Parte 3 – O Fluxo Dentro do Vazio
A água escorria lentamente pelas rachaduras do subsolo. A luz da lamparina a óleo mal
alcançava as paredes, criando sombras tremeluzentes que pareciam respirar com Shin.
Ele estava ali há horas.
Seu corpo, semi-imerso em uma poça rasa de água escura, tremia de frio. A dor nos
meridianos era como agulhas ardentes. Mas ele não se movia. Apenas respirava. Lentamente.
O sistema monitorava tudo:
『Pressão espiritual: 78%』
『Atividade neural: 112%』
『Fadiga: crítica』
『Estado corporal: instável』
『Estado mental: estável』
E ainda assim… algo o mantinha.
O silêncio do Vazio preenchia seu interior. Não como ausência, mas como base. Como
espaço entre os fluxos. E sobre esse espaço, a Maré fluía.
Era como treinar num rio dentro de um buraco negro.
A água tentava envolver. O Vazio absorvia. A fricção entre os dois criava… padrões.
Formas. Círculos. Ondas.
Ele não estava mais apenas reproduzindo movimentos. Estava entendendo. Sentindo.
Um pensamento passou pela sua mente:
A água toca o que o vazio não alcança. O vazio sustenta o que a água não consegue
proteger.
Era paradoxal. Mas verdadeiro.
E no momento em que aceitou isso — em que parou de tentar controlar ambas as forças
e simplesmente deixou-as existir — algo rompeu dentro dele.
『Resistência Mental – Nível 1 desbloqueado』
『O cultivador desenvolveu estabilidade emocional e psíquica para suportar pressões
espirituais contínuas』
『Novo atributo: Tolerância a Instabilidade Espiritual +7%』
『Resistência a perturbações ilusórias +12%』
『Fadiga mental reduzida em sessões de cultivo』
O mundo à sua volta ficou em silêncio absoluto por alguns segundos.
Depois… um sussurro:
『Caminho do Oceano Sombrio — reconhecido. Nome provisório: “Raiz Entre
Correntes”.』
Shin sorriu, por dentro.
A dor não sumira. Mas agora tinha forma. Peso. Direção.Pela primeira vez desde a queda do culto, ele não sentia apenas raiva ou culpa. Sentia foco.
Ao abrir os olhos, viu a água sobre sua pele brilhar levemente.
E nas sombras distantes do orfanato, sobre os telhados quebrados, uma silhueta
encapuzada sorriu.
Saren Vehl, olhos ocultos, observava.
Em sua mão, um novo símbolo: a mesma meia-lua, agora com quatro pontos.
Mas ainda não era a hora.
Ele desapareceu.
E Shin, exausto, adormeceu entre poças frias e o calor do próprio avanço.