Naoya, ainda perplexo com a pergunta de Sayuri, sentiu um desconforto crescente em seu peito. O tom de voz dela, tão frágil e hesitante, contrastava com a clareza do que ela acabara de perguntar. Ele não sabia ao certo o que ela queria dizer com aquilo, mas algo em sua expressão lhe dizia que havia muito mais do que ele estava percebendo.
— Sayuri... — ele começou, mas parou ao ver que ela mantinha a cabeça baixa, evitando seu olhar.
O silêncio entre eles se prolongou, e Naoya sentiu a pressão de cada segundo que passava. Ele sabia que sua irmã esperava uma resposta, mas como ele poderia responder algo que nem entendia completamente? Desde que eram pequenos, ele sempre a via como sua irmã mais nova, sua responsabilidade, a quem ele precisava proteger. Mas agora, a pergunta dela o fazia questionar se ele havia entendido tudo errado.
Sayuri, por sua vez, permaneceu imóvel, suas mãos apertando levemente a barra de sua saia. Ela estava lutando contra a onda de emoções que ameaçava transbordar, mas sentia que já não podia mais esconder o que estava em seu coração. Cada vez que ela olhava para Naoya, algo dentro dela a fazia desejar ser mais do que apenas a "irmãzinha". E o medo de ser rejeitada a fazia hesitar, mas agora, depois de tudo, ela precisava de uma resposta.
— O que eu quero dizer, Onii-sama... — ela murmurou, ainda sem erguer a cabeça. — É que, às vezes, eu sinto que você só me vê como alguém que deve ser protegida. Como se eu fosse sempre aquela menininha frágil... Mas eu não sou mais assim.
Naoya piscou, sentindo o peso das palavras dela. Ele nunca havia pensado nisso dessa forma, mas ao ouvi-la, uma parte dele começou a perceber o quão pouco ele entendia dos sentimentos de Sayuri.
— Eu sei que você cresceu, Sayuri... — ele disse, tentando ser sincero. — Mas você sempre será importante para mim. É só que... você é minha irmã, e é natural eu querer cuidar de você.
Sayuri finalmente levantou a cabeça, seus olhos tristes encontrando os de Naoya. Ela mordeu o lábio, hesitando, mas decidiu continuar.
— Mas eu não quero que você apenas me veja assim. — Sua voz tremeu. — Eu não quero ser apenas sua irmãzinha que você sente que precisa proteger. Eu quero ser alguém com quem você pode compartilhar tudo, alguém com quem você se importa de verdade, não só por ser sua irmã, mas alguém que você pode...
Naoya se sentiu ainda mais confuso. O que Sayuri estava tentando dizer ia além de uma simples reclamação sobre a maneira como ele a tratava. Havia algo mais profundo ali, algo que ele temia estar começando a entender, mas que, ao mesmo tempo, não conseguia aceitar.
— Sayuri, eu... — Ele parou, as palavras fugindo de sua mente. Como ele poderia responder algo assim? Ele a amava, claro, mas o que ela estava sugerindo parecia ultrapassar os limites que ele sempre considerou inquebráveis.
— Não precisa dizer nada — interrompeu ela, percebendo o desconforto dele. — Eu só queria que você soubesse como me sinto. Talvez eu esteja errada, talvez isso tudo seja uma confusão minha, mas... esses sentimentos estão aqui, e eu não consigo mais ignorá-los. Eu quero ser mais do que a sua irmãzinha, eu quero ser a sua…
Enquanto dizia ela simplesmente parou suas palavras e olhou para seu irmão que a olhava atônito. O coração de Naoya acelerou, e ele se viu sem saber o que fazer.
Sayuri sempre fora sua irmãzinha, mas agora, ele via que os sentimentos dela iam além do que ele imaginava. E por mais que ele quisesse negar, a verdade era que ele também não conseguia ignorar a profundidade daquele momento.
Um longo silêncio se instalou novamente, e dessa vez, ambos se sentiram incapazes de preenchê-lo com palavras.
