A noite ainda envolvia a Academia Arcadia quando passos firmes, porém contidos, ecoaram pelo corredor da ala feminina.
Sakura Minazuki caminhava com a mão pressionando o lado do corpo. Sangue escorria por entre os dedos, mas ela mantinha a postura ereta. O orgulho ainda era maior que a dor. Maldição... perder duas vezes daquela desgraçada sorridente. E ainda sair viva.
Parou diante da porta do quarto da Santa.
Respirou fundo.
Toc. Toc.
A porta abriu pouco depois.
Mari apareceu com uma expressão de puro sono e um tapa-olho pendurado na testa.
— …Minazuki? Caramba, você tá sangrando!
Yumi logo surgiu atrás, com um pijama branco e os cabelos soltos, e arregalou os olhos ao ver o uniforme manchado.
— S-Sakura?! O que aconteceu?
Sakura abaixou a cabeça levemente.
— …Não importa. Só... por favor… me cure, vossa santidade.
O silêncio que se seguiu fez até Mari parar de respirar.
Yumi, ainda em choque, assentiu.
— C-claro… entra. Senta ali, rápido!
Mari correu para preparar o canto de cura improvisado, puxando uma manta e um travesseiro extra. Sakura sentou-se com firmeza, mesmo rangendo os dentes discretamente.
Yumi ajoelhou-se ao lado. Estendeu as mãos, e um brilho suave começou a envolver seus dedos.
A magia de cura de Yumi não brilhava como o ouro de um milagre. Era o verde das folhas que curam, da vida que insiste em continuar.
Sakura fechou os olhos.
E Yumi sentiu a dor, ela engasgou com a própria respiração. Sentiu o corte atravessar sua própria carne, mesmo que ilusoriamente. Era sempre assim. E sempre seria. Mas ela permaneceu ali, firme, canalizando a energia.
Mari observava a cena em silêncio, sentada sobre os calcanhares.
Sakura entreabriu os olhos e, por um momento, pareceu observar Yumi de verdade pela primeira vez.
— …Você… sente?
Yumi hesitou, depois assentiu levemente.
— Desde sempre.
Sakura desviou o olhar. Estava quieta. Orgulhosa. Mas seus olhos... carregavam respeito.
— E ainda assim... você continua fazendo isso?
Yumi respirou fundo.
— Porque, mesmo que doa… eu não quero ver ninguém sentindo dor.
O silêncio entre elas foi quebrado apenas pelo som do feitiço finalizando. A luz verde se dissipou devagar, deixando a pele da espadachim perfeitamente regenerada, sem cicatriz.
Yumi soltou um gemido abafado e caiu sentada no chão, exausta.
Sakura olhou para o lado.
— …Obrigada, Kazehara.
Levantou-se com calma, a dor desaparecida. Quando chegou à porta, parou um instante.
— …Se alguém perguntar, diga que eu tropecei numa pedra.
Mari arqueou uma sobrancelha.
— Uhum. Pedra né?
Sakura ignorou e saiu.
A porta se fechou devagar.
Mari e Yumi ficaram em silêncio por um momento.
— Ela não disse o que aconteceu. — murmurou Yumi.
— Não precisa. Aqueles olhos… ela lutou com alguém.
Yumi olhava para a porta.
— Ela me chamou pelo nome…
Mari piscou.
— ...Meus céus. Isso é o mais próximo de um elogio que a Minazuki consegue fazer.
— Talvez... ela não seja só a espadachim obcecada que todos acham.
— E você não é só a santa fofa que todos adoram.
Yumi sorriu, mesmo sentindo dor.
— Somos mais do que parecemos, né?
— Com certeza. — disse Mari, se jogando de volta na cama. — Só falta esse garoto idiota perceber.
Yumi murmurou:
— …É. Só falta ele.