O crepúsculo se instalava lentamente sobre o Reino de Lumirian, tingindo o céu de tons alaranjados e rosados. As sombras se alongavam sobre as vastas planícies e colinas, cobrindo as cidades e vilarejos em um véu de melancolia. Em Romagna, as ruas estavam estranhamente quietas, como se um pressentimento sombrio pairasse sobre o povo. No entanto, o murmúrio incessante dos rumores ainda ecoava pelos becos e praças, alimentando a curiosidade e o medo.
A batalha em Sorano, a antiga capital, havia deixado cicatrizes profundas no coração do reino. As notícias publicadas pela Gazeta Lumirian, sob a liderança de Nancy Lin, trouxeram uma versão que buscava acalmar os ânimos e encobrir a verdade. As ruas de Romagna estavam cheias de cópias da última edição do jornal, onde as manchetes contavam a história de dois monstros controlados pela organização criminosa “As Garras do Dragão”, cujo embate resultou na devastação de Sorano.
Nas palavras do jornal, Lucius Perlasca, o diretor da Academia de Cavaleiros, havia morrido como um herói, sacrificando-se para salvar o maior número de vidas possível. Para a população, essa narrativa foi um alívio, algo que explicava o inexplicável e oferecia uma falsa sensação de segurança em tempos de incerteza. A ideia de que um vilão foi responsável por tamanha destruição era mais fácil de aceitar do que a verdade por trás do embate entre Léo e Lucius.
Em Trentino, uma cidade próspera ao norte, os rumores também corriam soltos. O mercado central estava mais agitado que o normal, com mercadores e clientes discutindo fervorosamente sobre o que realmente aconteceu em Sorano. As versões variavam, desde histórias de um demônio de fogo que havia saído de uma antiga cripta, até lendas sobre anjos caídos que travavam batalhas pela alma do reino. As pessoas se agrupavam em pequenos círculos, falando em sussurros, como se o simples fato de mencionar os eventos pudesse atrair uma nova calamidade.
Nos vilarejos de Brisighella, Castiglione, e San Gimignano, onde Léo havia crescido, o impacto das notícias era ainda mais pessoal. No Vilarejo de San Gimignano, a casa da família Stark estava cercada de olhares curiosos e preocupados. Os vizinhos, muitos dos quais conheciam Léo desde pequeno, sussurravam sobre o jovem que havia se tornado uma lenda, mas cujos feitos estavam envoltos em mistério. Alguns acreditavam que ele havia se sacrificado, outros que ele estava escondido, mas todos concordavam que o jovem Léo Stark jamais voltaria a ser o mesmo.
Enquanto isso, no Vilarejo de Brisighella, uma pequena taberna estava lotada. Homens e mulheres bebiam e discutiam acaloradamente sobre os acontecimentos recentes. Uma figura encapuzada, sentada em um canto escuro, observava tudo em silêncio. Seus olhos faiscavam com interesse, como se absorvessem cada fragmento de conversa. O mistério e a desconfiança pairavam no ar, mas ninguém se atrevia a questionar diretamente o que havia acontecido. A verdade era algo perigoso demais para ser revelado.
O reino estava em estado de alerta. Em cada cidade e vilarejo, guardas e cavaleiros patrulhavam as ruas com mais frequência, suas armaduras brilhando sob o sol poente. A presença de soldados era um lembrete constante de que a paz em Lumirian era frágil, e que qualquer perturbação poderia trazer de volta o caos. A notícia de que alguns membros da realeza haviam perecido durante o conflito em Sorano apenas aumentava a tensão. As famílias nobres estavam reclusas, temendo novos ataques e conspirações.
Enquanto isso, a Academia de Cavaleiros Perlasca estava em um estado de luto e celebração. A morte de Lucius havia deixado um vazio difícil de preencher, mas ao mesmo tempo, os jovens cavaleiros que haviam se destacado na batalha contra a máfia Wolfs e a vampira Wanda estavam sendo condecorados por seus feitos. Entre eles estavam Lucas, Lumina, Greg, Cedric, Léo, Alex e Annie, que, apesar de terem sobrevivido e contribuído para a derrota dos criminosos, carregavam o peso de saberem a verdade.
