Capítulo 79: O Limiar da Perdição

O centro da Biblioteca era um lugar em que a luz nunca havia tocado. Mesmo quando Ethan e Elyss avançaram pelos corredores tortuosos, onde as paredes pareciam sussurrar segredos de eras passadas, algo os impelia a seguir. O ar estava carregado com uma presença densa, que parecia se entrelaçar com suas próprias emoções e pensamentos. Quanto mais avançavam, mais intensos ficavam os efeitos da energia que emanava do Véu.

Ethan sentia o peso do Fragmento em sua mente, pulsando em um ritmo acelerado, como se a própria essência de sua existência estivesse sendo puxada para fora dele. Cada pensamento, cada sensação, era uma batalha para não sucumbir ao poder sombrio que o cercava.

— A sensação... é como se o mundo estivesse desaparecendo. — Elyss disse, sua voz fraca, como se tentasse manter o controle sobre si mesma. Seus passos estavam hesitantes, mas ela se recusava a parar. — Não consigo sentir mais o chão sob meus pés.

Ethan não respondeu de imediato. Ele estava absorvendo cada fragmento de informação que vinha à sua mente, tentando entender o que estava acontecendo. A visão do Véu ainda estava clara em sua mente, mas havia algo mais que ele não conseguia decifrar. Algo relacionado à esfera que ele havia visto na sua visão.

Eles passaram por mais um corredor e chegaram a uma enorme porta de pedra, coberta por símbolos antigos e gravuras que pareciam estar em constante movimento. À medida que se aproximavam, os símbolos começaram a brilhar, emitindo uma luz fraca, mas crescente.

— Esta é a entrada... — Elyss murmurou, o medo agora evidente em sua voz. — O que vamos encontrar lá dentro?

Ethan estendeu a mão e tocou a porta. A energia que emitiu parecia absorver sua própria essência, mas ele a suportou. Ele precisava saber a verdade, mesmo que isso significasse confrontar a própria origem do Véu.

Com um estalo ensurdecedor, a porta se abriu, revelando uma sala de proporções gigantescas. O ambiente era completamente diferente de tudo o que já haviam visto na Biblioteca. Em vez de estantes e livros, havia uma enorme câmara de pedras negras, com um pedestal central onde repousava uma esfera brilhante, irradiando uma luz tão intensa que era impossível olhar diretamente para ela. Ao redor do pedestal, correntes de energia pareciam fluir como rios, distorcendo o espaço e criando ondulações no ar.

— O Véu... — Ethan sussurrou, sentindo um arrepio na espinha. Ele sabia que aquele lugar era o núcleo de tudo, a origem de sua conexão com o poder do Fragmento.

Elyss ficou parada ao lado dele, seus olhos fixos na esfera. Havia algo nesse lugar que parecia consumir tudo à sua volta. Era como se a própria essência do mundo estivesse sendo drenada lentamente, como se estivessem diante de algo que não deveria existir.

De repente, uma figura emergiu da escuridão ao fundo da sala, suas formas indefinidas e nebulosas, como uma sombra viva. Seus olhos brilhavam com uma luz maligna, refletindo a energia do Véu. A presença era esmagadora, e Ethan sentiu sua mente vacilar diante da intensidade do ser que estava diante deles.

— Você chegou... — a voz da figura era profunda, reverberando no ar como uma melodia macabra. — Era inevitável.

Ethan tentou se concentrar, seus olhos fixos na figura. Ele sabia que aquela era a manifestação do Véu, a entidade que governava todo o equilíbrio das realidades. Mas, ao mesmo tempo, ele sentia que algo mais estava acontecendo. O Véu não era apenas uma entidade. Era uma força primordial, um ser de pura existência que estava além da compreensão humana.

— O que você é? — Ethan perguntou, sua voz rouca pela tensão crescente.

A figura sorriu, uma expressão que não parecia humana, mas ainda assim transmitia uma sensação de inevitabilidade.

— Eu sou o Limiar. A fronteira entre os mundos. O elo que mantém o véu entre a vida e a morte, entre o real e o irreal. E agora, você tocou o Fragmento, o que significa que está além dos limites de sua compreensão. Você não pode mais voltar.

Elyss deu um passo à frente, seu olhar desafiador.

— E o que você quer de nós? Por que nos trouxe até aqui?

O Limiar não respondeu de imediato. Ele simplesmente se aproximou, e a energia que emanava dele parecia distorcer o espaço ao redor deles. Cada movimento seu fazia o tempo e a realidade parecerem vacilar. A sala se tornava cada vez mais incompreensível, como se o próprio tecido da existência estivesse desintegrando sob o peso daquela presença.

— Eu não trouxe vocês até aqui, criança. Vocês foram guiados. Cada passo que deram, cada decisão que tomaram, os aproximou desse momento. O Fragmento já os escolheu. Agora, é tarde demais para recuar.

Ethan não sabia o que era mais aterrador: a afirmação da figura ou a sensação de que ele realmente não tinha mais controle sobre sua própria jornada. Ele olhou para Elyss, que ainda estava firme ao seu lado, e sabia que não podiam ceder agora.

— O que quer de nós? — Ethan repetiu, sua voz mais firme. Ele sabia que estava lidando com algo muito além de seu poder, mas não podia desistir. Não sem lutar.

O Limiar sorriu novamente, mas dessa vez o sorriso era mais sinistro, como se ele tivesse lido cada pensamento de Ethan e soubesse que ele estava pronto para confrontá-lo.

— O Véu não exige nada de vocês, exceto sua essência. Para que o equilíbrio seja restaurado, tudo deve ser consumido. O Fragmento não é uma chave; é a sentença. E vocês são as chaves que o liberarão.

De repente, a esfera no pedestal brilhou com uma intensidade ofuscante. A luz emanada dela parecia envolver tudo, tornando a sala um único ponto de energia que os absorvia. Ethan tentou resistir, mas sua mente estava começando a se distorcer, as imagens do passado e do futuro se misturando em uma confusão incompreensível.

A sensação de ser puxado para dentro da própria existência era esmagadora. Ele olhou para Elyss, e, por um instante, seus olhares se encontraram, transmitindo um entendimento silencioso. Eles precisavam tomar uma decisão. Agora.

— Elyss! — Ele gritou, sua voz cortando o turbilhão de energia ao redor deles. — A chave está aqui. A resposta está dentro de nós.

Elyss assentiu, sua determinação se refletindo em seus olhos. Eles não poderiam simplesmente deixar o Véu consumir tudo. Não enquanto houvesse uma chance de lutar.

Com um esforço desesperado, Ethan estendeu as mãos em direção à esfera, sentindo a pressão do Véu tentar dominá-lo. Mas ele não se importou. Ele não iria permitir que o Limiar vencesse. Ele tinha que fazer isso, para salvar Elyss, para salvar o mundo.

A energia da esfera fluiu para suas mãos, e uma explosão de luz e escuridão tomou conta da sala.