Capítulo 1 - Confissões Anônimas
Narrado por Alice
Se você está esperando uma história fofinha de romance colegial, pode ir embora agora.
Sério. Vai. Corre.
Porque aqui não tem flores, nem juras de amor no pôr do sol. Aqui tem mentiras, cartas queimadas e uma confissão que quase destruiu minha vida. E tudo começou numa aula de literatura.
— Quero que escrevam uma carta — disse a professora Clarice, com aquele tom de quem está prestes a mudar o destino de alguém. — Uma verdade que vocês nunca tiveram coragem de dizer em voz alta.
A sala ficou em silêncio. Isso, por si só, já era estranho. Mas o que veio depois foi pior.
— Vai ser anônima. E vai ser lida em voz alta na próxima aula.
Pronto. Estamos ferrados.
— Professora, isso é tipo… legal? — perguntou o Guilherme, o menino que não sabe escrever "mas" sem acento.
Ela só sorriu. Aquele tipo de sorriso que faz você pensar que vai perder pontos se não obedecer.
Suspirei e peguei minha caneta. Se era pra confessar, então que fosse de verdade. Escrevi a frase que carrego no peito há meses. Aquela que me faz perder o sono toda noite.
"Eu me apaixonei por ele… mesmo sabendo que era o namorado da minha melhor amiga."
Dobrei o papel. Respirei fundo. E entreguei.
No dia seguinte, mal entrei na sala e o clima já estava esquisito. Gente cochichando, outros tentando adivinhar quem escreveu o quê. E eu? Eu fingia que estava interessada na parede.
— Vamos começar — disse Clarice, segurando um monte de papéis como se fossem bilhetes da morte.
O primeiro era engraçado.
"Fui eu que quebrei a perna da estátua do diretor e culpei o cachorro da escola."
A turma inteira caiu na risada. Até eu ri. Um pouco.
O segundo era bizarro.
"Eu como sabão quando estou nervoso."
A partir aí, tudo virou uma mistura de confissões vergonhosas e segredos bobos… até chegar a minha carta.
Clarice limpou a garganta. E leu.
"Eu me apaixonei por ele… mesmo sabendo que era o namorado da minha melhor amiga."
Silêncio mortal.
Até que alguém riu. Um riso seco. Reconhecível.
Júlia.
Minha melhor amiga.
Ela estava bem atrás de mim. Eu senti a respiração dela parar. E logo depois, o olhar de todo mundo que estava à esquerda da sala virou lentamente em minha direção.
Merda. Merda. MERDA.
— Quem escreveu isso? — alguém cochichou.
— Aposto que foi a Alice — disse o Matheus, o fofoqueiro oficial da sala.
— Cala a boca, Matheus — murmurei, sentindo meu rosto pegar fogo.
Na saída, tentei fugir. Estilo ninja mesmo. Mochila no ombro, passos rápidos, olhos no chão.
Mas claro que Davi, o garoto mais insuportavelmente curioso do universo, me encontrou.
— Alice! Espera aí!
— Não. Vai embora, Davi.
— Foi você, né?
— São cartas anônimas! Por que todo mundo acha que fui eu?
Ele riu. Davi sempre ri. Mesmo quando tá falando besteira.
— Porque você é a única com coragem o suficiente pra falar a verdade.
Cruzei os braços. Odiava quando ele acertava.
— Digamos que tenha sido eu. E dai?
— E dai que agora o colégio inteiro vai querer saber quem é o "ele".
Aí estava o problema. O "ele"... era o Noah.
Ex da Júlia. Atual dono do meu coração em frangalhos. E talvez o cara que também me olhou hoje com um olhar que dizia: “Eu sei que foi você.”
— Você vai contar pra Júlia? — perguntei, quase sem ar.
Davi arqueou uma sobrancelha.
— Eu? Eu sou só o mensageiro da desgraça. Mas... se fosse você, eu correria. E rápido.
— Obrigada, Davi. Muito últil como sempre.
— Disponha. Sou praticamente um conselheiro emocional.
Fingi que dava um soco nele. E ele fingiu que doeu.
Mas quando virei o corredor, lá estava ela. Júlia.
Com os olhos cheios de lágrimas. E Noah, ao lado.
Talvez a verdade doa mesmo. Mas naquele momento, doeu em todo mundo.
Fim do capítulo 1