Capítulo 5: O Doce do Ódio

Parte 1: O Renegado Desperta

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Plano Interdimensional — A Dimensão do Ódio

O ar era espesso. Não existia cor, apenas tons de cinza, preto e vermelho escuro. O céu parecia ferido, com rachaduras sangrando sombras que serpenteavam sobre as ruínas flutuantes.

E no centro de tudo… ele.

Lucius.

O Oráculo Renegado.

Exilado por trair as leis celestiais.

Selado por tentar substituir o Amor por algo muito mais fácil de alimentar: o Ódio.

Seus olhos eram como brechas negras. Sua pele, marcada por inscrições arcanas que vibravam em vermelho. Ele estava de pé sobre um altar retorcido, diante de uma árvore morta que gotejava sombras líquidas.

Nas mãos, segurava algo pequeno... e terrivelmente poderoso:

Uma caixa com quatro bombons negros.

— O mundo se esqueceu de mim... — sua voz ecoava como trovão abafado — mas o coração humano nunca deixou de me alimentar.

Ele ergueu a caixa, e um redemoinho de trevas se formou à sua volta.

— Amor... paixão... esperança… — ele cuspiu as palavras. — Tudo isso é frágil. Mas o ódio... o ódio é puro. Duradouro. Contagiante.

E então, ele sorriu.

— Hora de espalhar minha receita.

Com um estalar de dedos, o véu da dimensão se rasgou. E Lucius atravessou para o mundo humano.

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Alguns dias depois — Colégio Aurora

O clima estava... estranho.

Não era como o típico caos mágico do passado. Era pior. Silencioso. Gélido.

Pessoas estavam brigando sem motivo.

Discussões entre casais. Amigos que se odiavam de repente. Professores nervosos. Olhares frios nos corredores.

João Ricardo sentiu isso antes mesmo de pisar na escola.

— Tem algo errado — ele disse a Tati, que já segurava o arco invisível na forma de colar.

— Isso não é feitiço de paixão... é algo mais denso.

Do outro lado do pátio, Caio também notava. Ele tentava conversar com Ruby, mas ela estava estranha. Fria. Ríspida.

— Eu não sei por que aceitei sair com você — ela disse de repente. — Foi uma ideia idiota.

Caio ficou paralisado. Aquilo não era normal. Não era ela.

E então, ela caiu de joelhos.

— Me... desculpa... algo... algo tá errado comigo...

E desmaiou.

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Na enfermaria — minutos depois

— Não tem febre. Nem sinais de infecção — disse a enfermeira. — Mas ela está com os batimentos acelerados... como se estivesse em conflito interno.

Alya apareceu pela janela, suas asas prateadas tremulando discretamente. João e Tati se afastaram com ela para um canto do corredor.

— Não é magia comum — ela disse. — Eu senti no ar. Uma essência emocional distorcida. Como se alguém tivesse... canalizado ódio puro.

João fechou os punhos.

— Quem faria isso?

Alya hesitou… e então respondeu:

— Lucius.

Tati arregalou os olhos.

— O Oráculo renegado? Aquele que tentou transformar o amor em arma e foi banido?

— Ele conseguiu escapar da prisão dimensional. E mais: criou um novo feitiço, na forma de doces amaldiçoados. Os Doces do Ódio.

— E como a gente desfaz isso?

— Só o chocolate do Cupido pode anular o doce do ódio — disse Alya —, mas... quem consome os dois não se apaixona. Só volta ao normal. Ou seja… Lucius está criando caos sem risco de afeto.

João bufou.

— Um caos frio. Sem coração. Sem cura verdadeira. Só... destruição emocional.

Tati cerrou os dentes.

— Então é isso. Um novo arco...

João a olhou.

— O Arco do Ódio e Amor. E nós estamos no meio.

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Enquanto isso — Nas sombras de um prédio abandonado

Lucius caminhava calmamente por um corredor escuro, passando por caixas com doces envenenados, empilhadas como armamentos mágicos.

— Deuses do amor… oráculos obedientes… cupidos tolos... — ele murmurava. — Todos se ajoelharão diante da verdade:

O ódio é eterno.

