Capítulo 3: Ecos do Coração

Parte 1: Um Rival Invisível

Na manhã seguinte, Caio acordou com uma sensação estranha. Como se estivesse vivendo uma vida que não era exatamente a dele. O quarto parecia o mesmo, a luz entrava pela janela com a mesma intensidade, mas algo no ar estava... fora do lugar.

Ele se virou na cama e olhou para a mochila encostada na cadeira. Dentro dela, a barra de chocolate embrulhada em papel dourado parecia pulsar — como se tivesse batimentos próprios.

> "O caos começa quando o desejo se torna impossível de ignorar."

— Alya havia dito.

Caio se levantou, tomou banho, vestiu-se e encarou o espelho. Seus olhos estavam diferentes. Mais firmes. Mais... determinados.

Ele já havia feito sua escolha. E agora, precisava descobrir o que estava mudando em Ruby.

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No colégio, Ruby estava cercada por amigas, mas parecia distante.

Ela ria quando falavam com ela, mas não parecia realmente ouvir. Sua cabeça estava em outro lugar.

— Ruby? — chamou Caio, com um sorriso tímido, tentando se aproximar no intervalo.

Ela olhou para ele por um momento. Havia uma hesitação nos olhos dela — como se estivesse vendo alguém que deveria conhecer melhor... mas não lembrava por quê.

— Oi... Caio, né?

— Sim, sou eu. Tudo bem com você?

Ela deu de ombros.

— Tive um sonho estranho ontem... Acho. E hoje acordei com uma música na cabeça.

— Piano?

Ruby piscou.

— É. Como você sabe?

Caio sorriu sem jeito.

— Chute.

Mas por dentro, seu coração acelerou. Ela está começando a lembrar. Ou, pior — o feitiço está se reconstruindo.

Antes que pudesse dizer mais alguma coisa, uma voz surgiu atrás deles:

— Ruby! Estava te procurando.

Um garoto alto, de blazer elegante — não do uniforme padrão — apareceu. Ele tinha cabelos escuros e uma mecha azul caindo sobre os olhos. Seu sorriso era confiante. Arrogante, até.

Ruby arregalou os olhos.

— Noah?

— Faz tempo, não é? — disse ele, ignorando completamente Caio. — Soube que você está tocando piano de novo.

— Eu… nem lembrava que sabia.

Noah sorriu de lado.

— A gente tem muita coisa pra lembrar. Inclusive do nosso passado.

Caio observava, sentindo algo dentro dele se revirar. Quem é esse cara?

Ruby parecia abalada. Em poucos segundos, todo o clima mudou. Como se uma nova força tivesse entrado no jogo.

— Eu... preciso ir. — disse ela, saindo rápido.

Noah assistiu ela se afastar e, sem virar-se, falou diretamente a Caio:

— Você deve ser o novo. Um conselho: cuidado com o que deseja. Às vezes, o amor machuca mais quando é forçado.

Ele então lançou um sorriso falso.

— Boa sorte, Caio.

E foi embora.

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Mais tarde, já sozinho no terraço da escola, Caio segurava a barra de chocolate nas mãos. A luz do sol refletia no papel dourado, e ele podia jurar: havia pequenas rachaduras se formando na superfície, como se o chocolate estivesse trincando por dentro.

E então, uma voz ecoou atrás dele.

— Você está atrasado.

Alya apareceu, pairando levemente no ar, como uma brisa prateada.

— O que significa isso? — perguntou Caio, mostrando a barra.

— Outro desejo foi feito. Outro contrato. Outra barra… foi entregue.

O mundo pareceu parar.

— Outro… Cupido?

Alya olhou para longe, para o céu.

— Não. Não é um cupido. É algo pior. Alguém que já conheceu o caos… e quer ele de volta.

Caio sentiu um frio na espinha.

Noah.

Parte 3: O Julgamento se Aproxima

Alya caminhava sozinha pela névoa do Plano Etéreo.

