Capítulo 6 – O Contrato
Era estranho estar sentada diante de um advogado usando terno de grife, com uma caneta tinindo de cara e um contrato de casamento na minha frente… E eu, com as mãos trêmulas, uma blusa simples e o coração em pedaços.
Minha mãe ainda estava no hospital, e cada dia que passava o tratamento ficava mais caro. Eu já tinha vendido tudo que podia, até minha dignidade começava a ir junto.
— Está tudo aqui, senhorita Monteiro. O casamento será apenas formal. Você terá sua própria ala na mansão. Não há exigência de intimidade, exceto uma cláusula referente a… fertilidade, que podemos conversar depois — disse o advogado, sem me encarar diretamente.
Eu engoli seco.
— E se eu quiser desistir?
Ele me encarou pela primeira vez.
— Você não poderá. Uma vez assinado, é irrevogável por doze meses. Romper antes do prazo resultará em multa — ele apontou para um número exorbitante.
Pensei na minha mãe. Pensei na vida que eu tinha, ou melhor, que não tinha.
E foi aí que ele entrou na sala.
Leonardo Vasques.
O mesmo homem do carro preto. Os mesmos olhos frios de tantos anos atrás, agora ainda mais intensos. Por um instante, tive certeza: ele era o menino triste e solitário que eu vi aos 10 anos, naquele carro de luxo. Mas agora, era um homem feito… E completamente inalcançável.
Ele me olhou como se fosse ver uma faxineira sentada na sua cadeira de couro.
— É você? — ele perguntou, quase entediado.
— Sim — respondi, tentando manter a voz firme.
— Não era pra ser você. Mas... já que chegou até aqui, vamos terminar isso logo.
O advogado pigarreou.
— Senhor Vasques, a senhorita Monteiro leu o contrato e está pronta para assinar.
Leonardo nem sequer me olhou.
— Ótimo. Quanto antes isso acabar, melhor. Não tenho tempo pra joguinhos.
Eu quis dizer que não estava brincando, que isso não era um jogo pra mim. Mas quem escutaria?
Assinei.
Naquele segundo, eu vendi a minha liberdade.
O casamento aconteceu dois dias depois. Sem convidados. Sem música. Sem beijo.
Somente duas testemunhas, o juiz e um fotógrafo para comprovar legalmente.
No final da cerimônia, Leonardo se virou para mim, ainda sem sorrir.
— Bem-vinda ao meu mundo. Regras: não mexa nas minhas coisas, não apareça na empresa, e nunca — ele enfatizou — nunca pense que esse casamento é de verdade.
Respirei fundo.
— Tudo bem. Só preciso da ajuda pra minha mãe. O resto... pode fingir que eu nem existo.
Ele arqueou uma sobrancelha, pela primeira vez, surpreso com a minha frieza.
— Interessante. Talvez isso funcione, afinal.
Mas havia algo nos olhos dele...
Um incômodo, talvez. Uma memória. Uma dúvida.
E naquele dia, ao chegar na mansão, vi um porta-retrato virado para baixo no escritório dele.
Curiosa, espiei.
Era uma foto antiga.
Uma criança num carro preto, com os olhos tristes, encarando o nada.
O mesmo olhar que me perseguiu desde os meus 10 anos.
Eu não estava louca.
Eu o conhecia desde antes.
E ele... talvez se lembrasse de mim também.