O dia começou de forma incomum. Evelyn havia saído cedo para correr pela cidade, enquanto Oliver analisava os novos upgrades da sua moto.
O primeiro era conveniente: sem necessidade de chave, agora ela ativava por reconhecimento de voz.
O segundo era mais chamativo, um painel holográfico repleto de funções que ele provavelmente nunca usaria.
Mas, enquanto explorava os detalhes, algo o fez parar.
Ele sentiu.
Um cansaço repentino, como se algo drenasse sua energia por um instante. Mas não era ele. Era Evelyn.
Os poderes de Oliver se manifestavam de várias formas, mas, com o tempo, ele percebeu que tinha desenvolvido uma espécie de conexão com ela.
Não era algo que ele havia planejado, apenas aconteceu. E agora, sentindo o desgaste dela, ele não perdeu tempo.
— Leve-me até ela.
A moto reconheceu sua voz, o painel holográfico brilhou por um instante e, em seguida, o motor roncou suavemente antes de acelerar, guiando-o diretamente até Evelyn.
A moto acelerou pelas ruas, movendo-se de forma quase autônoma enquanto Oliver mantinha uma expressão neutra, mas focada.
Ele não precisava de um mapa ou rastreador.
Ele apenas sabia.
Quando a encontrou, Evelyn estava encostada em um banco de praça, respirando pesadamente, com as mãos apoiadas nos joelhos.
O suor escorria pela sua testa, e seu olhar estava um pouco distante, como se estivesse tentando se recuperar de algo.
Oliver desceu da moto e se aproximou sem dizer nada. Apenas parou ao lado dela e esperou. Evelyn notou sua presença, mas não reagiu de imediato.
Só depois de alguns segundos ela levantou a cabeça e suspirou.
— Como você me achou?
Oliver apenas deu um pequeno sorriso de canto.
— Intuição.
Evelyn estreitou os olhos, desconfiada.
— Intuição, é?
— Exato.
Ela revirou os olhos e se endireitou, ainda parecendo um pouco cansada.
— Eu exagerei... De novo.
— Você sempre exagera.
— Cala a boca.
Oliver soltou um riso e estendeu a mão para ela. Evelyn hesitou, mas acabou pegando, deixando que ele a puxasse para cima.
Assim que ficou de pé, sentiu as pernas bambearem um pouco, e Oliver automaticamente a segurou pela cintura para evitar que caísse.
Evelyn congelou.
Oliver percebeu tarde demais que a posição deles havia ficado... próxima demais. Seu rosto estava a poucos centímetros do dela, e ele conseguia sentir a respiração ainda acelerada da mulher.
Evelyn o encarava, seus olhos brilhando de um jeito diferente.
— Eu devia ter ficado na moto — Oliver murmurou, tentando afastar a tensão.
Evelyn sorriu de leve.
— Mas aí você não teria me segurado assim.
Ele piscou.
— ...Você fez isso de propósito?
Ela não respondeu. Apenas inclinou ligeiramente a cabeça, como se desafiasse Oliver a soltar ela primeiro.
Por um momento, nenhum dos dois se mexeu. Apenas ficaram ali, se encarando. Então, Oliver suspirou e a soltou devagar.
— Vamos pra casa.
Evelyn apenas sorriu e caminhou ao lado dele até a moto.
Mas, no fundo, aquele pequeno momento entre eles ainda pairava no ar.
Oliver seguiu calmamente até a biblioteca ao lado do apartamento, com as mãos nos bolsos e a expressão relaxada.
O clima estava fresco, e o som dos passos de Evelyn, que tentava discretamente segui-lo, misturava-se ao ambiente tranquilo da rua.
Ele já havia percebido sua presença. Desde o momento em que saiu de casa, sentiu o olhar curioso e desconfiado dela o acompanhando.
Mas decidiu se divertir um pouco com a situação e fingiu não notar.
Dentro da biblioteca, o cheiro de papel e madeira antiga preenchia o ar.
Oliver caminhou até uma das seções mais afastadas, passando os olhos pelos títulos disponíveis.
Evelyn, por outro lado, se escondia atrás das estantes, tentando agir de forma natural. Mas sua mente estava presa na palavra que ele havia dito antes de sair.
"Amiga?"