Seus pés não tocavam o chão, mas cada passo deixava um rastro prateado no ar. Seu semblante estava sombrio, e as asas prateadas fechadas, como se carregassem um peso invisível.

À frente dela, surgia uma figura encapuzada, de túnica branca e dourada. Seus olhos, quando visíveis sob o capuz, brilhavam com um azul que cortava qualquer mentira. Atrás dele, asas imensas e radiantes se estendiam como o firmamento — tão claras que era impossível olhar por muito tempo.

Era Lucian, o Anjo do Julgamento.

— Chamou-me, Cupida menor? — sua voz ecoou com poder divino, mas calma.

Alya abaixou a cabeça em reverência.

— Lucian, estou diante de uma infração celestial.

— Noah, um humano marcado pelos erros do ciclo anterior, retomou o uso do Chocolate do Cupido.

— Isso viola o pacto firmado entre os Deuses do Amor e os mortais.

— E ameaça reabrir as feridas que João Ricardo e a deusa Tati selaram.

Lucian permaneceu em silêncio por longos segundos. Depois, ergueu a mão, e nela surgiu uma pena dourada flutuando acima de uma balança.

— E o novo portador? O jovem Caio... ele também é parte desse desequilíbrio?

— Não. — disse Alya. — Caio ainda tem um desejo puro. Ele apenas quer conquistar o amor verdadeiro de Ruby. Mas está sendo enredado pela presença de Noah.

Lucian assentiu.

— Então, tomarei providências. O ciclo do caos não pode recomeçar.

Ele fechou os olhos.

— Mas antes, os seladores do pacto devem ser consultados. João Ricardo e Tati... Devem ser chamados.

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Enquanto isso, no mundo humano...

João Ricardo terminava de lavar a louça enquanto Tati brigava com o micro-ondas, tentando esquentar leite.

— João! Por que esse aparelho apita toda hora?! — reclamou ela.

— Porque você botou o garfo dentro dele, Tati!

Ela fez bico. Mesmo sem os poderes divinos, Tati ainda era um caos ambulante.

Mas naquele momento, uma leve brisa prateada invadiu a cozinha.

E logo, uma pena dourada desceu do teto e flutuou diante deles.

— Isso... não é bom sinal — murmurou João, sério.

A pena se iluminou e, na luz, surgiu o holograma de Alya.

— João Ricardo. Tati. O equilíbrio está ameaçado.

— Alya?! — disse Tati surpresa. — Pensei que os deuses não se meteriam mais!

— E não iriam... até Noah burlar as regras.

João apertou os olhos.

— Noah...?

— Ele usou novamente o chocolate do Cupido. Mas ele não fez um pedido puro. Ele quer poder. Quer reconquistar o que perdeu no ciclo anterior. Isso quebra o pacto.

Tati ficou pálida.

— Se ele continuar... vai reabrir o caos.

João assentiu.

— Onde está esse Noah?

— Na mesma escola onde estuda Caio... e onde Ruby, a garota amada, começou a ter fragmentos de memória do ciclo anterior.

— Se as memórias voltarem... o feitiço pode se reconstruir.

— E Caio? — perguntou João.

— Ainda é um inocente. Mas se ninguém intervir, ele será arrastado para o mesmo abismo que você enfrentou.

João respirou fundo.

— Então é hora de quebrar a promessa de paz e entrar em cena. Vamos até lá, Tati.

Tati apertou o punho com força.

— Vamos impedir outro Bolo do Caos.

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Na dimensão celestial...

Lucian ergueu uma mão diante de um espelho de julgamento. Imagens do colégio começaram a se formar.

Ele viu Noah encarar Ruby com um olhar ambíguo.

Viu Caio caminhando nervoso pelos corredores, apertando algo dentro da mochila — a barra de chocolate.

Viu Ruby tocando o piano... e uma aura dourada surgindo ao seu redor.

