No entanto, enquanto todos mostravam progresso, Kay se destacava... por ficar para trás.
— Não demorou muito para passar vergonha! — provocou Ravena ao ultrapassar Kay, já com várias voltas de vantagem.
— Como eles se acostumaram tão rápido? — murmurou Kay, confuso.
Tentando aumentar sua velocidade, ele acabou saindo da pista, esbarrando nas laterais. Ravena e Fiona riam discretamente ao vê-lo atrapalhado.
O traje está se movendo antes de mim; parece que não consigo mantê-lo firme. Como os outros conseguem lidar com isso? Kay se perguntava, observando seus companheiros passarem novamente com facilidade.
— Os trajes estão normais. Estranho, ele deveria ser o mais rápido aqui, já que tem 100% de compatibilidade! — disse uma das cientistas, observando o tablet.
— Compatível? — Kay repetiu, confuso, enquanto ainda estava caído no chão.
Mira parou ao lado dele, preocupada.
— O que está acontecendo? Foi a mesma coisa no teste! — disse ela.
— Ele está seguindo meus movimentos, mas parece que está indo antes de mim — explicou Kay, tentando entender.
— Antes? Como assim? — questionou Mira, confusa.
— Não é assim para você? — Kay perguntou, surpreso.
— Para mim, ele só deixa meu corpo mais forte. Foi questão de alguns minutos para me acostumar! — respondeu Mira.
— Mais forte, acostumar, compatibilidade... Então era isso! Eu preciso me sintonizar com o traje! — concluiu Kay, animado.
— Mas é isso que estamos fazendo! — riu Mira.
— Vocês são incríveis... Acho que vou precisar de mais tempo para isso! — disse Kay, se levantando e olhando os recrutas, que continuavam o treino sem demonstrar cansaço.
— Desculpa, Mira, mas pode impedir que as pessoas me atrapalhem? — pediu Kay.
— O que você vai fazer? — perguntou Mira, intrigada.
— Vou meditar! — respondeu ele, sentando-se na lateral da pista para sair do caminho dos corredores.
— O que ele está fazendo? — murmuravam os veteranos, perplexos.
— Já desistiu? — zombavam alguns deles.
— O que ele está fazendo? — perguntou Thaís, correndo ao lado de Mira.
— Eu não sei. Ele disse que ia meditar e pediu para não o interrompermos — respondeu Mira.
— Ele deve ter enlouquecido! — riu Sky, um novo recruta.
— Quem é você? — perguntou Mira, surpresa.
— Esse é nosso colega de quarto, Sky! — respondeu Kratos.
— Eu não me lembro de ter visto você no quarto... — disse Thaís, intrigada.
— Eu estava lá, mas é normal não me verem — comentou Sky, de forma enigmática.
— Não tem graça manter o mesmo ritmo. Vamos fazer igual à Ravena e testar nosso limite. Corram com tudo! — incentivou Kratos, acelerando.
Yan observava de longe, junto com a cientista, que olhava para o tablet.
— A leva deste ano é realmente boa... mas esperava mais de um 100% — comentou Yan.
— Pode ser compatível, mas se o usuário não tiver capacidade, não adianta nada — disse a cientista, desligando o tablet.
— Corram por mais uma hora, e estão liberados para descansar! — anunciou Yan, observando a determinação dos recrutas.
— Por que fomos acelerar? Agora temos que manter isso por uma hora! — lamentou Thaís, exausta.
Uma hora depois, os recrutas suspiraram aliviados ao final do treino.
— Finalmente! — disseram, aliviados.
— Que novatos são esses? — exclamavam os veteranos, ainda surpresos com o desempenho deles.
— Ele está dormindo? — murmurou Ravena para Fiona, observando Kay.
Os recrutas olharam para ele. Kay manteve-se imóvel na posição de meditação durante todo o tempo.
— Não sei o que ele está fazendo, mas a concentração dele é impressionante. Vocês têm dez minutos para descansar. Depois, vamos para o próximo treino! — avisou Yan.
Mira, aproveitando o intervalo, colocou uma garrafa de água e uma xícara ao lado de Kay sem fazer barulho, afastando-se discretamente.
— Ele está dormindo? — perguntou Thaís, curiosa.
— Não, ele está meditando — respondeu Mira.
