EPISÓDIO 4 – A Primeira Noite
Narrado por Isabela Monteiro
O carro preto deslizou pelas ruas como um fantasma elegante, silencioso e caro demais. Ao meu lado, Leonardo Vasques mexia no relógio de ouro com um tédio calculado. Nem parecia que tinha acabado de se casar.
Comigo.
— Foi tudo muito... rápido — arrisquei dizer, tentando quebrar o gelo.
Ele não me olhou.
— Foi um contrato, Isabela. Não uma história de amor.
A frase doeu. Não porque eu esperava flores ou declarações, mas pela frieza com que ele a disse. Como se eu fosse um móvel novo entregue na casa dele.
— E agora? — perguntei, olhando a cidade sumindo no retrovisor. — A gente… vai morar junto?
Dessa vez ele olhou. Devagar. Com aquele olhar que misturava desprezo, curiosidade e um traço de diversão cruel.
— Você é minha esposa legal, Isabela. E minha imagem pública depende disso. Então sim… vai morar comigo. Mas não se iluda. Entre nós dois só existe papel. E limite.
Sorri de canto, mesmo com o coração apertado.
— Ótimo. Também não gosto de homens mandões e gelados.
O queixo dele subiu, surpreso com minha ousadia. Pela primeira vez, notei: ele gostava de ser desafiado.
Chegamos à mansão.
Era maior do que tudo que eu já tinha visto. Um castelo moderno, com colunas de mármore, fontes que pareciam saídas de um filme, e um hall tão grande que minha casa caberia ali dentro... três vezes.
Ele andava na frente, e eu tentava acompanhar de salto alto e vestido pesado.
— O quarto de hóspedes está pronto para você — disse ele, sem olhar pra trás. — Teremos eventos juntos, aparições, entrevistas. Você deve seguir o protocolo. Sem escândalos. Sem perguntas.
— E se eu não seguir?
Ele parou. Virou-se.
Apenas me encarou por um segundo longo.
E sorriu.
— Vai descobrir o preço.
À noite, me vi sozinha no quarto mais luxuoso que já entrei. Tudo era branco, dourado, silencioso. Mas, por dentro, eu estava um caos.
Eu me casei. Com um estranho. Um homem rico, lindo e assustador.
E amanhã, minha vida de mentira começa.
Me sentei na cama enorme e macia. E então, escutei uma batida na porta.
Pensei que fosse uma empregada. Mas não. Era ele.
Leonardo.
De camisa aberta no pescoço, sem gravata, mais informal — e perigosamente mais bonito. Com um copo de uísque na mão e um olhar indecifrável.
— Você está confortável? — perguntou, entrando sem pedir.
Assenti, desconfiada.
— Acha que pode fingir ser minha esposa por tempo suficiente sem me envergonhar?
Levantei o queixo.
— Acha que pode fingir ser um marido humano sem me congelar?
Ele riu. Um riso seco, mas real.
— Você é diferente da outra.
— Qual outra?
— A que eu escolhi. A mulher perfeita. Silenciosa. Submissa.
— Sinto muito decepcionar.
Ele se aproximou. Devagar. Como se me estudasse.
— Não está me decepcionando, Isabela. Está me confundindo.
O silêncio entre nós ficou denso. Ele parou diante de mim, ergueu a mão... e encostou os dedos na minha barriga.
Um toque leve. Quase simbólico.
— Está tudo bem? — perguntei, quase sem voz.
— Só estou lembrando a mim mesmo... que agora você é minha.
Minhas bochechas queimaram. Mas eu não recuei.
Ele me olhou nos olhos. Firmemente.
— Boa noite, esposa de contrato.
— Boa noite, marido de gelo.
E então, saiu.
Deixando no ar aquele cheiro dele — amadeirado, forte e viciante.
E a certeza de que aquela noite era só o começo do nosso jogo perigoso.