Nos salões da academia, cerimônias de homenagem eram realizadas em memória de Lucius. Retratos do diretor adornavam as paredes, e discursos sobre sua bravura e sacrifício eram feitos por aqueles que o admiravam. No entanto, para os jovens cavaleiros, cada palavra era um lembrete doloroso da mentira que precisavam manter. Eles sabiam que Lucius não era o herói que todos acreditavam ser, mas sim uma figura trágica, corrompida pelo poder e pela ambição.
Os líderes do reino, temendo a desestabilização e o pânico, decidiram encobrir a verdade. O verdadeiro embate entre Léo e Lucius, assim como o envolvimento de Léo na destruição de Sorano, foi cuidadosamente suprimido. Em vez disso, a narrativa de que as Garras do Dragão foram responsáveis pela calamidade foi espalhada, com o Mago da Máscara de Ferro, Fockz, sendo apontado como o principal culpado. Ele continuava foragido, um inimigo invisível que servia como bode expiatório para os medos do povo.
Enquanto a versão oficial dos eventos se espalhava, Léo se isolava em um local remoto, longe da academia e das cidades. O peso das ações que havia tomado, e das vidas que haviam sido perdidas, era uma carga que ele sabia que teria que carregar pelo resto de seus dias. O jovem cavaleiro, outrora cheio de sonhos e esperanças, agora enfrentava uma realidade dura e amarga. O destino de Lumirian ainda estava incerto, e ele sabia que o caminho à frente seria cheio de desafios e sacrifícios.
Léo observava o horizonte, a chama de sua espada refletindo nos olhos, enquanto o sol se punha. A jornada dele estava longe de terminar. Ele sentia que havia mais por vir, mais batalhas a serem travadas, não apenas contra inimigos externos, mas também contra os demônios internos que agora o assombravam. E embora o reino estivesse mergulhado em mentiras e incertezas, Léo sabia que, eventualmente, a verdade viria à tona, e quando isso acontecesse, ele precisaria estar pronto.
A noite caiu sobre Lumirian, mas a chama de resistência dentro de Léo continuava a arder, pequena, mas inextinguível.
Léo estava perdido em pensamentos quando, de repente, sentiu uma presença familiar se aproximando. Levantou o olhar e, antes que pudesse reagir, foi surpreendido por Lumina, que correu em sua direção e se lançou em seus braços. O impacto suave do corpo dela contra o dele quebrou a barreira de solidão e dor que o jovem cavaleiro havia erguido em torno de si. As lágrimas de Lumina molhavam sua túnica, e ele percebeu o quanto ela também sofria.
— Desculpa, Léo… Eu sinto tanto… — Lumina soluçava, apertando-o com mais força, como se temesse que ele desaparecesse. — Eu não devia ter deixado as coisas chegarem a esse ponto. Tudo isso... tudo isso é minha culpa.
Léo, ainda em choque pelo contato, demorou a responder. Finalmente, com uma voz suave e reconfortante, começou a passar a mão pelos cabelos de Lumina, tentando acalmá-la.
— Shh... Você fez o que achava certo, Lumina. — Ele sussurrou, tentando manter a voz firme. — Não se culpe. Não foi sua culpa... nada disso foi.
Eles permaneceram ali, abraçados, por um longo tempo, como se o mundo ao redor tivesse parado. O calor do corpo de Lumina e o peso do momento fizeram com que Léo se sentisse mais humano, menos como a arma de destruição que todos agora temiam. No fundo, ele sabia que aquele abraço era algo que ele precisava, algo que o mantinha ancorado à realidade, à esperança.
O silêncio foi quebrado pelo som de passos leves se aproximando, e uma voz conhecida interrompeu o momento.
— Desculpa atrapalhar o casalzinho, mas precisamos voltar para a academia. — Lucas disse com um tom brincalhão, mas com um sorriso que mostrava que ele entendia o quão importante aquele momento era para os dois.
