O POR QUE DISSO?

Depois da fantástica aventura do espantalho e da cobra, algo parecia estar errado. Fiquei o dia todo brincando, e minha mãe estava quieta demais. E, por mais que eu não entendesse o porquê disso, pensei: "Ah, não deve ser nada." Até o momento em que chegou o terceiro dia sem ver meu pai, e foi quando fiz novamente a pergunta para minha mãe: "Cadê meu pai?" E foi aí que tudo mudou. Ela não conseguia mais sustentar as desculpas e me disse: "João, seu pai não irá mais ver você." Foi quando oficialmente despertei algo que seria essencial para ajustar minhas fraquezas: o "esquecer". Uma arma muito poderosa que, se cair nas mãos erradas, pode levar a pessoa à ruína.

Tudo o que me lembro foi de falar um "tudo bem" e voltar a brincar como se nada tivesse acontecido, como se aquela conversa nunca tivesse existido. Daquele momento em diante, deletei tudo o que sentia por meu pai biológico: memórias, sentimentos, nada mais habitava em mim. Eu simplesmente fiquei assistindo e brincando sozinho por mais um dia. Apesar de não parecer, minha imaginação era incompreendida pelas outras crianças. Eu ganhava um boneco com a mão aberta, eu colava um graveto em sua mão como se fosse uma "espada" e amarrava suas costas com uma sacola, como se fosse uma capa de super-herói. E, nisso, esse herói enfrentava todos os inimigos, sem recuar e sem saber se um dia iria perder. Tudo o que eu sabia sobre esse meu herói imaginário é que ele seria implacável e que ele tinha uma moto muito da hora, feita com fios de tricô amarrados no guidão de uma antena de TV e sua "porta-espada", que era um papel enrolado que eu chamava de bainha.