Aquele que vai sumir

O aviso ainda estava em sua mão. A caligrafia era irregular, como se tivesse sido escrita por uma criança com medo.

O próximo a desaparecer será aquele que você mais ama.”

Akira encarava as palavras como se pudessem sangrar.

No peito, o vazio crescia com garras invisíveis.

Não sabia se era medo, culpa… ou uma dor que ainda não tinha nome.

Ele correu.

Saiu pela porta como se o mundo atrás estivesse desmoronando.

A cidade parecia… diferente.

As cores estavam mais lavadas, como se o tempo estivesse desbotando a própria existência.

Yui.

Esse era o nome que surgiu como uma agulha enfiada em sua memória.

A única pessoa que o fazia lembrar que era humano.

A amiga de infância que sempre dizia que o mundo era só um teatro absurdo — e eles, atores conscientes demais.

Akira correu até a antiga escola onde costumava encontrá-la antes de tudo virar pesadelo.

A entrada estava aberta.

Mas os corredores estavam vazios.

Luz fluorescente piscando, o som irritante do neon quebrado.

E nas paredes, fotos rasgadas, molduras com espelhos quebrados no lugar dos retratos.

No fim do corredor, ele a viu.

Sentada numa sala iluminada por velas, de costas.

Cabelos pretos. Corpo magro. Silhueta familiar.

Yui.

Yui…?

Ela não respondeu.

Sou eu, Akira… você se lembra?

Silêncio.

Ele se aproximou, devagar, como quem se aproxima de um santuário profanado.

Eu preciso te tirar daqui. Algo horrível vai acontecer. Alguém… alguém está tentando te apagar.

Yui virou-se lentamente.

Mas os olhos dela… estavam completamente brancos.

Sem pupilas. Sem brilho. Sem alma.

Akira… quem é você?

O chão pareceu sumir sob seus pés.

O quê?

Ela inclinou a cabeça, curiosa, como uma boneca com defeito.

Você está me confundindo com outra pessoa? Eu nunca te vi.

Não… não… você é Yui! Você me conhecia! A gente… a gente ria juntos! Você me chamava de idiota toda vez que eu esquecia os fones na chuva!

Yui piscou devagar.

Um sorriso vazio brotou em seus lábios.

Nunca vi alguém tão desesperado pra provar que existe.

Akira caiu de joelhos.

O próximo a desaparecer...

Ele encarou as mãos. Estavam cobertas de cinzas escuras, queimando em silêncio.

O mundo ao redor começou a trincar, como vidro prestes a explodir.

Yui levantou.

A voz dela agora era múltipla — a mesma voz do homem do chapéu branco.

Talvez você esteja tentando lembrar de alguém que só existia… na versão anterior de você.

As velas apagaram.

Tudo mergulhou na escuridão.

Akira gritou.

Mas o som não saiu.

Só fumaça.

Quando acordou, estava numa sala branca infinita, sozinho.

No chão, apenas um espelho.

Ele se olhou.

E o reflexo não era ele.

Era alguém… com o rosto borrado, sorrindo.