Quando as pálpebras de Outono se abriram, sua cabeça estava latejando como um tambor em uma taverna de merda.
Piscando contra a névoa, ela observou seus arredores e imediatamente... "Que porra é essa?"
Seu olhar desceu rapidamente, absorvendo o pesadelo rosa claro e cheio de babados.
Babados? Babados, pelo amor de Deus?
Suas pernas estavam amarradas às pernas de uma cadeira, seus braços firmemente presos atrás das costas. Seu cabelo loiro prateado caía em cachos soltos sobre seus ombros.
Ela estava vestida com... um vestido? Um bem bonito, por sinal.
"Que inferno... que inferno...?"
Uma brisa suave a fez olhar para cima
E seu olhar congelou.
Havia um bolo na frente dela. Um maldito bolo inteiro, com uma única vela acesa, a cobertura formando o número '18' por algum motivo.
Seu estômago se contorceu. "Dezoito?" Exatamente... deveria ser seu aniversário. Ela não comemorava um aniversário desde... desde sempre.
Outra brisa fria lambeu sua pele. Ela olhou para cima. Como para o céu acima dela.
A Lua de Sangue!!!
Ela pairava ali, inchada e vermelha, irradiando um brilho antinatural na clareira. Era uma área semiflorestada e ao seu redor, lobos estavam em um amplo círculo... toda a matilha Bloodhound... seus olhos brilhando no escuro.
Então ela os avistou. Os bastardos que a haviam pescado do rio, sorrindo como se tivessem ganhado algum tipo de loteria fodida. Ela se contorceu, puxando seus pulsos, seus tornozelos. "Me soltem, seus idiotas cheios de pulgas!" ela rosnou.
O instinto tomou conta. Ela se inclinou para frente, pronta para fugir... a cadeira balançou.
"De jeito nenhum... Filho da p...!" Ela ia cair de cara naquele bolo estúpido quando...
Uma mão larga e calejada se estendeu, pegando sua testa a um centímetro da cobertura. O impacto a sacudiu, mas o bolo sobreviveu.
"Cuidado," uma voz profunda ressoou.
A mão a empurrou de volta para a posição vertical.
Outono piscou, sua visão clareando.
E então ela o viu.
Alfa Kieran!
Ela olhou fixamente para o rosto que fazia sua alma se encolher e seu coração ter uma overdose de cafeína.
Mãe dos lobos!!! Que homem!
Ele era alto... obscenamente alto... com uma estrutura magra e predatória envolta em couro preto. Ombros largos... ombros que poderiam levantar um cavalo, braços marcados com cicatrizes e tatuagens. Mais cicatrizes cruzavam seu pescoço. Ele parecia ter saído de um catálogo de vilões. A 'Edição Bastardo Sombrio'. Seu maxilar era afiado o suficiente para cortar vidro, sua boca fixada em um semblante permanente. Cabelo escuro, mais comprido em cima, caía desalinhadamente sobre sua testa, meio sombreando olhos que queimavam como ouro derretido.
E esses olhos estavam fixos nela.
E ele a estava encarando como se quisesse arrancar sua espinha... ou beijá-la. Talvez ambos.
Seu coração pulou.
"Não. Não mesmo. Que se foda isso,"
Sua respiração falhou.
Então... dor... um tipo estranho de dor.
Uma dor repentina e ardente em seu peito, como uma faca quente torcendo entre suas costelas. Seus pulmões pararam. Um cheiro forte inundou seus sentidos... como pinheiro selvagem, fumaça e algo... dela?
"Não! Não... não, não.! "
Sua loba se agitou, um gemido subindo em sua garganta. E bam...
"Companheira!!! "
As narinas de Kieran se dilataram. Seu olhar escureceu. Ele também sentiu.
Por um instante, o mundo parou. A matilha prendeu a respiração. A Lua de Sangue pulsava acima deles.
Mas então...
***TAPA.***
A palma de Kieran atingiu seu rosto com tanta força que seus dentes chacoalharam.
"A Deusa da Lua zomba de mim!" ele rosnou, sua voz transbordando de nojo.
A cabeça de Outono virou para o lado, sangue florescendo em sua língua. Ela riu, cuspindo vermelho na grama. "É? Bem, ela tem um péssimo senso de humor, eu acho." Outono murmurou.
O lábio de Kieran se curvou. Sem mais uma palavra, ele se virou e saiu tempestuosamente, seu sobretudo preto chicoteando atrás dele. E assim, ele girou sobre o calcanhar e se afastou a passos largos, respirando como se estivesse prestes a assassinar uma floresta inteira.
Vaias!!! Risadas!
