A Princesa atrapalhada e o Cavaleiro cético

O sol brilhava sobre os jardins do castelo de Axoland, iluminando as flores que dançavam ao sabor da brisa. Mabel Abysscale, a princesa de Axoland, estava em pé diante do espelho em seus aposentos, ajustando seu vestido formal. O tecido era de um azul profundo, bordado com fios de ouro que formavam o símbolo da dinastia Abysscale. Ela estava radiante, mas também um tanto nervosa. Afinal, Ferme O'Malley, o aspirante a cavaleiro por quem ela nutria uma certa... paixão, havia sido convocado para acompanhá-la em uma missão importante. E ela não queria parecer menos do que uma princesa exemplar.

- Pronta para impressionar, Mabel! - ela disse para si mesma, dando uma última virada no espelho. - Agora, só falta encontrar a saída deste castelo gigantesco. Como é que eu saio daqui mesmo?

Era aí que começava o problema.

Mabel saiu de seus aposentos com uma alegria imensa, mas, após alguns minutos de caminhada, percebeu que estava completamente perdida. O castelo de Axoland era imenso, com corredores que pareciam se estender a quilômetros, escadarias que levavam a lugar nenhum e portas que se abriam para salas que ela nunca tinha visto antes.

- Onde está a saída principal? - ela murmurou, olhando para os dois corredores idênticos à sua frente. - Esquerda? Direita? Ah, que seja, vou de esquerda! Se der errado, eu culpo o arquiteto.

Ela seguiu pelo corredor da esquerda, mas, em vez de encontrar a saída, deparou-se com uma sala cheia de funcionários ocupados. Um deles, um homem baixo e rechonchudo com um grande livro nas mãos, olhou para ela com surpresa.

- Oh, Sua Alteza! O que a traz aqui? - perguntou ele, fazendo uma reverência desajeitada que quase o fez derrubar o livro.

- Eu, hum, estou apenas... inspecionando o castelo! - Mabel respondeu, tentando soar convincente. - Sim, inspecionando. Tudo em ordem por aqui?

- Sim, Sua Alteza! - o homem respondeu, claramente confuso. - Estamos apenas catalogando os estoques de vinho. Algum problema?

- Vinho? Não, não, nenhum problema! - Mabel disse, rindo nervosamente. - Continuem o bom trabalho! E, hum, não bebam tudo, ok?

Ela saiu da sala rapidamente, sentindo o calor subir ao seu rosto. "Por que eu disse que estava inspecionando o castelo? Que ideia ridícula!", pensou, enquanto se virava para outro corredor.

Desta vez, ela entrou em uma sala onde várias empregadas estavam dobrando lençóis. Ao vê-la, todas pararam e fizeram reverências.

- Oh, Sua Alteza! - uma das empregadas disse, com um sorriso gentil. - Precisa de algo?

- Não, não, estou apenas... explorando! - Mabel respondeu, tentando parecer descontraída. - Vocês sabem onde fica a saída principal?

As empregadas trocaram olhares confusos.

- A saída principal, Sua Alteza? - uma delas perguntou. - Não é na ala leste?

- Ah, sim, claro! A ala leste! - Mabel disse, como se soubesse exatamente do que estavam falando. - Obrigada! Eu só estava testando vocês. Tudo sob controle!

Ela saiu da sala, mas, assim que a porta se fechou, ouviu as empregadas começarem a rir baixinho. "Ótimo, agora elas vão pensar que eu sou uma princesa desorientada", pensou Mabel, envergonhada. "Mas quem precisa de direções quando se tem um título real, né?"

Determinada a encontrar a saída, Mabel continuou a vagar pelos corredores, mas cada vez que achava que estava no caminho certo, acabava em um lugar completamente diferente. Em uma ocasião, ela entrou em uma sala cheia de armaduras e espadas, onde um grupo de cavaleiros estava treinando.

- Sua Alteza! - um dos cavaleiros disse, surpreso. - O que a traz aqui?

- Eu, hum, estou apenas... avaliando o treinamento! - Mabel respondeu, tentando soar autoritária. - Sim, avaliando. Vocês estão fazendo um bom trabalho!

Os cavaleiros trocaram olhares confusos, mas logo se recomporam.

- Obrigado, Sua Alteza! - disseram em uníssono.

Mabel saiu da sala rapidamente, sentindo-se cada vez mais envergonhada. "Por que eu não consigo encontrar a saída? É um castelo, não um labirinto!", pensou, frustrada. "Quem construiu isso? Um louco?"

Finalmente, após várias voltas e reviravoltas, Mabel encontrou-se em uma sala que parecia familiar. Era a cozinha do castelo, onde os chefs estavam ocupados preparando uma refeição.

- Sua Alteza! - um dos chefs disse, surpreso ao vê-la. - O que a traz aqui?

- Eu, hum, estou apenas... conferindo o cardápio! - Mabel respondeu, tentando parecer interessada. - Sim, o cardápio. O que estão preparando?

- Um banquete para o retorno de Vossa Majestade hoje, Sua Alteza - o chef respondeu, orgulhoso. - Temos pernil assado, sopa de legumes, pães frescos e...

- Ótimo, ótimo! - Mabel interrompeu, sem paciência para ouvir a lista completa. - Continuem o bom trabalho! E, hum, guardem um pouco para mim, caso eu não consiga sair daqui.

