Ventos Sobre as Águas

🌊 Capítulo Especial – Ventos Sobre as Águas

O Navio “Aurora Negra” cortava as ondas com firmeza. As velas tremulavam sob o céu claro, e o som das águas batendo no casco preenchia o ar com uma calma que os amigos não sentiam há dias. Ainda faltavam algumas horas até que avistassem o lendário Continente Zero, e o mar estava tranquilo — um raro presente.

No convés, Mike estava de pé próximo à proa, os olhos fixos no horizonte.

— Pensando no próximo fragmento? — perguntou Julhian, se aproximando com as mãos nos bolsos e a katana presa às costas.

Mike assentiu levemente.

— Estamos ficando sem tempo. Ainda faltam quatro páginas. E algo me diz que as coisas vão ficar mais perigosas a partir daqui.

Julhian cruzou os braços.

— Você sempre diz isso. Mas a gente continua sobrevivendo.

— Por enquanto — respondeu Mike, com um sorriso de canto. — Mas sabe o que realmente me preocupa?

— O quê?

— A Karina e a Serena... deixadas sozinhas na cozinha do navio.

Nesse momento, um estouro ecoou da parte interna da embarcação, seguido de um grito:

ALGUÉM ME DÁ ÁGUA, O ARROZ PEGOU FOGO!!

Mike e Julhian trocaram olhares.

— É, tá começando.

No refeitório improvisado, Karina estava agachada com uma panela fumegante nas mãos, abanando com desespero. Serena tentava conjurar um jato d’água preciso, mas só conseguia criar uma neblina.

— Eu te disse que arroz precisa de três partes de água! — disse Serena, suando nervosa.

— Eu tava tentando seguir o instinto! — rebateu Karina, abanando ainda mais. — E foi você quem disse “deixa no fogo alto”! Isso é claramente sua culpa!

— Era só pra ferver mais rápido...

A porta se abriu com um baque.

— Que cheiro de fumaça é esse?! — disse Natália, entrando com os olhos arregalados.

— Nosso almoço virou carvão. — Karina largou a panela em cima de um barril. — Eu sou eletricista de combate, não cozinheira!

Piter apareceu logo atrás, já com um copo de suco na mão.

— Podíamos só comer pão e queijo hoje...

— VOCÊ TÁ BEBENDO MEU SUCO DE FRUTA PROIBIDA?! — gritou Serena.

— Tava na geladeira. Lei do mar.

Kyouran apareceu por último, mastigando calmamente uma maçã.

— Todos vocês são terríveis na cozinha.

— Ah, como se você soubesse cozinhar, veneno ambulante — provocou Karina.

— Sei preparar carne seca com tempero de pimenta e raiz tóxica. Quer experimentar?

Karina recuou meio passo.

— ...Passo.

Horas mais tarde, após um almoço improvisado (muito pão, queijo e sucos estranhos), os sete estavam sentados no convés, observando o mar, cobertos com mantas por conta da brisa fria que começava a chegar.

— Sabem... — disse Natália, deitada de costas olhando o céu — às vezes me pergunto se, quando tudo isso acabar, vamos conseguir viver uma vida normal.

Serena se aninhou contra uma das caixas de suprimentos.

— Eu não saberia nem por onde começar... uma vida normal parece tão distante agora.

— Eu queria abrir uma taverna — murmurou Piter, do nada.

Todos o olharam, surpresos.

— Uma taverna? — repetiu Karina.

— É. Simples. Boa música, boas bebidas, sem monstros de gelo tentando me matar.

— Isso é... surpreendentemente específico e pacífico. — Julhian riu.

Mike inclinou a cabeça, pensativo.

— Eu não sei se quero uma vida normal. Acho que... quero entender esse mundo até o fim. Descobrir os segredos por trás das páginas.

— Você quer carregar tudo sozinho, né? — disse Kyouran, olhando para ele com seus olhos penetrantes.

Mike suspirou.

— Alguém tem que fazer isso.

— Mas você não está sozinho — disse Serena, suavemente.

— É — completou Julhian. — Nós estamos com você. Até o fim.

Um silêncio confortável pairou sobre o grupo por alguns segundos, interrompido apenas pelo som das ondas e do navio avançando firme.

— Ali! — gritou Natália, se levantando e apontando.

Todos olharam para o horizonte. No meio do nevoeiro que surgia lentamente, contornos gelados começavam a se formar: geleiras, florestas de pinheiros, montanhas brancas... o Continente Zero estava finalmente diante deles.

— Chegamos... — murmurou Mike.

Karina esticou os braços.

— Preparados para congelar até os ossos?

— Só se você não queimar nossa comida de novo — respondeu Serena, rindo.

— Sem piadas com o arroz... sério. É um assunto sensível.

O grupo riu, mesmo com o frio já se aproximando.

O clima era gélido, mas os corações estavam aquecidos.

A verdadeira jornada continuaria em breve.