Léo levantou a cabeça, relutante, o peso da realidade retornando com força. A ideia de voltar à Academia de Cavaleiros Perlasca o enchia de uma mistura de emoções conflitantes. Ele sabia que a academia representava tanto seus sonhos quanto seus pesadelos. E, acima de tudo, sabia que retornar significava enfrentar as consequências do que havia ocorrido.
— Não sei se quero voltar, Lucas... — Léo murmurou, quase para si mesmo. — Talvez seja melhor eu ir para casa, me afastar de tudo isso.
Enquanto ele falava, outra figura se aproximou por trás dele. Antes que pudesse perceber, sentiu uma dor aguda na cabeça ao ser atingido por um soco. Virou-se, surpreso, e deu de cara com Alex, que estava visivelmente irritada, mas ao mesmo tempo aliviada.
— Idiota! — Ela exclamou, o rosto corando um pouco ao perceber que tinha chamado a atenção de todos. — Eu quase morri usando aquele golpe gravitacional no final da sua luta. Fiz aquilo com o único objetivo de te fazer voltar...
As palavras dela saíram com uma intensidade que fez Léo perceber o quanto todos eles estavam ligados, não apenas por serem colegas, mas por algo mais profundo. Alex, percebendo o que havia dito, corou ainda mais e, tentando disfarçar, completou rapidamente.
— Digo, para voltar para a academia e terminarmos o ano juntos, seu cabeça-dura.
Lumina, que ainda estava nos braços de Léo, sorriu ao ouvir isso. O calor de seus amigos, mesmo nas situações mais difíceis, sempre conseguia iluminar os cantos mais sombrios do coração de Léo.
Ele soltou um suspiro profundo e olhou para o horizonte, onde o sol começava a se pôr, tingindo o céu de laranja e vermelho. As palavras dos seus amigos, a presença deles ao seu lado, o fazia perceber que, apesar de tudo o que havia ocorrido, ele não estava sozinho.
— O que eu seria sem vocês? — Léo murmurou, um pequeno sorriso aparecendo em seus lábios pela primeira vez em muito tempo.
— Um desastre ainda maior do que já é. — Lucas respondeu com um sorriso travesso.
— Exato. — Alex completou, cruzando os braços e tentando manter uma expressão séria, mas seus olhos brilhavam de preocupação e carinho.
Léo não pôde deixar de rir um pouco, um som que parecia estranho após tanto tempo de tensão e tristeza. Ele sabia que o caminho à frente ainda seria difícil, mas com eles ao seu lado, sentia que talvez pudesse enfrentá-lo.
— Vamos então. — Léo disse finalmente, seu olhar determinado. — Temos um ano para terminar, e eu tenho que acertar umas contas com a academia.
Juntos, os quatro começaram a caminhar em direção à Academia de Cavaleiros Perlasca. Enquanto o sol se punha, os raios dourados pareciam traçar um caminho no horizonte, como um símbolo de esperança para o futuro. Havia muito a ser feito, muitos desafios a serem enfrentados, mas, por enquanto, eles estavam juntos, e isso era o suficiente.
Após a devastadora batalha que abalou tanto a antiga capital, Sorano, quanto a atual capital real, o Reino de Lumirian mergulhou em um período de reconstrução. As ruínas das duas grandes cidades eram um lembrete sombrio das forças que quase as destruíram. Os dias seguintes foram marcados por um esforço conjunto para reerguer o que foi perdido, e toda a nação se uniu em torno de um objetivo comum: restaurar o que havia sido destruído.
Na antiga capital, Sorano, o trabalho era particularmente árduo. As ruas, antes majestosas e cheias de história, estavam agora cobertas de escombros. Muitos dos edifícios antigos haviam sido reduzidos a entulho, e o solo, ainda instável pelos tremores provocados pela Espada Mágica dos Tremores, tornava a reconstrução um desafio complexo. Garimpeiros experientes foram trazidos de todos os cantos do reino para ajudar na remoção de destroços e para procurar materiais valiosos perdidos nas profundezas da terra.
