No salão principal havia uma mesa baixinha própria para os anões; tinha uns oito metros de comprimento e estava coberta de iguarias. Quico pensou nas coisas gostosas que iria comer; ficou tão distraído procurando adivinhar o que havia sobre as mesas que não reparou na porta quando passou. Pan! Uma cabeçada. Os outros quiseram rir, mas Quico fez carranca.
Como não havia música, tocavam sinos. Eram sinos pequenos e grandes, todos de ouro, e estavam colocados dentro dos salões; quando os príncipes entraram no salão principal, os sinos repicaram: dlin! dlon! dlun! dlin! dlon! dlun!
Todos desfilaram diante dos príncipes para cumprimentá-los; inclinavam-se diante deles e passavam adiante. Quando chegou a vez das crianças, Oscar foi o primeiro; fez uma grande reverência diante da princesa e rasgou um bom pedaço da meia comprida, que estava muito justa. Fingiu não perceber o acidente e continuou assim mesmo, com a meia rasgada em cima do joelho. Os outros também fizeram reverências, cada um por sua vez.
Cecília inclinou-se e o vestido cor do arco-íris, que era de gaze muito fina, deu uma rabanada na cara de Vera; Lúcia, que era a mais desembaraçada, fez o vestido cor do céu virar-se e aparecerem todas as estrelas; Vera, com o vestido cor de sonho, tropeçou na saia comprida e quase foi ao chão.
Começou o banquete; Cecília viu um prato todo enfeitado de vermelho e ficou com água na boca; pensou que fosse tomate, mas lá não havia tomates, então perguntou para uma anãzinha ao seu lado:
— Faça o favor de me dizer que prato é aquele?
— Cristas de galo — respondeu a anã.
Ela deu uma cotovelada em Lúcia:
— Vamos comer cristas de galo?
Lúcia disse que preferia outro prato, que ela estava olhando desde o princípio e devia ser novidade. Perguntou para um anão de bigode branco que estava comendo com muito apetite:
— Faça o favor de me dizer que prato é aquele coberto com molho esbranquiçado?
— Língua de galo — respondeu o anão, com a boca cheia.
Vera cochichou:
— Nossa Senhora! Tudo aqui é de galo! Também, coitados, eles não têm mais nada para comer.
— Mas têm ouro em quantidade que nós não temos — respondeu Lúcia.
— Mas o que adianta tanto ouro se não podem comprar nem um bife, nem batatas fritas? — questionou Vera, que gostava muito de batatas fritas.
Cecília disse:
— E quantos galos não precisam matar para fazer esse prato? Língua é uma coisa tão pequenina, decerto é do tamanho da minha unha.
— Nem fale — respondeu Lúcia.
Quico, um pouco adiante, comia um quitute amarelo; Oscar perguntou:
— O que você está comendo, Quico?
— Ovos de galo — ele respondeu.
As meninas começaram a rir, e Cecília perguntou:
— De galo ou de galinha?
Riram mais e começaram a comer ovos; havia ovos em todas as modalidades: cozidos, fritos, crus, temperados, sem tempero, com mel, sem mel, com casca, sem casca...
Os doces também eram variados e todos feitos com mel, pois não havia açúcar. A única bebida era chá, feito com uma erva perfumada que brotava dentro da montanha.
Os anões comiam, bebiam, conversavam e riam; os príncipes sorriam, os sinos tocavam, os cachorros latiam ou roíam ossos debaixo da mesa. A pena de galo de Oscar tinha caído nas costas; a de Quico estava dependurada numa orelha. O vestido cor de sonho de Vera estava meio rasgado porque, à saída da igreja, um anão o pisou com toda a força.
Os cachorrinhos já estavam sem penas nas cabeças e com as jaquetas fora do lugar; Pingo tinha a sua na barriga; andavam debaixo das mesas e, quando as pessoas os esqueciam, davam latidos pedindo ossos de galo.
Mais de uma hora ficaram ali comendo e bebendo; o anão mais velho da montanha, o de longas barbas brancas que tinha ouvido falar nas flores, nos pássaros, nos livros e na música, fez um grande discurso desejando felicidade aos jovens príncipes.
Em seguida houve o baile; a música seria a dos sinos de ouro tocada por doze anões vestidos de verde; formaram-se os pares. Quinze de um lado e quinze de outro; dançavam uma espécie de quadrilha, pois não conheciam danças modernas, iam para diante e para trás fazendo grandes reverências uns para os outros.
As crianças, entusiasmadas com o espetáculo, ficaram num canto, olhando. Os príncipes foram os primeiros a sair da fila; ficaram no centro do salão e, quando os sinos começavam a tocar, davam voltas de mãos dadas por todo o salão. Os outros pares iam atrás e, quando se encontravam, inclinavam-se como se estivessem se cumprimentando pela primeira vez.
Oscar e Quico estavam achando muita graça e queriam também entrar na dança, mas as meninas não deixaram; eles iriam atrapalhar, pois eram muito mais altos que os anões.
Quando terminou a dança, todo o mundo bateu palmas. Depois os príncipes sentaram-se em poltronas de ouro colocadas num estrado bem alto e ficaram assistindo às danças dos outros. Os convidados dançaram durante muito tempo, mas sempre a mesma coisa e os sinos só tocavam da mesma maneira: dlin! dlon! dlun!
