Dias das escolhas

O pátio de pedra do quartel central estava cheio de jovens. O frio da manhã não impedia o calor que emanava dos corpos tensos, corações acelerados e olhos atentos. As fileiras estavam formadas, e os sons abafados de passos, cochichos e armas sendo ajustadas preenchiam o ar denso.

Leo, Aaron, Sarah, Erwin e Daren estavam juntos, observando o movimento ao redor.

— Ei, cadê aquela tal pedra do julgamento que o pai falou? — cochichou Erwin, olhando ao redor com curiosidade. — A gente ia usar ela pra medir o nível, né?

Aaron olhou para os lados e chamou um recruta mais velho que estava próximo.

— Ei... você sabe onde está a pedra do julgamento? Aquela coisa que mede o poder?

O rapaz soltou uma risada seca, como se tivessem contado uma piada velha.

— Que pedra? Isso aí é coisa do passado. Gastava uma fortuna pra cada uma daquelas. Só os generais têm acesso a uma hoje, se tiver. Aqui... agora é diferente. Cada grupo vai enfrentar um oficial. Eles medem a força, habilidade, controle... tudo na prática.

— Então vamos lutar mesmo? — perguntou Daren, franzindo o cenho.

— É, e eles ficam de olho em tudo. Os comandantes das legiões observam cada detalhe. Às vezes a luta acontece no primeiro dia, às vezes só no último. Teste dura uma semana inteira. Não se animem muito — o recruta respondeu, antes de ser silenciado por um grito firme.

Silêncio! — ecoou a voz grave no pátio, fazendo todos se virarem.

Era o comandante do quartel. Um homem alto, de armadura pesada, com cicatrizes pelo rosto e olhar rígido. Caminhou até o centro da plataforma de pedra, com outros soldados de patente ao seu redor.

— Sejam bem-vindos ao Pátio da Decisão. A partir de hoje, vocês serão observados. A escolha das legiões não será feita por sorte ou opinião. Será feita por mérito. — Ele fez uma pausa, encarando a multidão. — Esqueçam as histórias sobre pedras mágicas ou testes antigos. Agora, o combate é real.

Os murmúrios se calaram. Leo manteve o olhar fixo no homem, sentindo uma pressão surgir no peito. Sarah cruzou os braços, séria. Aaron apertava o punho da espada.

— Apresentarei agora os comandantes das legiões trinta e três à quarenta — continuou o comandante. — Eles estarão observando cada um de vocês durante os testes. Sim, pode demorar dias até sua luta. Não adianta se precipitar. A melhor forma de vencer aqui... é se manter vivo e atento. Vão com calma.

Sete figuras caminharam até o alto da muralha que cercava o pátio. Cada uma com uma postura distinta. Alguns tinham armaduras pesadas, outros trajes leves de batalha. Um deles tinha uma lança longa nas costas; outro, um machado gigante. Mas o que mais chamou atenção foi uma mulher entre eles — expressão fria, olhos quase cinzentos — que encarou a multidão com desdém.

Leo engoliu seco. Sarah se ajeitou. Erwin, ao lado, murmurou:

— Agora começou de verdade, né?

Leo respondeu com um leve aceno, os olhos fixos na muralha. A guerra havia chegado... e a escolha também.

O sol cruzou o céu lentamente, arrastando consigo as horas de tensão. O primeiro dia da seleção havia sido longo… exaustivo. O grupo de Leo, Aaron, Sarah, Erwin e Daren permaneceu o tempo todo no pátio, atentos, esperando que seus nomes fossem chamados — mas não foram.

Os combates começaram logo após o discurso do comandante, e seguiram um após o outro como peças em uma linha de sacrifício.

110 combates foram realizados naquele dia.A maioria foi derrotada em menos de trÊs minutos. Alguns tentaram impressionar, outros mal conseguiam segurar suas armas com firmeza. Os oficiais pareciam testar mais a coragem do que a técnica.

E no fim… apenas dois venceram.

— O primeiro… — cochichou Erwin, enquanto observava os quadros de anotação — … só venceu porque o oficial escorregou. Sorte pura. Ele tava quase no chão.

Aaron franziu o cenho. — E mesmo assim quase foi desclassificado. Os comandantes ficaram em dúvida.

Mas foi o segundo vencedor que silenciou o pátio.

Um garoto de expressão vazia, olhos verdes intensos e cabelos castanhos curtos. Ele subiu na arena sem dizer uma palavra, sem hesitar. Quando o sinal soou, ele se moveu.

Rápido. Preciso. Quase inumano.

Avançou com leveza, desviando de dois golpes do oficial sem sequer recuar. E então, num único movimento limpo, acertou um golpe direto no torso do oponente, sem força bruta — só técnica. O oficial caiu ajoelhado, surpreso.

O pátio ficou em silêncio absoluto. Nem os comandantes na muralha esconderam o espanto.

Sarah observou aquilo com os olhos arregalados.

— Quem… quem é ele?

Leo demorou para responder. O golpe tinha sido rápido demais, mas havia algo… familiar.

— Não faço ideia… — murmurou ele, inquieto.

Aaron, ao lado, cruzou os braços devagar.

— Vocês viram aquilo? O movimento dele... ele sabia o que o oficial ia fazer antes mesmo de acontecer.

Sarah assentiu, engolindo seco.

— Parecia... a nossa visão.

Leo manteve os olhos fixos na arena vazia, agora manchada de terra e suor.

— Eu também senti isso…

Por um momento, os três ficaram em silêncio. Aquele garoto desconhecido, de olhos verdes e passos leves, lutava como alguém que via além do tempo. Como eles.

O comandante desceu à arena pouco depois. Sua voz cortou o silêncio como uma lâmina:

Por hoje, basta. Todos estão dispensados. Amanhã, novas lutas começarão.

Os grupos começaram a se dispersar, e o céu já se tingia de laranja.

Leo e os outros seguiram para os dormitórios improvisados. O cansaço pesava nos ombros, mas o que mais pesava era a incerteza.Quem seria o próximo? E quem era aquele garoto?E, mais inquietante que tudo… como ele possuía a mesma técnica que só eles conheciam?