Esses garimpeiros, com suas picaretas encantadas e olhos treinados, trabalhavam lado a lado com magos especializados em magia de terra e transmutação. Esses magos eram capazes de mover grandes quantidades de solo e pedra com facilidade, reconstruindo as fundações dos prédios desmoronados e reforçando o terreno instável. O trabalho era meticuloso e exigia tanto força física quanto um conhecimento profundo das artes mágicas e de engenharia.
Os marceneiros desempenharam um papel crucial na reconstrução das cidades destruídas, usando suas habilidades para erguer novas estruturas e restaurar as antigas. Eles trabalharam incansavelmente para reconstruir casas, pontes e fortalezas, garantindo que as cidades voltassem a florescer com vigor renovado, mantendo viva a esperança de um futuro melhor para todos.
Enquanto isso, na atual capital real, os esforços de reconstrução estavam igualmente intensos. A cidade, que havia sido palco de tremores catastróficos, ainda exibia cicatrizes profundas em suas ruas e edifícios. Cavaleiros, que antes estavam focados em proteger o reino de ameaças externas, agora voltavam suas espadas e habilidades para uma causa mais pacífica. Eles patrulhavam as ruas em ruínas, protegendo os trabalhadores e garantindo que nenhum perigo surgisse durante a reconstrução. Além disso, muitos cavaleiros estavam diretamente envolvidos nos esforços de reconstrução, usando suas habilidades físicas para erguer paredes e carregar materiais pesados.
A Academia de Cavaleiros Perlasca, reconhecendo a importância da reconstrução para a estabilidade do reino, decidiu envolver seus aprendizes nessa missão crucial. Missões foram atribuídas a grupos de aprendizes, e eles foram enviados tanto para Sorano quanto para a capital real, com o objetivo de auxiliar na reconstrução das cidades. Essas missões não eram apenas uma forma de ajuda, mas também uma lição valiosa para os jovens cavaleiros em formação, mostrando-lhes a importância de proteger e reconstruir o reino.
Léo, Lucas, Lumina, e Alex estavam entre os aprendizes designados para essas missões. Para eles, a tarefa era tanto um dever quanto uma forma de redenção, especialmente após os eventos que levaram à destruição. Cada um deles tinha uma função específica: Léo, com sua força e habilidades recentemente descobertas, ajudava a mover grandes pedras e materiais. Lucas, com seu conhecimento tático, coordenava equipes de trabalhadores para garantir que o trabalho fosse eficiente. Lumina, com sua habilidade mágica, auxiliava os magos na reconstrução das estruturas mais delicadas, enquanto Alex, com sua capacidade estratégica, liderava as missões de patrulha e segurança ao redor dos locais de reconstrução.
Os aprendizes da academia aprenderam rapidamente que o trabalho de reconstrução era árduo e exigia tanto coragem quanto paciência. Cada dia era uma batalha contra o tempo, contra os elementos e, por vezes, contra os próprios limites físicos e emocionais. Mas, à medida que as semanas passavam, os resultados começavam a aparecer. Edifícios que antes eram apenas ruínas começaram a tomar forma novamente, as ruas foram limpas e reforçadas, e a vida começou a retornar tanto a Sorano quanto à capital real.
A população, inicialmente abalada e desmoralizada, começou a recuperar a esperança ao ver os esforços de reconstrução. Os aprendizes de cavaleiro, antes vistos apenas como jovens inexperientes, ganharam o respeito e a admiração das pessoas, que viam neles a nova geração de protetores e líderes do reino.
Sorano e a capital real, embora ainda distantes de sua antiga glória, estavam em um caminho firme de recuperação. As cicatrizes da batalha permaneceriam por muito tempo, mas o espírito de Lumirian era inquebrável. E, à medida que os aprendizes da Academia de Cavaleiros Perlasca davam o melhor de si para ajudar na reconstrução, sabiam que estavam fazendo parte de algo maior que eles mesmos: a restauração de um reino que, mesmo diante da adversidade, não se curvaria.