Flashback – NovaStar Entertainment, Abril de 2011
O prédio da agência NovaStar Entertainment era um emaranhado de corredores e salas de ensaio, sempre repleto de vozes animadas, passos apressados e música ecoando pelas paredes. Para quem estava ali há tempo suficiente, aquele caos era um lar. Para os novatos, podia ser esmagador.
Zaria sentia cada célula do seu corpo vibrar com nervosismo enquanto caminhava pelo corredor principal da empresa. Aos 15 anos, ela havia acabado de chegar à Coreia do Sul para iniciar sua jornada como trainee. O sonho de se tornar uma idol a impulsionava, mas a timidez lhe fazia questionar se conseguiria se encaixar naquele mundo tão intenso.
Ela segurava firme a alça da mochila enquanto olhava ao redor, observando rostos desconhecidos. Alguns trainees passavam por ela sem notar sua presença, imersos em seus próprios mundos. Outros lançavam olhares curiosos, avaliando-a rapidamente. Era difícil não se sentir deslocada.
Foi então que uma voz alta e animada ecoou pelo corredor.
— Ei, você!
Zaria virou-se assustada e encontrou Yuna se aproximando com passos apressados. Ela vestia roupas de treino largas e usava um boné virado para trás, exalando uma confiança natural.
Com 17 anos, Yuna estava prestes a debutar, e todos na agência sabiam quem ela era. Mas, ao contrário do que Zaria imaginava sobre idols experientes, Yuna não parecia inacessível ou distante.
Pelo contrário, ela sorria de orelha a orelha, como se tivesse acabado de encontrar uma amiga perdida.
— Você é a nova trainee, né? Aquela estrangeira que chegou hoje?
Zaria mordeu o lábio antes de responder. Seu coração batia forte, e sua voz saiu baixa.
— Sou... Park Yejin.
Yuna inclinou a cabeça, avaliando-a com um brilho curioso nos olhos.
— Uau, seu sotaque é fofo. E o seu nome é muito formal... Que tal um apelido?
— Apelido?
— Sim... — Yuna fez um rosto pensativo, até soltar um sorriso como se algo tivesse surgido à mente. — Que tal Zaria? É sonoro e combina com você.
— Eu... eu gostei. Posso pensar em usar ele.
— Você toca violão?
A pergunta pegou Zaria de surpresa.
— Toco... um pouco.
— "Um pouco"? — Yuna arqueou as sobrancelhas, cruzando os braços. — Ouvi dizer que você é incrível. Mas tudo bem, não precisa se gabar na frente da noona.
Zaria sentiu as bochechas esquentarem. Não sabia como reagir àquela energia intensa e descontraída.
— Eu não sou tão boa assim...
Yuna riu e, sem pedir permissão, passou um braço pelos ombros de Zaria, guiando-a pelo corredor como se fossem amigas de longa data.
— Bom, já que está aqui, eu oficialmente te declaro minha protegida!
Zaria piscou, confusa.
— O quê?
— Você parece perdida. E, como futura idol da casa, é meu dever garantir que você não morra de nervoso antes mesmo de subir no palco. Eu já te dei até um novo apelido. Tudo está caminhando bem.
Zaria sorriu de leve, sentindo o peso do nervosismo diminuir um pouco. A personalidade expansiva de Yuna era o exato oposto da sua, mas, de alguma forma, aquilo a confortava.
— Obrigada... Noona.
Yuna piscou para ela.
— Agora vem, vou te mostrar um lugar secreto onde os treinadores não aparecem. Se quiser sobreviver aqui, precisa saber onde se esconder.
E assim, nasceu uma amizade inesperada.
Para os outros trainees, Yuna e Zaria eram a dupla perfeita — o sol e a lua, o caos e a calma, a extroversão e a timidez. Mas, para Zaria, Yuna era mais do que uma simples colega de agência.
Ela foi a primeira pessoa a fazê-la sentir que pertencia àquele lugar.
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Dias atuais – Estúdio Sky Records, Setembro de 2023
O estúdio estava em silêncio absoluto, exceto pelo som do lápis de Zaria batendo ritmicamente na mesa. Os produtores queriam a última faixa do álbum, e Zaria folheava seu caderno de composições em busca de algo que não fosse sobre Hunter — ele não merecia mais músicas dedicadas a si, mesmo que fossem todas relatos sobre seus abusos.
Ao passar por uma das páginas, ela parou, olhando para o nada, como se estivesse relembrando um sentimento nostálgico do dia em que escreveu. As lembranças vieram tão depressa, como um golpe, e ela soube que aquela seria a música para fechar sua lista.
Years without you.
Uma música que fala sobre saudade. Zaria a escreveu nos tempos de trainee, em um momento de tristeza, para uma pessoa que era muito importante para ela, que sumiu e nunca mais retornou. E ela nem sabia o porquê. Mas passou muito tempo sem conseguir seguir em frente.
Ela leu a letra mais uma vez, sentindo cada palavra como um eco de um passado distante, mas nunca esquecido.
**"Já se passaram anos e você ainda não se foi
It’s been years and you’re still not gone
Não faz sentido eu não conseguir seguir em frente
Doesn’t make sense that I can’t move on
Sim, eu tento, eu tento, eu tento, eu tento
Yeah, I try, I try, I try, I try
Mas esse sentimento nunca morre
But this Feeling never dies..."
Seus dedos deslizaram pelo caderno onde rabiscava versos e melodias. Essa música não era apenas sobre saudade — era um lamento, um adeus não dito.
Mas agora... agora ela voltaria.
O nome de Yuna ecoava em sua mente desde aquela noite. O produtor tinha sugerido o nome dela casualmente, como se não estivesse acabando de abrir um portal para um passado que Zaria manteve trancado a sete chaves.
Ela não sabia como reagir. Seu coração disparou. Suas mãos suaram. Era um pesadelo ou um presente inesperado?
A música falava da ausência, da dor de perder alguém sem despedidas, da sensação de ver o outro apenas através de telas e notícias. Será que Yuna se lembraria da letra? Ela a enviou há tanto tempo. Talvez nem soubesse de nada.
Zaria mordeu o lábio, lembrando-se da última vez que tentou manter contato. Ela havia enviado um trecho dessa música para Yuna, cantando apenas com o violão, uma versão crua. Na época, pensou que seria ignorada, assim como as mensagens anteriores. Mas, daquela vez, Yuna respondeu.
"Isso é bonito... e triste ao mesmo tempo. Parece que tem um ressentimento escondido nas entrelinhas."
Zaria nunca disse nada depois disso. Nunca confirmou nada.
Mas agora... agora Yuna estaria ali, diante dela. No mesmo espaço. Nos mesmos olhos. No mesmo ar.
Ela apertou os olhos, respirando fundo.
Seu coração já estava frágil demais. Ainda presa num relacionamento abusivo, ainda tentando encontrar forças para sair. Como poderia lidar com Yuna reaparecendo do nada?
Seria uma lembrança do que perdeu? Ou uma nova chance para a restauração de uma ligação?
E, mais do que tudo, ela teria coragem de cantar essa música na frente dela?
A resposta viria em breve. E Zaria não sabia se estava pronta.