Capítulo 62 - Pouca Compaixão

O silêncio era pesado. Não aquele tipo de silêncio calmo, mas o tipo que surge quando algo foi perdido, ou revelado tarde demais.

Midoki, ainda ajoelhado após o desaparecimento de Spencer e Morgana, apertava os punhos contra o chão, onde pequenos cristais de energia espiritual ainda cintilavam.

Midoki (pensando): "Droga... fiquei feliz por um minuto... mas... a minha missão era recuperar a Fonte da Ordem..."

Sua respiração falhava. Havia alívio, sim, mas também dúvida, como uma rachadura invisível na muralha de suas convicções.

Midoki (pensando): "Se bem que... eu não sei mais se deveria fazer isso..."

Uma sombra vacilante surgiu entre os destroços, Malcon Bedivere, ferido, o braço pendendo inutilizado, mas com um sorriso confiante, tão sincero quanto uma cicatriz.

- M. Bedivere: "Nunca duvidei… meu colega." - Disse ele com dificuldade, cuspindo um pouco de sangue, mas mantendo-se em pé como um soldado que se recusa a cair diante do fim.

Midoki ergueu os olhos, tocado pelo reconhecimento silencioso que havia ali.

Mas outro tom se impôs. Frio. Quase acusatório.

Tristão: "Você..." - Disse Tristão, avançando. - "Por que raios entregou o Necronomicon ao meu pai?"

Midoki hesitou. A pergunta foi uma flecha no peito. Seu olhar se estreitou.

Midoki: "O seu... pai? Mas... como assim?"

Tristão cruzou os braços. Seus olhos brilhavam com uma dor antiga, uma ferida que parecia aberta desde o nascimento.

Tristão: "Ah... vocês não contaram nada pra ele?"

Ele riu brevemente, um riso amargo e vazio, antes de continuar:

Tristão: "Melyadus é a reencarnação do lendário cavaleiro sagrado, Rivalen. Aquele da lenda… do cavaleiro que matou uma vampira e tomou seu sangue. Foi assim que ele ganhou a habilidade de reencarnar."

Um silêncio desconfortável caiu. Malcon desviou o olhar. Merlin permaneceu imóvel.

Tristão: "Aquela vampira era minha mãe, Midoki. Ela foi transformada quando já estava grávida, e então o meu pai se viu forçado a matá-la. É por isso que eu também sou um. Um híbrido condenado desde o início."

Midoki arregalou os olhos. Algo em seu peito apertou como se sua própria existência fosse posta à prova.

Midoki: "Isso... foi um pedido dele..." - Murmurou, em tom de desculpa.

Tristão cravou os olhos nele, sem piedade.

Tristão: "Graças a esse grimório que vieram buscar... Melyadus se foi. Ele usou o Necronomicon para tentar convencer Marcos, o irmão gêmeo dele, a se libertar do Submundo. Uma das técnicas proibidas... permite trocar a própria raça com a de outro. Melyadus queria aceitar o fardo, e deixar que Marcos voltasse… para assumir o lugar dele como Rei dos Demônios, sucessor de Satan. Então... Marcos negou e... depois... o matou."

Midoki abaixou a cabeça. O fardo do erro pesava mais que qualquer espada que já empunhara.

Midoki: "Eu... realmente não sabia..."

Uma nova voz interrompeu o clima tenso. Suave. Madura. Racional.

- Tristão: "Está tudo bem." - Caminhava, agora com olhos sombrios, mas calmos. - "Eu... agora pretendo me aliar a vocês."

O ambiente pareceu estremecer. Aquele que outrora fora tratado como inimigo, agora buscava o mesmo fim.

Merlin se adiantou, sua voz trazendo pragmatismo ao caos.

Merlin: "Sugiro que se fortaleçam. Ainda enfrentaremos as tropas de cavaleiros sagrados de Nova Camelot… o próprio Rei Arthur, além de Agravaine e Lancelot.

Ele fez uma pausa, o olhar distante, quase profético.

Merlin: "Reunirei forças com outras raças. Partiremos em três meses para Vhastorg."

*Há 7 mil anos no futuro*

A paisagem era outra. Morta. Cinzenta. Insondável.

