A notificação pulsava em azul etéreo, seu brilho contrastando com as sombras que já começavam a envolver o dormitório no entardecer:
[Requisição Interna de Missão – Zona Avaliação E]
Setor 7 – Subnível Inativo
Natureza: Limpeza e reconhecimento de área
Status: Classificação Baixa / Voluntária
Recompensa: 1500 pontos de contribuição + bônus por desempenho
Bryan franziu o cenho, estudando cada palavra com a minúcia de quem lê uma sentença de morte. O dispositivo digital marcava 17h42 – hora estranha para qualquer missão de reconhecimento oficial.
"Limpeza e reconhecimento no Setor 17? A essa hora?" murmurou para si mesmo, enquanto seus olhos âmbar escaneavam os detalhes menores da notificação.
Com um gesto preciso, tocou a borda do holograma, buscando informações adicionais. Nada. A missão não possuía instrutor nomeado, nenhum símbolo de facção visível. Apenas um selo solicitado de requisição interna – anônimo, discreto, perigosamente vago.
O canto de sua boca se ergueu num breve sorriso involuntário.
Suspeito. Extremamente suspeito.
E era exatamente esse tipo de armadilha que Bryan aceitava deliberadamente. Não por arrogância ou por necessidade de se provar. Mas porque precisava entender quem tinha interesse em provocá-lo, em testá-lo ou – mais provavelmente – em eliminá-lo.
A Academia Imperial estava repleta de sombras mais profundas do que a maioria dos estudantes jamais perceberia. Sombras que agora pareciam chamar por ele.
Trinta minutos depois, Bryan atravessava os corredores externos da Academia. O manto negro de infiltração tremulava levemente atrás dele como asas de um corvo enquanto seus passos, quase inaudíveis graças às botas encantadas, marcavam um ritmo constante e determinado.
Seu traje de combate noturno abraçava cada músculo como uma segunda pele: tecido elástico reforçado com fibras mágicas, placas estrategicamente posicionadas para absorção de impacto, e equipamentos ocultos nas dobras do tecido. O capuz lançava uma sombra parcial sobre os cabelos brancos, tornando seu rosto uma máscara de contrastes sob a luz débil dos corredores.
As adagas gêmeas repousavam em coldres ocultos junto às costelas, enquanto duas espadas curtas cruzavam suas costas como presas adormecidas, prontas para dilacerar quem quer que estivesse esperando por ele nas profundezas da Academia.
Bryan não se permitiu hesitar ao alcançar o ponto de descida – um portal rúnico antigo, quase esquecido, que levava ao Setor 7. A estrutura estava coberta por uma camada fina de poeira, as inscrições mágicas desgastadas pelo tempo. Pouquíssimos sequer sabiam que aquele lugar ainda era funcional. Menos ainda possuíam autorização para entrar.
Mas agora ele tinha. E isso por si só já era informação suficiente.
Seus olhos escanearam o ambiente uma última vez, verificando se estava sendo observado, antes de ativar a runa de acesso. Em segundos, o portal vibrou com energia arcana ancestral, emanando um brilho azulado que contrastava com a quietude do local.
"Vamos descobrir quem está jogando comigo," pensou Bryan, enquanto sentia seu corpo sendo puxado pelo feixe de teleporte.
A sensação de deslocamento durou apenas um instante antes de Bryan se materializar numa câmara ampla de pedra negra e fria. O ar ali tinha densidade quase palpável – um misto de umidade estagnada, ferrugem antiga e algo mais indefinível, como sussurros presos nas paredes por séculos.
Corredores estreitos se estendiam em várias direções, precariamente iluminados por cristais azulados que pareciam lutar para manter sua luz. O silêncio era absoluto, quebrado apenas pelo som ocasional de gotas caindo em poças distantes.
Bryan inspirou profundamente, deixando os sentidos refinados absorverem cada detalhe. O chão irregular guardava pegadas recentes – movimento calculado, não aleatório. Padrões de deslocamento similares aos usados por equipes treinadas. Posicionamento tático.
"Definitivamente não é uma missão padrão," concluiu, enquanto sua mente já mapeava rotas de fuga e pontos de emboscada potenciais.
Com um pensamento silencioso, ativou o Sistema:
"Análise de Combate."
O mundo ao seu redor ganhou novas dimensões instantaneamente. Correntes de mana residual se tornaram visíveis como filamentos azulados. Pontos de calor deixados por passagens recentes. Padrões de deslocamento de ar indicando movimentação nos corredores adjacentes.
Bryan avançou com a fluidez de um predador noturno, cada passo medido, cada sentido em alerta máximo. Na primeira bifurcação, detectou uma sutil mudança na pressão atmosférica – alguém ou algo se aproximando, tentando encurralá-lo.
Ele sorriu internamente. A presa conhecia a armadilha – o que a tornava o verdadeiro caçador.
Na terceira curva do corredor labiríntico, o ataque veio.