Quem era essa "amiga" que ele poderia encontrar ali? Ele já conhecia alguém daquela biblioteca? Ou estava apenas jogando palavras ao vento para irritá-la?
Ela estreitou os olhos, observando cada movimento dele.
Oliver escolheu um livro e se sentou em uma mesa próxima à janela. Evelyn se moveu lentamente, espiando por trás de uma estante, seu olhar fixo nele.
Então, do nada, uma garota se aproximou de Oliver.
Evelyn prendeu a respiração.
A moça sorriu e puxou uma cadeira, se sentando ao lado dele com naturalidade.
Oliver, por sua vez, apenas desviou o olhar do livro por um instante e acenou levemente com a cabeça.
"Quem é essa?" Evelyn sentiu um pequeno incômodo no peito, sua mente trabalhando rápido.
Ela precisava ouvir a conversa.
Se esgueirando um pouco mais, ela tentou se aproximar sem ser notada.
Mas Oliver, ainda sem levantar o olhar do livro, de repente falou em um tom casual:
— Pode sair daí, Evelyn.
Ela congelou.
A garota ao lado dele piscou, confusa.
Evelyn saiu lentamente do esconderijo, seu rosto vermelho de irritação.
— Eu não estava me escondendo!
Oliver finalmente ergueu os olhos para ela, um pequeno sorriso brincando em seus lábios.
— Não? Então por que está atrás daquela estante há cinco minutos?
Evelyn cruzou os braços, tentando manter a pose.
— Eu só estava vendo os livros.
A garota ao lado de Oliver riu baixinho.
— Vocês são um casal engraçado.
Oliver apenas balançou a cabeça e voltou a ler.
Evelyn, por outro lado, sentou-se ao lado dele, determinada a não sair dali.
Se aquela garota era a tal "amiga", ela ficaria ali para descobrir.
A garota ao lado de Oliver olhou de Evelyn para ele, ainda sorrindo.
— Ah, entendi... Então vocês são realmente namorados?
Evelyn abriu a boca para responder, mas Oliver foi mais rápido:
— Algo assim.
A resposta neutra só fez Evelyn sentir um leve incômodo no peito. Ele não negou completamente, mas também não afirmou nada.
A garota riu de novo e se apresentou:
— Sou Isabelle, trabalho aqui na biblioteca. Você vem com frequência, né, Oliver?
— De vez em quando — ele respondeu, folheando o livro.
Evelyn não gostou daquela conversa. Por que aquela garota sabia que Oliver ia lá? Ele já a conhecia antes? Desde quando?
Ela se inclinou um pouco, encarando Isabelle com um olhar analítico.
— Vocês são amigos?
— Ainda não — Isabelle respondeu, piscando. — Mas eu não me importaria.
Evelyn sentiu um calor estranho subindo pelo corpo. Ela não gostou do tom daquela resposta.
Oliver, por outro lado, apenas deu de ombros.
— Se for o caso, agora você tem duas amigas — disse Isabelle, olhando para Evelyn.
Evelyn sorriu sem mostrar os dentes.
— Hmm... Claro.
Oliver percebeu a tensão no ar, mas manteve sua postura relaxada, como se nada estivesse acontecendo.
Isabelle pegou um livro e começou a folheá-lo casualmente.
— Então, Oliver... Você já terminou aquele livro que pegou da última vez?
Evelyn travou.
A última vez?
Então ele já tinha falado com ela antes.
Oliver assentiu levemente.
— Sim. Foi interessante.
Evelyn continuou em silêncio, observando tudo.
Ela não queria admitir, mas estava se sentindo... irritada.
Por que essa garota falava com tanta naturalidade com Oliver?
E por que Oliver não parecia incomodado?
Antes que percebesse, seus dedos começaram a tamborilar na mesa.
Oliver, sem tirar os olhos do livro, murmurou:
— Está tudo bem aí?
— Tá sim — Evelyn respondeu rápido.
Mas ele percebeu.
— Hmm.
Isabelle, por outro lado, notou o clima e sorriu.
— Bom, vou deixar vocês dois sozinhos. Até mais, Oliver.
Ela acenou e se afastou, deixando Evelyn finalmente respirar.
Oliver fechou o livro e olhou para ela.
— E então? Você veio aqui só para me espionar?
— N-Não! — Evelyn cruzou os braços. — Eu só... queria ver se você não estava aprontando nada.
