Capítulo 2 — Fogo
A vila Koro estava em ruínas, coberta por escombros e cadáveres espalhados pelo chão. Goblins e humanos jaziam inertes, suas vidas ceifadas pela violência.
Carlos, com a respiração pesada, cambaleava, ensanguentado e exausto.
— Foi por pouco... — ele murmurou, seus olhos, antes brilhando em um tom branco intenso, agora apagados. Seu corpo cedeu ao cansaço e ele caiu, incapaz de suportar mais.
Uma voz lenta e impiedosa interrompe o silêncio, como um eco na devastação.
— Que interessante, não esperava encontrar você aqui.
A raiva de Carlos se acendeu imediatamente. Seus olhos, antes apagados, brilharam com fúria.
— Finalmente chegou... Karina. — Ele estava furioso, mas a exaustão o deixava fraco. Mesmo assim, ele se ergueu, sem se entregar.
Karina soltou uma risada fria, sem pressa, observando-o com um sorriso debochado.
— Hahaha... Que adorável, ainda se parece com a Agatha. — Ela se aproximou, com sua presença ameaçadora. Karina era uma mulher de cabelos negros como ébano, olhos tão escuros quanto a noite e pele pálida, quase espectral. Seu vestido negro parecia engolir a luz, e o colar branco que usava brilhava como um contraste frio e mortal.
— Não se atreva a falar o nome dela!
Karina o olhou, desinteressada, e seu sorriso se alargou, como se soubesse exatamente o que estava fazendo.
— E o que você vai fazer? — Sua voz era baixa e cheia de escárnio.
Carlos, tremendo de raiva, ergueu sua espada, decidido a lutar até o fim. Karina soltou uma gargalhada, fria e calculista.
— Carlos... Carlos, seja honesto consigo mesmo. Não existe um único cenário onde você venceria.
Carlos riu, mas não era uma risada qualquer; seu sorriso se tornou distorcido, quase maníaco, enquanto apontava sua lâmina para frente.
— Eu já venci. Tive uma verdadeira família. Algo que você jamais conhecerá.
A fúria tomou conta de Karina. Ela estalou os dedos e, num movimento brusco, desferiu um ataque mágico em direção a um prédio próximo. Em um único golpe, o edifício desapareceu, como se nunca tivesse existido.
— Eu vou matar seu filho. Vou garantir que ele sofra até a última gota de esperança. Seus amigos? Vou matá-los um a um, lentamente, enquanto ele assiste impotente. — Karina sorriu, o rosto maquiado com um prazer cruel.
Carlos, mesmo ferido, não hesitou.
— A Agatha não vai deixar, eu também não. E a Destroyer está com eles.
Karina sorriu com desdém, como se a fala dele fosse a coisa mais patética que já ouvira.
— Você é realmente um idiota, dar uma arma mística de fogo para um menino de onze anos... Hahaha! Mas, sinceramente, como você pensa que vai me deter?
Sem mais palavras, Carlos avançou com a espada, os músculos quase cedendo pela dor, mas a determinação ainda queimava em seus olhos. Karina não se moveu. Apenas fechou os olhos, seu sorriso se alargando ainda mais. A chuva caía incessante, misturando-se com os destroços das casas destruídas e os corpos que cobriam o chão — humanos e monstros, sem vida.
— Você nunca muda, Carlos...
O som do mundo desapareceu. Por um instante, tudo ficou em silêncio, até mesmo a chuva parecia ter parado de cair. Apenas as gotas de água ainda ressoavam, quebrando a quietude ao tocar o chão.
Carlos não resistiu. Ele caiu, o corpo dilacerado, restando apenas suas pernas, a parte superior completamente apagada pela fúria de Karina. A vitória estava clara, mas não havia satisfação em seus olhos.
— Arky... Eu vou torturar você por anos. — A ameaça saía das suas palavras como veneno, ainda assim, seu sorriso não vacilava.
Com um movimento de desdém, Karina se virou para sair. Alguns monstros apareceram ao seu lado, como sombras obedientes.
