olhares que dizem demais

O dia seguinte amanheceu com um céu limpo, e Riyeon se sentia leve – algo raro para ela.

Enquanto o motorista a levava até a academia, ela observava a cidade através da janela, mas sua mente sempre voltava à noite anterior, no toque hesitante de Anya, no jeito como a garota franzia as sobrancelhas sempre que ficava nervosa.

Ela não sabia exatamente o que estava acontecendo entre elas, mas, não queria definir ou rotular nada. Apenas queria continuar provocando Anya, testando sua paciência, fazendo-a reagir.

Quando chegou à academia, Riyeon saiu do carro com um sorriso discreto, que logo chamou atenção.

— Bom humor hoje, Riyeon? — perguntou uma colega, surpresa.

— Alguma coisa boa aconteceu? — outra garota comentou, olhando para ela com curiosidade.

Riyeon apenas ergueu uma sobrancelha e seguiu pelo corredor sem responder.

Ao entrar na sala de aula, seus olhos automaticamente procuraram Anya.

E lá estava ela, sentada no final da sala, de cabeça baixa, rabiscando algo em seu caderno de couro.

Riyeon sorriu de canto e caminhou até sua mesa, sentando-se ao lado da garota sem cerimônia.

— Dormiu bem? — perguntou, baixinho.

Anya arregalou os olhos, claramente surpresa pela pergunta.

— O quê?

— Se dormiu bem. Depois do nosso encontro na pista de skate. — Riyeon enfatizou as últimas palavras só para provocá-la.

Anya desviou o olhar rapidamente, suas bochechas ganhando um tom rosado.

— Não foi um encontro.

— Hmm... — Riyeon inclinou a cabeça, fingindo refletir. — Duas pessoas, juntas, em um ambiente descontraído, compartilhando momentos... Parece um encontro para mim.

Anya suspirou, tentando ignorá-la, mas Riyeon percebeu o pequeno sorriso que a garota tentou esconder.

Isso era perigoso.

Não porque Riyeon se importava com o que os outros pensariam, mas porque ela estava gostando demais desse jogo entre elas.

E o resto da sala percebeu isso.

Ao longo do dia, a proximidade entre as duas ficou cada vez mais evidente.

Elas trocavam olhares constantes.

Riyeon sempre aproximava o seu rosto de Anya, tentando espiar o que ela fazia, algo que antes não era habitual. E a jovem tentava esconder o caderno de couro que tinha desenhos secretos da garota ao seu lado.

Em momentos soltos, Anya pegava Riyeon encarando-a com um brilho curioso nos olhos. 

E, o que mais chamou atenção de todos, Riyeon ria.

Não risadas forçadas ou educadas. Mas risadas genuínas, aquelas que vinham com facilidade sempre que Anya a respondia com um comentário inesperado, tentando impedi-la de espiar sob seu ombro.

Isso não passou despercebido.

As garotas da academia cochichavam. Algumas observavam com olhares curiosos. Outras, com inveja.

E então havia Daehyn.

Ela não precisava ouvir os rumores para notar o que estava acontecendo.

Estava tudo ali, na forma como Riyeon se inclinava levemente para perto de Anya quando falava, na forma como os olhos dela brilhavam de um jeito que nunca brilharam quando estavam juntas.

Daehyn apertou a caneta com mais força do que deveria, sua mandíbula travando.

Aquilo não era só amizade.

Riyeon nunca tinha dado atenção para ninguém daquela forma antes.

E agora, do nada, estava fascinada por Anya?

Isso a incomodava. Muito.

Daehyn não queria admitir, mas havia uma pontada de algo desagradável crescendo dentro dela – algo que parecia muito com ciúmes.

Ela precisava fazer alguma coisa.

E, a partir daquele momento, decidiu que não deixaria Riyeon escapar tão fácil.

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O refeitório da academia estava lotado. O som de risadas e conversas preenchia o ambiente, enquanto as alunas se reuniam em seus grupos habituais. Anya, segurando sua bandeja com a refeição simples que tinha escolhido, caminhava pelo salão, procurando um lugar para se sentar.

Ela nunca gostou muito daquele ambiente. Era barulhento, cheio de olhares julgadores, e um lembrete constante de que ela era diferente da maioria ali. As alunas a rejeitavam, justamente, porque Riyeon a acolhera.

Mas, naquele dia, havia algo pior esperando por ela.

Ao passar ao lado de uma mesa onde algumas garotas da elite estavam sentadas, ela não percebeu quando um pé sutilmente se estendeu à sua frente.

Tudo aconteceu rápido demais.

O tropeço.

A sensação do chão se aproximando.

O impacto.

O barulho alto da bandeja se espatifando no chão, espalhando comida por toda parte.

Por um momento, o refeitório ficou em silêncio.

E então, as risadas começaram.

— Meu Deus, que patética! — uma das garotas zombou, segurando a boca como se estivesse chocada.

— Nem sabe andar direito!

— Isso que dá colocar qualquer um nessa escola...

Anya sentiu o rosto queimar de vergonha.

Ela ficou de joelhos no chão, tentando assimilar o que tinha acabado de acontecer. Seus olhos caíram sobre os pés de Daehyn, que estavam na posição exata de alguém que havia acabado de puxá-los de volta.

Anya não precisou de mais nada para entender.

Daehyn estava de braços cruzados, um sorrisinho satisfeito nos lábios.

— Devia prestar mais atenção por onde anda — disse, sua voz carregada de veneno.

Anya sentiu um nó na garganta.

Ela queria desaparecer.

Mas, antes que pudesse reagir, uma voz ecoou pelo refeitório, fazendo o burburinho cessar de imediato.

— O que diabos está acontecendo aqui?