Os últimos dias têm sido difíceis, mas bastante recompensadores. Eu consegui fazer dez flexões seguidas, sem desmaiar por falta de ar. Considero isso uma vitória.
São quatro da manhã, e eu comecei o dia me exercitando. Dez flexões, onze abdominais e uma corrida até a casa do meu mestre, que são mais ou menos uns onze quilômetros.
Tinha acabado com os exercícios no meu quarto. Não era o lugar mais ideal pra isso, mas quem não tem cão caça com gato, e eu nunca tive ambos. Mas agora eu não choro mais por isso, vou começar a caça sozinho.
Hoje já faz cinco dias desde que eu “morri”. Pelos menos é assim que o grupo de valentões deve achar, e eu prefiro que pensem isso mesmo.
Eu decidi que deveria ficar nas sombras por hora. Até eu ficar forte, não poderei ser visto.
Me lembro do que aquele cara falou naquele dia. Ele atacava os mais fracos por não achar a luta contra os mais fortes algo vantajoso. Ele foi pelo caminho fácil, mas eu não vou ser assim!
Diferente dele, eu estou pronto pra ir pra cima dos mais fortes, não me importo se vai demorar muito pra chegar ao nível deles, ou que não exista certeza da minha vitória.
Dessa vez vou lutar mesmo, ficar chorando e me vitimizando não vai mudar nada, então vou fazer o que pessoas de sucesso fazem, vou me aprimorar.
Eu corri doze quilômetros sem parar até aqui, estou morto de cansaço. Mesmo estando quase vomitando, eu ainda estava cheio de energia, não ligava para o meu cansaço físico.
Estava à frente da propriedade do meu mestre, era uma pequena casa de dois andares e um quintal muito grande. A casa era cercada por uma cerca de ferro, a única entrada ficava conectada a calçada.
Meu mestre era um dos trabalhadores desse lugar, sua função em “Santa Guerra” era a de fazer tudo. Mas ele atendia apenas aos donos de comércio.
Tive que me acostumar com a rotina dele, como ele está me ajudando, então eu tenho que me adequar ao que é mais confortável para ele. E isso significa acordar às quatro da manhã.
Entrando no quintal dele, pude o ver trabalhando no seu sistema de irrigação automático.
O quintal era grande, mas ainda queria entender como ele consegue ter tantas máquinas e uma horta naquele espaço.
Me aproximo, e ele foi rápido em detectar minha presença. Às vezes eu acreditava que meu mestre tinha algum super sentido ou algo assim, ele parecia ver o mundo de um jeito diferente.
— Bom dia mestre, estou pronto para começar o treinamento de hoje! —
Falo com seriedade e convicção, ele olha para mim balançando a cabeça.
— Meu nome é Dionísio, não precisa me chamar de mestre… mas tanto faz, hoje vai ser um momento importante para o seu treino, então presta bastante atenção —
Ele me guiou até uma plataforma de madeira, em cima dela ficamos um a frente do outro.
Parece que hoje eu finalmente vou aprender técnicas reais de luta, nos últimos cinco dias, tenho apenas treinando meu corpo com alguns exercícios de calistenia, mas finalmente vou aprender golpes.
— Ok, você já exercitou o bastante para passar o básico do meu próprio estilo particular de luta.
Na minha época de aluno, não tinha ninguém para me ensinar, então desenvolvi o meu próprio estilo.
Não foi fácil, eu apanhei muito enquanto tentava ficar mais forte, mas depois de um tempo eu entendi onde eu mais estava errado.
Então esse estilo é criado usando todas as minhas falhas como base. Um especialista é alguém que já cometeu todos os erros possíveis, e foi isso que me tornou forte.
Para começar, a postura é a mais importante de tudo. Para poder atacar, defender e lutar no geral, você deve ter uma postura forte.
No meu estilo, as costas devem ficar completamente retas, os joelhos firmes e só um pouco dobrados. A cabeça sempre está alinhada ao seu inimigo, toda a sua atenção deve ser focada nele, assim como todo seu corpo deve apontar para ele.
O braço menos usado será nosso escudo, ele fica com o cotovelo dobrado, a palma da mão aberta, com os dedos bem esticados, e alinhada a sua testa.
Com ele você deve focar em direcionar os golpes inimigos, não os bloqueie, apenas mude sua direção.
Além disso, também o use para agarrões, puxões ou empurrões. Eles serão usados para ter um controle de campo do inimigo, então isso é para movimentar o inimigo.
Já o braço dominante, o que você mais usa, ele vai ser o seu ataque. Ficará mais recuado e retraído na postura, sua mão fechada em um punho, com o dedo médio levemente exaltado.
