Capítulo 4: Mundo dos escravos (2)

— Espero nunca mais ver você na minha vida, sua maldição. 

Enquanto uma mãe discutia com seu filho, o choro da criança ecoava pelo quarto, como se implorasse por ajuda, mas ninguém ouvia seus gritos.

— Vou deixá-lo morar com seus avós; assim, você me deixará em paz. 

A criança, com os dedos tremendo de medo e as pernas incapazes de se mover, nada mais conseguia fazer além de chorar.

— Você só sabe chorar, criança fraca! 

A mãe parecia mais um animal feroz do que a figura protetora que deveria ser. Seus olhos firmes fitavam o filho, como se rejeitassem sua presença e desejassem seu fim.

Ela lançou um olhar agressivo e desferiu um tapa tão forte que o som ecoou pelo quarto. Não havia mais ninguém na casa, apenas os dois.

— É tudo culpa sua. Se você não tivesse nascido, nada disso teria acontecido. 

"A mamãe é assustadora. Eu não quero viver com ela, por favor, alguém me ajude."

Muitas vezes isso acontecia com o menino. Repetidas vezes, seu rosto ficava vermelho pelos tapas, e sua barriga era chutada a ponto de fazê-lo vomitar toda a comida ou líquido ingerido.

Como eu odeio minha mãe… Não sei nada sobre ela, desde que fui embora de casa. Não tenho ideia de onde ela esteja ou o que tenha feito de tão errado. Tudo o que sei é que ela nunca se importou comigo. Meu pai, então… Nunca ouvi falar dele na minha vida. Só sei que ele desapareceu, como se nunca tivesse existido. Ele foi apenas mais uma sombra na minha vida. Eu me pergunto se ela o abandonou também, ou se ele fugiu antes que ela pudesse fazer o mesmo com ele. Eu… juro que se eu topar com a minha mãe algum dia, vou fazer ela pagar por tudo o que me causou….

Takeshi, que estava desmaiado e tendo pesadelos com sua mãe, começou a dar sinais de vida. Quando ouviu a voz de um jovem se aproximando dele.

— Parece que ele está acordando. Vou pegar um pouco de água para acordá-lo. 

A pessoa pegou um copo de madeira, encheu com água e jogou no rosto de Takeshi.

Assustado, Takeshi se levantou rapidamente e, sem conseguir ver direito, esfregou os olhos. Logo percebeu que suas roupas estavam diferentes.

— Eu estou vivo... E quem é você? — ele disse, olhando para a pessoa e se afastando um pouco dela.

— Calma, não precisa ficar com medo de mim — falou a pessoa, de maneira simpática.

— Eu sei que está tudo confuso, mas vou tentar explicar o que está acontecendo — ele se sentou no chão com as pernas cruzadas e olhou para Takeshi.

Depois que Takeshi esfregou os olhos e usou a água no rosto para se refrescar um pouco, olhou para o rosto da pessoa em pé, que o observava.

O garoto tinha cabelos loiros intensos e chamativos, que contrastavam com seus olhos azuis vívidos, realçando ainda mais sua beleza. Seu corpo era magro e esguio, indicando uma possível privação alimentar. Seus dentes, notavelmente brancos, destacavam-se em seu semblante.Ele vestia roupas desgastadas e rasgadas, com um odor desagradável. A peça, já em frangalhos, deixava expostas suas coxas e parte do abdômen, dando-lhe a aparência de alguém em situação de rua. Com uma altura de 1,50 m, sua figura transmitia uma sensação de abandono.

Takeshi olhou para as roupas do garoto e pensou: "Será que ele está precisando de dinheiro?", logo percebeu onde estava. Ele não estava naquela floresta estranha, mas sim numa cela com o garoto.

A cela era suficientemente ampla para que ambos pudessem habitar ali. Havia duas camas, uma posicionada em cada canto da parede, que exibia uma tonalidade marrom envelhecida, suja e coberta por teias de aranha, evidenciando a completa negligência do local. 

O chão era de madeira gasta e irregular, e havia uma janela no centro da parede, por onde a luz entrava no ambiente; entretanto, barras de ferro impediam qualquer tentativa de fuga. Na mesa de madeira que ficava no centro da cela, havia três garrafas de água, acompanhadas de dois copos vazios. 

Ao lado esquerdo, uma porta de ferro, de tamanho comum, servia como a única saída da cela. Porém, estava trancada com correntes e uma fechadura. 

Havia uma janela no canto esquerdo, na parte superior, que era a única fonte de luz na cela. A luz era bastante forte, e a janela também proporcionava ar puro, permitindo que respirassem ali dentro.

Takeshi olhou para suas roupas e notou que vestia a mesma roupa que o garoto na cela. Sem entender por que estava ali, ele finalmente decidiu falar com o garoto.

— Por que estou com essas roupas? — ele perguntou, enquanto mexia nas roupas e sentia um cheiro horrível, como se ninguém tivesse lavado ou cuidado delas.

"Merda! Alguém vomitou nisso? Olha, eu sei que não tenho as melhores roupas, mas caramba, alguém não sabe cuidar de uma peça de roupa?"

