Ódio?

Capítulo 12 — Ódio?

Tempo desconhecido

Três crianças sentam-se na grama sob o céu límpido, gargalhando despreocupadamente. Dois garotos e uma menina compartilham aquele momento simples e perfeito.

— Que tal fazermos uma promessa? — sugeriu o menino loiro, com um sorriso largo e cheio de entusiasmo.

Os outros dois pararam de rir e o olharam, curiosos.

— De onde veio isso? — perguntou a menina, arqueando as sobrancelhas.

— Não sei... Mas sinto que isso pode ser importante algum dia. — Ele manteve o sorriso e estendeu o punho fechado.

— O sonho de cada um, unidos nesse triângulo. — Sua voz estava cheia de animação e esperança.

Os outros trocaram olhares e acabaram rindo, mas decidiram acompanhar o gesto.

— Até eu ser um aventureiro incrível! — declarou o menino loiro com firmeza, o brilho nos olhos refletindo seu sonho.

A menina sorriu e estendeu a mão.

— Até eu me tornar uma maga tão poderosa quanto minha mãe!

O menino de cabelos negros hesitou por um momento. Diferente dos outros, ele não tinha um sonho claro... ou pelo menos ainda não.

— Anda logo, Arky! Você é tão estranho! — provocou a menina, soltando uma risadinha junto com o loiro.

Ele suspirou, rolou os olhos, mas sorriu no final.

— Tá, tá... Até eu ser tão forte quanto o meu pai... — disse Arky, com um olhar cheio de determinação.

Os três punhos se uniram, formando um triângulo simbólico.

Eles se olharam e riram, contagiados pela leveza do momento.

— Isso é uma promessa! Vamos ficar juntos para sempre! — disseram em uníssono, antes de voltarem a rir como crianças que ainda desconhecem o peso do futuro.

Guilda dos Aventureiros

— Carol? Arky? — Sawo abriu um sorriso genuíno, fofo e cheio de alegria.

— Sawo! — exclamaram os dois ao mesmo tempo, animados.

Eles correram até ele, e o reencontro começou com um abraço caloroso. Depois de mais de dois meses sem ver o amigo, a única coisa que Arky e Carol conseguiram fazer foi abraçá-lo com força, como se nunca mais fossem soltar.

Sawo sorria de orelha a orelha, enquanto Carol e Arky choravam de felicidade. Percy, que antes estava sentado observando a cena em silêncio, levantou-se e pousou a mão gentilmente na cabeça de Sawo.

— Bom trabalho, Sawo. — Percy não costumava demonstrar muito afeto, nem tinha grande afinidade com Sawo, mas naquele momento a emoção o venceu.

— Senhor Percy... — Sawo retribuiu o sorriso, surpreso e grato.

Carol secou as lágrimas e, com a voz embargada, finalmente falou:

— Você nos deu um baita susto!

— É, nunca mais faz isso! — Arky riu, ainda segurando o abraço, o que fez os três rirem juntos.

Escondido em um canto, Gilber observava a cena com um sorriso discreto, sem querer chamar atenção. Já Prasquiu estava com a expressão carrancuda, visivelmente irritado.

— O que foi? Por que essa cara? — perguntou a princesa, encarando-o com curiosidade.

— Não sei... — respondeu ele, franzindo ainda mais o cenho. — Eu realmente não consigo entender o que estou sentindo agora.

Carol o observou por um momento e, de repente, mostrou a língua, provocando-o.

— Seu otário! — disse ela, rindo.

Prasquiu ficou ainda mais vermelho de raiva.

— Eu vou te matar! — rosnou, suas veias quase saltando enquanto cerrava os punhos.

Antes que ele pudesse avançar, a princesa segurou sua mão e sorriu gentilmente.

— Calma, Prasquiu. Dessa vez, você é o culpado. Mas não se preocupe... Está tudo bem agora.

Toda a fúria de Prasquiu pareceu esvair-se. Ele respirou fundo, fechou a cara e tentou fingir que estava sério novamente.

— Você ainda é só uma criança, senhor Prasquiu — provocou a princesa, zombando de sua atitude.

Com o rosto levemente corado, ele desviou o olhar e se afastou.

