Capítulo 17: Treino ou Conversa?

No entanto, enquanto todos mostravam progresso, Kay se destacava... por ficar para trás.

— Não demorou muito para passar vergonha! — provocou Ravena ao ultrapassar Kay, já com várias voltas de vantagem.

— Como eles se acostumaram tão rápido? — murmurou Kay, confuso.

Tentando aumentar sua velocidade, ele acabou saindo da pista, esbarrando nas laterais. Ravena e Fiona riam discretamente ao vê-lo atrapalhado.

O traje está se movendo antes de mim; parece que não consigo mantê-lo firme. Como os outros conseguem lidar com isso? Kay se perguntava, observando seus companheiros passarem novamente com facilidade.

— Os trajes estão normais. Estranho, ele deveria ser o mais rápido aqui, já que tem 100% de compatibilidade! — disse uma das cientistas, observando o tablet.

— Compatível? — Kay repetiu, confuso, enquanto ainda estava caído no chão.

Mira parou ao lado dele, preocupada.

— O que está acontecendo? Foi a mesma coisa no teste! — disse ela.

— Ele está seguindo meus movimentos, mas parece que está indo antes de mim — explicou Kay, tentando entender.

— Antes? Como assim? — questionou Mira, confusa.

— Não é assim para você? — Kay perguntou, surpreso.

— Para mim, ele só deixa meu corpo mais forte. Foi questão de alguns minutos para me acostumar! — respondeu Mira.

— Mais forte, acostumar, compatibilidade... Então era isso! Eu preciso me sintonizar com o traje! — concluiu Kay, animado.

— Mas é isso que estamos fazendo! — riu Mira.

— Vocês são incríveis... Acho que vou precisar de mais tempo para isso! — disse Kay, se levantando e olhando os recrutas, que continuavam o treino sem demonstrar cansaço.

— Desculpa, Mira, mas pode impedir que as pessoas me atrapalhem? — pediu Kay.

— O que você vai fazer? — perguntou Mira, intrigada.

— Vou meditar! — respondeu ele, sentando-se na lateral da pista para sair do caminho dos corredores.

— O que ele está fazendo? — murmuravam os veteranos, perplexos.

— Já desistiu? — zombavam alguns deles.

— O que ele está fazendo? — perguntou Thaís, correndo ao lado de Mira.

— Eu não sei. Ele disse que ia meditar e pediu para não o interrompermos — respondeu Mira.

— Ele deve ter enlouquecido! — riu Sky, um novo recruta.

— Quem é você? — perguntou Mira, surpresa.

— Esse é nosso colega de quarto, Sky! — respondeu Kratos.

— Eu não me lembro de ter visto você no quarto... — disse Thaís, intrigada.

— Eu estava lá, mas é normal não me verem — comentou Sky, de forma enigmática.

— Não tem graça manter o mesmo ritmo. Vamos fazer igual à Ravena e testar nosso limite. Corram com tudo! — incentivou Kratos, acelerando.

Yan observava de longe, junto com a cientista, que olhava para o tablet.

— A leva deste ano é realmente boa... mas esperava mais de um 100% — comentou Yan.

— Pode ser compatível, mas se o usuário não tiver capacidade, não adianta nada — disse a cientista, desligando o tablet.

— Corram por mais uma hora, e estão liberados para descansar! — anunciou Yan, observando a determinação dos recrutas.

— Por que fomos acelerar? Agora temos que manter isso por uma hora! — lamentou Thaís, exausta.

Uma hora depois, os recrutas suspiraram aliviados ao final do treino.

— Finalmente! — disseram, aliviados.

— Que novatos são esses? — exclamavam os veteranos, ainda surpresos com o desempenho deles.

— Ele está dormindo? — murmurou Ravena para Fiona, observando Kay.

Os recrutas olharam para ele. Kay manteve-se imóvel na posição de meditação durante todo o tempo.

— Não sei o que ele está fazendo, mas a concentração dele é impressionante. Vocês têm dez minutos para descansar. Depois, vamos para o próximo treino! — avisou Yan.

Mira, aproveitando o intervalo, colocou uma garrafa de água e uma xícara ao lado de Kay sem fazer barulho, afastando-se discretamente.

— Ele está dormindo? — perguntou Thaís, curiosa.