Oscar e Cecília, Quico e Vera foram dançar também; todos os anões ficaram parados e assistindo. Lúcia pegou Pingo no colo e
foi também para o meio do salão. Foi um sucesso, mas não puderam dançar nada moderno porque os sinos repicavam sempre a mesma coisa. Os anões voltaram a saracotear. Então Oscar avisou a meninada:
— É hora! Vamos fugir enquanto eles ficam dançando.
Enquanto os anões formavam pares e círculos, as crianças foram saindo uma a uma e se esgueirando por uma porta lateral que não tinha ninguém perto. Foram dar numa ruazinha deserta atrás do palácio; Oscar, que ia chefiando, disse:
— Venham vindo como se estivéssemos passeando; assim, se encontrarmos alguém, não desconfiará. Trouxeram os cachorros?
— Estão aqui conosco.
— Então vamos.
Viraram ruas, torceram esquinas, subiram, desceram; quando viam algum grupo de anões, cumprimentavam e riam como se estivessem se divertindo. De vez em quando Vera dizia:
— Será que estamos certos?
— Estamos — respondia Oscar. — Temos que subir uma ladeira muito íngreme, depois chegamos àquele corredor escuro que vai dar no alto da montanha.
Cecília começou a rir:
— O que será que Padrinho vai pensar quando nos vir com estas roupas?
— Vai achar muita graça — disse Lúcia.
Depois de terem caminhado um bom tempo, chegaram à entrada de um corredor comprido, onde não havia iluminação alguma. Espiaram e ficaram com um pouco de medo, sem coragem de continuar a fuga. Quico quis mostrar valentia e entrou primeiro, dizendo:
— Vocês vêm ou não vêm?
Lúcia disse:
— Afinal a princesinha Filó foi tão boa para nós e nós vamos embora sem falar nada para ela? Acho que isso é ingratidão.
— Também estou achando — respondeu Cecília.
— Mas o príncipe não quer deixar a gente ir embora — disse Quico. — Então vamos ficar prisioneiros aqui a vida inteira?
— Se a gente pedisse a Filó, quem sabe deixaria a gente ir?
— Vamos experimentar — disse Vera.
Nesse instante ouviram um barulhinho no fim do corredor; abaixaram-se num canto e ficaram quietinhos, sem saber o que fazer. Viram então uma luzinha numa lanterna e depois apareceu Julião, que como sempre estava de sentinela. Quando viu as crianças acocoradas no canto escuro, levantou a lanterna e falou:
— O que estão fazendo aqui? Deixaram o baile?
— Não — respondeu Quico bem depressa. — Saímos para dar uma voltinha e tomar um pouco de ar, lá dentro estava muito quente. Você não foi à festa, Julião?
— Eu assisti ao casamento e voltei ao meu trabalho — respondeu Julião. — Uma bonita festa, não acharam?
— Linda — disse Cecília. — Tão linda que até vamos voltar para lá e continuar a assistir às danças. O que vocês acham?
Todos concordaram e voltaram ao palácio do príncipe, onde a festa estava terminando. Quico suspirou:
— Qual! Não há meio de fugir desta montanha! Estou até desanimado!
— Não desanime — disse Vera. — Vamos sair, sim.
Quando chegaram ao palácio, os convidados estavam se retirando; antes de sair inclinavam-se e agradeciam. Ficaram as aias e o casal de príncipes. Filó chamou as crianças para junto deles e disse:
— Vocês agora vão voltar para seu país, meus filhos. Já conversei com meu marido e ele concordou. Hoje à noite Julião irá levá-los para o alto da montanha. Gostei muito de vocês, mas infelizmente não podem viver aqui. Vocês têm seus pais, suas mães e eles devem estar aflitos sem notícias...
As crianças entreolharam-se e deram suspiros de satisfação; a princesinha era mesmo um amor. O príncipe falou também:
— Gostamos muito de vocês; são crianças bem-educadas e obedientes; não tentaram fugir nenhuma vez, por isso gostei muito. Mas a nossa cidade não serve para vocês viverem.
As crianças ficaram vermelhas quando o príncipe disse que elas não haviam tentado frigir; Oscar mais ainda. Então perguntou para disfarçar:
— Senhor príncipe, será que podemos voltar algum dia para visitá-los? Gostamos tanto da sua cidade...
O príncipe olhou a princesa:
— Filó quer que vocês voltem algum dia para uma visita.
Cecília, que gostava muito de dar presentes, perguntou:
— E os senhores permitem que eu traga uma lembrança lá de fora? Só uma lembrancinha?
Filó riu-se e perguntou:
— O que você quer trazer, Cecília?
A menina disse que queria trazer pássaros para enfeitar a cidade; Vera traria flores para perfumar; Lúcia traria livros para instruir; Oscar traria música para alegrar. Quico lembrou-se do sol, mas como não podia trazê-lo, lembrou-se de repente e disse:
— Eu trago um cavalo!
Todos riram. Depois disseram que nada poderiam fazer com um cavalo; então Quico prometeu levar café, pois a princesa tinha ouvido falar em café e tinha muita vontade de provar uma xícara dessa bebida tão gostosa.