Ele estalou os dedos e um garoto comum recebeu um bombom negro.

— Distribuam. A escola será o campo de testes.

Seus olhos brilharam.

— E que comece... o Combo Caótico.

(Parte 2): Lembranças Corrompidas

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Colégio Aurora – Laboratório de Química – Meio da Aula

As luzes fluorescentes piscavam. O clima era denso.

João, sentado ao fundo da sala, observava os colegas com atenção. Depois do incidente com Ruby, ele sabia que os Doces do Ódio estavam circulando — discretos, mas devastadores.

Alya estava infiltrada como “estudante transferida”, com seus cabelos prateados presos em trança e uma aura que tentava parecer o mais humana possível.

Tati fingia anotar fórmulas, mas mantinha o colar em forma de arco pronto para ativar.

Caio, à frente, observava dois garotos discutirem:

— Você roubou meu experimento!

— Cala a boca, você sempre copia minhas ideias!

De repente… um tapa.

A turma congelou.

E antes que alguém pudesse reagir… gritos e caos.

Os dois começaram a se atacar com vidros, espalhando produtos e quebrando bancadas.

João saltou da cadeira:

— É ele! Um dos dois comeu o doce!

Alya já estava ao lado deles, os olhos brilhando em azul claro.

Ela murmurou:

— “Claritas Emotio.”

Um círculo de luz prateada surgiu sob os pés dos dois garotos — uma magia de purificação emocional.

Um dos meninos caiu ajoelhado, segurando a cabeça:

— M-Minha irmã... ela me odiava… n-não… isso não é real...

Alya arregalou os olhos.

— Ele está tendo falsas lembranças! Lucius está mexendo na mente deles!

Tati se aproximou, pálida:

— Isso é mais do que só ódio… ele está reconstruindo memórias com dor.

João cerrou os punhos.

— Ele está criando traumas. Artificialmente.

— Como um vírus emocional — disse Alya. — Se espalha, se mistura com memórias reais e destrói os laços que mantêm as pessoas juntas.

Caio ajudou a segurar o garoto afetado, e logo depois Alya ofereceu um pedaço da barra de chocolate do Cupido.

Assim que ele mordeu, uma luz dourada tomou seu corpo.

Ele desmaiou… e acordou segundos depois, com lágrimas nos olhos:

— O que… eu estava fazendo?

Tati suspirou:

— Ele voltou ao normal. Mas sem qualquer afeição. Como se nada tivesse acontecido.

João se encostou na parede, cansado:

— Lucius está criando uma geração de pessoas vazias. Sem amor… e sem lembrança clara de por que se machucaram. Apenas... o vazio.

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Mais tarde — Sala Secreta do Arco Celestial (instalada na escola)

No porão antigo do colégio, Alya desenhava um mapa mágico no chão. Tati observava. Caio trazia uma caixa com amostras de doces enegrecidos que haviam sido encontrados nos armários e mochilas de outros alunos.

João analisava os dados.

— Já temos 23 alunos afetados. Todos com surtos emocionais seguidos de amnésia leve e sentimentos negativos persistentes.

— E nenhum deles lembra como conseguiu o doce — disse Caio. — Eles só... "apareceram" com ele.

Alya fechou os olhos:

— Lucius está usando âncoras emocionais. Ele deve estar escondendo os doces em lugares marcados com traumas ou lembranças dolorosas.

Tati concluiu:

— Então precisamos identificar onde o ódio é mais forte… antes que ele alcance massa crítica.

João se virou.

— Se ele corromper alguém com poder mágico ou com resquícios do antigo feitiço do Cupido…

Alya completou:

— …ele pode fundir os dois doces.

Todos ficaram em silêncio.

Um chocolate capaz de gerar paixão já causava caos.

Um doce que espalha ódio estava destruindo laços.

Mas os dois juntos?

Seria o nascimento de um novo tipo de feitiço.

O Doce do Caos Total.

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Enquanto isso — Em um antigo teatro abandonado

Lucius olhava para uma garotinha de uns 12 anos, sentada em uma cadeira.

