A CIDADE MAIS RICA DO MUNDO

Houve um breve silêncio, depois a princesinha sorriu e perguntou a Cecília, levantando a cabeça, pois a menina era bem mais alta:

— Como é seu nome?

— Cecília.

E você? E você? — perguntou aos outros.

Depois que todos disseram seus nomes, quis saber os dos cachorrinhos; coçou a cabeça de Pingo e voltou-se para o príncipe:

— Mande os meninos para minha casa; quero hospedá-los.

Oscar, Quico e Vera ficaram um pouco assustados. Como? Então eles iam ficar ali dentro da montanha? E o Padrinho? Não os estaria procurando lá fora? Era preciso explicar que eles tinham de voltar, não podiam ficar na cidade dos anões. Oscar resolveu falar:

— Senhor príncipe, viemos até aqui por acaso, mas agora precisamos voltar para nossa casa. O senhor podia fazer o favor de nos mandar levar para fora da montanha outra vez?

O príncipe consultou os companheiros ao seu lado, cochichou com o guia que havia acompanhado as crianças e respondeu:

— Vocês são meus prisioneiros; irão embora quando eu decidir que podem ir.

Vera ficou nervosa e quis intervir também:

— Mas, príncipe, senhor príncipe, nós não podemos ficar aqui; temos de ir embora.

— Irão quando eu quiser — tornou a responder o príncipe.

A princesa Filó despediu-se de todos e deixou o salão acompanhada por duas anãs vestidas de branco; o príncipe deu ordem ao guia para que levasse as crianças à casa de Filó. Foram todos; atravessaram duas ruas calçadas de ouro; na esquina de uma delas, quatro crianças brincavam com umas pedrinhas coloridas; faziam uma espécie de jogo. Quico ficou espantado e sussurrou aos companheiros:

— São pedras preciosas. Vejam que maravilha!

Pararam uns instantes para olhar; um jogava safiras, outro rubis, outro esmeraldas e outro ametistas. Vera murmurou:

— Que beleza!

Oscar falou baixinho para os outros companheiros:

— Estou pensando em fugir; temos de fugir de qualquer jeito. Como fomos cair prisioneiros desta gente? E depois, até quando? E nossas famílias não ficarão aflitas? Não podemos ficar aqui.

Cecília fingiu-se muito interessada no jogo dos anõezinhos e falou também:

— Oscar tem razão. Vamos tratar de fugir, mas de que jeito? Quem sabe a gente pode dar alguma coisa para o guia e ele nos põe para fora?

— Dar o quê? — disse Lúcia. — Eles têm tudo, ouro em quantidade, eles não vão aceitar nada. O príncipe disse que nesta cidade não se usa dinheiro.

Quico teve uma ideia:

— Quem sabe a gente descobre alguma coisa que lhes agrada muito; vamos perguntar o que o guia mais aprecia e quem sabe assim ele nos ajudará.

O guia estava chamando; perguntaram-lhe o nome, disse que se chamava Julião. Andaram mais um pouco e chegaram à casa da princesa Filó. Era uma linda vivenda, baixinha, com pedrinhas de todas as cores enfeitando as paredes; as telhas eram feitas com

pedaços de diamantes; toda ela tinha um brilho extraordinário. Oscar, que era o mais alto, deu logo uma cabeçada na porta de entrada; na mesma hora o galo cresceu. Os outros riram e ele ficou zangado, dizendo:

— Outros vão dar cabeçadas também...

Entraram. Filó esperava-os num pequeno salão todo atapetado; perguntou se eles estavam com fome e se queriam comer alguma coisa. Veio uma anã trazendo uma bandeja de ouro cheia de bolos de mel; os meninos comeram alguns, depois deram outros aos cachorros. Começaram a conversar com a princesa e foram perdendo a cerimônia; perguntaram muita coisa.

A princesa ria e achava muita graça. Procurou brincar com Pipoca, mas Pipoca estava desconfiado, sem querer muita brincadeira. A aia da princesa simpatizou com Pingo; a todo momento procurava coçar a barriga dele, mas Pingo, aborrecido, fingia querer pegar a mãozinha da aia fazendo "nhoc". Ela dava um gritinho e recolhia a mão.

As outras anãs, companheiras de Filó, contaram que há dois dias esperavam a chegada dos estrangeiros, pois Julião, que era a eterna sentinela da cidade, tinha ouvido rumor de gente subindo a montanha. Então foi ver; uma noite, saiu por uma porta invisível, que só ele conhecia, e foi espiar os estrangeiros. Viu as barracas, rondou por elas, sondou tudo, ouviu os latidos dos cachorros...

As crianças lembraram-se de que Eduardo tinha ouvido passos uma noite à volta das barracas; tinha sido Julião. Vera perguntou se eles não tocavam sinos durante a noite; responderam que sim. Há uma semana os sinos tocavam festivamente para anunciar o casamento dos príncipes; de dia e de noite.

Estavam todos sentados no tapete à volta da princesa; depois de conversarem muito, Filó perguntou se eles não queriam conhecer a cidade. Os meninos não queriam outra coisa; saíram acompanhando Julião, que ia na frente, e mais três anões que se juntaram à comitiva. Filó ficou numa das janelas da casa, rodeada de safiras, e disse adeus com a mãozinha cheia de anéis. Lúcia murmurou:

— Que amor de princesa!