— Senhorita Karina, estou a seu dispor. — Disse um vampiro peculiar, com cabelo preto e olhos vermelhos, sua pele pálida refletindo a luz da chuva. Suas orelhas pontiagudas e o semblante frio completavam sua aparência ameaçadora.
— Procure por Arky e traga-o até mim. Eles fugiram há alguns dias, e devem estar perto do reino agora. Não os mate.
— Sim, senhorita. Voltarei em breve.
O vampiro desapareceu, e Karina, com uma expressão de raiva mal disfarçada, se teletransportou para um destino desconhecido.
Uma semana antes
Algumas horas após a fuga da vila Koro, o silêncio da floresta era quebrado apenas pelos gritos abafados de Carol. Ela se contorcia, a dor era insuportável, e Arky e Sawo estavam completamente perdidos.
— Carol, fala com a gente! — Sawo gritava, desesperado, mas a verdade é que eles eram apenas crianças, sem saber o que fazer diante de algo tão horrível.
Carol chorava, o curativo que haviam feito estava completamente desfeito, e o sangue ainda fluía sem parar.
— Arky, o que faremos? — Sawo mal conseguia respirar de pânico.
Arky estava paralisado, sua mente em colapso. Estavam sozinhos na floresta, com uma amiga gravemente ferida, e não tinham nada que pudesse parar o sangramento. Eles não sabiam sequer como fazer um curativo decente com o que tinham à mão.
— Fo... — Carol tentou falar, mas a dor a impediu.
— Carol? — Ambos chamaram, seus olhos cheios de lágrimas.
— Fogo... por favor... — Ela murmurou, a perda de sangue a fazendo cair rapidamente na inconsciência.
— Fogo? O que o fogo poderia fazer? — Sawo não entendia, a ideia parecia insana.
Mas Arky, de repente, compreendeu. O medo tomou conta de seu corpo, e o pavor o paralisou.
— Isso é suicídio, e a dor será insuportável... Você tem certeza disso? — Arky perguntou entre lágrimas, sua voz trêmula de pânico.
— Rápido... por favor... é a única chance... — Carol estava quase sem fôlego, sua voz uma sombra distante.
— Sawo, procure algo para fazer fogo! Foi você quem fez ela perder o braço! — Arky não estava mais raciocinando. O pânico o dominava, mas Sawo não hesitou.
Sawo começou a vasculhar o carrinho, desesperado. Ele encontrou comida e água, mas também uma espada estranha. Quando tocou nela, uma queimadura instantânea o fez soltar um grito.
— Aí! — Ele gritou, olhando para a queimadura.
— O que foi? — Arky perguntou, sem conseguir compreender.
— Essa espada está muito quente!
Arky olhou para a espada, os olhos arregalados de surpresa. Era a Destroyer, a espada mística do "fogo".
— Por que o lixo do meu pai deixaria isso aqui? — Arky pensou, o pânico se tornando mais intenso.
Carol estava cada vez mais pálida, seus lábios secos, o rosto inchado pela dor. Ela se contorcia no chão, as lágrimas escorrendo, implorando por ajuda.
— Eu imploro... façam isso parar... — Sua voz estava fraca, quase inaudível. Ela estava sem forças, e a floresta escura ao seu redor parecia engolir tudo.
Arky, tremendo, pegou a espada. Ele olhou para Carol, mas o terror o impediu de agir.
— Eu não consigo... Sawo, faça você! Afinal, foi você o culpado! — Arky estava fora de si, em pânico. Sawo o entendeu, a dor de ver Carol sofrer destruiu qualquer resistência que ele ainda tinha.
— O que eu faço? — Sawo perguntou, sua voz fria, tentando se concentrar.
Arky o olhou, os olhos vermelhos de tanto chorar.
— Pressione a espada no machucado. Se você hesitar, ela vai sofrer mais. Pressione até que as peles se fundam. Eu vou preparar o curativo enquanto você queima. Carol, estique o braço e tente não gritar.