— Não, ele está meditando — respondeu Mira.

— No que isso vai ajudar? Não vejo sentido algum! — comentou Fiona, cética.

— E de repente resolveu falar com a gente, hein? Decide aí, Fiona: vai fazer parte do grupo ou vai continuar se fazendo de difícil? — provocou Thaís.

— Eu só disse que queria fazer ele desistir; não tenho nada contra vocês! — retrucou Fiona.

— Então para de agir como se tivesse e se junta logo ao nosso grupo! — disse Thaís.

— E os outros? — perguntou Fiona, indicando os outros recrutas.

— Aqueles? Eles formaram o grupo deles, mas não estão interferindo com a gente. Então, deixa eles pra lá! — respondeu Thaís.

— Parando pra pensar, nós não fizemos nada que chamasse atenção até agora — comentou San.

— Verdade! Agora que você falou... a gente não se destacou em nada! — concordou Dan.

— Do que estão falando? Vocês foram mais rápidos do que eu! — disse Sarah.

— Chamar atenção desnecessária também é ruim. Olha ali! — comentou Ravena, apontando para os veteranos.

Os veteranos olhavam para Kay com desdém e impaciência.

— Quanto tempo ele vai ficar nisso? Já está ficando chato! — murmuravam, impacientes.

— Quem se importa! Temos que focar no nosso treino — disse outro veterano.

— Não me importo de ficar no grupo de vocês, mas aquele cara está nos fazendo passar vergonha! — declarou Ravena.

— Então é só sair, ué! — retrucou Thaís.

Ravena ficou irritada, mas se manteve em silêncio por um momento.

— Vou superar ele em tudo que mandarem a gente fazer. Farei ele passar vergonha sozinho. E isso vale pra você também! — disse Ravena, voltando-se para Thaís.

— O que você disse? Tá querendo tirar onda comigo? — exclamou Thaís, irritada.

— Estou dizendo que vale a pena te humilhar e quebrar sua confiança pessoalmente! — retrucou Ravena.

— Então tenta! Vai passar vergonha quando eu quebrar essa sua confiança de lagartixa! — desafiou Thaís.

A tensão entre as duas era evidente, e os outros recrutas, surpresos, perceberam o significado daquela provocação. Ravena acabara de declarar rivalidade não só com Thaís, mas também com Kay, deixando claro que os reconhecia como oponentes dignos.

Eles beberam água e aguardaram os dez minutos passarem. O treino seguinte consistiu apenas em movimentações para aumentar a compatibilidade com o traje. Fizeram polichinelo e outros exercícios que exigiam a movimentação do corpo.

Esse treino continuou até a hora do almoço, e todos suspiravam, cansados.

— Amanhã testaremos as armas com as quais vocês são compatíveis! Geralmente, é arma branca, mas aqueles que conseguem se adaptar a armas de fogo tornam-se mais valiosos para o exército. Estão dispensados por hoje. Amanhã, no mesmo horário, tentem se preparar antes que se repita o que ocorreu hoje — disse Yan.

— Sim, senhor! — responderam os soldados, batendo continência.

Yan se retirou.

— Finalmente vamos descansar! — exclamou Dan, exausta.

— Meu corpo está dolorido! — disse San, sentando-se no chão.

— O traje foi feito para ser usado por longos períodos, até dias, mas precisamos nos acostumar primeiro! — afirmou Kratos.

— Isso é fácil para mim! — bragou Slayer.

— Estão dizendo isso, mas estão tremendo mais do que tudo — observou Ravena, com uma expressão tranquila.

— O tempo está fechando, parece que vai chover! — alertou Sarah.

Nesse momento, Mira saiu correndo.

— Para onde você está indo? — exclamou Thais, cansada.

— Vou pegar um guarda-chuva! — respondeu Mira.

— Não precisa, vamos dar um jeito! — insistiu Kratos.

Mira parou e perguntou como.

Kratos e Slayer, sem atrapalhar Kay, pegaram-no pelas pernas e pelos braços, levando-o para um local coberto, onde o deixaram.

Mira novamente colocou a garrafa ao lado dele e agradeceu pela ajuda.

— Desculpem pelo trabalho que eu dei a vocês! — disse Kay, se levantando.

— Se estivesse acordado, poderia ter vindo andando! — comentou Slayer.