Esse braço deve ficar próximo do seu corpo. No meu estilo, não existe golpe desperdiçado. Ele sempre deve ser usado da forma mais estratégica possível, sem erros, sem ataques desesperados, apenas um cálculo frio e focado.
O seus alvos vão ser os pontos fracos dos inimigos, primeiro você identificar a postura do inimigo, depois a quebra, e só então você ataca.
Ataque genericamente os pontos principais das posturas, acertando articulações, os pontos de união dos membros com o resto do corpo.
Áreas sensíveis, principalmente na parte da cabeça, o queijo é um excelente alvo para desmaiar rápido o inimigo.
A garganta e barriga também são ótimos lugares para ataques, mas não se esqueça de estudar a postura do inimigo para saber o melhor lugar para acertar.
Os pés sempre firmes no chão, mesmo no nosso estilo focado no movimento rápido dos braços, as pernas e pés são muito importantes. Além de firmar nossa postura, ela também serve para desestabilizar o inimigo.
Nós as usamos para fazer rasteiras surpresa, mas como tudo nesse estilo, as rasteiras devem ser bem planejadas e executadas.
Além disso usamos joelhadas para quebrar a postura, e chutes altos para derrubar de vez.
Os olhos sempre presos ao inimigo, desvia o olhar, e o mesmo que aceitar a derrota. Entendeu tudo?! —
Eu balanço a cabeça e grito sim. Era bastante coisa de uma só vez, parecia que ele só queria me ensinar o máximo sem ter qualquer calma. Pra falar a verdade, parecia que ele queria se livrar logo de mim.
Mas estava pouco me importando com isso, iria evoluir, e o quanto meu mestre está disposto a me ensinar não faz diferença.
Se fosse o meu eu de cinco dias atrás, iria estar reclamando pela falta de interesse que um desconhecido tem em fazer um favor pra mim.
Mas agora eu não sou mais assim, agradeço o tempo que ele está dedicando para me ensinar.
— ótimo, fique em posição, agora você vai aprender na prática. —
Eu fiz como ele falou, a posição era simples, não foi difícil fazer ela. Mas acredito que não estava fazendo direito.
Ele andou em minha volta, estava analisando cada parte da minha postura. Ser observado por ele era estranho, quase a sensação de ser observado por um animal selvagem.
— Não está mal, mas poderia ser bem melhor. Com o tempo você natural pega o jeito, então ficar em posição vai ser fácil.
Agora iremos fazer uma batalha simulada, eu serei seu inimigo. Mas não se preocupe, irei pegar leve. —
Meia hora depois dele ter falado aquilo, eu estava literalmente enterrado de cabeça para baixo em um espaço só de terra no seu jardim.
Ele não pegou nem um pouco leve! Todo o meu corpo estava vermelho de tanto apanhar.
E parece que ele finalmente se interessou pelo treinamento, mas o que tem animado esse maluco, é espancar um menor de idade com dermografismo.
Mas não posso reclamar, cavalo dado não se olha os dentes. Mas ainda assim…
— Você não disse que ia pegar leve?! —
Levantei rapidamente do chão, meu rosto estava coberto por terra, até a minha roupa estava suja, já que eu tinha sido enterrado até a altura do peito.
Ele estava apenas tomando um picolé sentado em uma cadeira de praia. Não pergunte de onde essas coisas saíram, só fui enterrado por doze segundos, como ele teve tempo pra isso?!
Sem se levantar ou olhar para mim, ele apenas riu da situação, como se fosse algo muito engraçado.
— E por que eu faria isso? Os seus inimigos não vão pegar leve com você, então porquê eu pegaria?
Não pense que estou apenas sendo sádico com você. A dor é uma excelente ferramenta de aprendizado, e eu estou usando ela no seu treino.
Absorva essa dor, a use para ficar mais forte, então evolua. Foi assim que eu fiz, se não quiser se acostumar com a dor, então é melhor nem ter vida. —
Do nada esse descabelado decidiu virar filósofo. Mas errado não está, preciso me acostumar com isso, já sofri muita dor, mas nunca aprendi nada com ela.
Mas agora eu vou, já está na hora de me acostumar com isso.
Levantei pronto para outra, sentia muita dor, mas a determinação mantinha meu corpo dormente para essa sensação.
Já tinha entrado em posição, estava 100% pronto para continuar esse treino. Tenho um claro objetivo para seguir, e dessa vez, vou até o final.
— vamos lá mestre, eu estou pronto para continuar. Não pense que pode se livrar tão fácil de mim. —
Digo isso com um grande sorriso no rosto. E ele também pareceu sorrir, mesmo que eu saiba que ele nunca iria admitir.
— Cala a boca moleque, já está se achando demais. —
Ele levanta da cadeira e vem pra cima pronto para lutar. O treinamento era difícil, mas não queria mesmo desistir.