Ela saiu da cozinha, sentindo-se cada vez mais desesperada. "Ferme deve estar me esperando lá fora, e eu aqui, perdida no meu próprio castelo!", pensou, quase chorando de frustração. "Isso é um pesadelo. Um pesadelo real."

Mabel estava no meio de um corredor que parecia idêntico a todos os outros que ela já tinha passado. Ela olhou para a parede, onde um retrato de um dos seus ancestrais a encarava com uma expressão que parecia dizer: "De novo, Mabel? Sério?"

- Ah, cala a boca, tataratataratataravô Abysscale! - ela resmungou para o retrato, como se ele pudesse ouvir. - Você não sabe como é difícil achar a saída desse labirinto de pedra que voce ordenou construir!

Foi então que ela ouviu passos atrás de si. Passos firmes, lentos e... irritantemente familiares. Ela se virou e lá estava ele: Ferme O'Malley, o nobre de uma família quase extinta e aspirante a cavaleiro que, apesar de ser obrigado a protegê-la, parecia fazer questão de deixar claro que isso era a última coisa que ele queria fazer na vida.

Ele parou a alguns metros dela, com os braços cruzados e um olhar que poderia congelar o sol. Seus olhos estreitos e sua postura rígida transmitiam uma mensagem clara: "Você de novo?"

- Sua Alteza - ele disse, com uma voz tão fria que cortou toda a animação de Mabel - O que você está fazendo aqui?

Mabel engoliu em seco, tentando manter a postura. Ela não podia deixar transparecer que estava perdida. Não diante daquele que ela tinha uma certa quedinha.

- Eu? Ah, nada de mais - ela respondeu, tentando soar casual. - Só estava... explorando. Sim, explorando! Um castelo tão grande assim precisa ser explorado, não acha?

Ferme não mudou a expressão. Ele apenas levantou uma sobrancelha, como se estivesse esperando que ela continuasse a se enrolar sozinha.

- Explorando - ele repetiu, com um tom que deixava claro que ele não acreditava em uma palavra do que ela dizia. - E por acaso a "exploração" incluiu se perder no caminho para a saída principal?

Mabel sentiu o rosto ficar quente e extremamente vermelho. Como ele sabia? Ele tinha algum tipo de radar para detectar humilhações?

- Eu não estou perdida! - ela protestou, cruzando os braços. - Eu só... não achei a saída ainda. É um castelo grande, Ferme! Não é como se eu tivesse um mapa mágico na cabeça.

Ferme suspirou, como se estivesse lidando com uma criança teimosa. Ele olhou para ela com um misto de desprezo e resignação, como se estivesse pensando: "Por que eu tenho que lidar com isso?"

- A saída principal fica a menos de cinco minutos daqui - ele disse, com uma voz que era quase um insulto. - Mas, claro, Sua Alteza deve ter suas razões para transformar um trajeto simples em um conto de cavalaria.

Mabel abriu a boca para responder, mas Ferme já tinha se virado e começado a caminhar, claramente esperando que ela o seguisse. Ele nem sequer olhou para trás para ver se ela estava vindo. Ele simplesmente presumiu que ela não tinha escolha.

- Ei, espere! - Mabel chamou, correndo para alcançá-lo. - Você não pode simplesmente sair andando assim! Eu sou a princesa, lembra?

- Lembro, a princesa que é tão forte que futuramente terá o poder pra mudar o mundo, aquela que os reinos sucumbiram em medo ao saber da sua magia ou coisa assim- ele respondeu, sem parar de caminhar e de forma irônica. - E, como a princesa, você deveria saber que pontualidade é uma virtude. Mas, claro, quem sou eu para questionar os hábitos da realeza?

Mabel ficou com os lábios apertados, tentando não deixar transparecer o quanto aquilo a irritava. Ferme sempre tinha esse jeito de falar que fazia tudo soar como uma crítica velada. E o pior era que ele nunca levantava a voz ou perdia a compostura. Ele era frio.

- Você poderia ser um pouco mais gentil, sabe? - ela disse, tentando soar firme, mas falhando miseravelmente. - Eu não pedi para nascer princesa.

- E eu não pedi para ser designado como seu guarda-costas - ele respondeu, sem olhar para ela. - Mas aqui estamos.

Mabel ficou sem resposta por um momento. Ela sabia que, no fundo, Ferme se importava com ela. Ou, pelo menos, era o que ela gostava de acreditar. Mas ele tinha um jeito de esconder isso tão bem que às vezes ela questionava se ele não a odiava de verdade.

Eles chegaram à saída principal, onde os cavalos já estavam preparados para a missão. Ferme finalmente parou e se virou para ela, com um olhar que era uma mistura de desdém e... algo mais. Algo que Mabel não conseguia decifrar.

- Pronta para a missão, Sua Alteza? - ele perguntou, com um tom que fazia parecer que ele já sabia a resposta.

- Pronta - Mabel respondeu, tentando soar confiante. - E desta vez, prometo não me perder.

Ferme olhou para ela por um longo momento, como se estivesse avaliando cada palavra que ela tinha dito. Então, ele simplesmente virou as costas e começou a preparar o cavalo.

- Típico da Alteza... - ele murmurou, quase imperceptivelmente, mas Mabel ouviu.

Ela ficou parada por um momento, tentando decidir se aquilo era um insulto ou apenas o jeito dele de ser... bem, ele. No final, ela decidiu ignorar.

E assim, eles partiram em direção ao planalto de Umbralis, com Mabel e Ferme partindo juntos a Umbralis.