— No que isso vai ajudar? Não vejo sentido algum! — comentou Fiona, cética.
— E de repente resolveu falar com a gente, hein? Decide aí, Fiona: vai fazer parte do grupo ou vai continuar se fazendo de difícil? — provocou Thaís.
— Eu só disse que queria fazer ele desistir; não tenho nada contra vocês! — retrucou Fiona.
— Então para de agir como se tivesse e se junta logo ao nosso grupo! — disse Thaís.
— E os outros? — perguntou Fiona, indicando os outros recrutas.
— Aqueles? Eles formaram o grupo deles, mas não estão interferindo com a gente. Então, deixa eles pra lá! — respondeu Thaís.
— Parando pra pensar, nós não fizemos nada que chamasse atenção até agora — comentou San.
— Verdade! Agora que você falou... a gente não se destacou em nada! — concordou Dan.
— Do que estão falando? Vocês foram mais rápidos do que eu! — disse Sarah.
— Chamar atenção desnecessária também é ruim. Olha ali! — comentou Ravena, apontando para os veteranos.
Os veteranos olhavam para Kay com desdém e impaciência.
— Quanto tempo ele vai ficar nisso? Já está ficando chato! — murmuravam, impacientes.
— Quem se importa! Temos que focar no nosso treino — disse outro veterano.
— Não me importo de ficar no grupo de vocês, mas aquele cara está nos fazendo passar vergonha! — declarou Ravena.
— Então é só sair, ué! — retrucou Thaís.
Ravena ficou irritada, mas se manteve em silêncio por um momento.
— Vou superar ele em tudo que mandarem a gente fazer. Farei ele passar vergonha sozinho. E isso vale pra você também! — disse Ravena, voltando-se para Thaís.
— O que você disse? Tá querendo tirar onda comigo? — exclamou Thaís, irritada.
— Estou dizendo que vale a pena te humilhar e quebrar sua confiança pessoalmente! — retrucou Ravena.
— Então tenta! Vai passar vergonha quando eu quebrar essa sua confiança de lagartixa! — desafiou Thaís.
A tensão entre as duas era evidente, e os outros recrutas, surpresos, perceberam o significado daquela provocação. Ravena acabara de declarar rivalidade não só com Thaís, mas também com Kay, deixando claro que os reconhecia como oponentes dignos.
Eles beberam água e aguardaram os dez minutos passarem. O treino seguinte consistiu apenas em movimentações para aumentar a compatibilidade com o traje. Fizeram polichinelo e outros exercícios que exigiam a movimentação do corpo.
Esse treino continuou até a hora do almoço, e todos suspiravam, cansados.
— Amanhã testaremos as armas com as quais vocês são compatíveis! Geralmente, é arma branca, mas aqueles que conseguem se adaptar a armas de fogo tornam-se mais valiosos para o exército. Estão dispensados por hoje. Amanhã, no mesmo horário, tentem se preparar antes que se repita o que ocorreu hoje — disse Yan.
— Sim, senhor! — responderam os soldados, batendo continência.
Yan se retirou.
— Finalmente vamos descansar! — exclamou Dan, exausta.
— Meu corpo está dolorido! — disse San, sentando-se no chão.
— O traje foi feito para ser usado por longos períodos, até dias, mas precisamos nos acostumar primeiro! — afirmou Kratos.
— Isso é fácil para mim! — bragou Slayer.
— Estão dizendo isso, mas estão tremendo mais do que tudo — observou Ravena, com uma expressão tranquila.
— O tempo está fechando, parece que vai chover! — alertou Sarah.
Nesse momento, Mira saiu correndo.
— Para onde você está indo? — exclamou Thais, cansada.
— Vou pegar um guarda-chuva! — respondeu Mira.
— Não precisa, vamos dar um jeito! — insistiu Kratos.
Mira parou e perguntou como.
Kratos e Slayer, sem atrapalhar Kay, pegaram-no pelas pernas e pelos braços, levando-o para um local coberto, onde o deixaram.
Mira novamente colocou a garrafa ao lado dele e agradeceu pela ajuda.
— Desculpem pelo trabalho que eu dei a vocês! — disse Kay, se levantando.
— Se estivesse acordado, poderia ter vindo andando! — comentou Slayer.