— E descobriu algo?
— Sim.
— O quê?
Ela hesitou.
— Que eu não gosto dessa Isabelle.
Oliver riu baixinho.
— Ciúmes?
— Não enche.
Ele apoiou o queixo na mão, observando-a com diversão.
— Você não muda.
Evelyn bufou.
— E você não me engana.
Oliver apenas sorriu e voltou a ler.
Ela continuou ali, emburrada, mas sem sair do lado dele.
O celular de Evelyn vibrou sobre a mesa. Ela pegou o aparelho e olhou a tela, lendo a mensagem.
[Irmão Mais Velho]: Acabei de chegar na cidade. Pensei em passar aí pra te ver.
Seu corpo ficou tenso na hora.
— Droga...
Oliver levantou os olhos do livro.
— Algum problema?
Evelyn largou o celular na mesa e suspirou.
— Meu irmão mais velho acabou de chegar na cidade e quer me visitar.
Oliver piscou lentamente.
— Não sabia que você tinha um irmão mais velho.
— Você nunca perguntou.
— Justo.
Evelyn passou a mão nos cabelos, claramente inquieta.
— Isso não é bom...
— Por quê?
Ela olhou para Oliver com uma expressão séria.
— Porque ele é superprotetor. E se ele souber que moramos juntos, vai querer te matar.
Oliver fechou o livro com calma.
— Entendi. Então eu devo me preparar para um possível assassinato?
Evelyn bufou.
— Não brinca com isso.
Ele sorriu de leve.
— Relaxa. Se ele quiser me matar, eu só fujo. Ou revido.
— Não ajuda!
Evelyn se levantou rapidamente.
— Eu tenho que ir pra casa antes dele aparecer do nada.
Oliver também se levantou, ajeitando a jaqueta.
— Vamos então.
Ela o encarou com suspeita.
— Você vai comigo?
— Ué, não é lá que eu moro também?
— Mas...
Ele inclinou a cabeça.
— Tá com medo do seu próprio irmão?
— N-Não!
— Então vamos.
Evelyn suspirou, derrotada.
— Que seja. Mas se ele perguntar, você é só meu colega de apartamento, entendeu?
— Ah, então você não vai dizer que me ama?
— Cala a boca e anda logo.
Oliver riu baixo e seguiu ao lado dela.
A visita do irmão prometia ser... interessante.
Evelyn sentiu o peso do momento assim que seu irmão cruzou a porta. Gerarld sempre foi protetor com ela, e agora, ali estava Oliver, sentado no sofá, encarando-o com sua típica expressão neutra.
O silêncio durou alguns segundos antes que Oliver, sem qualquer hesitação, dissesse:
— Sou um homem que ama muito a sua irmã.
O ar pareceu ficar mais pesado. Evelyn ficou rígida, sua mente trabalhando a mil.
O que diabos Oliver estava pensando ao dizer algo assim logo de cara?!
Gerarld não respondeu imediatamente. Seu olhar se estreitou levemente enquanto analisava Oliver de cima a baixo.
Mas então, o que parecia ser um clima tenso se desfez em um segundo quando um sorriso puxou o canto da boca de Gerarld.
— Poxa, então finalmente admitiu?
Oliver deu um leve sorriso, e ambos se cumprimentaram com um aperto de mão firme, como se fossem velhos
amigos que não se viam há tempos.
Evelyn ficou boquiaberta.
— Espera, espera, espera! — Ela levantou as mãos. — O que tá acontecendo aqui?!
Gerarld riu, colocando uma mão no bolso.
— Relaxa, maninha. Eu conheço o Oliver há anos.
Ela piscou.
— Hã?!
Oliver se recostou no sofá.
— Trabalhei com ele antes mesmo de trabalhar contigo. Foi Gerarld quem me conseguiu um emprego no mesmo lugar que você trabalhava alguns anos atrás.
Evelyn arregalou os olhos.
— E VOCÊ NUNCA ME CONTOU ISSO?!
Oliver deu de ombros.
— Nunca teve motivo.
Gerarld balançou a cabeça, nostálgico.
— Oliver era um dos caras mais eficientes que já trabalhei junto. Sentimos falta da produtividade dele.
Oliver retrucou sem hesitar:
— E eu não sinto falta do cansaço.
Gerarld riu.