O garoto ia responder Takeshi, mas Takeshi fez outra pergunta.

— O dono desse lugar não tem uma roupa melhor e uma cela mais limpa? — ele disse, tapando o nariz.

O garoto esboçou um sorriso de animação ao ouvir a voz suave e calma de Takeshi. E então se preparou para responder, levantando as sobrancelhas de felicidade.

— Bom, é porque pegaram suas roupas. Quanto ao dono, eu não o conheço. Não faço ideia se ele tem uma roupa ou uma cela limpa — ele apontou para Takeshi e acrescentou: 

— Mas, sendo sincero, isso nem me atrapalha. Já me acostumei com o cheiro.

Takeshi ficou surpreso.

— Como você aguenta isso? Essa roupa fede muito. E a cela, principalmente... — Takeshi fez uma cara de nojo ao olhar para o garoto.

Takeshi percebeu como estava conversando com o garoto de forma natural, sem nenhum problema. Isso o fez refletir.

"Pera... Agora que percebi, estou falando com alguém diferente. A única pessoa com quem eu realmente conversei sem problemas foi... Koda. Falando nisso, será que ele está vivo?"

Ele percebeu que Takeshi estava com uma expressão fechada e pensativa. Decidiu, então, fazer algo para tentar chamar a atenção dele.

— Sobre a sua pergunta, eu não sei como me acostumei com isso. Mas, tirando isso, qual é o seu nome? — lerguntou, balançando as pernas com ansiedade, como se aquele fosse o momento mais importante da vida.

Takeshi olhou para ele, surpreso, pois poucas pessoas se importavam com seu nome, mas logo respondeu.

— Meu nome é Kairu Takeshi, mas pode me chamar de Takeshi. — ele falou enquanto colocava a mão no peito e olhava um pouco para baixo.

O garoto fez uma expressão pensativa, achando o nome de Takeshi estranho, pois nunca tinha visto dois nomes juntos, além de soar incomum para ele.

— Que nome estranho. Nunca vi alguém com esse nome... Tikashi? Principalmente com dois nomes — disse, surpreso.

— Não é assim que se fala. Você está pronunciando meu nome errado — respondeu Takeshi, corrigindo o garoto. 

Takeshi ficou incomodado com isso, mas ao olhar bem para onde estava e, principalmente, para o garoto, ele pensou:

"Calma, isso é estranho. Será que ele não conhece porque veio de outro país, ou será que ele é alguém totalmente diferente? Principalmente porque eu tô em um mundo diferente…"

Quando ele pensou sobre o mundo diferente, se lembrou da dor que sofreu daqueles doze seres. Um nervosismo cresceu em seu peito, fazendo-o perder o fôlego. Ele apertou o peito com a mão esquerda.

— Tikashi, você está bem? — ele falou, se aproximando de Takeshi.

Takeshi, que conseguiu se acalmar um pouco, respondeu com a voz trêmula:

— Estou bem — ele tirou a mão do peito e respirou.

O garoto, já preocupado com Takeshi, pensou por um momento:"Devo perguntar o que aconteceu?", Mas logo percebeu que isso só o deixaria mais nervoso.

Então decidiu falar o seu nome.

— Tikashi, meu nome é Layos — Layos se levantou e apontou o dedo para cima ao dizer seu nome.

— Que nome legal. Nunca ouvi falar de alguém chamado Layos — Takeshi achou engraçada a forma como Layos se apresentou e sorriu para ele.

Layos ficou muito feliz ao saber que Takeshi achava seu nome interessante e conseguia pronunciá-lo corretamente, mas ficou triste por não saber dizer o nome de Takeshi da forma correta. Porém, ficou feliz quando viu Takeshi sorrir para ele.

Depois de sorrir, Takeshi falou:

— Layos, quando você disse que eles me roubaram, a quem você se referia? — ele ficou olhando para Layos, para saber a resposta.

Layos estava feliz por ver que a conversa estava fluindo e que Takeshi estava se abrindo para ele.

— Eu quis falar dos caras sem rosto — ele se sentou no chão novamente e falou bem baixo para Takeshi escutar.

Takeshi entendeu que ele estava falando dos mascarados que quase o mataram. Takeshi sentiu uma leve pontada no peito por causa do medo, mas logo se acalmou.

— Mas como eu vim parar aqui nesta cela?

— Um dos caras sem rosto trouxe você aqui, mas você estava desmaiado. Eles jogaram seu corpo aqui na cela — ele falava enquanto cruzava os braços.

Para mim, já estava evidente que os mascarados eram os protetores deste lugar. Pelo que entendi até agora, eles eram extremamente fortes. Ainda precisava reunir mais informações sobre eles e descobrir uma maneira de sair daqui em segurança.

— Você quer saber de outra coisa, Takeshi? 

Takeshi refletiu bem antes de falar, pois precisava sair daquele lugar, mas ainda não tinha muitas informações.

— O que exatamente esses caras sem rosto fazem aqui? E o que eles são? — Takeshi perguntou, olhando sério para Layos.