— Eu falhei em me tornar compatível com esse ghoul. Ele se recusa a me obedecer! — desabafou Kay.
— Do que você está falando? — exclamou Ravena, confusa.
— As células que foram usadas nos trajes ainda estão vivas, então, de certa forma, restam a personalidade ou, talvez, o instinto do ghoul. Eles são seres irracionais, mas não são burros e, acima de tudo, são teimosos. Preciso tentar de novo, mas de uma forma menos amigável! — explicou Kay.
— Esse cara ficou maluco ou estou ouvindo errado? — exclamou Fiona.
— Ele ficou maluco! — confirmou Slayer.
— Domar os ghouls tão rápido, vocês são impressionantes! — comentou Kay, admirado.
— Vamos almoçar daqui a pouco. Você vai também? — perguntou Mira.
— Ainda não. Preciso domar esse ghoul. Vai levar menos tempo desta vez, mas até chegar nele, vai demorar. Não acho que vou terminar antes do anoitecer! — respondeu Kay.
— Então almoce primeiro e depois treine! — sugeriu Mira.
— É, talvez um intervalo não faça mal — concordou Kay.
— Quero ouvir mais sobre isso durante o almoço! — disse Mira.
— Tudo bem! — respondeu Kay.
Eles voltaram para os quartos e vestiram roupas normais. Logo depois, foram almoçar.
— Nem fala nada! Isso só é diferente do que eu pensava, então quero entender! — disse Ravena, à mesa.
— Nem falei nada! — retrucou Thais.
— Para ser específico, "conexão" seria a palavra certa! — afirmou Kay.
— Conexão? — exclamou Dan.
— Os trajes foram criados com células de diferentes ghouls. Eles se devoram e o predominante mantém sua vontade, e é com esse ghoul que você se conecta. Por isso, os trajes são até mais rápidos que os próprios ghouls. E é por isso que esse ghoul se tornou orgulhoso. Quanto mais vocês se conectam, mais aumentará sua compatibilidade com o traje. Mas, devido à falta de células do próprio ghoul, não conseguirão uma compatibilidade de 100% por meios normais e não por muito tempo. Você praticamente vai subjugar temporariamente o ghoul. Foi o que notei quando adentrei na consciência dele. É difícil explicar, mas é quase isso! — explicou Kay.
— Em resumo, se sua vontade devora a do ghoul, você conseguirá mais compatibilidade com o traje. É por isso que você já tem 100% logo no início? Mas isso não faz sentido, já que o próprio ghoul está te atrapalhando! — exclamou Ravena.
— Não sei se é isso. Eu não sou tão inteligente para essas coisas. O que sei é que preciso subjugar o ghoul para conseguir usar o traje. Caso contrário, ele vai continuar me atrapalhando! — disse Kay.
— Consciência do ghoul, hum... Entendo, entendo! — comentou a cientista que estava atrás de Kay.
— Você estava observando o treino — disse Kay.
— Você se lembra? Teve uma pessoa que disse que viu um ghoul assim que vestiu o traje, mas no mesmo instante aquele ghoul virou poeira e desapareceu. Foi o próprio Julius. Achamos que foi algum tipo de miragem ou ilusão, ou algo do tipo! — explicou a cientista.
— Se isso é verdade, então ele subjulgou o ghoul no mesmo instante em que vestiu o traje! Praticamente matou o ghoul! — disse Kay.
— Entendi, então é isso que acontece com quem tem mais compatibilidade. Os trajes mantêm a vontade do ghoul mais forte e tentam impedir o usuário de usá-lo. Para acessar o ghoul, precisa meditar profundamente. Interessante — disse a cientista, anotando tudo. — Mas como funciona o processo de subjugar o ghoul? Tem garantia de que apenas meditando consegue acessar o ghoul? É algum tipo de viagem ao subconsciente? Tem algum truque para fazer isso mais rápido? — questionou a cientista.
— Acho que as consciências se unem, mesmo sobrou só a vontade do ghoul. Para vencê-lo, basta subjugá-lo! — respondeu Kay.
— Mas como você vai subjugá-lo? Lutando em sua mente? Conversando? — perguntou a cientista, intrigada.
— Tenho outra coisa mais importante para pensar agora, por favor, não me distraia! — disse Kay.
— Mais importante que domar o traje? O que seria? — exclamou a cientista.