— Vossa Alteza, eu... eu vou ficar lá fora, garantindo a segurança do perímetro. — E saiu rapidamente, claramente envergonhado.

A princesa não conseguiu segurar uma risada.

Enquanto isso, Sawo terminou o longo e gentil abraço com Carol e Arky. O ambiente parecia mais leve, como se toda a tensão tivesse desaparecido por um instante.

— Então vocês também decidiram virar aventureiros? — perguntou Sawo, curioso.

— Sim! Agora somos todos aspirantes a aventureiros. Só falta você se juntar a nós — respondeu Arky, com um brilho de orgulho e determinação nos olhos.

— Hmm... precisa ser inteligente pra isso? — brincou Sawo, rindo.

— Não necessariamente, mas pode ajudar! — Carol respondeu, rindo junto.

— Fica quieta! — Sawo gargalhou, contagiado pela alegria dos amigos.

Arky suspirou, com um sorriso nostálgico.

— Eu senti falta dessas risadas... — murmurou, lembrando-se da época em que todos moravam na vila Koro.

Por um momento, o silêncio tomou conta. A nostalgia os envolveu.

— Você tem razão... — começou Sawo, mas foi interrompido por uma presença opressora que emanava da porta à frente.

Uma aura pesada e assustadora pareceu preencher o corredor.

— Próximo... — disse uma voz sombria, ecoando do outro lado da porta.

Sawo estremeceu. Aquela voz...

Essa voz...

De repente, memórias fragmentadas invadiram sua mente. Ele se lembrou da vez em que foi espancado por tentar brincar com seus amigos. Daquele dia em que foi acusado de invasão e detido injustamente.

— Quem é? — perguntou ele, com o semblante mudando.

— Sawo? — Carol leu a mente dele, tentando entender o que ele estava sentindo, mas as lembranças estavam turvas, difíceis de decifrar.

De repente, vozes começaram a ecoar na mente de Sawo, como sussurros enlouquecedores.

“Mate... Mate... Mate ele!”

Carol ficou paralisada. Ela queria dizer algo, mas o choque a impediu.

— Você vai gostar dele, Sawo! Ele morava com a gente na vila Koro. Sempre foi muito legal conosco... — disse Arky, sem perceber a tensão crescente. Ele não se lembrava do que Silvere Lucios tinha feito com Sawo.

— Arky... — Carol tentou segurá-lo, mas já era tarde.

Sawo levantou o olhar, e algo mudou em sua expressão.

— Quem está atrás dessa porta? — perguntou com uma voz fria e cortante.

Arky parou, surpreso.

Percy e a princesa também perceberam a mudança repentina no comportamento de Sawo. O corredor ficou em silêncio absoluto.

A porta à frente continuava exalando aquela pressão assassina e sufocante.

— Próximo! — gritou a voz novamente, ainda mais raivosa.

Os olhos de Sawo se estreitaram.

— Essa voz... — Ele deu um passo à frente, o ódio queimando em seu peito. — Eu me lembro dela...

E, com cada passo que dava em direção à porta, seu rancor crescia.

Lembranças de Sawo

Sawo e Lucios estavam em uma praça pública. O menino fora arrastado até lá, sendo segurado pela orelha com brutalidade.

— Plebeu de merda! Como ousa conversar com minha sobrinha? — rosnou Lucios, antes de chutá-lo com tanta força que um dos dentes de Sawo se quebrou e caiu.

Naquele momento, Sawo tinha apenas nove anos, talvez menos.

Sempre que os olhos de Lucios encontravam os de Sawo, o garoto sentia o peso de um ódio esmagador. A aura de Lucios era tão opressora que parecia capaz de fazer até elefantes desmaiarem. E toda vez que se cruzavam, essa presença sufocante era direcionada exclusivamente para Sawo, como uma sentença silenciosa.

— Um lixo como você quer brincar com Carol e Arky? — Lucios agarrou novamente a orelha de Sawo, desta vez com tanta força que deixou uma cicatriz que o garoto carregaria para sempre.

Naquele dia, Sawo apanhou até não conseguir mais levantar.

Carlos, um conhecido da família, e a mãe de Sawo logo souberam do ocorrido e tentaram intervir.