Como se quebrasse o silêncio, Sayuri se virou e saiu do quarto de seu irmão, aquela conversa entre eles fizera com que Naoya pensasse sobre sua fraqueza em relação a corrigir o mal entendido e ver também a coragem que a sua irmã teve ao dizer aquelas palavras, deixando ele sem saber como reagir ou saber como agir. Como ele poderia olhar nos olhos de sua irmã de agora em diante? Aquilo faria com que os dois não mais conseguissem se olhar por um bom tempo e como seus pais estavam viajando estaria só os dois sozinhos naquela casa.
Enquanto tentava processar tudo que havia acontecido naquele dia, uma notificação havia chamado sua atenção, uma nova mensagem havia chegado do número desconhecido. Aquela mensagem havia feito com que ele se sentisse mais confuso ainda, com o objetivo daquela pessoa.
"Vejo que ainda não foi capaz de lembrar quem eu sou ou ter uma pista sobre minha identidade. Tudo bem, eu vou ser boazinha e te dar uma chance de descobrir minha real identidade. Isso é só porque possivelmente você já deve ter recebido uma confissão da sua kouhai e ter ficado sem saber como responder. Vamos a uma gincana? A partir de agora, você vai conseguir responder as minhas mensagens, só não pode me ligar, e se conseguir descobrir quem eu realmente sou você vence, se não conseguir vou continuar a te pertubar. Aliás, você já cumpriu a parte da sua promessa?"
Aquela mensagem confusa havia feito Naoya se perguntar se a outra pessoa que estava lhe enviando mensagem já estava impaciente sobre tudo isso e também havia feito ele se lembrar da sua promessa e de que deveria cumpri-la, causando ainda mais motivos para que ele não conseguisse processar o que havia acontecido.
Naquela tradicional sala japonesa, Naoya tentava manter a calma, olhando para os finos detalhes do ambiente, que remetia a uma tradição muito presente na era Edo. Ele observava atentamente as paredes cobertas de portas de shoji, o tatame bem cuidado no chão, e as gravuras delicadas que decoravam o espaço. Sentindo a serenidade que a sala transmitia, ele respirou fundo, tentando absorver aquela calma para si.
As lembranças do que havia acontecido anteriormente ainda pesavam em sua mente, mas o ambiente o ajudava a se concentrar e refletir. Estava ali em busca de clareza e talvez uma solução para o que o afligia. Naoya sabia que precisava encontrar equilíbrio para lidar com tudo o que estava acontecendo em sua vida.
Naoya permaneceu em silêncio, deixando que a tranquilidade daquela sala tradicional o envolvesse. Ele fechou os olhos por um momento, ouvindo apenas o som suave do vento que passava pelas frestas das portas shoji. As palavras de Sayuri ainda ecoavam em sua mente, misturando-se à misteriosa mensagem que havia recebido no celular. Tudo parecia emaranhado, e ele se via em uma encruzilhada sem saber qual caminho escolher.
Quando finalmente abriu os olhos, Naoya percebeu uma figura entrando na sala. Era o agente do governo, com a expressão séria de sempre, o que fez Naoya tentar decifrar seu olhar. O homem se aproximou, jogou uma pasta sobre a mesa e se sentou na almofada à sua frente.
— Senhor Akagawa, você sabe por que eu o chamei aqui?
A pergunta repentina fez Naoya se sobressaltar, sem saber como responder ou sequer por onde começar.
— Akagawa Naoya, 16 anos, estudante do ensino médio e noivo de Mayumi Hanazono — continuou o agente, sem esperar uma resposta. — Suas notas são excelentes em algumas matérias e medianas em esportes. Não participa de nenhum clube atualmente e, até agora, não demonstrou interesse em nenhum.
Enquanto o agente lia seus dados, Naoya o observava com curiosidade, tentando entender o que estava acontecendo. Inúmeras perguntas começaram a surgir em sua mente. O agente fechou a pasta e olhou diretamente para ele, cruzando as mãos sobre a mesa.
— Já pensou na possibilidade de trocar de esposa?