— Chega. — disse o anjo, sua voz como um trovão silencioso.

— Noah, filho do ciclo anterior, sua alma ainda está marcada.

— E agora, será julgada.

Lucian ergueu sua pena dourada. Ela desceu suavemente até o reflexo de Noah no espelho.

No momento em que tocou sua imagem...

Noah, no mundo real, parou de andar. Seus olhos se arregalaram.

O chocolate em seu bolso começou a derreter...

Como se estivesse sendo apagado da existência.

— Não... Não! NÃO! — ele gritou, assustando os colegas ao redor.

Ele caiu de joelhos, sentindo algo ser arrancado de dentro de si — o elo mágico com o Chocolate do Cupido estava sendo rompido à força.

Parte 4: Professores, Memórias e Máscaras

Colégio Augusta Moreira – Dia seguinte

A sala de aula estava especialmente silenciosa naquela manhã. Algo no ar parecia... diferente.

Caio olhava pela janela, distraído. Ele ainda carregava a barra de chocolate, escondida no fundo da mochila, embrulhada como um segredo proibido. Apesar de não ter dado a Ruby ainda, ele sentia como se algo estivesse crescendo dentro dele. Um instinto estranho, uma ansiedade que ia além da paixão comum.

Ruby entrou na sala segundos depois, os cabelos presos em um coque bagunçado. Seu olhar cruzou o de Caio por um breve instante... e ela sorriu de leve.

Mas logo, sua expressão se apagou.

Como se... tivesse se lembrado de algo e não soubesse de onde vinha.

Ela caminhou até sua carteira, abriu o caderno e, por um impulso misterioso, rabiscou um nome na borda da folha:

João Ricardo.

Ela franziu a testa.

— Quem é João Ricardo...? — murmurou, quase sem perceber.

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A porta se abriu com força.

A professora titular de Literatura havia faltado, e a direção informara a chegada de dois substitutos no mesmo dia — o que era raro.

Dois jovens entraram na sala.

— Bom dia, turma. — disse o primeiro, ajeitando os óculos. Ele tinha cabelo bagunçado, um olhar esperto e desconfiado.

— Sou o professor João. Esse aqui é o professor auxiliar... Tati.

— É professora, na verdade! — disse Tati, com um sorriso exageradamente forçado. — Mas podem me chamar de "Tati, a incrível".

A classe riu — todos menos Caio, Ruby e Noah.

Caio olhou fixamente para João.

Havia algo estranho naquele cara. Algo que mexia com sua cabeça, mesmo sem conhecê-lo.

Ruby também começou a suar frio. Seus dedos tremeram.

Ela desenhou outra coisa no caderno. Sem pensar, rabiscou um coração atravessado por uma flecha... e um pequeno arco no canto da folha.

— Por que desenhei isso...? — sussurrou.

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Noah, sentado ao fundo, tinha a cabeça baixa.

Desde a noite anterior, sentia-se... diferente. Algo havia sido arrancado de dentro dele. Sua mente parecia em branco em certas partes, como se memórias tivessem sido queimadas.

Mas uma coisa restava: raiva.

— Lucian... você vai se arrepender disso. — pensava, mordendo o lábio. — E se o João Ricardo está aqui... então o jogo recomeçou.

Noah então percebeu um novo rosto entre os alunos.

Um garoto de cabelos loiros platinados, usando um capuz roxo e uma expressão entediada. Ele nunca o tinha visto antes... mas o estranho o encarava com um leve sorriso.

— Outro deus? Um observador? — Noah tentou se concentrar, mas uma dor de cabeça súbita o impediu de pensar.

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Intervalo

Tati arrastou João para o corredor.

— Eles ainda não lembram, mas Ruby está à beira de despertar.

— Ela escreveu seu nome, João. Seu nome!

— Então o reset está se desfazendo mais rápido do que prevíamos. — disse João, tenso.

