O sol ainda nem havia nascido, mas Sakura Minazuki já estava de pé. O dojo da ala de combate estava vazio, exceto por ela.
A Nozarashi cortava o ar. Cada golpe, uma lembrança. Cada movimento, uma ferida que não cicatrizava.
Ela já havia perdido para Hikari duas vezes.
A primeira foi pública.
“Você não tem honra.”
Essa frase ainda queimava sua garganta. Maldita impulsividade. O que ela esperava dizer?
Hikari não respondeu com palavras. Ela respondeu com movimento.
A lâmina fria encostando na garganta.
A ausência completa de som. A explosão de velocidade.
A certeza de que, se Hikari quisesse, Sakura estaria morta.
A segunda derrota foi ainda pior.
Mais íntima. Numa noite silenciosa. Um duelo não oficial.
E mesmo ali, mesmo com aura e foco total… Hikari a leu como um livro aberto.
"Você pensa demais."
Ela ainda sentia a dor do golpe na lateral do corpo. De forma imaginária claro.
Mas pior que isso era a frustração. A humilhação.
E mesmo assim…
“Kazehara me curou sem fazer perguntas.”
Sakura baixou a espada, sentando no tatame.
Yumi havia sentido a dor por ela. Mesmo sem saber por quê Sakura estava ferida. Mesmo sem receber nada em troca.
"Ela sente a dor de tudo que cura..."
Sakura fechou os olhos.
— Que tipo de garota aceita isso? E sorri depois?
Mesmo que ambas estivessem apaixonadas pelo mesmo garoto, Sakura sentia uma dívida.
“Yumi Kazehara... você é gentil demais. Forte demais. E isso me enfraquece só de olhar.”
Ela ergueu a espada mais uma vez.
— …Mas da próxima vez, Hikari, não será tão fácil.
Do lado de fora da academia, Hiro Tanaka parou de andar abruptamente.
Seus olhos fixaram-se no vazio.
Um tremor sutil. Uma vibração imperceptível. Mas ele a reconhecia.
“Mana… voidborn.”
Ele fechou os olhos.
“Esses miseráveis… estão aqui?”
O vento soprou forte, como se quisesse levar a dúvida embora. Mas Hiro não esqueceu. O cheiro da desgraça era inconfundível.
Ele não viu nada. Não ouviu nada.
Mas sentiu.
E isso era o suficiente.
Do outro lado do campus, Saori Kurosawa parou diante de três figuras vestidas em trajes nobres.
Renji, Kaito e Ayaka Kurosawa — seus meio-irmãos.
Todos do terceiro círculo mágico. Todos com sorrisos tortos.
— Olha só… a bastarda da família resolveu aparecer.
Saori congelou.
Kaito se aproximou.
— Ainda fingindo que é uma de nós?
— A academia deve estar com critérios muito baixos ultimamente. — disse Renji, rindo.
Ayaka, com um olhar frio, completou:
— Espero que ao menos você saiba se ajoelhar quando perdemos a paciência.
Saori não respondeu. Mas suas mãos tremiam.
Foi então que uma voz masculina soou às costas do grupo.
— Chega.
Os irmãos viraram.
Hiro Tanaka caminhava em passos calmos, com as mãos nos bolsos e o olhar impassível.
— Parem de mexer com ela.
Renji arqueou a sobrancelha.
— E você é quem? De qual família nobre?
Kaito riu:
— Porque pra mim… parece só um plebeu.
Hiro encarou os três.
— Eu sou mesmo.
Silêncio.
Ayaka zombou:
— E ainda assim tem coragem de se meter?
Renji ergueu a mão, conjurou, e lançou ignis.
Hiro desviou sem esforço. Em um segundo, estava atrás dele.
Um chute seco na perna.
Um soco na costela.
Um giro com o antebraço — e Renji caiu no chão, sem ar, completamente desacordado.
Kaito e Ayaka congelaram.
— Levem ele. — disse Hiro, sem emoção.
Eles obedeceram, furiosos, mas silenciosos.
— Isso não vai ficar assim! — disse Ayaka, antes de sumir com os outros.
Hiro virou-se para Saori.
— Você está bem?
Ela ainda tremia. Mas seus olhos estavam fixos nele.
O mesmo garoto que matou um Raksha.
O mesmo garoto que enfrentou os filhos do duque como se fosse nada.
— E-eu… — ela começou, sem saber o que dizer.
O coração dela disparava.
Por quê?
Ela odiava plebeus. Não era isso que ela sempre dizia?
Então por que, vendo ele ali, protegendo-a… ela queria que ele ficasse?
— Obrigada, murmurou. — Idiota.
Hiro apenas assentiu.
— Se precisar… eu estarei por perto.
E foi embora, como se nada tivesse acontecido.
Saori tocou o próprio peito, irritada.
— Droga… por que meu coração está batendo assim…?
Ela olhou para o chão. E pensou em voz alta:
— Eu não… eu não gosto dele.
Mas o rosto dela dizia outra coisa.