Sawo não entendeu de imediato, mas então a ideia de Arky e Carol se fez clara em sua mente.
— Você enlouqueceu? — Sawo perguntou, a incredulidade tomando conta de seu tom.
— Sawo, não temos tempo! — Arky gritou, com um desespero que cortava a garganta.
O desespero tomou conta de todos eles. O som de Carol gritando era agudo, penetrante, como se cada grito rasgasse a alma de Sawo e Arky. Eles estavam em estado de pânico absoluto.
— Sawo! — Carol gritou, sua voz quebrando.
No momento seguinte, Sawo, em um reflexo quase involuntário, pressionou a espada contra o braço dilacerado de Carol. O grito de Carol foi tão agudo e desesperado que parecia ecoar pela floresta inteira. A dor que Sawo sentiu ao ouvir aquele grito foi insuportável.
Arky, sem alma, começou a preparar o curativo, os movimentos automáticos, mas seus olhos estavam vazios. O som dos gritos de Carol ainda ecoava em seus ouvidos.
— Não, não, não, não... — Eles choravam, mas não havia mais nada a fazer. A dor que aquele momento causou seria algo que nunca esqueceriam.
Carol finalmente desmaiou, e a ferida em seu braço, agora cauterizada, parou de sangrar por completo. O silêncio caiu, pesado e tenso. Sawo, completamente atordoado, caiu para trás, sem forças para falar, mover-se ou sequer reagir. Seus olhos estavam vazios, perdidos na dor que não conseguia mais processar.
— Agora eu preciso enfaixar. — Arky, ainda em pânico, pegou uma tesoura improvisada e cortou uma parte de sua própria blusa. Com mãos trêmulas, ele usou o mel que havia encontrado no carrinho e o aplicou cuidadosamente sobre a ferida, tentando ao máximo manter a calma. Ele cobriu a ferida com o pano da camisa, mas Carol não pareceu sentir, seu corpo ainda inerte.
— Uma fogueira, precisamos de uma fogueira, o calor vai relaxar os músculos... e água gelada. — As palavras de Arky saíam arrastadas, a exaustão e o terror o consumindo. Ele estava tentando raciocinar, mas a pressão mental o estava engolindo.
Sawo continuava imóvel. Seus olhos estavam fixos em Carol, mas não se mexiam. Não piscavam. Não falavam. Apenas lágrimas escorriam pelo seu rosto, sem som, como se até seu choro tivesse se perdido.
Arky não conseguia mais chorar. O grito de Carol ainda reverberava em sua mente, e o que restava de seu ser estava à beira do colapso. Era como se ele tivesse entrado em um transe mental, incapaz de processar o que acabara de acontecer.
— Eu não posso parar. Se eu enlouquecer agora... ela vai morrer. Não é o suficiente, ainda não é o suficiente. Água, fogueira, comida... água, fogueira... comida... fogo... adultos... médicos... — A mente de Arky girava freneticamente, suas ideias se atropelando. As palavras se misturavam em um turbilhão de pânico.
Seu corpo estava tremendo incontrolavelmente. Com um esforço hercúleo, ele conseguiu fazer uma fogueira. Seus movimentos eram descoordenados e fracos, mas ele não podia desistir. Colocou o carrinho ao lado da fogueira, tentando criar uma sensação de calor ao redor de Carol, que ainda estava inconsciente.
— Eu tenho que fazer uma cama improvisada... Se ela se mover no carrinho, a ferida pode abrir de novo. — Arky murmurou para si mesmo, sua mente se esforçando para manter a lógica em meio ao caos. Mas a dor da pressão o fez hesitar. Ele mal conseguia se mexer. Sua energia se esgotara completamente, e a leve sensação de alívio que ele experimentara com a cauterização da ferida acabou por derrubá-lo. Seu corpo estava ao limite.
— Não posso parar... não agora... — Ele se forçou a levantar, mas as forças o abandonaram, e a visão diante de seus olhos começou a desvanecer.