Três figuras encapuzadas materializaram-se das sombras como se fossem parte delas. Moviam-se com a sincronia perturbadora de assassinos treinados juntos por anos. Adagas curvas cintilavam nas mãos de dois deles, enquanto o terceiro empunhava chakrams – armas letais em mãos experientes.
Nenhuma palavra foi dita. Nenhum aviso oferecido. Apenas intenção letal pura.
Bryan respondeu como água envenenada – fluido, adaptável e mortalmente preciso.
Desviou-se do primeiro ataque com um movimento lateral quase impossível, seu corpo inclinando-se em um ângulo que desafiava as limitações normais. No mesmo movimento contínuo, a lâmina em sua mão esquerda riscou o ar com precisão cirúrgica, rasgando a lateral da túnica do primeiro agressor e extraindo uma linha fina de sangue.
O segundo atacante aproveitou o momento para lançar um chute giratório imbuído de mana – a energia azulada intensificava a força do golpe para níveis capazes de estilhaçar ossos. Bryan reagiu por puro instinto, abaixando-se sob o arco do ataque enquanto sua mão capturava o tornozelo no ar.
Com um giro brutal de seu próprio corpo, Bryan arremessou o agressor contra a parede de pedra. O impacto ecoou pelo corredor, seguido pelo som inconfundível de ossos se quebrando e um gemido abafado.
O terceiro atacante, mais cauteloso que seus companheiros, recuou dois passos enquanto seus dedos traçavam padrões complexos no ar. Um selo explosivo começou a se formar – uma ruína de destruição prestes a ser liberada.
Bryan não permitiria.
Em um movimento que beirava a um teletransporte, atravessou o espaço entre eles. Antes que o selo pudesse ser completado, o encapuzado se viu pressionado contra uma pilastra antiga, a lâmina de Bryan forçada contra sua garganta com pressão calculada – suficiente para ameaçar, sem cortar fatalmente. Ainda.
"Quem mandou vocês?" a voz de Bryan saiu como um sibilo perigoso, seus olhos âmbar penetrando a sombra do capuz para encarar o adversário.
O silêncio foi sua única resposta. Nenhum medo se manifestou na linguagem corporal do homem – apenas uma calma anormal diante da morte iminente.
Bryan aumentou a pressão da lâmina, sentindo a resistência da pele começar a ceder.
"Fala… ou sangra," articulou, cada palavra carregada com a promessa de que não hesitaria em cumprir a ameaça.
"Chega."
A voz veio das sombras mais profundas do corredor – serena e cortante como gelo deslizando sobre vidro polido. Não era um grito, sequer um comando enfático. Era uma constatação tranquila de alguém acostumado a ser obedecido sem questionar.
Bryan girou instantaneamente, a segunda lâmina já em mãos, seu corpo assumindo postura defensiva perfeita. Mas o ataque esperado não veio.
Uma figura solitária emergia da escuridão com passos medidos e silenciosos. Envolto em um manto púrpura profundo com costuras negras intrincadas, o homem se aproximava sem pressa. Era alto e esguio, com a postura perfeita de um aristocrata guerreiro. Seu rosto permanecia descoberto – um gesto deliberado de confiança ou, talvez, de absoluta certeza em sua capacidade de se defender mesmo conhecido.
Os olhos do estranho eram o que mais chamavam atenção – âmbar como os de Bryan, mas de um tom mais antigo, como metal temperado por décadas de experiência. Neles, Bryan reconheceu a mesma frieza calculista que via em si mesmo quando se olhava no espelho – mas lapidada pelo tempo, refinada pela experiência, tornada letal pela prática.
A presença do homem era ao mesmo tempo sutil e esmagadora. Ele não irradiava aura como os magos ostentosos da Academia; sua força era contida, precisamente controlada, como uma lâmina envolvida em seda fina.
"Isso não foi uma emboscada, Bryan Blake," disse o homem, sua voz baixa reverberando no corredor estreito como uma sentença final. "Foi uma convocação. Um teste." Deu mais um passo à frente, os olhos fixos nos de Bryan, sem piscar. "E você passou.
O olhar de Bryan permaneceu impenetrável enquanto avaliava o homem à sua frente. Não havia surpresa em seus olhos, apenas uma calculada reavaliação da situação. Os três atacantes haviam recuado, adotando posições de sentinela nas sombras – não mais ameaças, mas guardiões daquele encontro clandestino.
"Gostaria de saber que tipo de teste exige uma emboscada nas profundezas da Academia," respondeu Bryan, sem baixar completamente as armas. "E quem está tão interessado nos meus resultados."
O homem de manto púrpura sorriu levemente – o gesto não alcançou seus olhos.
"Meu nome é Kethras Vayne. Sou o Primeiro Lâmina das Lâminas do Crepúsculo." Ele fez um gesto sutil com a mão, e as paredes ao redor começaram a brilhar com runas ocultas, revelando que estavam em uma câmara maior do que parecia inicialmente. "Há muito observamos sua… adaptação à Academia."
Bryan embainhava lentamente suas armas, mas sem relaxar a postura defensiva.
"Então essa foi sua forma de dizer olá?" perguntou, o sarcasmo escondendo sua análise constante da situação.
