O Véu Da Noite

Do lado de fora, o encapuzado caminhava pela rua escura. Sua capa ondulava suavemente com o vento. Ao passar por um trabalhador que estava em uma esquina, o rapaz parou, seus olhos se fixando no homem com uma expressão desconcertante, mas ainda assim imóvel. O trabalhador não parecia surpreso ao ver o encapuzado, mas mesmo assim ele seguia olhando pra ele sem dizer nada.

“E então? O que está fazendo aqui?” a voz do encapuzado cortou o silêncio da rua. O tom era familiar, mas havia algo estranho, algo que sugeria que ele reconhecia o homem.

O beco que havia sido palco do massacre agora estava completamente limpo. Nenhum rastro de sangue, nenhum corpo, nenhum indício sequer de que um crime brutal havia ocorrido ali. Apenas um silêncio sepulcral preenchia o ar denso, enquanto os policiais e heróis vasculhavam a área, frustrados com a completa ausência de evidências.

Um dos investigadores, um policial de meia-idade chamado Detetive Park Hyun-soo, suspirou enquanto analisava o local. "Isso não faz sentido... recebemos uma denúncia anônima sobre um possível ataque, mas não há nada aqui. Nem uma gota de sangue. Como se esse lugar estivesse abandonado há anos."

Ao seu lado, um dos heróis designados para a investigação, conhecido como Thunderclap, cruzou os braços, visivelmente irritado. "Isso só pode ser trabalho dos Remanescentes Das Ruínas... eles são os únicos que têm essa precisão para agir e sumir sem deixar rastros. Mas se foram eles, por que matariam um grupo de criminosos e heróis juntos?"

"Talvez para mandar uma mensagem..." murmurou uma heroína de cabelos castanhos presos em um rabo de cavalo, chamada Silverveil. Ela passou os olhos atentos pelo ambiente, sentindo que havia algo fora do lugar, algo que escapava da percepção comum. "Seja quem for, não quer ser encontrado." E, de fato, aquele alguém estava ali... observando-os das sombras.

​No topo de um prédio abandonado próximo ao local, duas figuras se escondiam entre as ruínas. Uma delas, o mesmo homem encapuzado que havia executado o massacre, observava atentamente a movimentação abaixo. Ao seu lado, estava o trabalhador desconhecido que havia cruzado seu caminho momentos antes.

O encapuzado inclinou levemente a cabeça e quebrou o silêncio: "Eu perguntei antes... mas ainda não respondeu. O que estava fazendo ali?"

O trabalhador, em vez de responder diretamente, suspirou e cruzou os braços, antes de abrir um sorriso quase provocador. "Sabe... foi um pouco rude da sua parte nem sequer me dar boa noite antes."

O encapuzado permaneceu imóvel por um instante. Então, como se a provocação não tivesse sido nada demais, simplesmente respondeu: "Boa noite." Sua voz era firme, mas desprovida de qualquer emoção real. "Agora... responda."

O trabalhador riu baixinho e encolheu os ombros. "Eu estava apenas seguindo aquela gangue até o local. Coincidência que acabei esbarrando com você."

O encapuzado observou o homem por alguns segundos, tentando detectar qualquer sinal de mentira. Nada. Sua expressão continuava neutra, mas, por dentro, ponderava. Ele poderia estar mentindo... mas se estivesse, que motivo teria?

Por ora, decidiu que não valia a pena prolongar a conversa. Deu um último olhar para a movimentação dos heróis e policiais lá embaixo antes de virar-se para partir. "Se não há mais nada..."

Mas, assim que ele deu o primeiro passo para se afastar, o trabalhador falou novamente. Seu tom agora era diferente – mais sério, mais firme. Uma mudança súbita que fez o encapuzado parar.

"Daqui a dois dias, uma reunião será realizada." O encapuzado permaneceu em silêncio. "O seu tempo para se organizar começa agora," o trabalhador continuou. "Então se arrume... e esteja pronto."

A sombra do capuz não conseguia esconder completamente os olhos do homem. E, pela primeira vez, eles brilharam em um vermelho profundo, intenso como o crepúsculo de um dia perdido. Ele ergueu levemente o rosto, permitindo que a lua iluminasse seus cabelos brancos como neve.

O nome que ressoava nas profundezas da sociedade corrompida... um nome temido por aqueles que conheciam as trevas. Elysian. Um membro dos Remanescentes Das Ruínas, conhecido como Oblivion Sage. Sua resposta veio fria e certeira. "Entendido."

A cidade nunca dormia. Entre suas vielas estreitas, ruas iluminadas por letreiros de neon e becos tomados pelo cheiro de ferrugem e concreto úmido, o caos se camuflava na normalidade. Dois dias. Era tudo o que Elysian tinha antes da reunião. Ele precisava aproveitar cada segundo.

