CAPÍTULO 10 – O REINO DE CINZAS

O templo era vivo.

Cada parede pulsava como carne antiga.

O ar... pesado, espesso, cheio de vozes que murmuravam em línguas mortas.

Nefer seguiu Ak-Zarel por corredores que se contorciam em formas impossíveis.

O chão tremia com cada passo do rei antigo, como se o próprio mundo se curvasse sob seus pés.

— Por que me trouxe aqui? — Nefer perguntou, sentindo o bracelete queimar.

— Porque aqui é onde tudo começou.

E onde tudo termina. — Ak-Zarel respondeu, sem olhar para trás.

Eles chegaram a uma sala circular.

No centro, um trono feito de ossos de reis.

Em volta, sete pilares — cada um representando uma era esquecida.

— Você é a oitava era.

A era do fim. — Ak-Zarel declarou, com voz suave demais para tanto peso.

Nefer não respondeu.

Mas seu corpo tremia.

Não de medo.

De memória.

Ali... naquele lugar...

ele já havia estado antes.

Imagens invadiram sua mente.

Era ele… criança… ajoelhado diante do trono, com sangue nas mãos.

O pai sorrindo.

A multidão em silêncio, assistindo ao nascimento do novo herdeiro.

Ele havia aceitado.

Havia feito um pacto.

Mas depois... algo mudou.

Algo dentro dele se partiu.

— Eu vi... o que eu era. — Nefer disse, baixo.

— Eu sei o que fiz.

Ak-Zarel se aproximou, olhos brilhando como carvão aceso.

— Você era puro.

Não havia culpa.

Havia propósito.

Você nasceu para abrir o caminho.

— E quantos morreram por esse caminho?

Quantas almas eu queimei… sem nem lembrar?

O trono tremeu.

Os pilares choraram poeira.

Ak-Zarel parou diante do filho.

— Você pode continuar lutando contra o que é.

Ou pode aceitar.

E reinar.

Nefer encarou-o.

— Reinar sobre o quê?

Ak-Zarel ergueu a mão.

E o chão se abriu.

Lá embaixo… um novo mundo.

Um reino coberto por cinzas.

Onde homens andavam de joelhos.

Onde os céus estavam em chamas.

E onde o nome de Nefer era entoado como oração.

— Esse é o futuro que você criou. — Ak-Zarel sussurrou.

— Só precisa aceitar.

Nefer caiu de joelhos.

O bracelete explodiu em dor.

A luz se partia…

e a sombra se aproximava.

Mas então…

uma voz.

Fraca.

Quase esquecida.

De alguém que um dia o amou.

Nefer… escolha a vida.

Foi como um corte.

Como ar entrando nos pulmões pela primeira vez.

Ele gritou.

Um grito que rasgou o templo.

Que rachou os pilares.

Que fez Ak-Zarel recuar, com os olhos arregalados.

— EU ESCOLHO SER LIVRE! — Nefer gritou, com lágrimas e fúria.

E o bracelete... se quebrou.

Mas a luz… não.

A luz cresceu.

Tomou o templo.

E o reino de cinzas… tremeu.

O rei caiu de joelhos.

E o filho se levantou.

Pela primeira vez...

como homem.