No momento seguinte, Arky desmaiou, caindo para o lado, sem forças para continuar. O silêncio na floresta foi interrompido apenas pelos estalos da fogueira e o som distante do vento.
Um tempo depois
Provavelmente haviam se passado várias horas, ou até mesmo um dia inteiro. Arky acorda debaixo de uma árvore, a sensação de cansaço ainda o envolvia. Ao olhar para o lado, vê Carol deitada em uma cama improvisada de folhas e panos, seus olhos vagamente fixos no horizonte. Próxima a ele, alguns pratos de comida e um pequeno tronco com água, que parecia ter sido utilizado como um copo improvisado. A comida estava guardada em um pote de madeira, provavelmente encontrado nas margens do rio.
— O que é isso? Um tronco com água dentro? — Arky se perguntou, reconhecendo a tentativa de usar a natureza ao redor para sobreviver. Ele analisou o cenário ao redor. A fogueira estava intacta. O fogo ainda arde. Mas algo estava diferente. Era de dia agora. A espada Destroyer não estava por perto.
Ele então observou Carol, notando com um alívio cauteloso que ela estava respirando, ainda viva. No entanto, Sawo não estava lá.
— A fogueira está intacta... será que alguém repôs o fogo? — Arky pensou em voz alta, se perguntando quanto tempo havia se passado desde o caos. Seu olhar se fixou no vazio ao redor, aguardando por algo ou alguém.
Foi então que Sawo apareceu. Mas algo estava errado. Seus olhos estavam vazios, sem vida, como se a alma tivesse se distanciado dele. Seu corpo parecia arrastado, e ele carregava algo que chamou a atenção de Arky: a espada Destroyer, com vestígios de sangue em sua lâmina. A buxexa de Sawo também estava suja de sangue.
— Sawo? — Arky disse, surpreso, mas sentindo uma mistura de alívio e tristeza ao vê-lo.
Sawo, como se ouvindo o chamado de Arky, recuperou o brilho nos olhos. Ele caiu de joelhos e, com um soluço, o abraçou, seus olhos se enchendo de lágrimas.
— Arky, você acordou! Eu fiquei com tanto medo... Um dia inteiro se passou, e vocês não acordavam... Eu tentei continuar o que você começou, mas... não sabia o que fazer... Desculpa. — Sawo parecia perdido, sua voz trêmula, a mistura de alívio e medo em seus olhos.
— Está tudo bem... Mas que sangue é esse? — Arky perguntou, tentando entender o que tinha acontecido.
Sawo suspirou profundamente, como se tentando juntar os pedaços de sua coragem.
— Não é meu. Eu tentei caçar coelhos para fazer um almoço decente... os alimentos que tínhamos estavam estragados. O carrinho já estava lá há semanas. Também achei uma carta, mas... não sei ler. — Ele disse, envergonhado.
— Entendo... E o coelho? — Arky perguntou, seu olhar focado na espada.
Sawo desviou o olhar, assustado.
— Eu tentei caçar, mas... essa espada... ela queimou o coelho por completo. Quando eu o perfurei, ele carbonizou instantaneamente. — A expressão de Sawo era uma mistura de pavor e incompreensão.
— Ninguém nunca te falou sobre itens místicos, né? — Arky perguntou, com curiosidade.
— Não... você conhece? — Sawo parecia surpreso, esperando uma explicação.
— Sim, essa espada era do meu pai. Não sei por que ele deixou isso com a gente, mas ela tem uma lâmina que alcança 70 graus Celsius. Quando ela perfura algo, a temperatura da lâmina chega a 1000 graus Celsius. Ela é encantada, então não derrete, mas o corpo vira pó. — Arky explicou, seu tom revelando o quanto ele conhecia o poder destrutivo do artefato.
— Então... por que a Carol não foi carbonizada? — Sawo perguntou, confuso.