— Não precisava fazer isso! Ele é só uma criança! — gritou a mãe de Sawo, com lágrimas escorrendo pelo rosto.

Ver sua mãe chorando daquele jeito partiu o coração de Sawo.

— Ver minha mãe chorar assim... por algo que eu fiz... doeu... doeu demais. — Ele ainda se lembrava do sangue que escorria de seus ferimentos, formando uma poça vermelha no chão, misturada às suas lágrimas.

Lucios, por sua vez, fingiu total inocência quando confrontado por Carlos.

— Esse menino invadiu nossa propriedade. Admito que talvez eu tenha sido um pouquinho bruto, mas um crime desses é intolerável — disse ele, com um sorriso sarcástico.

Após o incidente, Sawo foi punido. Carlos disse que ele precisava ficar trancado por duas semanas, como forma de "pagar pelo erro" e ser perdoado.

— Então eu tentei... tentei me redimir... mas não foi fácil. Passei duas semanas num quarto escuro e vazio, chorando sozinho, onde ninguém podia me ouvir — lembrou Sawo, a voz embargada pelas memórias dolorosas.

A situação da família já era difícil, mas depois daquele episódio, as coisas ficaram ainda piores. A mãe de Sawo estava desesperada, considerando vender a casa para que pudessem se mudar.

Ela só queria encontrar um lugar onde o filho não fosse insultado por ser pobre.

Um lugar onde Sawo pudesse brincar em paz com seus amigos.

Guilda dos Aventureiros

Ao abrir a porta da guilda, Sawo parou, seus olhos imediatamente se encheram de ódio.

— Eu sabia… — sussurrou ele, enquanto encarava a figura à sua frente.

Lucios o observou por um momento, incrédulo.

— Esse menino? — murmurou, surpreso. Ele nunca se deu ao trabalho de perguntar o nome de Sawo. Para ele, o garoto não era nada além de o plebeu que espancara em praça pública anos atrás.

— Sawo! — gritou Carol, correndo para impedi-lo. Mas, ao tocá-lo, ela recuou com um grito de dor. A pele de Sawo estava quente como brasas.

"O braço dele queimava tanto que sua própria roupa começou a chamuscar."

Lucios estreitou os olhos e então riu com desprezo.

— Ah… Agora eu lembro. Você é aquele pirralho que costumava brincar com a Carol. — Lucios havia mudado ao longo dos anos, mas seu desprezo por Sawo permanecia inalterado. — Bem, me desculpe pelos velhos tempos… eu estava fora de mim — disse ele, com uma risada cínica.

O sorriso de Lucios apenas alimentou o ódio de Sawo. Para ele, aquilo soava como uma zombaria.

— Sawo! — Percy gritou novamente, percebendo que o ódio do amigo estava transbordando, transformando-se em uma aura quase palpável.

— Cala a boca, Percy. — A voz de Sawo ecoou pela sala, profunda e fria. Um silêncio pesado caiu sobre o ambiente. — Se abrir a boca de novo… eu te mato.

O olhar assassino de Sawo fez todos ao redor ficarem em choque. Carol e Arky o encaravam com espanto e medo.

A princesa deu um passo à frente, mantendo Percy atrás dela.

— Percy… esse não é o Sawo — disse ela, em um tom baixo e sério.

Percy permaneceu em silêncio. Ele sentia o peso daquela aura sufocante.

Silvere, um guerreiro veterano da guilda, observava tudo com atenção. Diferente dos outros, ele não parecia assustado.

— Moleque, sugiro que meça suas palavras — disse Silvere, olhando Sawo com desdém.

Sawo deu um passo à frente, seus olhos fixos em Lucios. Mesmo dominado pela raiva, ele sabia que não podia matá-lo… ainda.

— Eu vim aqui para fazer o teste — disse Sawo, a voz carregada de fúria quase incontrolável.

— Tudo bem, mas não precisa desse escândalo todo… afinal, você é só uma porra de uma criança — respondeu Lucios, com um sorriso maldoso.

— Você fala demais… vamos logo com isso — respondeu Sawo, mantendo uma expressão séria e impenetrável.

— Isso… é assustador… — murmurou Carol, sentindo um calafrio.

Lucios franziu o cenho, a irritação crescendo.

