Episódio 7

Capítulo 7 – A Primeira Noite na Mansão Vasques

A mansão dos Vasques era tão grande que eu podia me perder nela… e honestamente, queria me perder.

Leonardo mal falou comigo depois do casamento. Deixou claro que eu teria meu próprio quarto, do outro lado da casa, e que ele não tolerava atrasos, perguntas ou sentimentalismos.

Eu era uma intrusa. Uma funcionária com aliança.

A governanta, Dona Celina, me guiou pela mansão com um sorriso forçado.

— O senhor Leonardo prefere silêncio absoluto nas áreas comuns. E se ele estiver no escritório, não se aproxime. Ah, e nunca entre no quarto dele sem permissão.

— Ele tem medo de que eu roube a alma dele? — murmurei, tentando aliviar o clima.

Ela me olhou de lado, quase sorrindo.

— Talvez ele já tenha perdido faz tempo, querida.

No meu quarto — que mais parecia uma suíte de hotel cinco estrelas — sentei na beira da cama enorme e encarei o espelho. A aliança brilhava no meu dedo, fria e pesada como uma corrente.

Isso não é amor. Isso é sobrevivência, pensei.

Na manhã seguinte, desci para o café da manhã. A mesa estava posta com mais talheres do que eu sabia usar. Leonardo já estava lá, lendo o jornal, impecável como sempre.

— Bom dia — arrisquei.

Ele respondeu com um leve aceno de cabeça.

— Você está atrasada. O café é servido às sete. Agora são sete e treze.

— Uau. E eu achando que o casamento traria alguma flexibilidade no horário — murmurei, servindo-me de café.

Ele baixou o jornal e me encarou.

— Isso não é um casamento, Isabela. É um contrato. E eu exijo pontualidade.

— E eu exijo café forte. Viu? Estamos empatados — rebati, encarando-o.

Por um segundo, ele pareceu… divertido? Não. Impossível.

Leonardo Vasques não conhecia o conceito de humor.

— Você é mais ousada do que eu esperava.

— E você é mais insuportável do que eu imaginava.

O silêncio pairou no ar, denso. Até que ele se levantou, caminhou até mim e disse em voz baixa:

— Pode brincar agora, mas não se esqueça: nesse jogo, quem quebra as regras... paga caro.

Senti um arrepio. Não de medo, mas de algo mais confuso, mais perigoso.

O cheiro dele, o tom da voz, o olhar intenso… tudo nele era uma ameaça e uma promessa ao mesmo tempo.

Naquela tarde, fiquei vagando pelos corredores até encontrar uma porta entreaberta. Curiosa, entrei. Era o escritório dele.

Fotos, documentos, livros... e o mesmo porta-retrato virado para baixo.

Olhei ao redor. Sozinha. Peguei a moldura.

Era ele. Criança. Com o mesmo olhar de anos atrás.

O mesmo olhar que me atravessou quando eu tinha 10 anos, na calçada da farmácia.

Ele também me viu. Eu tinha certeza. Mas por que ele não reconhecia?

— Você está sempre onde não deveria estar.

Virei assustada. Leonardo estava parado na porta, braços cruzados, expressão gelada.

— Eu... desculpa. A porta estava aberta.

— Isso não é desculpa. Aprenda a respeitar limites, Isabela.

— E você? Quando vai aprender a olhar além do seu próprio mundo?

Ele deu um passo à frente, ficando perigosamente perto.

— Meu mundo é feito de controle. E você entrou nele para cumprir um papel. Nada mais.

— Eu entrei para salvar minha mãe. Você comprou uma esposa, não uma boneca.

Ele me encarou. Por um segundo, algo brilhou nos olhos dele. Dor? Raiva? Reconhecimento?

— Cuidado, Isabela. Esse mundo quebra gente como você.

— Então me subestime. Mas vou sair daqui mais forte, com ou sem você.

Ele se aproximou mais ainda. Seu rosto a centímetros do meu.

— Você não tem ideia no que se meteu.

— E você não tem ideia de quem eu sou.

Nos encaramos por longos segundos.

O ar entre nós estava elétrico. Eu podia sentir o calor dele, o perfume amadeirado, a tensão que tremia entre nossos corpos.

Mas então ele recuou.

— Saia do meu escritório.

Saí. Mas levei comigo uma certeza: ele se lembrava de mim. Talvez não com palavras, mas com a alma.

E isso era só o começo.