No segundo em que ele se foi, a matilha explodiu.
"Renegada imunda!"
"Cadela ingrata!"
"Ela não merece a Lua de Sangue!"
"A audácia... "
Algo veio voando em sua direção antes que Outono pudesse se mover. Depois outro. Pedras a atingiram... seixos no início, depois maiores. Uma atingiu sua têmpora, sangue quente escorrendo pela sua bochecha. Outra atingiu sua clavícula. Ela cerrou os dentes, recusando-se a gritar. Mas havia um limite para o que alguém poderia suportar -
"Fodam-se todos vocês!" ela cuspiu, puxando suas amarras. "Venham me desamarrar e digam isso na minha cara, seus covardes! Malditos bastardos! Querem jogar alguma coisa? Me desamarrem e eu vou mostrar a vocês..."
Uma pedra do tamanho de um punho voou em direção à sua cabeça... Outono fechou os olhos, incapaz de se esquivar... mas então nada... nada a atingiu.
"CHEGA!" Uma figura atravessou a multidão.
Outono abriu os olhos lentamente para encontrar a pedra levitando a centímetros de seu rosto antes de cair com um baque aos seus pés.
A figura caminhou em sua direção... pequena. Uma mulher idosa. Vestida em camadas de mantos remendados e carregando um cajado que parecia mais velho que a própria lua... o cajado de Moisés (Outono riu internamente).
"Chega dessa bobagem... Todos saiam... " Ela continuou andando tão suavemente como se deslizasse no gelo.
Seus dreadlocks grisalhos estavam amarrados em um coque que desafiava a gravidade. Seus olhos brilhavam como relâmpagos em uma tempestade.
Pequena mas furiosa, ela se colocou entre Outono e a matilha, braços abertos. "Todos... SAIAM!" ela latiu. "Agora! Ou vou colocar laxantes suficientes na próxima refeição de vocês para fazer vocês cagarem a própria coluna!"
"Mas... mas curandeira Mango... Ela é uma ladra!" alguém gritou.
"Ela é a companheira do Alfa!" Mango rugiu de volta. "Ou o cheiro atingiu vocês na bunda com força demais para perceberem?"
"Ela não é digna," alguém mais murmurou.
Mango bateu seu cajado, fazendo o chão tremer. "Nenhum de vocês é digno! Eu vejo o que todos vocês fazem quando ninguém está olhando!"
Resmungando, a matilha se dispersou, embora alguns ainda lançassem maldições por cima dos ombros.
Mango se virou para Outono, balançando a cabeça. "Bem, você está uma merda completa."
Outono sorriu, sangue manchando seus dentes. "Sério? No meu melhor vestido? Que insulto. Mas acho que não fui fácil... fiz um bom trabalho com eles."
Mango bufou, puxando uma faca de seu cinto. "Oh, você fez. Você mordeu um dos guerreiros com tanta força que ele realmente precisou de uma maldita vacina contra raiva."
Mas a faca de Mango não conseguia cortar aquelas cordas. Encantadas? Wolfbane?
Mango recuou com uma careta e então acenou com a mão. "Desamarrem-na."
Alguns guerreiros da matilha, provavelmente Gammas... hesitaram.
"AGORA, idiotas!" Mango disparou. "Antes que eu enfie esse cajado tão fundo no seu traseiro que você vai sentir o gosto de casca."
A contragosto, as cordas foram cortadas com algo brilhante.
Outono caiu para frente, apoiando-se na mesa ao lado do bolo que já estava deformado e esmagado com toda aquela chuva de pedras sem mira.
Mango a acariciou suavemente, murmurando algo sob sua respiração enquanto limpava o sangue na têmpora de Outono.
Conforme mais cordas caíam, Outono esfregou seus pulsos, observando a curandeira. "Por que você está me ajudando?"
O olhar de Mango passou para a Lua de Sangue, e depois de volta. "Porque a Deusa escolheu você por uma razão, garota. E eu não mijo no destino." Ela apontou com o queixo para o bosque. "Agora venha. Antes que Kieran mude de ideia e decida esfolar você afinal."
Outono se levantou, suas pernas trêmulas. "Ele teria que me pegar primeiro."
Mango sorriu maliciosamente. "Oh, ele vai."
Um uivo perfurou a noite... muito longo... baixo e cheio de fúria.
De Kieran.
A loba de Outono tremeu. Seu olhar foi direto para Mango, implorando
Mango suspirou. "É. Você está ferrada."
Após um momento de pausa, Outono estalou o pescoço, flexionou os ombros. "História da minha vida."
E sem aviso, ela tentou correr para as árvores... descalça, machucada... e bum.
Ela caiu de cara no chão.