Capítulo 14

Localização; Avalon

Eros

A partir da meia noite Eros retornou como se nada ocorresse, seu sorriso era maior que qualquer problema que enfrentava, e ele não poderia estar mais feliz em despejar suas frustrações em uma cama cheia de mulheres.

Depois de se deparar com as duas moças de mais cedo, foi satisfeito com mais outras que apareceram logo depois. O dia tinha sido grande e incansável, sempre era quando se tratava de mulheres.

Se ela tinha um ponto fraco na vida certamente era a natureza oposta da sua. Ele não conseguia resistir aos encantos que uma bela mulher jogava para cima dele, principalmente quando o seduziam.

Andando pelos corredores intermináveis e escuros do castelo, ainda lembrava do gosto de suas parceiras e dos toques desavergonhados que deu e recebeu, ele tinha que repetir a cena. Talvez repetisse a fugida quando desse.

No entanto, quando se aproximou do seu quarto, notou Connor seu melhor amigo o esperando com as mãos no pequeno muro que protegia a sacada. E a sua expressão violenta pronto para começar uma briga feia dissipou qualquer pensamento do príncipe.

As fênix eram uma espécie que reverenciavam lutas, resolviam seus problemas com brutalidade e sem nenhum pingo de culpa. Eros perdeu as contas de quantas vezes lutara com Connor a troca de nada ou por apenas apostarem, isso quando não sentiam raiva reprimida um do outro e precisavam esvaziar aos socos e pontapés.

Na grande maioria das vezes Eros ganhava, mas também apanhava o suficiente para sentir por alguns dias. Ele não poderia dizer que não gostava da forma como seu povo vivia, ele era semelhante, repetia os mesmos gestos, falas, mas tinha momentos que não tinha forças para brandir uma espada ou vontade de lutar contra as ofensas que receberia. Por isso fugiu do amigo. Voltando para o caminho contrário.

A lua tinha um brilho diferente naquela noite, estava de alguma forma alaranjada e foi o tom mais bonito que Eros pode apreciar, enquanto olhava de cima para o resto do reino. Só pode se lembrar de sua casa, de quão alto ele poderia ver o mundo lá embaixo e se sentir seguro. Parte dele queria voltar para Zamoria, abortar a missão, e jogar para o alto toda essa diplomacia de quinta que estava fingindo. Esquecer que a maldita existia ou apenas matá-la de uma vez, estrangulá-la.

Seus punhos cerraram até que os nós dos dedos ficassem brancos e ele se lembrou da amaldiçoada. Como se suas pernas tivessem vida própria, ele seguiu para lá, para o cativeiro que ele mesmo queria ter colocado-a, para deixá-la lá por toda a sua vida.

Ódio não era um sentimento que Eros sentia facilmente, o único que recebia em toda sua vida foi seu pai, mas agora Maeve Escarlate também havia conquistado um lugar.

Quando desceu nas calçadas até o calabouço fez questão de fazer barulho e importunar, deu pisadas fortes no chão, bateu palmas até os dedos arderem e gritou animado como se já fosse de manhã.

— Acorda, raio de sol!

Ela estava deitada tranquilamente como se nada importasse, ele não aguentou.

— Vamos maldita, finalmente chegou o momento de falarmos a sós.

Ele cruzou os braços e se endireitou, esperando uma reação, pelo que estudou sobre ela, notou que Maeve era mais quieta do que pensava, mais fria do que gelo e mais perigosa do que ele podia prever, subestimá-la não seria bom. Contudo, ter medo era algo que jamais sentiria por ela assim como compaixão.

— Me diga como está sendo a hospedagem? Está gostando? Será que hoje Ambrose te infringiu de novo e por isso esse mau humor?

Maeve então se levantou, sua mandíbula estava tão apertada que parecia estalar a qualquer momento.

— Eu ainda vou transformar você em cinzas nas minhas mãos, antes de me dar ao trabalho de ouvir sua voz irritante de novo.

O sorriso de Eros vacilou por um segundo, mas ele logo gargalhou, sua risada ecoando pela profundidade do calabouço.

— A serpente é engraçada, você não tem poder para me machucar, muito menos força. Me admira tanta coragem em me desafiar, Rubra.

— Para você sou Maeve Escarlate.