No primeiro dia a noite já avançava quando Elysian voltou para uma de suas bases secundárias, uma instalação oculta no subsolo de um armazém abandonado. O ambiente era frio, silencioso, apenas o brilho de telas holográficas iluminando as paredes metálicas.

Diante dele, uma pilha de dados coletados da operação no bar. Informações criptografadas, registros fragmentados, conversas interceptadas. Um quebra-cabeça incompleto, mas uma peça chamava atenção.

"As informações vêm de um só lugar… um nome constantemente mencionado nas comunicações entre os mafiosos e os heróis corruptos." Na tela, o nome apareceu, piscando em vermelho: Dante Vasquez.

Conhecido no submundo como “O Cobrador”, Dante não era apenas um informante comum. Ele intermediava negócios ilícitos, vendia segredos e lucros sujos para qualquer um disposto a pagar. Mais do que isso, ele era um fantasma – nunca permanecia muito tempo no mesmo lugar, sempre mudando de identidade e localização.

Isso explica por que os heróis não o eliminavam. Eles dependiam dele tanto quanto os criminosos. Elysian franziu o cenho. Agora, ele sabia a quem caçar.

No dia seguinte a noite estava úmida e pesada quando três sombras se moveram silenciosamente pelos telhados da zona industrial. O vento cortante da madrugada arrastava o cheiro de óleo e poeira, mas o trio não se importava.

Elysian liderava a missão. Seus passos eram leves como os de um espectro, os fios quase invisíveis em seus dedos preparados para atacar a qualquer momento. Atrás dele, duas figuras mantinham-se na escuridão.

À sua direita, um vulto esguio com um manto que ondulava como se estivesse em outra dimensão. As bordas de seu traje cintilavam levemente com tons azulados, e, quando se movia, parecia que sua forma se desmanchava em traços borrados, como uma pintura inacabada. Codinome: “Vulto Imaterial”.

À sua esquerda, um homem de porte robusto, vestindo um traje escuro cravejado de microcircuitos pulsantes. Seus olhos brilhavam em um tom cibernético, Codinome: “Oráculo Sintético”.

Os três observavam a construção abaixo – um antigo galpão aparentemente abandonado, mas com atividade intensa no subsolo. Ali estava Dante Vasquez, o Cobrador. Elysian quebrou o silêncio: "Tem certeza que ele está lá?"

O Oráculo Sintético sorriu de canto e ativou um holograma. “Ele está lá. Movimentação incomum, sinal de segurança reforçada. Parece que está vendendo informações para outro grupo.” O Vulto Imaterial inclinou levemente a cabeça. Sua voz soou calma, mas com um toque etéreo: "Entramos e interrogamos ou apenas observamos?"

Elysian girou levemente os dedos, sentindo a tensão dos fios de grafeno entre suas mãos. "Observamos primeiro. Se for necessário..." Ele não precisou terminar a frase. Ambos os aliados entenderam o que ele queria dizer. Se fosse necessário, fariam Dante sumir da face da Terra.

Os dois dias passaram num piscar de olhos. A reunião estava prestes a acontecer. Elysian estava caminhando pela cidade como qualquer outra pessoa, vestido com um traje discreto, sua presença dissolvida no fluxo da multidão. Ele havia deixado seu traje encapuzado para trás, sua postura mais casual, menos ameaçadora. Os olhos atentos que o vigiavam não viam nada além de um homem comum.

Mas havia algo estranho. Ele não parecia um criminoso. Nem alguém suspeito. Ele caminhava entre as pessoas sem se destacar, sem chamar atenção... como se fosse apenas mais um jovem voltando do trabalho.

A passos calculados, ele entrou em um prédio comercial e subiu no elevador. O som da campainha anunciando os andares ecoava no espaço pequeno e fechado. O espelho refletia seu rosto... um rosto que o público nunca associaria a um Cavaleiro do Apocalipse.

Quando a porta se abriu no último andar, ele saiu e passou pelos corredores brancos impecáveis de um laboratório.

Os funcionários o cumprimentaram com respeito. "Só mais um dia de trabalho duro, não é, Min-kyu?" um dos cientistas mais velhos disse com um sorriso.

Seo Min-kyu sorriu de volta, um sorriso discreto, educado. "Sim... só mais um dia." Enquanto caminhava para seu escritório, a verdade se desenrolava como um véu.

Seo Min-kyu e Elysian eram a mesma pessoa. A mente mais brilhante do laboratório era um dos Remanescentes Das Ruínas, Oblivion Sage.