A pergunta repentina pegou Naoya de surpresa. Ele olhou seriamente para o agente, sem entender o rumo daquela conversa.
— O que você quer dizer com isso?
— O que quero saber é: você já considerou cancelar seu casamento atual?
Naoya ficou confuso, tentando interpretar o clima da situação.
— Eu nunca pensei nisso... Não sei onde você quer chegar com esse assunto.
— Vou ser mais claro — disse o agente, adotando um tom mais direto. — Analisamos seu perfil e percebemos um pequeno erro que levou à união de duas pessoas incompatíveis. A questão é: você tem a oportunidade de cancelar seu casamento atual e ser emparelhado com alguém realmente compatível.
Naoya colocou as mãos no rosto, incrédulo com o que acabara de ouvir. Ele, finalmente, tinha a chance de cancelar aquele casamento arranjado pelo governo e talvez cumprir sua promessa à amiga de infância. No entanto, ao pensar nisso, seu coração apertou ao lembrar-se dos momentos que viveu com Mayumi. Sua mente foi inundada por flashes de lembranças, o que fez sua decisão de aceitar a proposta ser adiada pela confusão em seus sentimentos.
— E então? — continuou o agente. — O que me diz, senhor Akagawa? Você continuará com seu casamento atual ou prefere retornar ao processo de triagem e ser designado a uma nova esposa, baseada nos seus dados? A decisão é sua.
Naoya assentiu, tentando controlar a confusão em seu coração. Sem conseguir processar tudo de imediato, ele abaixou a cabeça, incapaz de manter contato visual com o agente à sua frente.
Naoya permaneceu em silêncio, tentando processar a enxurrada de informações que acabara de receber. A proposta do agente era inesperada, quase surreal. Ele finalmente tinha a chance de escapar de um casamento arranjado, imposto pelo governo, algo que sempre o incomodou, mas que ele havia aprendido a aceitar com o tempo. O dilema agora era maior do que ele podia ter imaginado.
Mayumi, sua noiva, com quem ele havia começado a criar uma vida e construir memórias, não era apenas uma desconhecida qualquer. Eles tinham compartilhado momentos significativos, e ele não podia negar o impacto que ela tinha em sua vida. No entanto, a promessa que fizera no passado à sua amiga de infância agora parecia uma saída de tudo isso, uma oportunidade de reconectar-se com um futuro que ele havia idealizado.
O agente observava Naoya pacientemente, percebendo a luta interna que ele enfrentava. Não era uma decisão fácil, e o silêncio na sala parecia se tornar mais pesado a cada segundo que passava.
— Eu sei que isso não é simples — o agente quebrou o silêncio, mantendo o tom profissional. — Mas, senhor Akagawa, você deve entender que não há muito tempo para refletir. O governo precisa de uma resposta.
Naoya abaixou a cabeça, pressionando as têmporas com as mãos, sentindo a pressão de uma decisão que poderia mudar completamente sua vida. De um lado, estava o caminho que ele havia traçado com Mayumi, uma vida que ele estava começando a construir, apesar das circunstâncias que os uniram. Do outro, havia a chance de começar de novo, de tentar cumprir uma promessa que ele havia mantido no fundo do coração por tanto tempo.
— Não posso tomar essa decisão agora... — Naoya finalmente murmurou, a voz fraca de incerteza. — Isso envolve muito mais do que só meus sentimentos.
O agente olhou para ele, impassível.
— Entendo. Mas a sua decisão não pode demorar muito. O governo tem prazos, e sua triagem será reavaliada em breve. Pense bem, senhor Akagawa. Às vezes, seguir o coração é mais arriscado do que seguir a razão.
Com essas palavras, o agente se levantou, pegou a pasta da mesa e se dirigiu à porta. Antes de sair, lançou um último olhar para Naoya, como se esperasse uma última palavra. Mas Naoya permaneceu em silêncio, imerso em seus próprios pensamentos. Quando a porta deslizou suavemente para fechar, ele sentiu o peso da decisão cair sobre ele como nunca antes.