— E aquele garoto, Caio, parece estar próximo demais dela. Se ele usar a barra de chocolate...

— O caos retorna. — completou João.

Eles se entreolharam, e João suspirou fundo.

— Vamos ter que agir. Discretamente.

— Discretamente...? Eu sou uma ex-deusa, João, lembra? Eu não sei o que é agir discretamente!

— Tati... por favor, só dessa vez.

Ela bufou.

— Tá bom. Mas se essa Ruby lembrar tudo de uma vez, vai ter garota jogando piano em cima de mim de novo, né?

— Só se você provocar de novo...

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Enquanto isso, na sala do fundo...

O garoto encapuzado se aproximou de Noah no bebedouro.

— Você foi julgado pelo Céu. — disse o estranho, com voz calma. — Mas ainda pode escapar disso... se agir rápido.

Noah arregalou os olhos.

— Quem é você?

— Alguém que também odeia as regras dos deuses. — respondeu o estranho, sorrindo. — E que quer ver esse tal João Ricardo... cair.

Parte 5: Fragmentos, Confiança e Sussurros Celestiais

Noite – Quarto de Ruby Aquamarine

Ruby despertou com um sobressalto.

Seu peito arfava, e o suor frio escorria por sua testa. Os lençóis estavam enrolados em suas pernas como se ela tivesse lutado contra algo invisível durante o sono.

Ela se sentou lentamente na cama, levando a mão ao peito.

Sonhos estranhos. Sensações que pareciam mais reais do que deveriam.

Um nome ecoando no fundo da mente:

— João Ricardo...

Ela não conhecia esse nome... ou conhecia?

Tocou os lábios, assustada com a intensidade daquela memória onírica: uma chuva fina, um toque nos dedos, um beijo que parecia verdadeiro demais para ser invenção.

Do lado de fora, o céu estava silencioso demais.

Mas, acima das nuvens, Alya, com seus cabelos prateados, olhos azul-claro e vestido florido rosa, flutuava com suas asas igualmente prateadas, observando a menina atentamente.

— Ela está começando a lembrar... — murmurou, preocupada. — Não deveria estar acontecendo tão cedo...

Um brilho se formou ao seu lado nas nuvens.

A presença de Lucian, o Anjo do Julgamento, se materializou ao seu lado. Sua armadura celestial reluzia com seriedade. Os olhos azuis gélidos eram impenetráveis.

— Alya, você tem ciência do que está acontecendo. O efeito do chocolate está ecoando... sem ter sido consumido.

— Eu sei, Lucian. Mas a culpa não é minha. Quem quebrou as regras foi Noah, o garoto que forjou o ritual com intenções impuras.

Lucian cruzou os braços com expressão impassível.

— Então ele será levado ao julgamento. Amanhã. No Reino Intermediário.

Alya baixou os olhos, aliviada.

— Obrigada por entender... Estou tentando impedir o caos, não provocá-lo.

Lucian a observou por alguns instantes em silêncio.

— Por enquanto, está cooperando. Mas se Ruby recuperar todas as memórias antes da hora... não hesitarei em intervir.

Acordos foram feitos com João Ricardo e Tati. Este mundo só está em equilíbrio por causa disso.

Alya assentiu, séria.

— Eu não vou deixar isso se repetir, Lucian. Juro pelas estrelas.

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Colégio Augusta Moreira – Dia seguinte

Caio caminhava em silêncio com a barra de chocolate em mãos.

Não era um chocolate qualquer. O simples contato com o embrulho fazia seu coração pulsar mais forte, como se sentisse o poder que havia ali dentro.

Ruby...

Ela o olhava diferente nos últimos dias. Às vezes sorria, às vezes parecia distante — como se lutasse contra algo que nem ela mesma compreendia.

Ele queria que ela o visse. De verdade.

Mas será que a magia era o único jeito?

Um toque no ombro interrompeu seus pensamentos.