— Você só tocou a lâmina nela, não a perfurou. A lâmina estava a cerca de 70 graus, então provavelmente a ferida foi apenas cauterizada. Não causou mais danos. Você foi muito corajoso, Sawo. Eu não sei o que faria sem você lá. — Arky sorriu, uma leve gratidão se misturando com o alívio. Ele então se levantou, tentando mudar de assunto. — Como você pensou em fazer essa cama de folhas e pano?
Sawo olhou para o chão, como se hesitasse por um momento, antes de responder.
— Eu não queria deixar a Carol naquele estado. Fiz o máximo para não machucá-la. Vi que a espada tinha infectado a pele dela, então fiz uma compressa de água... Não sei se ajudou muito, mas eu tentei.
— A água estava quente ou fria? — Arky perguntou, focando nos detalhes.
— Estava morna. Eu molhei um pano e, depois de colocar a Carol na cama, voltei e pressionei a ferida. — Sawo falou com cuidado.
— Você retirou o curativo? — Arky continuou, atento a cada palavra.
— Sim. Minha mãe me ensinou a fazer isso... foi quando meu cachorro perdeu a perna. Claro, Carol não é um cachorro, mas achei que poderia ajudar. Também peguei um pouco de babosa e coloquei no curativo. — Sawo explicou, um pouco envergonhado, mas satisfeito com o que fez.
— Caraca... na minha opinião, você fez um excelente trabalho. Vamos ver como ela está. — Arky sorriu levemente, sentindo uma onda de alívio.
Eles se aproximaram de Carol, e Arky notou que ela estava mais tranquila. O sofrimento dela parecia ter diminuído, mas ela ainda não havia acordado. O tempo parecia esticar, um dia se passando naquelas poucas horas.
— Não sei sobre a infecção... mas ela é muito forte. Isso me assusta. Mesmo depois de perder tanto sangue, ela ainda estava conversando com a gente. E a ideia de usar fogo... também me assusta. — Arky falou, com tristeza nos olhos, olhando para Carol. Ele parecia refletir sobre o que havia acontecido e a força da menina que, em sua opinião, estava mais para uma guerreira do que uma simples criança.
— Por favor, pare. Eu não quero lembrar disso.
Arky não consegue enxergar o que Sawo passou. Apesar de ser mais velho, ele ainda é uma criança, forçada a queimar sua própria amiga para salvá-la. Durante o processo, ouviu seus gritos e sentiu sua dor, e o sangue que manchou suas mãos ficará para sempre gravado em sua mente.
— Me desculpe, eu fui egoísta. Só pensei em mim mesmo. — Arky diz, com tristeza, sua voz carregada de arrependimento. Ele fugiu por medo, ignorando a dor de Sawo.
— Está tudo bem. Afinal, você tem apenas nove anos. Foi criado para ser forte desde muito novo, mas ainda é mais novo que eu. — Sawo tenta sorrir, buscando conforto nas palavras.
De repente, Carol se mexe na cama, fazendo os dois olharem rapidamente, surpresos.
— Pessoal? — A voz de Carol é fraca, quase inaudível.
— Isso é impossível! Você perdeu tanto sangue... Na teoria, só deveria acordar daqui a uma semana. — Arky fica incrédulo, ainda tentando entender o que está acontecendo.
— Pessoal? — Carol tenta novamente, sua voz quase não passando de um suspiro.
Arky e Sawo se aproximam dela, apreensivos.
— Por que está tudo tão estranho? Tem alguém aí? — Carol se desespera, sua voz cheia de confusão.
— Carol, você não está ouvindo a gente? — Arky pergunta, a sensação estranha de algo errado tomando conta dele.
Sawo começa a chorar, assustado. Ele se afasta, perdido, sem saber o que fazer, como se mais uma vez estivesse à mercê de algo que não podia controlar.
— Arky? Sawo! — Carol tenta chamar, mas suas palavras falham. Ela está imóvel, suas cordas vocais fracas, quase inaudíveis.
Carol não consegue ver nada. Não há cor, apenas o vazio. Ela não consegue falar, ouvir ou enxergar, uma consequência da perda de sangue, dos gritos e dos traumas psicológicos que levaram sua mente ao limite.