— Sabe com quem você está falando, seu plebeu de merda? — rugiu ele, furioso.

Sawo não respondeu. Apenas lançou a Lucios um olhar assassino, frio e calculista.

— Você tem duas opções: morrer agora… ou morrer depois — provocou Lucios, sorrindo com raiva.

Sawo permaneceu impassível e, sem desviar o olhar, estendeu a mão. Um brilho vermelho intenso iluminou o ambiente, e a espada Destroyer apareceu em sua mão.

— Magia? — alguém murmurou, incrédulo.

— Então você escolheu morrer aqui! — gritou Lucios, atacando com velocidade impressionante.

O golpe foi bloqueado pela Destroyer. O impacto gerou um brilho vermelho que cegou temporariamente Lucios. Em um movimento rápido e preciso, Sawo balançou a espada, e um dos dedos de Lucios voou pelo ar.

— Está brincando comigo? — rosnou Sawo, sua expressão séria deixando Lucios à beira da loucura.

— Você não me deixou escolha, pirralho! — gritou Lucios, conjurando uma lança feita de pura magia de luz.

Os espectadores não ousaram intervir. Eles sabiam que aquele era o teste de Sawo, e ninguém podia interferir.

Lucios avançou com a lança, seus movimentos rápidos e precisos. Mas Sawo desviou com um giro completo, atacando várias vezes enquanto girava. Todos os golpes foram bloqueados por Lucios, e ambos recuaram, sentindo a tensão no ar.

A aura ao redor deles ficou ainda mais pesada.

— Ele é forte… — pensaram os dois, ao mesmo tempo.

Mesmo assim, Sawo não queria matar Lucios. Nem mesmo queria vencer aquela batalha.

— Eu passei? — perguntou Sawo, ainda sério.

Lucios ficou surpreso por um momento e, em seguida, soltou uma gargalhada estrondosa.

— Você não entendeu, garoto? Isso não é apenas um teste… é um combate até a morte! — gritou Lucios, rindo com insanidade.

Sawo não reagiu.

— Não… é você quem não entendeu. Não consegue ver a distância entre nós? Montanhas… abismos… planetas… universos… Você é só um inseto. Eu poderia ter te matado com o primeiro golpe… ou durante o giro. Sua arrogância me irrita, seu nobre de merda — disse Sawo, a voz firme e carregada de desprezo.

Lucios rangeu os dentes, tomado por uma fúria descontrolada.

— Moleque! Para de se achar! Está usando uma arma mística, é lógico que vai vencer assim! — gritou Lucios, enfurecido.

Sawo deu um suspiro lento e lançou a Destroyer no chão.

— Você é tolo… Mas hoje, vou pegar leve com você… — disse ele, enquanto caminhava sem medo na direção de Lucios.

— Está me provocando? Seu idiota?! — berrou Lucios, furioso.

Com um rugido, ele girou a lança e atacou. Sawo sequer se moveu… até o último instante. Então, com um único movimento rápido, ele desviou e, com uma mão, agarrou Lucios e o lançou contra a parede.

A temperatura da mão de Sawo estava acima de 80 graus Celsius. O rosto de Lucios queimou instantaneamente.

Lucios gritou de dor, mas Sawo apenas ficou parado, encarando-o com um olhar frio e vazio.

Então, lentamente, ele começou a rir.

— Ha ha… Ha ha ha… Ha ha ha ha ha ha! — O riso ecoou pela sala, cada vez mais alto e mais insano.

— Sawo! — gritou Carol com lágrimas nos olhos.

Sawo estava prestes a liberar sua aura ameaçadora, mas, de repente, tudo parou. Num piscar de olhos, Percy, Gilber e Prasquiu cercaram Sawo, com as lâminas de suas espadas apontadas para seu pescoço.

— O quê...? — Sawo murmurou, confuso. Não havia entendido o que acabara de acontecer.

Lucios estava cravado na parede próxima, o rosto queimado e desfigurado pelo ataque de Sawo.

Sawo permaneceu imóvel. Sabia que qualquer movimento poderia significar sua morte imediata.

— O que... aconteceu? — Sua voz saiu vacilante, enquanto tentava processar o caos ao seu redor.