— Ei.

Era João Ricardo, o rapaz que Caio reconhecia de alguns rumores — e de uma estranha sensação de déjà vu.

— Pode falar comigo um minuto?

Caio hesitou, mas algo no tom maduro e sincero de João o fez assentir.

Eles foram até a biblioteca, onde uma garota loira folheava um livro de cabeça para baixo.

— Tati... — disse João.

— Ah, oi! — Tati largou o livro e olhou Caio dos pés à cabeça. — Então esse é o garoto novo com a barra do caos na mochila?

— Vocês... me conhecem?

— Mais do que você imagina — disse João. — Você achou aquele ritual por um motivo. Mas não entende o que está prestes a liberar.

— Eu sei exatamente o que estou fazendo. Quero que Ruby me veja... como eu a vejo.

Tati ergueu uma sobrancelha.

— Usar chocolate do Cupido pode te dar o amor dela. Mas não o coração.

João então tirou do bolso uma antiga foto — meio amassada, meio borrada. Nela, estavam Bia, Melissa, Cíntia... e, bem ao fundo, Ruby, observando o caos acontecer.

— Isso foi real. A escola inteira entrou em colapso. E eu tive que fazer um acordo com os deuses pra consertar tudo.

Caio olhou a imagem com os olhos arregalados.

— Ela... já estava envolvida nisso?

— Ela estava perto o bastante. E agora está sendo afetada de novo.

João se aproximou.

— A barra que você carrega... é uma responsabilidade, não uma salvação.

Tati completou:

— E a Alya? Você acha que ela quer o caos?

Caio hesitou.

— Ela me ajudou. Me ouviu. Foi a única que acreditou em mim.

João assentiu.

— Talvez ela esteja tentando impedir que algo pior aconteça. Mas o Noah, o outro garoto envolvido... ele fez o ritual por egoísmo.

E agora está indo a julgamento celestial.

Caio arregalou os olhos.

— Julgamento?

Tati confirmou, séria:

— Lucian está pronto pra apagar tudo se a situação sair do controle. E isso inclui você... e até a Ruby.

Caio engoliu em seco.

— Eu... eu não queria machucar ninguém.

João pôs a mão em seu ombro.

— Então escolha direito. A gente vai te ajudar. Mas precisa confiar.

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Torre oculta no colégio

Alya observava tudo, com as mãos unidas sobre o peito. Ela tremia.

— Ruby ainda está confusa... Caio ainda pode ser salvo...

Atrás dela, Noah apareceu. Ferido, mas de pé.

— Você mentiu pra mim.

— Eu dei uma chance. Você quis manipular.

— E agora vão me julgar? Só por querer ser amado?

Alya se virou, encarando-o com firmeza.

— Amor não se força, Noah. Você sabia disso.

Ele rosnou.

— Se eu for cair... vou levar Caio comigo.

Alya estreitou os olhos. Seu tom era calmo, mas cortante.

— Não se atreva.

Parte 6: Sonhos, Escolhas e Sombras em Movimento

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Noite — Quarto de Ruby Aquamarine

Ruby estava novamente deitada, mas não conseguia dormir. Seu coração batia como se algo estivesse prestes a acontecer. Desde o estranho sonho da noite anterior, uma inquietação persistia em sua mente.

Assim que adormeceu, foi arrastada para outro sonho... mas esse parecia diferente.

Estava de pé sob a chuva, em frente ao portão da escola. Vestia um uniforme diferente, e alguém corria em sua direção — cabelos castanhos, olhos aflitos.

João Ricardo.

Ele segurava seu rosto com cuidado, como se temesse perdê-la.

— "Eu não posso te esquecer... mesmo que eles apaguem tudo."

E então, ele a beijou.

Um beijo que fez seu coração estremecer — mas que ela nunca viveu.

Ruby acordou com um sobressalto, as bochechas coradas e os olhos arregalados.