— Carol... — Arky diz, um pânico crescente em seus olhos.
Sawo, ainda em lágrimas, se aproxima cautelosamente. Ele segura a mão de Carol, sua dor compartilhada.
— Sawo? — Carol sussurra, reconhecendo-o imediatamente. Era a mesma mão que a guiou em momentos de alegria, e agora era a mesma que segurava a espada que lhe tirou tudo.
Sawo aperta sua mão com mais força, as lágrimas caindo. Carol sente profundamente a dor e o desespero dele, e, apesar de tudo, sorri.
— Está tudo bem... Não chore... — Ela diz suavemente, tentando aliviar a dor de Sawo, buscando um conforto perdido. — Eu estou sonhando, não é? Que sonho longo...
— Arky... por favor, saia... — Sawo diz, sua voz carregada de seriedade e tristeza.
Arky sente uma sensação inexplicável de que precisa obedecer, embora não entenda o que está prestes a acontecer.
— Não se culpe tanto, por favor... — Sawo completa, a voz mais suave. Arky, hesitante, se afasta e vai para trás de uma árvore.
Eles estão dentro de uma pequena caverna, com uma floresta densa e um rio próximo. Sawo usou folhas para cobrir a entrada. Arky se recosta na árvore, seus pensamentos tumultuados, e começa a refletir sobre tudo o que aconteceu.
— Carol... me desculpa, eu fui fraco e inconsequente... Eu não consegui fazer nada... Prometi ao Carlos que protegeria todos vocês... mas fui eu quem... — A voz de Sawo se quebra e ele volta a chorar, apertando com força a mão de Carol, que está deitada.
— Sawo... está tudo bem, eu estou falando sério. Você não falhou. Eu não pulei para te salvar à toa, eu sabia que você tinha um grande futuro... Não consigo falar muito, então, por favor, pare de chorar... — Carol, com os olhos fechados, sorri suavemente, tentando transmitir calma.
Sawo chora mais intensamente, enxugando as lágrimas. Ele então pega a espada Destroyer, levantando-a com força. O clima no ambiente se torna denso, e Carol permanece calma, mas Sawo parece estar prestes a fazer algo extremamente doloroso, não só para ele, mas para todos.
— Não se culpe tanto, eu vou ficar bem... — Carol ainda sorri, a expressão dela serena.
Sawo, com uma velocidade arrepiante, movimenta a espada. O sangue que escorre não é carbonizado instantaneamente, como seria de se esperar. Ele fica visivelmente abalado, as lágrimas caindo novamente.
Arky está atrás da árvore, observando. Sawo sai da caverna, com um semblante sério, totalmente diferente do Sawo que ele conhecia. Seu rosto está vazio de emoção, mas sua postura é carregada de uma tensão perturbadora.
— Sawo? Por que está com a Destroyer? — Arky pergunta, sua voz tensa. Ele observa o sangue na lâmina, que não se carboniza. A expressão de Sawo, sombria e intransigente, é o que mais chama a atenção.
Arky sente o choque percorrer seu corpo ao ver o estado de Sawo, e sua mente começa a se preencher de um medo inquietante. Carol, por sua vez, não faz mais nenhum som. O silêncio toma conta, e a tensão é palpável, como uma presença ameaçadora que paira sobre a floresta.
— Sawo! O que você fez? — A voz de Arky transborda de preocupação e pavor, sua alma transbordando de um terror que ele não pode conter.
Sawo não responde. Ele permanece impassível, sério, e seu braço está sangrando.
Arky, agora com o coração apertado, entra na caverna. Quando seus olhos se fixam na cena à sua frente, seu rosto se contorce de surpresa e pavor. Ele olha para trás, com ódio visível queimando em seus olhos.
— O que você fez? — O ódio em sua voz é inconfundível, e a dor é mais do que evidente.
— Nada demais... apenas o necessário... — Sawo responde, sua voz calma e fria, quase irreconhecível.
Continua...