Kethras caminhou em direção ao centro da câmara, onde uma mesa circular de pedra escura surgiu do chão, envolta em símbolos arcanos quase imperceptíveis.
"Foi nossa forma de confirmar o que já suspeitávamos," respondeu calmamente. "A maneira como você lida com Kyle Trevane foi… reveladora. Mas precisávamos ver como você responde a uma ameaça real, sem espectadores, sem limites acadêmicos."
Ele gesticulou para a mesa.
"As Lâminas do Crepúsculo não recrutam pela pompa ou pelo espetáculo, como a Alvorada Arcana. Nem pelo simples teste de força, como os Punhos de Aço." Seus olhos fixaram-se em Bryan. "Recrutamos pela eficiência. Pela capacidade de agir nas sombras com precisão cirúrgica."
Bryan se aproximou da mesa, mas manteve-se em pé.
"E imagino que queira me recrutar," deduziu, sua voz neutra não revelando se a ideia o atraía ou repulsava.
"Oferecemos a você um lugar entre as Lâminas," confirmou Kethras. "Um caminho que poucos são dignos de trilhar. Autorização para missões de alto valor, acesso aos nossos recursos, treinamento especializado…"
"Não," cortou Bryan, surpreendendo Kethras pela primeira vez. "Não estou interessado em jurar lealdade a mais um grupo que tentará me controlar."
Um silêncio pesado pairou sobre a câmara. Os guardas na periferia enrijeceram, mas Kethras apenas inclinou levemente a cabeça, os olhos âmbar estudando Bryan com renovado interesse.
"Interessante," murmurou, quase para si mesmo. "A maioria imploraria pela oportunidade. Outros teriam medo de recusar." Ele circundou a mesa, mantendo os olhos fixos em Bryan. "Talvez, então, possamos chegar a um acordo diferente? Algo mais… adaptado às suas necessidades particulares?"
Bryan estreitou os olhos, percebendo a abertura.
"Que tipo de acordo você propõe?"
Kethras fez um gesto elegante com a mão. "Proponha você os termos. O que exigiria para representar as Lâminas do Crepúsculo?"
Bryan calculou rapidamente. A facção poderia ser útil, um meio para seus verdadeiros fins, desde que não o aprisionasse.
"Acesso aos portais da facção," disse finalmente, articulando cada termo com precisão. "Uso da arena privada de treinamento quando eu desejar, sem restrições. E, mais importante: nenhuma obrigação de seguir ordens que não me interessem."
Ele deu um passo à frente, seus olhos encontrando os de Kethras em um desafio silencioso.
"Não serei controlado. Por ninguém."
Kethras não recuou. Pelo contrário, um sorriso sutil formou-se em seus lábios.
"Os portais até rank C estão disponíveis para você," respondeu com calculada precisão. "Seu tier atual não permitiria segurança em portais superiores, independentemente de suas… habilidades excepcionais."
Ele ergueu um dedo.
"Entretanto, precisará formar uma equipe de pelo menos cinco membros para entradas oficiais. É protocolo de segurança, não negociável."
Bryan manteve a expressão neutra, embora a limitação o incomodasse. Portais superiores e a obrigação de ter uma equipe não estavam em seus planos.
"Quanto à sua autonomia," continuou Kethras, "as Lâminas exigem apenas duas coisas: sua presença nos torneios entre facções, representando nossa bandeira, e participação nas raids oficiais dos portais. No resto, você terá liberdade para seguir seus próprios caminhos."
Bryan ponderou as condições. Não era ideal – a limitação dos portais e a exigência de equipe eram obstáculos. Mas pesando tudo, ainda representava um avanço rápido comparado ao caminho convencional da Academia.
"E se eu recusar?" perguntou, testando o terreno.
"Então você sairá daqui sem consequências," respondeu Kethras sem hesitação. "Continuará seu caminho na Academia como qualquer outro estudante talentoso… embora saibamos que você está longe de ser comum."
Bryan bufou levemente, considerando suas opções. Os benefícios eram tentadores, e as restrições, embora irritantes, não o prendiam realmente. Era um meio para alcançar seus objetivos mais rapidamente.
"Aceito seus termos," disse finalmente, "com uma condição adicional: se em algum momento nossas prioridades se tornarem incompatíveis, tenho o direito de deixar a facção sem represálias."
Kethras estudou-o por um longo momento antes de estender a mão.
"As Lâminas do Crepúsculo aceitam suas condições, Bryan Blake."
Quando suas mãos se encontraram, runas prateadas brilharam brevemente entre seus dedos, selando o acordo como um contrato mágico.
"Bem-vindo às sombras," disse Kethras, sua voz agora carregando um tom quase paternal. "Acredito que descobriremos juntos até onde sua… peculiar natureza pode nos levar."
Bryan apenas assentiu, já calculando como usar esta nova conexão para seus verdadeiros propósitos. As Lâminas seriam um caminho, não um destino.
E ninguém – nem mesmo o astuto Kethras Vayne – precisava saber o que realmente movia Bryan Blake.