Capítulo 83 – Apenas Me Cure

A noite ainda envolvia a Academia Arcadia quando passos firmes, porém contidos, ecoaram pelo corredor da ala feminina.

Sakura Minazuki caminhava com a mão pressionando o lado do corpo. Sangue escorria por entre os dedos, mas ela mantinha a postura ereta. O orgulho ainda era maior que a dor. Maldição... perder duas vezes daquela desgraçada sorridente. E ainda sair viva.

Parou diante da porta do quarto da Santa.

Respirou fundo.

Toc. Toc.

A porta abriu pouco depois.

Mari apareceu com uma expressão de puro sono e um tapa-olho pendurado na testa.

— …Minazuki? Caramba, você tá sangrando!

Yumi logo surgiu atrás, com um pijama branco e os cabelos soltos, e arregalou os olhos ao ver o uniforme manchado.

— S-Sakura?! O que aconteceu?

Sakura abaixou a cabeça levemente.

— …Não importa. Só... por favor… me cure, vossa santidade.

O silêncio que se seguiu fez até Mari parar de respirar.

Yumi, ainda em choque, assentiu.

— C-claro… entra. Senta ali, rápido!

Mari correu para preparar o canto de cura improvisado, puxando uma manta e um travesseiro extra. Sakura sentou-se com firmeza, mesmo rangendo os dentes discretamente.

Yumi ajoelhou-se ao lado. Estendeu as mãos, e um brilho suave começou a envolver seus dedos.

A magia de cura de Yumi não brilhava como o ouro de um milagre. Era o verde das folhas que curam, da vida que insiste em continuar.

Sakura fechou os olhos.

E Yumi sentiu a dor, ela engasgou com a própria respiração. Sentiu o corte atravessar sua própria carne, mesmo que ilusoriamente. Era sempre assim. E sempre seria. Mas ela permaneceu ali, firme, canalizando a energia.

Mari observava a cena em silêncio, sentada sobre os calcanhares.

Sakura entreabriu os olhos e, por um momento, pareceu observar Yumi de verdade pela primeira vez.

— …Você… sente?

Yumi hesitou, depois assentiu levemente.

— Desde sempre.

Sakura desviou o olhar. Estava quieta. Orgulhosa. Mas seus olhos... carregavam respeito.

— E ainda assim... você continua fazendo isso?

Yumi respirou fundo.

— Porque, mesmo que doa… eu não quero ver ninguém sentindo dor.

O silêncio entre elas foi quebrado apenas pelo som do feitiço finalizando. A luz verde se dissipou devagar, deixando a pele da espadachim perfeitamente regenerada, sem cicatriz.

Yumi soltou um gemido abafado e caiu sentada no chão, exausta.

Sakura olhou para o lado.

— …Obrigada, Kazehara.

Levantou-se com calma, a dor desaparecida. Quando chegou à porta, parou um instante.

— …Se alguém perguntar, diga que eu tropecei numa pedra.

Mari arqueou uma sobrancelha.

— Uhum. Pedra né?

Sakura ignorou e saiu.

A porta se fechou devagar.

Mari e Yumi ficaram em silêncio por um momento.

— Ela não disse o que aconteceu. — murmurou Yumi.

— Não precisa. Aqueles olhos… ela lutou com alguém.

Yumi olhava para a porta.

— Ela me chamou pelo nome…

Mari piscou.

— ...Meus céus. Isso é o mais próximo de um elogio que a Minazuki consegue fazer.

— Talvez... ela não seja só a espadachim obcecada que todos acham.

— E você não é só a santa fofa que todos adoram.

Yumi sorriu, mesmo sentindo dor.

— Somos mais do que parecemos, né?

— Com certeza. — disse Mari, se jogando de volta na cama. — Só falta esse garoto idiota perceber.

Yumi murmurou:

— …É. Só falta ele.