrido.
Eu conseguia ver os contornos do meu joelho e minhas costelas, minha pele estava assustadoramente pálida e esticada.
E para piorar, meu corpo estava fraco e letárgico, meus membros pareciam ser feitos de aço de tão pesados que eles eram.
E minha cabeça estava começando a queimar, como se meu cérebro estivesse pegando fogo.
"Porra, o que está acontecendo comigo?"
De repente, uma presença estranha aparece diante de mim. Não é uma forma humana, mas sim uma bola de fogo azul flutuante que emitia uma luz intensa e vibrante. Eu olhei para a figura com olhos arregalados, meu coração batendo forte contra o meu peito.
"ԲԳԵԴԾԿ" Uma série de palavras incompreensíveis saíram da bola de fogo, parecia que ela estava tentando se comunicar comigo.
"Eu... Eu não entendo você," eu murmurei fracamente.
A bola de fogo parou por um momento, como se tentasse entender minhas palavras e então se aproximou de mim. Estranhamente, ela não tinha calor. Ela se colocou em cima da minha testa e então veio um brilho seguido da pior dor de cabeça que eu já senti na minha vida.
"Unn-aaaaaarrgg!!" eu rugi em agonia. Uma série de palavras, um idioma desconhecido surgiu no meu cérebro, o conhecimento ficou gravado no meu cérebro como se tivesse sido marcado em ferro em brasa.
"E agora? Consegue me entender?" A bola de fogo falou novamente, só que eu consegui entender. A voz não tinha um gênero definido, mas pelo tom frio e impassível eu tinha certeza que era de um homem.
"Si-sim, eu consigo, como voc-"
"Sem tempo para perguntas número sete, a menos que queira morrer a morte mais patética do mar de estrelas," ele me cortou em um tom impassível, que não deixava espaço para discussões.
Eu permaneci em silêncio, sem realmente entender tudo o que ele disse, mas foquei na parte importante, a que me permitiria sobreviver.
"Bom, pelo menos você quer viver. Agora o seu problema, você provavelmente está com o corpo pesado e mal consegue se mover, certo?"
Eu acenei em concordância, esperançoso que ele conseguisse resolver o meu problema.
"Você está morrendo número sete, seu corpo está faminto, mas não de comida, mas sim de mana."
Vendo minha confusão, ele explicou brevemente: "Mana é a energia que permeia toda a existência e nos permite fazer maravilhas inimagináveis, mas vamos deixar a explicação aprofundada para mais tarde."
A forma dele brilhou novamente e então um enorme cristal branco que parecia emitir luz própria surgiu aparentemente do nada fazendo um baque gigantesco no chão.
O meu corpo parecia reagir ao cristal, pois logo após ele aparecer uma fome insuportável, um vazio que implorava para ser preenchido, surgiu das profundezas do meu ser, rasgando a minha já frágil sanidade. "Agora, coloque sua mão no cristal e tente sentir a mana dentro dele", disse a voz.
Eu nem sequer registrei as palavras dele; toda a minha atenção estava focada naquela pedra. Meu corpo ansiava, não, ele implorava para que eu fosse até o cristal. Retirando forças de onde eu mesmo não sabia que tinha, arrastei-me pelo chão frio, lenta mas seguramente, até conseguir chegar até ele.
Assim que o toquei, pude sentir a energia invadir cada centímetro do meu ser, como se um rio de luz pura e pulsante corresse pelas minhas veias. Em um instante, a fome que me corroía — aquele vazio desesperador que me deixava frágil e à beira do desespero — foi subitamente saciada. Era como se uma chama revigorante tivesse acendido dentro de mim, dissipando toda a escuridão e trazendo um alívio que jamais imaginei sentir.
Ao absorver essa mana, cada célula do meu corpo se encheu de uma vitalidade surpreendente, como se eu tivesse redescoberto uma parte esquecida de mim mesmo. A sensação era tão intensa que, por um breve momento, eu me senti capaz de conquistar o impossível. A energia vibrava em sincronia com o meu coração, transformando o que parecia ser um poder adormecido em uma força viva, palpável e arrebatadora.
Lentamente, a fraqueza que eu sentia e a queimação na minha mente desapareceram, substituídas por uma força recém-descoberta. A melhora foi tanta que eu consegui me levantar com facilidade e colocar os dois braços no cristal, dobrando a força de absorção.
"O que é essa força? Essa… mana? Eu me sinto ótimo! Será que é assim que as pessoas que usam heroína se sentem?", pensei, fascinado com o que estava acontecendo comigo. Era uma sensação inebriante, a energia parecia se integrar a cada fibra do meu corpo, me fortificando infinitamente. Fiquei absorto naquela sensação até que ela parou abruptamente.
"O que aconteceu?", murmurei, confuso, olhando para o cristal, que agora estava opaco.
"Você absorveu toda a mana no cristal, garoto", a voz fria e sem emoção do fogo fátuo me tirou do meu devaneio. "Imagino que esteja se sentindo melhor", ele comentou, enquanto pairava no ar.
Virei-me e olhei para o meu corpo. Eu ainda tinha a pele anormalmente pálida e o corpo extremamente magro, mas eu não parecia uma múmia, só uma pessoa que sofria de um caso grave de anorexia. Rapidamente, tirei a máscara do meu rosto.
"Sim, a sensação de fraqueza e fome sumiu. Sinto uma sensação inebriante de força percorrendo meu corpo", comentei, maravilhado.
"Mas quem é você?", perguntei, confuso, mas não tão cauteloso, já que, se ele fosse uma ameaça, não teria me salvado.
"Meu nome é Yoskar, e eu sou o guardião deste local."
"E onde é aqui?", perguntei, enquanto olhava ao redor com curiosidade. O laboratório se estendia diante de mim em uma perfeição desconcertante. As paredes, de um branco imaculado, refletiam a luz fria que vinha do teto, criando um cenário onde o tempo parecia ter congelado. Cada superfície polida, sem uma única mancha ou sombra, dava a impressão de que o lugar havia sido preparado para algum evento monumental que nunca havia chegado. O chão reluzia, sem qualquer sinal de poeira ou desgaste, como se fosse limpo constantemente, mas invariavelmente vazio. O local estava repleto de mesas, frascos de diversos tamanhos e formatos, mas sem nenhum conteúdo dentro deles.
"Você está no laboratório de origem de Ravet."