Essa é, sem dúvida, uma das partes mais malucas da minha vida.
Durante o ensino fundamental, havia um valentão que vivia me enchendo o saco. No entanto, minha personalidade sempre foi tranquila. Nunca consegui sentir ódio de ninguém. Até para um inimigo, desejo o bem. Em uma discussão, prefiro sair como errado do que brigar para provar meu ponto.
Quando chegamos ao ensino médio, o destino nos colocou na mesma sala no primeiro ano. Era como se houvesse dois tigres caçando, cada um no seu canto. Ele sentava atrás, e eu na frente. Mas não se engane: sentar na frente não significava que eu era comportado. Eu conversava muito, passava cola e ajudava meus colegas em tudo o que sabia.
Certo dia, tive um desentendimento com outro cara e já estava pronto para soltar o soco quando, do nada, o valentão interveio. O outro era amigo dele, então, de repente, a briga virou entre eu e ele. Nunca fui de envolver terceiros nos meus problemas, sempre fui eu por mim mesmo. Mas, naquele momento, percebi que a situação tinha tomado outro rumo.
Ele se lembrou que, no fundamental, me provocava e eu nunca revidava. Achou que poderia dominar a "floresta". Mas pessoas pacíficas só são pacíficas porque conhecem o ódio que carregam. Com o tempo, fui me estressando com aquela situação, até que um dia pensei:
"No dia em que eu acordar de mau humor, ele vai ver."
Esse dia chegou. Acordei cedo, nem tomei café da manhã e fui direto para a escola, determinado a resolver tudo de uma vez. Quando cheguei, ele estava confiante, exalando aquele ar de superioridade. Assim que abriu a boca, mandei calar a boca. Ele xingou minha mãe.
Foi automático. Levantei. A sala inteira assistia como se já soubesse o desfecho. Os "playboys" torciam para ele, mas a galera da quebrada me conhecia. Ele veio na minha direção enquanto eu mantinha os braços abaixados. No momento em que deu o primeiro soco, algo despertou dentro de mim. Passei o dedo no rosto e vi um sinal vermelho.
A partir daí, foi instinto puro. Ele não sabia se se defendia ou me batia. Lembro apenas da professora tentando me separar, colocando a mão no meu rosto para que eu não conseguisse vê-lo. A porta da sala ficou lotada, e meus dedos estavam doloridos.
Depois, fomos parar na diretoria. A mãe dele chegou a ir na minha casa, dizendo que eu era de "gangue". Para piorar, um colega ouviu os amigos dele planejando me pegar na saída. Eu, como um bocó, não sabia de nada. Mas, no fim da aula, mais de 20 pessoas me acompanharam até minha casa, me protegendo. Foi um dos dias mais confusos da minha vida.
Lembro da cara do meu pai quando me viu chegando com aquela multidão. Eu não tive culpa de nada, mas aquela confusão toda me marcou.
Três semanas depois, pedi desculpas para ele enquanto jogávamos bola. Nunca mais brigamos. No fundo, sabíamos que tudo saiu do controle.
A maior surpresa para nós dois foi ver quantas pessoas estavam dispostas a me proteger.
Infelizmente, esse rapaz não está mais entre nós. Depois do ensino médio, ele faleceu em um acidente de trabalho. Quando soube, me senti muito mal. Mas teria sido pior se eu não tivesse pedido desculpas.