— Tanto faz no fim você e nada são a mesma coisa.

Mentira, ela era valiosa para todas as espécies, uma segurança, mas ao mesmo tempo um perigo, alguém que não se deve subestimar, por isso Eros a desprezava, abominava sua importância, sua força, ele queria destruí-la e depois consertar de novo para apenas machucá-la outra vez, e assim repetidamente.

Maeve fora a principal catalisador para Uziel perder o controle, desde que ele soube do nascimento dela a quase trinta e seis anos atrás perdeu o senso e se tornou pior do que já era, na época Eros dizia que seu pai enlouquecera, seu irmão mais velho discordava, mas não demorou muito para eles verem o efeito que a existência dela causou no homem.

Uziel incentivou guerras contra as serpentes, onde Maeve conseguiu matar quase todas as fênix que foram para Arcádia em busca de vingança, alguns voltaram, mas não podia se dizer que eram mais sãos, a maldita deixou tantas sequelas em sua raça, e hoje o que mais doía era vê-la bem, dormindo tranquilamente como se não fosse motivo de dor para muitos.

— Talvez devesse voltar para o buraco de onde saiu, está fedendo. — ela reclamou como se pudesse.

E Eros estreitou os olhos para aquelas chamas azuis que o encarava profundamente com repulsa.

Ela sentia o cheiro que estava nele, o cheiro das mulheres que dormiu a poucas horas antes, seus sentidos estavam em um dos melhores que já se foi registrado e Eros sabia disso apenas porque as Serpentes eram melhores que as Fênix em alguns quesitos e esse era um deles, depois da força.

era uma parte do porque ele odiava a espécie também. Um homem como ele não poderia viver em um mundo onde existisse alguém que se competisse o faria perder.

Perdido nesses pensamentos odiosos, enrugou o nariz quando sentiu cheiro dela avançar sobre ele novamente, era doce, parecido com o cheiro de uma violeteira roxa, deveria vir das madeixas sangrentas que estavam bagunçadas como de costume. Ele sentia desde a primeira vez que a viu.

Por um instante, ficou olhando para ela demais, de um jeito que não deveria e que era errado até para ele, e se odiando por isso, desviou o olhar logo em seguida e suspirou irritado.

Quem essa maldita pensava que era?

— Achei que você estava acostumada com cheiro de podre? Já que veio de um lugar que não era tão agradável.

— O que você sabe sobre as minhas terras?

— Sei que lá é o esconderijo dos demônios. Estranho é você tendo o faro igual o de um cachorro não ter ido até lá verificar. É tão valente, brava e forte.

Zombou, e Maeve disse estridente.

— Você não sabe de nada, fênix.

— Será? Eu estou muito convencido que sei mais do que você pensa…

— Um idiota como você não sabe nem procurar o caminho de casa sozinho.

Eros gargalhou, se divertindo com a irritação da mulher. Maeve se irritava fácil, paciência não era uma de suas virtudes e ela estava longe de ser agradável, mas ainda assim ele gostava de provocá-la.

— Talvez se você soubesse o seu caminho de casa voltaria para lá, mas tenho quase certeza que nem para onde ir tem mais, que destino cruel, e hoje por ironia do destino está justamente em um reino onde irá morrer. Se cooperasse talvez tivesse chances de sobreviver.

— Nem você acredita nisso. Estou em paz com meu fim, e você está confortável com o seu, não sei se minha morte será suficiente para você dormir tranquilo nos próximos anos.

— Você não sabe o quanto vai ser serpente…

E assim ele se foi de novo, levando uma sensação inquietante consigo para fora da cela, e quando parou entre o final das escadas, deixou sua cabeça encostar no batente e respirou profundamente como se não fizesse a dias.

Naquele momento Eros desejava uma mulher, uma que o fizesse esquecer aquela noite e os dias por completo, queria esvaziar a mente de novo. Voltar para o quarto era de longe sua melhor ideia e para ir em um bordel teria que atravessar a cidade.

Assim optou pela transformação, se jogou no parapeito da sacada e permitiu que suas asas surgissem antes de encontrar com o chão.

E os magos que passaram a noite acordados, assistiram por horas uma fênix voar pelo céu iluminado até o amanhecer surgir.