— Meu treino! — respondeu Kay.
— Treino? — a cientista ficou confusa.
— Então, por favor, não me distraia! — insistiu Kay.
— Entendo. Sobre aquele negócio de subjugar o ghoul temporariamente, realmente temos uma forma de fazer isso. O comando que damos para os seus trajes leva a um pequeno choque: a quebra de limite! Ela permite até que alguém sem compatibilidade use o traje em seu máximo desempenho, mas tem um preço. Quanto menor for a compatibilidade com o traje, maior será o rebote disso, e a quebra de limite dura pouco tempo! — explicou a cientista.
— E o que acontece depois? — exclamou Dan, preocupada.
— Depende! O traje se torna inutilizável. A pessoa pode quebrar alguns ossos, ou até mesmo morrer. Por isso, é recomendado usar em casos extremos de vida ou morte! — explicou a cientista.
Dan e San ficaram assustados.
— É porque está obrigando alguém orgulhoso a lutar sem vontade. Para compensar, ele deve apertar o traje, fazendo seus ossos quebrarem! — disse Kay.
— Se formos colocar isso em palavras, acho que seria mais ou menos assim: "Como esse fracote ousa me obrigar a salvá-lo? Agora eu mesmo irei matá-lo!" Ou, talvez, "Ele me usou para sobreviver, mas estávamos quase no mesmo nível, então eu entendo." Seria isso que os ghouls pensariam? — exclamou a cientista.
— Seria mais ou menos isso! — confirmou Kay.
— Quando for fazer a meditação, eu irei com você para avaliar as condições do traje, para ver se muda alguma coisa enquanto você tenta subjugar o ghoul! — disse a cientista.
— Eu não me importo! — respondeu Kay.
"Eu disse que não me importava, mas por que estão todos aqui? Isso vai levar até o anoitecer!" — exclamou Kay.
— Está chovendo, e aqui fora está frio. Vão lá para dentro — disse Kay.
— Tudo bem, não temos nada para fazer, vamos observar! — disse Ravena.
Kay tomou mais uma xícara de café.
— Vocês que sabem! — murmurou ele, dobrando as pernas e se preparando para meditar.
— Não vamos interferir — garantiu Mira.
Kay fechou os olhos e se concentrou. Os recrutas o observavam fixamente, enquanto a cientista, sentada com um tablet, monitorava Kay atentamente.
Poucos minutos depois, os recrutas ficaram entediados e foram jogar algo no alojamento. Algumas horas depois, a cientista também se cansou e foi cuidar de outras tarefas. Mais tarde, Kratos voltou para verificar Kay e, depois, entrou no alojamento novamente.
— Ele ainda está meditando! — disse Kratos.
— Já anoiteceu, ele precisa voltar para dormir — preocupou-se Sarah.
— Deixa que ele volta sozinho. Vou só cobrir ele e podemos ir dormir — disse Mira.
— Tem certeza? — exclamou Thais.
— Sim, o Kay sabe se cuidar. Ele é preguiçoso, mas quando se trata de matar ghoul, ele vai até o fim — respondeu Mira.
— Matar? Ele não ia domar? — exclamou Viviane.
— Conviver com um ghoul? O Kay nunca aceitaria isso! — disse Mira, retirando-se para buscar uma coberta.
— É por isso que demora tanto? Eles estão brigando dentro da mente do Kay? — perguntou San.
— Não dá para saber. Vamos esperar para ver — disse Slayer.
Mira retornou e colocou a coberta sobre Kay.
— Eu já vou dormir — avisou ela.
O grupo, ainda receoso, foi se deitar também.
Uma hora depois, o nariz de Kay começou a sangrar. Ele abriu os olhos e limpou o sangue.
— Que vontade impressionante... demorou para morrer! — disse Kay, servindo-se de outra xícara de café. Ele notou a coberta e pensou: "Será que foi a Mira?" Dobrou-a e deixou-a sobre uma cadeira.
Em outro ponto do alojamento, Ryuji sentiu algo. "Acho que vai começar!", pensou. Ele pegou o celular e fez uma ligação.
— Venha até o pátio.
Kay se dirigiu ao pátio e ficou parado, concentrando-se enquanto fechava os olhos. O silêncio dominou o lugar.