A sala de prática mágica ecoava com o som de círculos girando lentamente no ar. A luz das runas azuis refletia nas paredes brancas, criando sombras dançantes que pareciam respirar junto com a mana do ambiente.
Poucos alunos haviam se inscrito para o exercício extra de conjuração refinada.
Hiro estava entre eles, como sempre — silencioso.
Ao seu lado, com a postura ereta e o bastão mágico apoiado no ombro, Saori Kurosawa tentava não encará-lo por tempo demais.
Tentava.
— Você tá copiando meu padrão de dispersão? ela soltou.
— Não.
— Tá sim.
— Adaptei.
— Ou seja, copiou.
Hiro permaneceu imóvel. Mas ao invés de retrucar, deu dois passos em direção a ela. Tranquilo. Sem hesitação.
Perto. Perto demais.
O coração de Saori acelerou.
— O que pensa que tá—?!
Ele estendeu a mão lentamente — sem tocá-la — e traçou um padrão no ar, manipulando a mana diretamente com os dedos. Três pontos brilharam, triangulando um círculo, criando uma forma estável e compacta que girava com controle impecável.
— Seu método é eficiente, mas perde estabilidade em rotações laterais. Eu testei uma triangulação estática com variações orbitais.
— ...Você testou isso… agora?
— Ontem à noite. Sete vezes.
Saori ficou muda.
Cinco anos à frente, num mundo devastado, o céu coberto por cinzas e o ar carregado de mana corrompida.
Saori Kurosawa, mais velha, com cabelos presos num coque e roupas rasgadas de combate, gritava em meio ao caos.
— SE CONCENTRA, IDIOTA!
Hiro, mais velho também — vinte anos, exausto, mãos tremendo ao tentar conjurar uma barreira de contenção.
— Estou... tentando...!
— Tentar não é o bastante! SENTIR a mana é o BÁSICO! Se não controlar ela agora, vai matar nós dois!
Ele cerrou os dentes, ajoelhado, sujo de sangue. O círculo girava instável na frente dele.
— Concentra, estabiliza, CORRIGE! NÃO É PRA FAZER BONITO, É PRA FAZER DIREITO!
O círculo se firmou.
Por um instante.
Saori suspirou — exausta.
— Você é o aluno mais lento e mais teimoso que eu já treinei... mas pelo menos ouve.
De volta ao presente, Hiro recuou um passo. Os olhos fixos no círculo que acabara de demonstrar. Calmo. Quase entediado.
— Tente. Funciona melhor.
Saori estava corada. Violentamente.
— E-eu não preciso das suas sugestões!
— Não são sugestões. São dados.
Ela resmungou e cruzou os braços.
Mari, ao fundo da sala, fingia revisar um pergaminho, mas murmurou para Yumi ao lado:
— Olha a cor das bochechas dela. Tá parecendo uma maçã encantada.
Yumi mordeu o lábio, encarando a mesa.
— Ela tá... mais instável que ontem.
— Ela tá apaixonada.
— Ela tá negando com a alma.
No centro da sala, Saori rangeu os dentes. Mas testou.
Pela curiosidade. Pela teimosia.
E o maldito método funcionou.
Com menos mana. Mais controle. Maior alcance.
— Filho da...
Ela girou o bastão, cancelando o círculo, e murmurou:
— Ainda prefiro o meu.
Hiro não respondeu. Apenas voltou a praticar.
Mas o canto dos lábios dele... quase curvou. Por um milésimo de segundo.
Ou talvez fosse só o reflexo das runas.