— Ainda o mesmo de sempre.
Evelyn, ainda confusa e um pouco indignada, cruzou os braços.
— Então quer dizer que vocês já se conheciam esse tempo todo...
— Basicamente — Oliver confirmou.
Gerarld a cutucou com o cotovelo.
— E você nunca percebeu?
Ela ficou vermelha.
— VOCÊS NUNCA ME FALARAM!
Os dois homens trocaram um olhar e deram de ombros ao mesmo tempo. Evelyn soltou um suspiro longo e cansado.
— Isso é tão irritante…
Oliver riu de leve.
— Você já disse isso antes.
— E vou continuar dizendo!
Gerarld observava a interação dos dois, e um pequeno sorriso se formou em seu rosto.
— Bom, pelo menos sei que você está em boas mãos.
Evelyn parou.
Suas bochechas coraram ainda mais. Oliver apenas sorriu de leve, enquanto Gerarld se jogava no sofá.
Evelyn ainda estava processando tudo, mas uma coisa era certa: aquele dia tinha começado de um jeito e terminado de outro completamente diferente.
Evelyn ainda estava tentando assimilar tudo.
Seu irmão e Oliver já se conheciam há anos, e ninguém teve a decência de contar isso para ela?
O pior de tudo é que, agora que ela via a interação entre eles, fazia todo sentido.
O jeito como Oliver não demonstrava qualquer tensão na presença de Gerarld, e como seu irmão parecia completamente à vontade, como se estivesse revendo um velho colega.
Ela cruzou os braços, ainda desconfiada, enquanto Gerarld olhava ao redor.
— Então, o que temos pra comer aqui?
— Vai ter que pedir algo — Oliver respondeu sem tirar os olhos do celular.
Gerarld bufou.
— Como esperado de vocês dois.
— Ei! — Evelyn retrucou. — Eu cozinho quando preciso!
— "Quando preciso" — Gerarld repetiu, zombando.
Evelyn estreitou os olhos, mas preferiu ignorá-lo. No fundo, ela sabia que Oliver e seu irmão estavam se divertindo às custas dela.
Gerarld pegou o celular e já começou a procurar um delivery.
Enquanto isso, Oliver se levantou e caminhou até a cozinha, pegando um copo d'água.
Evelyn o seguiu com o olhar. Ainda estava incomodada com a conversa anterior.
— Oliver.
Ele parou, virando apenas a cabeça para encará-la.
— Hm?
Ela hesitou, mas decidiu perguntar mesmo assim.
— Quando o Gerarld te ajudou a conseguir aquele emprego... por que você aceitou?
Oliver tomou um gole d'água antes de responder.
— Porque eu precisava do dinheiro.
Evelyn franziu a testa.
— Mas você poderia ter trabalhado em outro lugar.
Oliver a encarou por um momento antes de dar um pequeno sorriso.
— Talvez eu quisesse ver você.
O coração de Evelyn deu um salto.
Gerarld, ainda focado no celular, levantou a voz do outro cômodo:
— Alguma preferência de comida ou posso pedir qualquer coisa?
Evelyn demorou um pouco para responder. Ainda estava tentando processar as palavras de Oliver.
Ele desviou o olhar dela e voltou a beber sua água como se não tivesse dito nada de mais.
Ela cerrou os punhos.
Ele fazia isso de propósito.
— T-tanto faz — respondeu, um pouco mais alto do que o necessário.
Gerarld deu de ombros e voltou a mexer no celular.
Evelyn, por outro lado, ficou encarando Oliver, que agora fingia estar completamente despreocupado.
Mas ela sabia que ele sabia.
Esse desgraçado...
— Pedi um delivery, deve estar chegando daqui a pouco.
— Ótimo. — Oliver comentou, bebendo um pouco de água.
— E dá tempo de conversarmos um pouco. — Gerarld apoiou os cotovelos na mesa, olhando para Oliver com um meio sorriso. — Você ainda escreve?
Evelyn revirou os olhos.
— Claro que ele escreve, ele vive disso.
— Não, eu tô falando das histórias antigas. Aquelas que ele escrevia antes dos livros.
Evelyn piscou, surpresa.
— Histórias antigas?
— É, aquelas que ele me mostrava anos atrás. Algumas eram até deprimentes, pra falar a verdade.