— Eu falhei em me tornar compatível com esse ghoul. Ele se recusa a me obedecer! — desabafou Kay.

— Do que você está falando? — exclamou Ravena, confusa.

— As células que foram usadas nos trajes ainda estão vivas, então, de certa forma, restam a personalidade ou, talvez, o instinto do ghoul. Eles são seres irracionais, mas não são burros e, acima de tudo, são teimosos. Preciso tentar de novo, mas de uma forma menos amigável! — explicou Kay.

— Esse cara ficou maluco ou estou ouvindo errado? — exclamou Fiona.

— Ele ficou maluco! — confirmou Slayer.

— Domar os ghouls tão rápido, vocês são impressionantes! — comentou Kay, admirado.

— Vamos almoçar daqui a pouco. Você vai também? — perguntou Mira.

— Ainda não. Preciso domar esse ghoul. Vai levar menos tempo desta vez, mas até chegar nele, vai demorar. Não acho que vou terminar antes do anoitecer! — respondeu Kay.

— Então almoce primeiro e depois treine! — sugeriu Mira.

— É, talvez um intervalo não faça mal — concordou Kay.

— Quero ouvir mais sobre isso durante o almoço! — disse Mira.

— Tudo bem! — respondeu Kay.

Eles voltaram para os quartos e vestiram roupas normais. Logo depois, foram almoçar.

— Nem fala nada! Isso só é diferente do que eu pensava, então quero entender! — disse Ravena, à mesa.

— Nem falei nada! — retrucou Thais.

— Para ser específico, "conexão" seria a palavra certa! — afirmou Kay.

— Conexão? — exclamou Dan.

— Os trajes foram criados com células de diferentes ghouls. Eles se devoram e o predominante mantém sua vontade, e é com esse ghoul que você se conecta. Por isso, os trajes são até mais rápidos que os próprios ghouls. E é por isso que esse ghoul se tornou orgulhoso. Quanto mais vocês se conectam, mais aumentará sua compatibilidade com o traje. Mas, devido à falta de células do próprio ghoul, não conseguirão uma compatibilidade de 100% por meios normais e não por muito tempo. Você praticamente vai subjugar temporariamente o ghoul. Foi o que notei quando adentrei na consciência dele. É difícil explicar, mas é quase isso! — explicou Kay.

— Em resumo, se sua vontade devora a do ghoul, você conseguirá mais compatibilidade com o traje. É por isso que você já tem 100% logo no início? Mas isso não faz sentido, já que o próprio ghoul está te atrapalhando! — exclamou Ravena.

— Não sei se é isso. Eu não sou tão inteligente para essas coisas. O que sei é que preciso subjugar o ghoul para conseguir usar o traje. Caso contrário, ele vai continuar me atrapalhando! — disse Kay.

— Consciência do ghoul, hum... Entendo, entendo! — comentou a cientista que estava atrás de Kay.

— Você estava observando o treino — disse Kay.

— Você se lembra? Teve uma pessoa que disse que viu um ghoul assim que vestiu o traje, mas no mesmo instante aquele ghoul virou poeira e desapareceu. Foi o próprio Julius. Achamos que foi algum tipo de miragem ou ilusão, ou algo do tipo! — explicou a cientista.

— Se isso é verdade, então ele subjulgou o ghoul no mesmo instante em que vestiu o traje! Praticamente matou o ghoul! — disse Kay.

— Entendi, então é isso que acontece com quem tem mais compatibilidade. Os trajes mantêm a vontade do ghoul mais forte e tentam impedir o usuário de usá-lo. Para acessar o ghoul, precisa meditar profundamente. Interessante — disse a cientista, anotando tudo. — Mas como funciona o processo de subjugar o ghoul? Tem garantia de que apenas meditando consegue acessar o ghoul? É algum tipo de viagem ao subconsciente? Tem algum truque para fazer isso mais rápido? — questionou a cientista.

— Acho que as consciências se unem, mesmo sobrou só a vontade do ghoul. Para vencê-lo, basta subjugá-lo! — respondeu Kay.

— Mas como você vai subjugá-lo? Lutando em sua mente? Conversando? — perguntou a cientista, intrigada.

— Tenho outra coisa mais importante para pensar agora, por favor, não me distraia! — disse Kay.