Carol e Arky correram até Lucios, o desespero estampado em seus rostos.

— Tio Lucios! — Carol gritou, chorando.

— Lucios! — Arky estava igualmente desesperado.

— Gilber, cure Lucios antes que ele morra — ordenou Percy, com uma expressão séria.

— E o garoto? — perguntou Gilber, relutante.

— Não se preocupe. Ele não vai atacar mais ninguém — garantiu Percy, com um olhar sombrio.

Sawo não conseguia pensar. Seus olhos vagavam pelo estrago que havia causado. O som do choro de Carol e o olhar de Arky o atingiram como facas. Ele sentia o peso esmagador da culpa.

Quando olhou para trás, viu a princesa.

— Princesa...? — Ele deu um passo em sua direção, mas ela recuou instintivamente.

Sawo parou de imediato, o coração apertado.

— Titio! — soluçou Carol, suas lágrimas caindo descontroladamente enquanto observava Lucios.

A lembrança do passado invadiu Sawo como um relâmpago cruel.

Ele se lembrou do dia do ataque. Dos gritos desesperados de Carol. Do momento em que a Destroyer carbonizou o braço dela.

— Eu fiz isso...? — sussurrou, paralisado em choque.

As memórias o destruíam por dentro. O olhar de Carol, carregado de dor e medo, o despedaçava.

— Carol...? — tentou se aproximar novamente, mas a expressão dela só trouxe mais lembranças.

Enquanto Gilber finalizava a cura de Lucios, a cicatriz da queimadura permanecia. Carol e Arky não desgrudavam dele, ambos aflitos e assustados.

— Eu... eu não queria... — Sawo murmurou, o rosto contorcido pela dor.

Carol estava brava, mas não conseguia odiá-lo. Ainda assim, ela estava em choque.

— Sawo...? — sussurrou Carol. Ao ler a mente de Sawo, percebeu o caos em que ele estava afundando. Ele estava à beira de um abismo mental, a um passo de se perder para sempre. — Tá tudo bem, Sawo... o Lucios já foi curado...

Mas Sawo não ouvia. Sua mente estava sendo esmagada pelas memórias e pela culpa.

— Você foi o culpado... Queime... — a voz da Destroyer ecoava em sua mente, alimentando sua loucura.

— Para... por favor... para...! — Ele se encolheu, e sua aura começou a vazar novamente.

Os guardas se prepararam para atacar.

— Eu mandei parar! — gritou Sawo, mas, em vez de continuar lutando, ele correu, desaparecendo em meio às sombras, com lágrimas escorrendo pelo rosto.

— Sawo! — Carol gritou, vendo-o fugir, mas sabia que ele estava se destruindo por dentro.

— Deixe-o ir — disse Percy, sua expressão fria e impassível.

— E se ele destruir mais coisas? — questionou Prasquiu, com um sorriso divertido.

— Ele não vai. Ele já morreu por dentro — respondeu Percy, sem qualquer emoção aparente.

Arky estava bravo demais para dizer algo, mas Carol sabia que Percy também estava sofrendo em silêncio.

— Mas... vamos deixá-lo sozinho? — perguntou Carol, indignada.

— Se você for atrás dele agora, só vai piorar a situação — afirmou Percy com firmeza.

— Mas... — Carol tentou argumentar, mas foi interrompida.

— Ele está certo, Carol... Sawo precisa ficar sozinho por um tempo — disse a princesa, com tristeza no olhar.

Carol não queria que Sawo pensasse que todos o odiavam, mas não sabia o que fazer.

— Como podemos salvá-lo? — perguntou, chorando.

— Não podemos. Isso é algo que só ele pode enfrentar agora... — Percy percebeu que a Destroyer havia sumido.

A sala de exames estava em ruínas. Lucios, mesmo depois de curado, permanecia desacordado.

— Classe... A... — murmurou Lucios, com uma voz fraca.

Percy se levantou e olhou na direção em que Sawo havia fugido.

— Cuidem de Lucios. Eu volto em breve... — disse, antes de partir atrás de Sawo, deixando a guilda em silêncio absoluto.

Fora do reino

Sawo correu freneticamente, sua mente consumida pelo desespero, até finalmente sair dos portões do reino. Nenhum guarda foi capaz de impedi-lo.