Oliver suspirou pesadamente, encarando Gerarld com a expressão neutra de sempre, mas qualquer um que o conhecesse bem saberia que aquilo era puro desgosto.
— Você ainda lembra disso?
— Claro que lembro. Você me mandava algumas pra eu dar opinião. Só que… nunca publiquei nada sobre elas, como você pediu.
Evelyn cruzou os braços, o olhar afiado.
— E por que eu nunca vi essas histórias?
— Porque elas não existem mais — Oliver respondeu simplesmente.
— Elas existem sim, você só escondeu.
— Evelyn…
— Oliver.
Gerarld riu e se recostou na cadeira.
— Pelo visto, tem alguém que quer muito descobrir seu passado, hein?
Oliver suspirou e se jogou para trás na cadeira, cobrindo o rosto com uma mão.
Oliver soltou um suspiro longo e cansado, abaixando a mão que cobria o rosto, só para encarar Gerarld com um olhar de quem já sabia o que viria.
— Não é sobre esconder, Evelyn — disse ele, a voz um pouco mais séria. — Eu simplesmente não vejo sentido em reviver algo que... já não faz parte de mim.
Evelyn permaneceu em silêncio por um momento, processando as palavras dele. Ela sabia que Oliver era bom em manter as coisas no passado, mas a ideia de ele esconder uma parte tão importante de sua vida a incomodava.
Mesmo assim, ela não queria pressioná-lo mais, então se limitou a observá-lo.
Gerarld, por outro lado, pareceu perceber a tensão crescente entre os dois e decidiu mudar de assunto.
— Bom, acho que podemos deixar as coisas do passado para lá, não é? — Ele disse, com um sorriso despreocupado. — Vamos focar no presente. Aliás, você já me disse que voltou com os livros agora, Oliver. Isso é impressionante.
Oliver assentiu, voltando a relaxar um pouco.
— Eu escrevo, sim. Mas de uma forma diferente. Tem mais a ver com... o que eu sinto, o que eu sou agora.
Evelyn observou o rosto de Oliver com mais atenção, notando como ele falava das suas histórias, sem tanta frieza.
Era uma sensação estranha, como se ele estivesse mais aberto do que costumava ser.
Talvez fosse o fato de Gerarld estar ali, um velho amigo, ou talvez fosse por ele estar confortável o suficiente para finalmente falar sobre isso com alguém.
O som da campainha tocou e a conversa foi interrompida.
Evelyn se levantou, aliviada por um momento de distração. Quando abriu a porta, o entregador estava ali, com algumas sacolas de comida.
— Pode deixar na mesa — disse Evelyn, rapidamente pegando as sacolas e levando-as para a cozinha.
Gerarld seguiu até a mesa, tirando uma garrafinha de vinho que ele trouxera consigo e despejando um pouco nas taças.
— Acho que vai ser uma boa refeição, já que estamos todos aqui, não? — Ele sorriu, tentando aliviar o clima tenso que estava se formando.
Oliver permaneceu calado por um instante, observando a comida ser colocada na mesa.
— Acho que sim. — Ele disse finalmente, com um leve sorriso, antes de se voltar para Evelyn. — Obrigado por… não perguntar mais sobre o passado, não dessa parte em específico.
Evelyn olhou nos olhos dele, percebendo algo nela mesma. Talvez fosse a forma como ela queria entender mais, mas também sabia que havia limites.
A última coisa que queria era forçá-lo a revisitar algo que ele não estava preparado para falar.
— Só não me esconda mais coisas, ok?
Oliver deu um sorriso leve, antes de finalmente pegar o garfo.
— Vou tentar.
E foi assim que, por um breve momento, todos pareceram relaxar, rindo e comendo juntos.
Mesmo que a conversa estivesse longe de ser resolvida, algo ali parecia mais calmo, mais compreensível. E para Evelyn, aquele já era um bom começo.
Enquanto a refeição seguia, a tensão parecia se dissipar pouco a pouco, como se os primeiros passos para um entendimento mais profundo estivessem sendo dados, sem pressa, mas com a vontade silenciosa de algo mais.
Gerarld, talvez por perceber que o clima ainda estava meio tenso, começou a falar sobre assuntos triviais, como viagens que fizera nos últimos meses e até um novo projeto que ele estava tocando na empresa.