Ela tremia.

— Você disse que só queria me ajudar… — ela sussurrou.

Lucius sorriu.

— E estou ajudando. Você se lembra de como eles riram de você? De como sua melhor amiga te traiu?

— M-mas… ela me pediu desculpas…

— Palavras vazias. Elas só magoam mais.

Ele entregou um bombom negro.

— Esse doce vai proteger você. Vai garantir que você nunca mais seja ferida.

A menina hesitou… e comeu.

Seus olhos se apagaram.

Lucius acariciou seus cabelos.

— Boa garota.

E sussurrou:

— Que o caos continue.

(Parte 3): Laços Ameaçados

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Colégio Aurora – Dia Seguinte

Os corredores da escola, sempre cheios de vida, agora carregavam uma tensão invisível. Estudantes andavam de cabeça baixa, amizades pareciam distantes, e pequenos desentendimentos se tornavam discussões sérias com frequência assustadora.

Tati observava tudo com um nó no estômago.

— Está piorando — disse ela para João, enquanto os dois observavam discretamente a quadra. — O caos está crescendo devagar... mas de forma precisa.

João assentiu, sério:

— Lucius está sendo estratégico. Ele não está só jogando doces por aí. Ele está escolhendo alvos emocionais. Pessoas com traumas, inseguranças, laços frágeis...

Tati baixou o olhar.

— Como... eu, antes de te conhecer.

João se virou.

— Ei. Você não é fraca. Você era uma deusa, e ainda tem a força de seguir mesmo sem poderes. E agora tem a mim.

Ela sorriu, mas não disse nada. Por um instante, tudo pareceu calmo.

Até que uma voz ecoou atrás deles:

— TRAIDORA!

Ambos se viraram, assustados.

Era Lívia, ex-líder do grêmio estudantil, agora com os olhos escuros como breu. Ela andava como uma boneca quebrada, o cabelo bagunçado e os punhos cerrados.

— Você... roubou tudo de mim, Tati!

— L-Lívia? O que está...?

— Você! Fez todos gostarem de você! Até o João! Você só finge ser boazinha!

Ela correu na direção de Tati com uma régua de metal nas mãos.

João se colocou na frente:

— CHEGA!

Lívia parou. Por um segundo, os olhos dela pareceram voltar ao normal. Mas então ela sussurrou:

— É tarde demais... ele está em todos nós...

Alya chegou voando, em sua forma real — asas prateadas abertas, os olhos como faróis de luz celestial. Em sua mão, a barra de chocolate do Cupido.

Ela tocou a testa de Lívia com dois dedos:

— "Amor, lembra-te de quem és."

Um brilho rosa e dourado se espalhou.

Lívia caiu ajoelhada, tremendo, depois começou a chorar.

— Eu... eu ia... machucar você, Tati... por quê? Eu gostava de você...

Tati se ajoelhou e a abraçou, mesmo tremendo.

— Não foi você. Foi ele. Foi o ódio.

Alya se virou para João e Caio, que havia acabado de chegar.

— Não podemos continuar apagando incêndios. Precisamos ir à fonte.

João apertou os olhos.

— O teatro abandonado. Foi onde tudo começou.

Caio pegou um mapa:

— E coincidentemente, é um dos pontos onde houve um incêndio anos atrás. Três alunos sofreram bullying lá. Talvez... seja a âncora que ele está usando.

Alya respirou fundo.

— Vamos juntos. Mas se encontrarmos Lucius… estejam prontos.

João perguntou:

— Prontos para o quê?

Ela respondeu:

— Para enfrentar o caos em forma pura.

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Enquanto isso – No Teatro Abandonado

Lucius caminhava sobre o palco, cercado de sombras que sussurravam.

Em suas mãos, uma nova criação:

— O Doce da Ressentimento Silencioso...

— … para aqueles que não explodem, mas guardam tudo até implodirem.

Ele riu sozinho.

— Que comecem os atos finais.

