Novos Caminhos, Velhas Feridas

Faltavam-me palavras para descrever o que estava diante de mim. Era um espetáculo deslumbrante: árvores de todas as formas e tamanhos, campos verdejantes que se estendiam até onde a visão alcançava, majestosas montanhas ao longe, e flores exóticas que nunca havia visto antes. Pássaros fascinantes cruzavam os céus sobre nós. Parecia que havíamos adentrado um mundo completamente novo. Mesmo contemplando tudo aquilo, não conseguia acreditar. 

Começamos a descer o morro, e todos ainda estavam desnorteados, observando tudo ao redor. Perguntava-me como isso era possível, como poderia ser tão diferente. Sempre considerei o reino de Bartton incrível, mas nada se comparava a isso. 

— Se não me engano, se seguirmos esse caminho, chegaremos a Graldrak. Vamos! — disse Edrian. 

Seguimos em frente pelo pequeno caminho. O clima era muito agradável. Fechei os olhos enquanto uma brisa suave passava por nós. Estava um pouco surpreso; achei que Clarice fosse parar a todo momento, mas ela apenas contemplava tudo com olhos arregalados. Talvez não quisesse mais atrapalhar o grupo após o ocorrido anterior. 

Alguns minutos depois, avistamos uma cidade no horizonte, provavelmente Graldrak. Não parecia ser muito grande; era apenas um pouco maior que uma vila. Conforme nos aproximávamos, percebi algo surpreendente: os anões haviam construído ou auxiliado na construção de Sylvaris, pois ambas compartilhavam semelhanças arquitetônicas. 

Ao adentrarmos na cidade, vi casas baixas de pedra, pequenas e robustas. As construções anãs originais ainda eram habitadas, mas muitas haviam sido ampliadas pelos humanos, com a adição de telhados de palha ou madeira. Isso evidenciava que as habilidades dos anões estavam em um nível excepcional. Mesmo após um milênio, grande parte de sua obra ainda estava preservada. 

Em alguns pontos, havia antigas passagens subterrâneas, mas pareciam abandonadas. Os humanos provavelmente as consideravam perigosas, além de pequenas demais para seu uso. Ao redor, vastos campos verdes e pastagens se estendiam, onde agora criavam gado e cultivavam cereais. No centro da cidade, um poço esculpido com runas antigas ainda fornecia água. 

Enquanto caminhávamos pelas ruas, notei ferreiros humanos tentando aprender com o passado. Sem o talento dos anões, a forja humana na cidade era inferior. Muitos utilizavam ferramentas antigas deixadas pelos mestres anões. 

Alguns humanos incorporaram músicas e lendas anãs às suas próprias tradições, criando uma fusão cultural única. Algumas famílias entoam essas canções enquanto trabalham na lavoura, muitas vezes sem compreender plenamente seu significado original. Aprendi muitas coisas com o mestre sobre os anões. 

Os camponeses e artesãos vestiam túnicas de linho ou lã fina, ajustadas por cintos de couro simples, enquanto calças leves e botas de sola macia tornavam o trabalho no campo mais suportável. Já os ferreiros e guerreiros, inspirados nos antigos mestres da forja, usavam roupas reforçadas, com aventais de couro grosso e braçadeiras resistentes. 

Os mais abastados, como mercadores e nobres locais, tentavam imitar a grandeza esquecida dos anões, ostentando bordados dourados e fivelas metálicas incrustadas com pedras lapidadas nas minas antigas. 

Enquanto Edrian buscava informações sobre o lorde da cidade, ouvi as pessoas comentando e descobri que os humanos não têm interesse nas minas antigas, pois são difíceis de escavar sem o conhecimento adequado. Alguns acreditam que criaturas sombrias espreitam nas profundezas. 

— Vamos falar com o lorde. Parece que ele fica naquela casa maior — indicou Edrian, apontando para uma grande casa no centro da cidade. 

Ao nos aproximarmos, Edrian foi até um guarda que estava na entrada e começou a falar com ele. Momentos depois, ele veio até nós. 

— Esperem aqui um pouco. Vou falar com ele. 

Edrian entrou na casa acompanhado por um guarda. Esperamos por alguns minutos até que outro guarda veio nos chamar. 

Ao adentrarmos, percebemos que o local era bem construído. As grandes pedras, meticulosamente colocadas, conferiam um charme adicional. Seguimos por um amplo salão até uma sala onde encontramos um grande escritório. Edrian estava sentado em uma cadeira, enquanto outro homem, provavelmente o lorde, ocupava uma poltrona atrás de uma mesa. 

— Bem-vindos, me chamo Dorian Valmont. Sou o lorde da cidade e soube que vocês atravessaram a Floresta da Noite Eterna e eliminaram o perigo. Não tenho palavras pra agradecer. Mandei vários homens, mas nenhum retornou. 

O homem de cabelos grisalhos e olhos castanhos vestia uma roupa de tecido refinado, complementada por anéis de ouro delicadamente trabalhados em seus dedos. 

— Nós só estamos aqui por causa dessa pessoa. — Edrian apontou para mim. 