Layos hesitou. Suas mãos tremiam, e sua boca parecia travada, mas, depois de alguns segundos, ele conseguiu falar, com a voz baixa:

— Eles escolhem alguém para enviar para algum lugar… e depois matam essa pessoa ou a vendem para alguém.

Ele fez uma pausa, como se lutasse contra as palavras antes de continuar:

— Eles são vendedores… mas vendem pessoas vivas para ganhar dinheiro. Talvez estejam desesperados por dinheiro, e é por isso que fazem isso… 

Takeshi começou a ligar os pontos na sua cabeça sobre o motivo de terem roubado suas roupas.

"Então foi por isso que eles pegaram minha roupa… Caras malditos! Imagina se eu tivesse ficado pelado. Aff… Pelo menos agora tenho uma informação útil. Se for realmente por dinheiro, eu também faria o mesmo…"

Ele voltou à realidade, desviando o olhar de seus pensamentos para encarar Layos.

— Layos, uma coisa… Você já viu uma janela brilhante e irritante antes? 

Layos parecia desconfortável com a pergunta, mas logo em seguida falou:

— Sim, eu conheço. Essa janela apareceu e me fez fazer algo terrível — falou com a voz fraca e a cabeça baixa.

Layos abaixou as sobrancelhas e ficou com uma expressão triste. Seus olhos mostravam que ele fez algo de que se arrepende.

"Realmente, essa janela é uma merda. Eu entendo ele… Eu quase morri na primeira tarefa. Melhor deixar esse assunto de lado por enquanto."

Takeshi suspirou e olhou para Layos.

— Desculpa por perguntar isso, Layos.

Layos balançou a cabeça e mexeu os braços, como se quisesse afastar o peso da conversa.

— Não precisa se desculpar. Você nem sabe o que aconteceu.

Ambos tinham passado por algo ruim por causa dessa tarefa. O clima estava pesado, o silêncio preenchia a cela como se o ar tivesse ficado mais denso. Takeshi e Layos ficaram um tempo sem dizer nada, apenas escutando a respiração um do outro, cada um preso em seus próprios pensamentos.

Layos olhava para o chão, mexendo os dedos de forma inquieta, como se quisesse se distrair de algo. Takeshi, por outro lado, mantinha os olhos fixos na parede, tentando organizar as informações na sua cabeça.

O silêncio durou tanto que começou a se tornar incômodo. Foi então que Takeshi, sentindo o peso da situação, decidiu quebrá-lo.

— Layos. 

— Oi, pode falar. 

Takeshi ainda não tinha muito tempo de amizade com Layos, mas sua intuição dizia que ele era uma pessoa boa, em quem podia confiar, então decidiu confiar em Layos e ajudá-lo.

— Layos, nós precisamos ir embora daqui. Eu sei que a gente não se conhece há muito tempo, mas você quer vir junto?

Layos hesitou por um momento, sentindo seu coração disparar no peito. O medo dos mascarados ainda estava cravado em sua mente, como uma sombra que nunca desaparecia. Sua respiração ficou um pouco instável, e ele apertou as mãos, sentindo o suor frio escorrer pelos dedos.

Ele já estava ali há muito tempo, sobrevivendo dia após dia sem saber o que viria a seguir. Sempre esperando o pior, sempre evitando chamar atenção. Mas agora, olhando para Takeshi, ele sentiu algo diferente—uma faísca, uma chance de que talvez não precisasse aceitar esse destino sem lutar.

Layos manteve o olhar fixo em Takeshi, o silêncio entre eles carregado de dúvidas e decisões não ditas. Ele abriu a boca para falar, mas hesitou. Sabia que, se desse informações demais, poderia estar colocando os dois em risco.

"Vamos! Aceita Layos, eu não sei como vou enfrentar eles sozinhos e também não quero deixar você aqui. Então por favor aceita."

Takeshi sentia a ansiedade corroer seu peito. Seu coração batia forte, e cada segundo de silêncio parecia uma eternidade. Ele queria desesperadamente a resposta de Layos, mas temia que fosse negativa. Enfrentar tudo sozinho seria um peso esmagador, e ele sabia disso.

Respirou fundo, tentando acalmar o turbilhão dentro de si. Seus olhos, firmes e cheios de determinação, encontraram os de Layos.

Então, sem hesitar, estendeu sua mão direita para ele. Seu olhar não era apenas de confiança, mas também de esperança—uma chama que insistia em não se apagar, mesmo diante do desconhecido.

— Vai querer, Layos? — ele sorriu para Layos.

Layos engoliu em seco e finalmente disse, com a voz baixa:

— É claro, Tikashi. 

"Ufa, ainda bem que ele aceitou. Não sei como seria enfrentar tudo sozinho. Sem falar que as tarefas vão ser difíceis lá no futuro..."

Um alívio percorreu o corpo inteiro de Takeshi, dissipando parte do peso que carregava. Pela primeira vez em muito tempo, ele sentiu um calor confortável dentro de si, como se não estivesse mais completamente sozinho naquele inferno.

Ele ergueu o rosto e, sem perceber, um sorriso sincero surgiu em seus lábios. Olhando para Layos, ele disse:

— Então, vamos, Layos.