Parte 4: Onde o Ódio se Esconde

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Sala Secreta da Biblioteca — Noite

Um mapa antigo do colégio estava estendido sobre a mesa. Acima dele, diagramas de energia emocional circulavam em vermelho escuro. Tati analisava tudo com os olhos arregalados.

— Aqui... todas as rotas de manifestação negativa convergem nesse ponto — ela apontou com o dedo. — O antigo teatro. Está fechado há anos.

Alya, flutuando levemente, cruzou os braços:

— Faz sentido. Lucius não escolheu esse lugar por acaso. Lá, emoções reprimidas se acumularam por décadas.

Caio olhava um monitor com dados celestiais transferidos por Alya:

— E segundo os registros, foi onde três alunos sofreram bullying e depois desapareceram misteriosamente. Lucius deve estar usando as marcas emocionais deles como âncoras.

João franziu a testa:

— Então... se destruirmos essas âncoras, cortamos o poder dele?

Alya assentiu.

— Sim, mas não será tão simples. Lucius não é como os outros. Ele era um oráculo, e depois foi renegado. Ele conhece as leis celestiais e sabe como contorná-las.

Se atacarmos diretamente, ele pode nos prender em ilusões, ou pior: usar nossos medos contra nós.

Tati abaixou os olhos, lembrando do que sentiu quando foi humana pela primeira vez.

João percebeu e segurou sua mão discretamente.

— Então precisamos de um plano — disse Caio, abrindo seu caderno de anotações, rabiscado com símbolos celestiais. — Ou seja, criar um ritual reverso com base na origem do Doce do Ódio.

Alya concordou.

— O Doce do Ódio foi feito com a essência da dimensão paralela onde Lucius foi selado. Mas se misturarmos isso com a essência do Chocolate do Cupido original, podemos forçar o ambiente a rejeitar Lucius como entidade dominante.

— Como se fosse um antídoto — disse Tati, animando-se um pouco.

— Exatamente — respondeu Caio. — Mas a barra original... aquela que eu recebi... ainda tem vestígios da energia do amor puro.

João cruzou os braços:

— Então temos que entrar no teatro, enfrentar Lucius, encontrar as três âncoras emocionais, colocá-las dentro de um círculo de purificação, e ativar o ritual com a barra.

Alya ergueu a mão.

— Um detalhe. Durante o ritual, Lucius vai nos atacar com tudo. Em vez de força bruta, ele vai usar o que há de mais vulnerável: nossas emoções.

Silêncio.

João então falou:

— Então vamos nos preparar. Se o caos vai tentar nos quebrar, vamos provar que nossos laços são mais fortes.

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Teatro Abandonado — Madrugada

A porta rangeu, e uma brisa fria soprou para fora, como se a própria escuridão estivesse viva.

João, Tati, Caio e Alya entraram lentamente, com lanternas acesas e o círculo de purificação nas mochilas.

O palco à frente estava parcialmente desmoronado. Cortinas rasgadas pendiam como espectros. No centro do palco, marcas antigas no chão formavam um símbolo: três olhos entrelaçados.

Alya congelou.

— Esse é o selo de Lucius... o Julgamento Triplo. Ele força cada um a reviver seu pior momento emocional. Só quem superar o trauma pode seguir adiante.

As luzes piscaram.

Um murmúrio ecoou pelo teatro:

> — "Vocês vieram. Finalmente... um pouco de coragem neste mundo podre."

A voz era fria como metal molhado.

Lucius apareceu no alto do palco, os olhos vermelhos como brasas queimando ressentimento.

Seu corpo parecia humano, mas sombras se agarravam a ele como raízes vivas. E em sua mão: um doce negro e brilhante.

— Se acham que o amor é forte, preparem-se para ver o que o ódio é capaz de fazer.

Ele jogou os braços para frente — e o mundo explodiu em fragmentos.

Cada um do grupo foi lançado para uma sala diferente, separados por ilusões.

João caiu em um lugar que reconheceu de imediato: seu antigo quarto, antes de conhecer Tati.

Vazio. Solitário. Silencioso.

E no espelho, um reflexo que dizia:

— "Sem os feitiços. Sem as garotas. Você é só... ninguém."

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Continua...