A terceira lua sangrou.
Não com timidez.
Mas com fúria.
O céu, antes calado, se rasgou em lamentos.
Estrelas caíam como cinzas.
E o deserto inteiro ficou vermelho — não por causa do sol, mas da presença dele.
Ak-Zarel havia despertado.
Nefer ficou em silêncio, observando o céu.
O bracelete em seu pulso agora estava rachado.
A luz que antes o guiava tremia, fraca… como uma vela prestes a apagar.
Iset colocou a mão em seu ombro.
— Está chegando a hora.
— Não. — ele respondeu. — Já chegou.
No coração do deserto, um novo templo havia emergido. Não construído... mas revelado. Como se sempre estivesse ali, enterrado sob os pecados do passado.
Chamavam-no de O Trono da Primeira Noite.
Era para lá que Nefer deveria ir.
Mas não para vencer.
E sim… para decidir.
Porque a guerra já estava em movimento.
Tribos inteiras estavam se curvando diante da sombra de Ak-Zarel, hipnotizadas por promessas de poder e imortalidade.
A cidade de Taben, no leste, queimava.
Os ventos traziam o cheiro de carne e fé morta.
— Eles o seguem como um deus. — disse Iset, olhando o horizonte. — E ele age como um pai que volta para buscar os filhos que o traíram.
— E o que eu sou pra ele? — Nefer perguntou.
Ela não respondeu.
Eles seguiram em silêncio.
Chegaram à beira de uma fenda profunda.
No fundo... o templo.
Dezenas de degraus de pedra negra, cobertos por símbolos que se moviam como serpentes adormecidas.
— Quando você pisar lá dentro… — Iset falou, com a voz embargada — …nada em você vai continuar o mesmo. Ou você o enfrentará... ou o abraçará.
Nefer desceu.
Um a um.
Degraus que cantavam com sua presença.
Ao chegar à porta do templo, ela se abriu sozinha.
Dentro… o frio.
Mas não um frio comum.
Era o tipo de frio que morava dentro dos ossos. Que arrancava memórias e as devorava em silêncio.
E então… ele apareceu.
Ak-Zarel.
Desta vez, não como uma sombra.
Mas como homem.
Vestido com o ouro dos reis e os olhos de um vazio que consumia tudo.
— Você voltou.
— Finalmente, meu filho.
Nefer encarou-o.
O bracelete reagiu. Luz e sombra duelando em sua pele.
— Eu não sou seu.
Ak-Zarel sorriu.
— Ainda não.
Mas será.
Porque mesmo as luzes mais fortes…
são feitas de sombras.