A escuridão era um manto sobre mim.
Ela se moveu como uma segunda pele, como se respirasse comigo, como se estivesse viva dentro de mim. E talvez estivesse.
O Poço do Abismo. Um lugar onde os condenados foram esquecidos, um buraco sem fim que devorava aqueles que foram lançados nele. Séculos de histórias sussurraram sobre esse lugar, sobre como as almas caíram, foram dilaceradas e se tornaram parte do próprio Abismo.
Mas eu não fui consumir.
Eu assumo o controle.
O silêncio absoluto ao meu redor era perturbador, mas não menos do que os olhos que continuavam a me observar das sombras. As criaturas—ou o que restava aquelas que falharam em sobreviver aqui—permaneceram à distância, sem ousar se aproximar.
Por quê?
Eu sabia a resposta.
Porque agora eu era um deles.
Minha mão deslizou sobre minha própria pele. Algo tinha mudado. Não era apenas a energia sombria que pulsava dentro de mim; meu próprio corpo era... diferente. Mais forte. Mais resistente. E, o mais estranho, eu não sinto fome, sede ou cansaço.
Um corpo que não se quebrava.
Uma mente que não se rende.
E um desejo de vingança que queimava mais do que qualquer dor.
Mas ficar parado aqui não me levaria a algum lugar.
Meu olhar se voltou para cima, para o nada. Não havia céu. Não havia luz. Apenas um véu de escuridão infinita. Eu preciso sair daqui.
Mas como?
Se fosse um lugar comum, eu tentaria escalar. Se fosse uma cela, procuraria um ponto fraco. Mas o Abismo não era um lugar feito para ser escapado . Era uma maldição. Um destino final.
Apertei os punhos, e as sombras ao meu redor estremeceram. Elas eram parte de mim agora... então, e se eu as usasse ?
Fechei os olhos e deixei a escuridão se mover. Não como algo que me dominava, mas como algo que me obedecia.
E então, senti.
Era como estender os dedos e tocar o próprio vazio. As sombras não eram apenas trevas – elas eram um caminho. Um corredor invisível, um espaço entre o real e o irreal, como se fosse o próprio tecido do Abismo.
Abra os olhos.
Sorria.
Se o Abismo me fez seus herdeiros, então eu usaria seu próprio poder para escapar.
Dei um passo à frente, e as sombras me engoliram.
Uma Travessia
O mundo ao meu redor distorce-se. O Poço do Abismo desapareceu, e eu fui lançado em um espaço onde não existia acima ou abaixo, esquerda ou direita. Tudo era uma imensidão infinita de vazio e murmúrios distantes.
Então, uma dor brutal atingiu minha cabeça como um ferro em brasa.
Imagens explodiram em minha mente.
Memórias que não eram minhas.
Mortes incontáveis. Homens e mulheres gritando enquanto suas carnes eram devoradas pela escuridão. O sofrimento dos que foram jogados aqui antes de mim. O medo de cada alma perdida, cada vida esmagada por essa prisão viva.
E, no meio disso tudo, uma verdade horrível se revelou.
O Abismo não era apenas um buraco .
Ele era uma entidade viva.
E estava esperando por alguém como eu.
Gritei, sentindo as vozes perfurando minha mente como espinhos afiados. Mas então, algo dentro de mim respondeu. Algo profundo, algo primordial.
As sombras ao meu redor se dobraram . Eles não me atacaram. Eles se curvaram.
Eu não era um prisioneiro aqui.
Eu era o novo governante.
A dor distante, e o vazio ao meu redor tremeu. Então, tudo desmoronou.
De repente, meu corpo foi puxado para frente, e minha visão se encheu de luz.
O Retorno
O impacto foi violento. Meu corpo foi arremessado contra o chão, o choque sacudiu meus ossos. Respirei fundo, meus pulmões se enchem com um ar pesado e quente.
E então percebi.
Eu não estava mais no Abismo.
Meus olhos se abriram, e o que me deixou imóvel.
Ruínas.
O lugar onde eu estava não era uma floresta, nem uma cidade, nem um castelo. Era um campo de destruição, com estruturas desmoronadas e cinzas espalhadas pelo chão. O cheiro de podridão impregnava o ar.
E no centro disso tudo, uma pilha de corpos.
Minha respiração se tornou irregular. Andei até os corpos, meus passos afundando na lama misturada com sangue seco. Eles usavam armaduras do Império.
O brasão da casa Von Elden.
Homens do meu próprio reino. Mortos. Massacrados.
Mas... quando?
Olhai para minhas próprias mãos. Elas tremiam, mas não por medo. Não por horror.
E sim por algo muito pior.
Eu não sinto nada.
Eu deveria me importar. Eu deveria sentir raiva, dor, confusão. Mas tudo o que havia dentro de mim era um vazio frio.
Eu estava morrendo uma vez.
E talvez, no momento em que despertei no Abismo, algo humano em mim teve morrido também.
Lentamente, ajoelhei-me e toque um dos corpos. A pele estava dura, seca. O tempo tinha passado. Quanto tempo? Dias? Semanas? Anos?
O Império ainda existia? Cedric ainda estava no trono?
Eu não tinha respostas. Mas sabia o que fazer.
Olhei para o céu escuro, onde uma lua pálida iluminava os destroços.
Minha jornada começou agora.
E quando ela terminasse, o mundo conheceria o verdadeiro terror.