Ardat Lili encarava Malphas, que sorria com seus olhos âmbar e lábios finos. Um sussurro em uma língua proibida escapava de sua boca:

Malphas: ”Tze’vorr… nadalkh vi’reth sha’makar.”

Ardat Lili sentiu o corpo estremecer. O Decreto da Purificação foi arrancado de seu peito como se fosse carne. Ela cambaleou. Aquilo não fazia sentido.

Ardat Lili: "Isso… isso deveria levar tempo..."

Malphas sorriu, agora com desdém.

Malphas: "O ritual para absorver, sim. Mas para extrair é bem simples. Eu só não tenho tempo para absorver o seu decreto... então a coloquei aqui."

Ele ergueu um anel negro com um rubi esbranquiçado no centro. Uma onda de energia maldita o envolveu, e o decreto foi selado ali.

Malphas: "Agora… não preciso mais de você."

Ele estendeu a mão e sussurrou:

Malphas: ”Xar-Gamos: Desgracium Animae.”

As chamas negras se ergueram em forma de mãos retorcidas.

Mas antes que tocassem o chão, um novo poder preencheu o ar. A água se ergueu como uma muralha e o nome foi pronunciado com autoridade ancestral:

Aurelius: "Resolva isso… Dakuwaqa. Liberar."

Um turbilhão azul emergiu do solo, girando como uma fera marinha. O Envoy da Água apareceu, sua forma de tubarão de crina reluzente esmagando o ataque demoníaco.

Ardat Lili, em agonia, gritou:

Ardat Lili: "ME DEVOLVA!! Isso não é seu! Isso… era a única coisa que me impedia de..."

Mas então, uma voz interrompeu com serenidade cruel.

Aurelius: "Não foi uma boa ideia… mas era pra acontecer."

Aurelius Seraphis surgia da névoa. Seus olhos dourados fitavam o caos com uma calma sobrenatural.

Ardat Lili caiu de joelhos. Seu corpo começava a pesar… como se a simples presença de Malphas ativasse algo em sua essência.

Ardat Lili: "Por quê… meu corpo... não consigo... me mover..."

Malphas arqueou uma sobrancelha.

Malphas" "Vocês ainda não compreendem, não é? Pobres insetos adoram me incomodar..."

Ele se virou para Aurelius.

Malphas: "E você? Quem é?"

Aurelius: "Bem, não preciso me apresentar a alguém como você. Seu destino já está selado… assim como o meu."

Malphas: "Então... morra!"

Aurelius: "Dakuwaqa."

O Envoy da Água se colocou entre eles com um rugido abissal.

Dakuwaqa: "Você nunca encostará um dedo no meu mestre."

Aurelius deu um passo à frente.

Aurelius: "Bem, é realmente um tédio encostar em alguém como você. Então… deixe-me mostrar com o que você está lidando."

Uma aura celestial emergiu. O Seishin de Aurelius foi revelado... puro, absoluto, impossível de compreender.

Malphas vacilou. Pela primeira vez… recuou.

Malphas: "Por ora… você não é minha prioridade."

Em um bater de asas negras, Malphas desapareceu nos céus. Mas ao passar pela distorção do domínio Jardim de Flores, seus olhos se abriram com surpresa.

Malphas: "Ah sim… isso é o meu verdadeiro foco."

Ele se lançou na distorção e encontrou o corpo desacordado de Midoki.

Malphas: "Não deveria dormir tão profundamente…"

Num golpe repentino e cruel, decepou sua cabeça. E fincou uma estaca negra no coração de Midoki.

O Jardim de Flores se rompeu, expelindo o corpo mutilado de Midoki… e também Malphas, que voou em direção a um das entradas do Submundo.

Aurelius observava. Silencioso. Inabalável. Ardat Lili tremia. Horrorizada.

Nenhum som. Nenhuma palavra.A cena parecia um quadro pintado à força, onde o horror foi deixado para quem pudesse decifrá-lo.

*7 mil anos no passado...*

A escuridão de uma caverna ancestral. Midoki, ainda em seu teste de provação. Subitamente…

Ele leva as mãos ao peito e grita.

Midoki: AAAAGH!

Midoki: "Eu acabei de sentir uma dor... como se tivesse sido decepado... ou... meu coração perfurado…"

Fim do capítulo.