— Hm… Você deve ser um guerreiro impressionante. Não quer trabalhar na minha guarda? Pago bem. 

— Não, estou apenas de passagem. 

— Que pena. 

Dorian se levantou, caminhou até um armário, abriu uma porta e retirou algo de dentro. 

— Conforme consta no pergaminho assinado pelo rei de Oastein, aqui tá o pagamento de vocês. — Ele se virou colocando alguns sacos de moedas sobre a mesa. 

Cada um pegou sua bolsa com 100 cruzeiros e agradeceu a Dorian. 

— Poderiam esperar um pouco lá fora? Preciso conversar com Dorian — pediu Edrian. 

Nós saímos do escritório e aguardamos no salão. Como já havia recebido o pagamento, eu queria partir em direção ao porto. Poucos minutos depois, Edrian surgiu acompanhado de Dorian. 

— Saito, Edrian me contou tudo. Quero agradecer novamente. Quanto àqueles dois, serão presos. Diga-me, ainda tem mais daqueles monstros na floresta? 

— Não sei exatamente, mas é provável que não. 

Aquele corrompido estava na floresta porque era uma rota única que conectava os reinos. Ele buscava um portador das pedras, mas aparentemente partiu. 

Teriam encontrado o paradeiro de uma das pedras, forçando um retorno urgente? Eu precisava agir rapidamente e localizar aquela caverna. 

— É bom ouvir isso. Se precisar de algo, é só me avisar. 

— Não precisa. Estou de partida pro porto. 

— Entendo. Siga a estrada próxima do rio e chegará ao seu destino sem problemas. 

— Na verdade, gostaria de pedir uma coisa. 

— O que? 

— Você tem algum metal sobrando? 

— Metal? Você quer dizer alguma arma? 

— Não precisa ser uma arma, pode ser pedaços, até armas quebradas. 

— Nós já estávamos com falta de minérios e metais e íamos começar a fazer Incursões às nossas minas. mas, agora que o comércio com Sylvaris pode ser restabelecido, essa escassez pode ser resolvida. Vou conseguir os metais para você. — Ele chamou um dos guardas e o informou para trazer os metais. 

Após isso, saímos da casa juntos, sem saber quanto tempo levaria para chegar ao porto de Drakvar. O melhor era partir o quanto antes, já que o mapa a partir desse ponto continha poucas informações. 

Clarice se despediu de todos com lágrimas nos olhos. Talia a abraçou emocionada, e Clarice, incapaz de conter a emoção, retribuiu o gesto. Em poucos dias, as duas desenvolveram uma forte amizade. Os demais também expressaram sua gratidão com palavras e gestos sinceros. 

— Saito, aqui, pegue. — Edrian estendeu um pequeno saco para mim. 

— Pra que isso? 

— Decidimos que cada um daria 20 cruzeiros de suas recompensas. 

— Não precisa. 

— Claro que precisa. Se não fosse por você, talvez nem estivéssemos vivos. Além disso, pode ficar com a carroça e o burro. Como vai viajar, vai precisar mais dele do que nós. 

— Anda, pega logo. Você merece mais do que qualquer um aqui. Se a gente se encontrar de novo, te pago uma bebida — comentou Otto com um sorriso. 

— Tá bom. Obrigado. 

Agradeci com um leve aceno e segui até a carroça com Clarice. O guarda trouxe uma quantidade razoável de metal e, juntos, organizamos nossos pertences antes de iniciar a jornada, enquanto os outros nos despediam com acenos. 

— Clarice, espero te ver de novo! — gritou Talia. 

Clarice se despediu com um aceno, enxugando as lágrimas com o braço. Antes de deixarmos a cidade, parei em uma barraca para comprar alguns suprimentos. A carne estava muito cara, então decidi não levar, já que não fazia ideia de quanto custaria o transporte de barco. 

Ao deixarmos a cidade, enquanto guiava o burro na carroça, olhei para trás e vi Clarice sentada, seu rosto iluminado por um sorriso sereno, como se estivesse em paz com tudo ao seu redor. 

— Por que tá sorrindo? 

— Agora, Isabella e Gisele terão comida novamente, assim como todas as pessoas das vilas, eles não vão mais morrer de fome. Estou muito feliz por termos conseguido ajudar. Viu? a gente pode mudar este mundo. 

— Ainda tá pensando nisso? Isso não muda quase nada. 

— Mesmo assim, esse foi o nosso primeiro passo. Talvez, em algum momento, tudo mude. — Ela ergueu o olhar para o céu. 

— Escuta, a partir daqui, use seu poder apenas quando eu disser. Você viu o que pode acontecer. 

— Tá bom. Como eu disse, me descuidei, mas não vai se repetir. Pode confiar em mim. 

Desviei o olhar para frente. Sempre que a observava, sentia um aperto no peito, uma sensação difícil de definir, algo mais profundo, um misto de tristeza e inquietação. Talvez ainda estivesse preso ao que aconteceu com Yuri e temesse que tudo se repetisse. Precisava me fortalecer antes de reencontrá-los. Mas a grande questão permanecia: como me tornar mais forte?