Dobraram uma esquina, atravessaram uma rua e entraram num pequeno edifício; em todas as janelas havia gente espiando, pois a notícia correu por toda a cidade e todos queriam ver as crianças estrangeiras. As ruas e casas eram iluminadas com lamparinas; Oscar perguntou a Julião o que havia nas lamparinas; o anão respondeu que era uma resina que escorria das paredes de certa gruta e produzia a luz que iluminava a cidade.

Entraram no pequeno edifício a que chamavam Casa do Mel. Havia uma torre com um brilhante em cima indicando o mel. Havia milhares de colmeias lá dentro, tratadas com muito carinho, pois o único açúcar que havia na cidade era proveniente do mel que as abelhas fabricavam. Elas eram tão mansas que passeavam

sobre as cabeças e as mãos dos anões que as tratavam. Havia seis anões tratando das abelhas. Depois de terem olhado tudo muito bem, deixaram a Casa do Mel e foram à Casa dos Tecidos.

Nessa outra casa, mais adiante, toda bordada de filigrana de ouro na fachada, havia milhares de aranhas tecendo para os anões. Os fios que elas produziam eram depois mergulhados em ouro líquido e só então serviam para a confecção de roupas para todos os habitantes da cidade. Havia aranhas de várias espécies; umas teciam fio fininho, que servia para fazer as sedas; outras, fios mais espessos, para os veludos; outras teciam fios ainda mais grossos que eram utilizados na fabricação de sapatos.

Por isso todos os habitantes andavam bem vestidos, com roupas de veludo e seda tecidas de ouro; não havia gente malvestida naquela cidade. Seis anões tratavam das aranhas, que eram também muito mansas, não faziam mal e passeavam sobre suas mãos e cabeças. As crianças, porém, não tiveram coragem de chegar muito perto; ficaram olhando de longe.

Deixaram a Casa dos Tecidos e foram ver a Casa dos Sapatos; aí eram feitos sapatos para toda a cidade. Como não havia lama nem pó naquela cidade encantadora, os sapatos eram também forrados de veludo e ouro. Tinham as pontas reviradas e muitos deles eram enfeitados com safiras e rubis.

Deixaram a Casa dos Sapatos e dirigiram-se para outro lado da cidade; ali moravam os galináceos de que se alimentavam os habitantes da cidade. Viram então milhares de galinhas numa espécie de galinheiro, cujos poleiros eram de ouro. Eram todas da raça garnisé. Vera perguntou a Julião:

— Dão milho às galinhas?

— Não conhecemos isso — disse Julião. — Damos bichinhos da terra e verduras.

Então eles viram doze anõezinhos cavando a terra à procura de minhocas para dar às galinhas; uma anã gorda e um pouco velha andava de um lado para outro juntando os ovos numa panela de ouro. Lúcia perguntou baixinho para fazer graça:

— Os ovos também são de ouro?

— Psiu! — fez Quico. — Não fale assim...

Foram depois visitar a igreja; era uma linda capela cheia de imagens; Nossa Senhora tinha um Menino Jesus de ouro no colo e, sobre a cabeça, um diadema de brilhantes.

Ajoelharam e rezaram; pediram a Deus que acalmasse Padrinho, que devia estar aflito com o desaparecimento deles. Mas estavam gostando tanto de tudo quanto viam... Quando iam deixando a igreja, pan!, uma batida de Quico na trave da porta de entrada e um galo na testa. Os outros riram; nisso ouviram o som de um sino; era um som lindíssimo e muito agradável. Julião disse:

— É hora do almoço; vamos voltar.

Foram outra vez para a casa da princesa, que os esperava com o almoço; entraram nos aposentos de Filó para lavar as mãos e pentear-se; foram depois conduzidos a uma sala onde eram servidas as refeições. Filó sentou-se numa almofada diante de uma mesinha com pés de esmeralda; as crianças sentaram-se à volta sobre almofadas de veludo e ouro. Não havia cadeiras. A princesa ria e conversava; queria saber o que as crianças tinham achado mais interessante. Foi servido o almoço, veio um prato com coxas de garnisé e pão de mel com bolos de cará; depois, chá feito com ervas da montanha.

As crianças comeram um pouco porque tinham fome, mas não gostaram do almoço; os pratos eram de ouro, assim como os talheres. A princesa explicou que o chá era feito de uma planta que eles cultivavam, mas nenhuma das crianças conseguiu tomar. Pingo e Pipoca deliciaram-se com os ossos de frango garnisé; já estavam familiarizados e corriam sobre as calçadas de ouro fazendo grande sucesso entre os habitantes da cidade.

Os meninos escorregavam muito; então Filó mandou vir sapatos próprios, com sola de veludo, para que eles não caíssem, mas não houve sapatos que servissem, pois os pés das crianças eram enormes. A princesa ordenou que fossem feitos sapatos apropriados e as medidas foram tomadas; só ficariam prontos no dia seguinte. Depois do almoço, as crianças permaneceram sentadas no chão conversando com a princesa Filó e as suas companheiras. A princesa teve muitas visitas naquele dia; toda a cidade queria ver aquelas crianças desconhecidas, grandes como gigantes. Estranhavam também os cachorros; muitos não conheciam animal dessa espécie; sabiam da existência de cachorros pelos desenhos que haviam herdado dos antepassados, mas há muitos, muitos anos, não havia cães na estranha cidade dos anõezinhos.