Mas, para Evelyn, tudo o que ela realmente conseguia perceber era Oliver, ali ao seu lado, a maneira como ele mexia na comida sem muita atenção, como se cada movimento fosse uma maneira de evitar mais conversa, mais perguntas.
O silêncio entre eles se tornou confortável, mas Evelyn ainda sentia um vazio, algo não dito.
Ela sabia que Oliver estava guardando algo, não apenas em relação a sua antiga vida, mas a própria maneira como ele via o presente.
O que mais ele estava escondendo? E por que ele parecia sempre tão distante, mesmo quando estava perto?
Gerarld interrompeu seus pensamentos com uma pergunta casual:
— E você, Evelyn, o que anda fazendo? Acho que você nunca me contou muito sobre seus projetos ultimamente.
Evelyn sorriu levemente, agradecida pela mudança de foco.
— Bem, tem sido... um pouco corrido. Estive me concentrando mais no meu trabalho, ajudando a organizar uns processos na firma, sabe? Nada muito emocionante.
Gerarld riu, pegando um pedaço de pão.
— Eu entendo. Todos nós temos nossos dias, mas você deveria aproveitar mais, você sabe. De vez em quando, uma pausa é boa.
Evelyn apenas assentiu, mas seus pensamentos ainda estavam em Oliver.
Ela queria mais, queria saber dele, queria entender como ele realmente se sentia, como ele estava lidando com tudo.
Mas, por mais que tentasse, ele sempre parecia tão fechado, tão protetor sobre si mesmo.
Oliver, como se tivesse lido seus pensamentos, olhou para ela com um sorriso tênue.
— Vai ficar tudo bem, Evelyn. Não se preocupe tanto com o que não sabemos ainda.
Aquelas palavras pareciam ter um peso maior do que ele pretendia, como se ele estivesse tentando consolá-la, mas ao mesmo tempo reafirmando o distanciamento que ele mantinha entre eles.
Evelyn engoliu em seco, tentando processar a mensagem dele, mas não respondeu. Não naquele momento.
Quando a refeição terminou e Gerarld se levantou para pegar seu casaco, ele deu um último olhar para Oliver e, com um sorriso, disse:
— Vai ser bom ver você de novo no jogo, Oliver. Acho que a empresa está sentindo sua falta.
Oliver não respondeu imediatamente. Apenas olhou para Gerarld, com uma expressão neutra, mas com algo de distante nos olhos.
— Pode ser — disse ele por fim, com uma leveza que parecia forçada.
Gerarld não pareceu perceber, mas Evelyn sentiu. Havia algo mais ali, algo não dito.
Depois que Gerarld se despediu e saiu, o apartamento voltou ao silêncio.
Evelyn ficou olhando para Oliver, que ainda parecia imerso em seus próprios pensamentos.
Ela queria perguntar mais, queria entender tudo, mas ela sabia que havia limites.
Ela se levantou e foi até a janela, olhando para fora.
O céu estava nublado, refletindo um pouco do seu estado de espírito.
Oliver se levantou também, indo até ela. Colocou uma mão suave em seu ombro, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
A sensação dele ali, tão perto, era reconfortante, mas ao mesmo tempo incompleta.
— Sou um mistério e provavelmente o mais difícil de se resolver — disse ele, com uma voz mais suave do que ela esperava.
Evelyn não respondeu de imediato. Olhou para ele por um momento, buscando algo mais.
Mas no fundo, ela sabia que, por mais que tentasse, algumas partes de Oliver estavam sempre fora de seu alcance.
E talvez fosse isso que o tornasse tão... complicado.
— Só não se afaste de mim, tá? — foi tudo o que ela disse.
Oliver sorriu levemente, um sorriso sincero, mas que ainda carregava um toque de tristeza.
— Eu não vou. Eu prometo.
Mas, para Evelyn, a promessa parecia mais um reflexo do que ele gostaria de acreditar do que uma garantia sólida.
Ela não sabia o que o futuro reservava para eles, mas por agora, isso parecia o suficiente.
E naquele silêncio que se seguiu, Evelyn sentiu que, talvez, o maior mistério de todos fosse o que se escondia por trás das palavras e gestos de Oliver.
Ela não sabia o que ele guardava, mas sabia que, de alguma forma, estava mais perto dele do que jamais imaginara. E isso, por enquanto, era tudo o que ela precisava.