— Eu matei ele... — O desespero tomou conta de Sawo, como um veneno se espalhando em suas veias.

Após correr sem rumo, ele finalmente caiu no chão, exausto.

— Você o matou. Ha, ha, ha, ha, ha, ha! — A voz da Destroyer se fez ouvir, zombando da angústia do garoto. — Cala a porra da boca! — Sawo gritou, socando violentamente o chão.

O impacto de seu soco fez o solo se abrir, criando uma cratera de três metros de altura e setenta metros de raio, um reflexo do caos interno que Sawo sentia.

— Por que? — Sawo se entregou à dor, as lágrimas caindo livremente. — Por que parece que tudo que eu faço está errado?

A tristeza o envolveu como um manto, e, sem mais forças, ele se ergueu, sua expressão vazia de qualquer emoção.

— O que você quer, Percy? — O olhar de Sawo estava perdido, a dor visível em cada palavra. — Veio me matar?

Percy, imperturbável, respondeu com seriedade.

— Não, eu jamais faria isso.

— Então por que veio?

— Eles não te odeiam, Sawo. Lucios está bem, e você não fez nada que ele não merecesse.

Mas, ao invés de alívio, as palavras de Percy fizeram a tristeza de Sawo se aprofundar ainda mais, como se um peso insuportável tivesse sido colocado sobre seus ombros.

— Eu sei o que você quer fazer... — Percy disse, sua voz carregada de preocupação. — Isso vai realmente resolver alguma coisa? Já pensou no quanto Carol e Arky vão sofrer? Eles são seus amigos, Sawo. O quanto eles vão ficar tristes? — Ele entregou a Sawo um cartão de guilda, seu gesto carregado de intenções. — Você vai precisar disso. É Classe A. Pense bem. Se você for agora, não poderá voltar enquanto for fraco.

Sawo olhou o cartão em suas mãos, um pouco menos perdido.

— O que é isso? — Ele parecia, pela primeira vez, prestar atenção.

— Você vai precisar disso para o que está por vir. — Percy disse com firmeza. — Eu fiz o mesmo, mas isso faz muito tempo. Não faça isso, Sawo. Não se mate.

Sawo olhou para ele com um sorriso tímido, mas cheio de dor.

— A gente vai se reencontrar?

Percy também sorriu, embora o fardo de suas palavras fosse pesado.

— Claro que sim. Você vai voltar para seus amigos.

— Percy... — Sawo hesitou, sua voz embargada pelas lágrimas. — Eu não sei se eles vão querer ouvir, mas... tenta dizer a eles... que eu amo todos eles...

Aquelas palavras foram um golpe no peito de Percy, que disfarçou a dor com sua habitual fachada séria. Por dentro, ele estava prestes a quebrar.

— Eu direi, Sawo... Sua jornada vai ser difícil, mas você vai seguir em frente. Há algo que você precisa saber: evite os nomes 'Ordem do Caos', 'Irmandade' e 'Cultistas'. — As palavras saíram frias, embora seu coração estivesse partido.

— Tudo bem... Muito obrigado, senhor Percy... Até algum dia. — Sawo deu um último passo, seu olhar fixo no horizonte. Não olhou para trás.

Sawo se afastou, sozinho, mas seu sorriso ainda permanecia inabalável, mesmo enquanto as lágrimas corriam silenciosamente pelo seu rosto.

Percy observou a partida de Sawo, o peso da decisão pesando sobre ele. Ele permaneceu parado, os olhos fixos na figura que se distanciava.

As lágrimas de Percy caíram, quentes e amargas, enquanto ele lembrava de sua própria dor.

— Mãe... — Ele sussurrou, a lembrança de sua partida e de como, ao voltar, encontrou tudo em ruínas, tudo em cinzas. — Que saudade...

Secando as lágrimas com um gesto rápido, Percy tentou afastar o peso da memória. A sensação de falha e arrependimento o consumia. O erro que ele cometeu há tanto tempo agora parecia ser a maior tragédia de sua vida.

— Espero que você não se arrependa, Sawo... — Sua voz se perdeu no vento, enquanto ele dava a volta, se preparando para voltar ao reino.

Continua...