Capítulo 51 - Vazio das Verdades

O silêncio pairava como um véu pesado sobre o salão etéreo de chá, onde apenas o sutil vapor que emergia da porcelana de Aurelius se movia com naturalidade. Do lado oposto, Andras mantinha os braços cruzados, embora a inquietação em seu olhar traísse a aparente compostura.

Andras: "Ele vai... ficar bem?" - Indagou ela, rompendo o silêncio, como quem busca consolo em uma voz que carrega séculos de sabedoria.

Aurelius não respondeu de imediato. Seus olhos permaneciam fixos no horizonte distante, como se contemplasse um quadro cuja pintura apenas ele era capaz de ver. Enfim, com um sorriso tênue, quase melancólico, ele respondeu:

Aurelius: "Bem... eu já sei o que vai acontecer, Andras. Mas que graça teria se dissesse?" - Seu tom era calmo, mas não despreocupado. Era o tipo de calma que vem apenas com o fardo de saber demais.

Andras estreitou os olhos, desconfiada, quase irritada:

Andras: "Você está dizendo que tudo isso já estava previsto?"

Aurelius: "Sim. Inclusive... neste exato momento, Lúcifer está despertando de sua incubação. É patético que alguém como ele ainda não tenha percebido que Midoki não está morto." - A voz de Aurelius soou mais grave, como se algo denso se insinuasse entre as camadas de ar.

Andras: "Ele vai receber aquela habilidade, não é...?" - Sussurrou Andras, os olhos arregalados em choque.

Aurelius: "Sim... aquela mesma. Ele já vinha cobiçando os poderes de Canvos há muito tempo." - Aurelius cruzou as mãos diante do peito, com os dedos entrelaçados de forma cerimonial.

Aurelius: "Mas há uma coisa que ele... não sabe." - Acrescentou ele, fitando Andras com os olhos semicerrados.

Um silêncio gélido pairou. Andras ia perguntar o quê, mas antes que pudesse vocalizar qualquer palavra, a cena esmaeceu, e o leitor foi privado da revelação.

Nas profundezas do Submundo, onde o tempo se curvava em servidão à escuridão, Lúcifer despertava. Seu corpo imponente se ergueu com lentidão cerimonial da câmara de incubação, gotas negras de essência abissal escorrendo de sua pele luminosa e pálida.

Diante dele, Stolas, curvado como um servo ancestral, foi o primeiro a falar:

Stolas: "Oh, Lorde... finalmente."

Ele se ajoelhou, com reverência quase febril.

Stolas: "Esta habilidade agora está... na palma de suas mãos. Com ela, certamente... descobrirá o último requisito para obter o Caos."

Lúcifer permaneceu em silêncio.

Seus olhos, dois eclipses inversos, voltaram-se para Chort Mammon, ajoelhado e imóvel como um totem vivo. Com um único toque em sua fronte, Lúcifer absorveu o fluxo absoluto das informações futuras daquele clone, rompendo com o tempo como se fosse papel velho.

Pensamentos fervilharam:

Lúcifer (pensando): "Então, a minha maior ameaça... isso é...Throk... o maldito Orc dos Cavaleiros Templários... Mesmo após eu ter assassinado o líder deles, ainda agem nas sombras... E pior... mataram um dos clones mais poderosos de Mammon..."

Stolas, mesmo hesitante, arriscou interromper o silêncio mental de seu senhor:

- Stolas: "Meu senhor... perdoe a interrupção. Um dos Errantes Celestiais trouxe uma notícia boa... e uma ruim."

Lúcifer: "Vá direto ao ponto." - Ordenou Lúcifer, sem emoção, como se sua própria voz esmagasse a vontade dos vivos.

Stolas se encolheu por reflexo, então prosseguiu:

Stolas: "Astaroth... foi derrotado."

O silêncio que se seguiu foi mortal.

Lúcifer virou o rosto lentamente, encarando Stolas como quem examina uma rachadura num cristal indestrutível.

Lúcifer: "Por quem?" - A pergunta saiu como um trovão contido.

Stolas: "Astaroth caiu, mas não havia demônios por perto para testemunhar quem o fez. A notícia boa é que os suspeitos estão sendo caçados por Ardat Lili nesse exato instante. E o... Belphegor..."

Stolas hesitou.

- Lúcifer: "Fale logo." - Exigiu Lúcifer.

- Stolas: "Belphegor que confrontou sua vontade no passado... agora parece ter se aliado aos Cavaleiros Templários."

O Portador da Luz então sussurrou, mais para si do que para os outros:

Lúcifer (pensando): "Isso só pode ser piada. Então alguém... entre eles... tem poder suficiente para derrotar um clone do Mammon e ainda contrariar os Decretos do Abismo... impressionante."

Virando-se por completo, Lúcifer caminhou até o trono espiralado de vértebras negras e, sem encarar seu servo, ordenou:

Lúcifer: "Levante-se. Entre em contato com Malphas, imediatamente. Mande-o atrás desses vermes... antes que Belphegor encontre Lili."

Stolas: "Agora mesmo, goshujin-sama!" - Disse Stolas, sumindo em um clarão obscuro.

O cenário mudava abruptamente. O som da madeira rangendo sob as ondas preenchia o ar. Um navio enorme. Cortando as águas cinzentas de um mar esquecido pelos mapas, navegava solitário.

Entre suas velas encantadas, era possível ver dezenas de Pukains, cuidando da embarcação com uma graça caótica. Mas no interior do navio... o ambiente era diferente.

Em um dos quartos, onde o tempo parecia desacelerar, Spink estava deitada em uma cama forrada com lençóis brancos, respirando de forma tênue.

Ao lado dela, Namiros segurava sua mão com ternura e uma raiva muda. A dor nos olhos dele não era de desespero, era de culpa.

E assim, o capítulo se encerrava.