— Mais importante que domar o traje? O que seria? — exclamou a cientista.

— Meu treino! — respondeu Kay.

— Treino? — a cientista ficou confusa.

— Então, por favor, não me distraia! — insistiu Kay.

— Entendo. Sobre aquele negócio de subjugar o ghoul temporariamente, realmente temos uma forma de fazer isso. O comando que damos para os seus trajes leva a um pequeno choque: a quebra de limite! Ela permite até que alguém sem compatibilidade use o traje em seu máximo desempenho, mas tem um preço. Quanto menor for a compatibilidade com o traje, maior será o rebote disso, e a quebra de limite dura pouco tempo! — explicou a cientista.

— E o que acontece depois? — exclamou Dan, preocupada.

— Depende! O traje se torna inutilizável. A pessoa pode quebrar alguns ossos, ou até mesmo morrer. Por isso, é recomendado usar em casos extremos de vida ou morte! — explicou a cientista.

Dan e San ficaram assustados.

— É porque está obrigando alguém orgulhoso a lutar sem vontade. Para compensar, ele deve apertar o traje, fazendo seus ossos quebrarem! — disse Kay.

— Se formos colocar isso em palavras, acho que seria mais ou menos assim: "Como esse fracote ousa me obrigar a salvá-lo? Agora eu mesmo irei matá-lo!" Ou, talvez, "Ele me usou para sobreviver, mas estávamos quase no mesmo nível, então eu entendo." Seria isso que os ghouls pensariam? — exclamou a cientista.

— Seria mais ou menos isso! — confirmou Kay.

— Quando for fazer a meditação, eu irei com você para avaliar as condições do traje, para ver se muda alguma coisa enquanto você tenta subjugar o ghoul! — disse a cientista.

— Eu não me importo! — respondeu Kay.

"Eu disse que não me importava, mas por que estão todos aqui? Isso vai levar até o anoitecer!" — exclamou Kay.

— Está chovendo, e aqui fora está frio. Vão lá para dentro — disse Kay.

— Tudo bem, não temos nada para fazer, vamos observar! — disse Ravena.

Kay tomou mais uma xícara de café.

— Vocês que sabem! — murmurou ele, dobrando as pernas e se preparando para meditar.

— Não vamos interferir — garantiu Mira.

Kay fechou os olhos e se concentrou. Os recrutas o observavam fixamente, enquanto a cientista, sentada com um tablet, monitorava Kay atentamente.

Poucos minutos depois, os recrutas ficaram entediados e foram jogar algo no alojamento. Algumas horas depois, a cientista também se cansou e foi cuidar de outras tarefas. Mais tarde, Kratos voltou para verificar Kay e, depois, entrou no alojamento novamente.

— Ele ainda está meditando! — disse Kratos.

— Já anoiteceu, ele precisa voltar para dormir — preocupou-se Sarah.

— Deixa que ele volta sozinho. Vou só cobrir ele e podemos ir dormir — disse Mira.

— Tem certeza? — exclamou Thais.

— Sim, o Kay sabe se cuidar. Ele é preguiçoso, mas quando se trata de matar ghoul, ele vai até o fim — respondeu Mira.

— Matar? Ele não ia domar? — exclamou Viviane.

— Conviver com um ghoul? O Kay nunca aceitaria isso! — disse Mira, retirando-se para buscar uma coberta.

— É por isso que demora tanto? Eles estão brigando dentro da mente do Kay? — perguntou San.

— Não dá para saber. Vamos esperar para ver — disse Slayer.

Mira retornou e colocou a coberta sobre Kay.

— Eu já vou dormir — avisou ela.

O grupo, ainda receoso, foi se deitar também.

Uma hora depois, o nariz de Kay começou a sangrar. Ele abriu os olhos e limpou o sangue.

— Que vontade impressionante... demorou para morrer! — disse Kay, servindo-se de outra xícara de café. Ele notou a coberta e pensou: "Será que foi a Mira?" Dobrou-a e deixou-a sobre uma cadeira.

Em outro ponto do alojamento, Ryuji sentiu algo. "Acho que vai começar!", pensou. Ele pegou o celular e fez uma ligação.

— Venha até o pátio.

Kay se dirigiu ao pátio e ficou parado, concentrando-se enquanto fechava os olhos. O silêncio dominou o lugar.