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Capítulo 11 – Salto Mortal

Joaquim sentiu.

Não era só um arrepio. Era um chamado.

Como o som abafado de uma trombeta ao longe, vindo de um lugar onde o sol não toca.

— Vai pra onde, Joaquim? — perguntou Maria, franzindo a testa.

Ele parou. O ar ao redor estava denso, como se o mundo prendesse a respiração.

— Não sei... mas tem algo errado aqui.

O vento sussurrava entre as árvores mortas. Os galhos pareciam braços apontando o caminho.

Hermanito bufou, desconfortável.

— Errado? Isso tudo já é uma loucura sem sentido.

Mesmo assim, seguiram. A trilha era estreita, coberta de folhas secas que rangiam sob os pés, como ossos estalando.

À frente, uma casa.

Velha, de madeira podre, janelas cobertas por panos escuros, telhado torto como se curvasse diante de algo invisível.

Na porta, uma idosa os esperava. O sorriso era gentil demais para aquele cenário. Dentes gastos, olhos fundos demais.

— Entrem. Tomem um café. Eu já estava esperando vocês.

A voz dela tinha algo de errado. Um eco abafado, como se saísse de um poço.

Maria trocou olhares com Joaquim, hesitantes.

Mas entraram.

O interior da casa era frio. Muito frio. Cheirava a mofo e coisa morta. Havia espelhos cobertos por tecidos pretos e velas apagadas em garrafas sujas.

A idosa serviu o café. O líquido era espesso, quase negro.

— O que três jovens estão fazendo aqui em Cavalo Marinho?

Joaquim respondeu rápido. Queria sair dali.

— Estamos procurando uma mulher. Cabelos pretos, longos. Pele morena. Olhos cor de mel.

A velha sorriu, os lábios rachados.

— Aqui sempre tem mulheres assim...

Hermanito riu, mas era um riso forçado. Sentia o lugar apertar o peito dele.

— Animado, né? E aquela bizarrice de ontem?

A velha suspirou.

— Um ritual de proteção.

Maria cruzou os braços, tentando manter a calma.

— E quem é o protetor daqui?

— O Careta... — sussurrou Hermanito, como se pronunciar o nome fosse chamar algo.

A idosa abriu a boca para responder.

Mas parou.

Seu corpo estremeceu como se tomado por uma força invisível. Ossos estalaram. A pele escureceu em manchas. Da coluna, três braços negros brotaram, pulsando com veias como tentáculos vivos.

Antes que pudessem reagir, as garras monstruosas os agarraram pelo pescoço.

A idosa agora tinha olhos negros como óleo queimado. E o Careta falou por ela.

— Sou eu de novo.

A voz cortava como lâmina enferrujada. Cruel. Zombeteira.

Ele se virou para Joaquim, saboreando cada palavra.

— Eu fico com essa garota. — Os olhos vazios pousaram em Maria. — Ela vai ser minha.

Maria tentou se soltar, mas o aperto afundava como se a mão estivesse viva, sugando sua força.

— Em troca, te dou dois desejos, garoto. Qualquer coisa.

Joaquim sorriu.

Mas o sorriso não era de alegria. Era de ódio.

— Só quero uma coisa, idiota.

O Careta se inclinou, curioso.

— O quê?

Joaquim fechou os punhos. Os olhos queimavam com algo antigo.

— A tua morte.

O Careta gargalhou. O som fazia as paredes da casa tremerem, e os espelhos cobertos pareciam querer estourar.

— E como você vai matar o que já está morto?

Joaquim ergueu o olhar. Encarou o monstro com fúria contida.

E, ali, no silêncio pesado, sua expressão mudou.

Como se estivesse pronto para pular no abismo.

Ou para criar um.