— Esse garoto de novo...

Ela foi até o espelho. Algo dentro dela estava mudando. Como se parte de si... estivesse voltando.

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No dia seguinte – Colégio Augusta Moreira

Caio estava sentado no jardim da escola, olhando para a barra de chocolate em suas mãos.

A conversa com João e Tati ainda ecoava em sua mente. As fotos, os avisos, os perigos...

Mas Alya também falara com ele naquela manhã. E sua presença celestial, seu olhar gentil, ainda o faziam acreditar que ela queria ajudar.

— "Você precisa confiar em seu coração, Caio." — ela dissera. — "Mas saiba que, se entregar o chocolate a Ruby... não haverá volta."

Enquanto ele pensava, Tati apareceu ao seu lado com um copo de suco de caixinha.

— Trouxe isso. Vai que você decide não ferrar com a realidade hoje.

— Isso é sua forma de me convencer?

— Não. É só suco mesmo. — ela deu de ombros. — Mas tô aqui se quiser conversar.

Antes que ele respondesse, uma gritaria estourou perto da entrada do colégio.

— ROUBO! ROUBARAM MEU MATERIAL! — gritou uma aluna.

Caio se virou instintivamente.

Uma figura encapuzada corria, com algo nos braços... algo embrulhado em uma toalha.

Seu coração gelou.

— A barra de chocolate?!

Ele correu atrás.

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Dentro do ginásio – minutos depois

Caio empurrou a porta, ofegante, e viu a figura encapuzada tentando abrir um armário trancado. Sem pensar, ele se jogou contra ela, os dois caindo no chão.

— Me devolve!

A figura se desvencilhou, mas antes que pudesse fugir, Tati surgiu com um taco de beisebol na mão.

— Nem tenta, querido.

Ela acertou o taco bem ao lado da cabeça do invasor — só o suficiente para assustar. A figura se rendeu e tirou o capuz.

Era... Noah.

Ferido. Suado. Determinado.

— Vocês não entendem... Eu precisava usar o chocolate. Ruby era minha última chance...

— Você está arruinando tudo! — Caio gritou.

— Eu só queria que ela me notasse... Só uma vez...!

Tati se aproximou, olhos cheios de compaixão.

— Então você devia ter tentado de verdade, não com truques mágicos que ferram a mente das pessoas.

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Nas nuvens — Tribunal Celestial

Enquanto isso, acima do mundo dos mortais, uma cúpula celestial se iluminava.

Lucian, com suas asas douradas e olhar austero, surgia no centro do salão, acompanhado de outros juízes celestes.

E diante dele, algemado por correntes de luz, estava... Noah.

— Noah de Oliveira. Você violou as regras do tratado estabelecido entre o Reino Celestial e os humanos João Ricardo e Tati. Você buscou o poder do Chocolate do Cupido conscientemente, mesmo após o fechamento do ciclo anterior.

Alya, do lado de fora, observava em silêncio. Ela não estava no banco dos réus. Estava com a cabeça baixa, mas livre.

Lucian a olhou brevemente.

— Alya cooperou com os guardiões. Sua pena será revista.

Noah, por outro lado, baixou a cabeça, derrotado.

— Eu só queria ser amado...

Lucian levantou a mão, e um selo dourado envolveu o garoto.

— O amor verdadeiro não pode ser forçado. Seu coração será limpo... e suas memórias, seladas.

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Colégio – Mais tarde

Caio segurava a barra de chocolate de volta em suas mãos.

João Ricardo estava ao seu lado.

— Você ainda tem a escolha. Mas agora, sabe o preço.

Caio olhou para o céu. O sol se punha lentamente.

— Não vou usá-la. Mas também não vou desistir dela. Vou conquistar a Ruby... do meu jeito.

Tati sorriu.

— Aí sim, garoto. É assim que se começa um caos saudável.

João riu.

— Bem-vindo ao clube.