O céu já não era um céu.
Onde antes havia um azul trêmulo e um véu quente, agora pairava uma fenda aberta, um rasgo cósmico que cuspia pedras negras em combustão — cada uma contendo a raiva milenar de Hadad'El-Ra.
O mundo ali dentro parecia curvar-se. A areia fervia. O templo tremia. O tempo oscilava entre presente e passado, como se a própria realidade estivesse apodrecendo.
Kazuhiko sentia a gravidade espiritual daquele momento se intensificando. E mesmo com todo o poder da Gula pulsando em sua alma, algo o deixava inquieto... desequilibrado.
Kazuhiko (pensando): — Já enfrentei cavaleiros. Já enfrentei João... Isso aqui... não deveria me abalar. Então por que meus joelhos querem ceder?
Um trovão cortou o céu.
Hadad'El-Ra não ria. Ele não gritava. Ele apenas existia — como uma tempestade feita de carne, praga e divindade. Seu corpo parecia ser feito de magma e pedra rachada, e no centro de seu tórax, uma runa antiga queimava: 𐤄𐤃𐤃.
A sétima praga caminhava.
Viktor, agora envolto na luz translúcida de Zadiel, ergueu sua espada com ambas as mãos. Seu braço monstruoso, antes uma maldição viva, agora emitia um brilho divino. Era como se a alma do arcanjo e a carne corrompida tivessem chegado a um pacto silencioso.
Viktor: — Eu sempre fui usado indevidamente... Até mesmo pela a minha própria arma que deveria ser minha, ela quase me dominou... Eles quase me dominaram.
A primeira pedra flamejante caiu atrás dele, explodindo parte do templo em uma chuva de brasas.
Gabriel (chocando as asas): — Esse ser... não é apenas uma praga. Ele é um conceito. Ele nunca viveu... para poder morrer.
Castiel: — Então vamos ensiná-lo a cair.
Kazuhiko permanecia parado, como se escutasse algo que os outros não ouviam. Um sussurro...
Kokuei (dentro da mente):
— Ainda se surpreende, Kazuhiko? Você não está enfrentando um ser físico. Está lutando contra uma memória viva de punição... A forma que o mundo encontrou para lembrar o que significa quebrar promessas divinas.
Kazuhiko (pensando): — Mas por que ele é tão mais forte que os outros que enfrentamos? João... Dominus... Eles eram monstros também.
Kokuei (voz mais grave):
— Porque você não estava sozinho. Lembra-se disso? Na guerra contra João, você tinha seu pai, além dos príncipes. Contra Dominus, teve o sacrifício do tempo. E agora… você ainda tem sorte de ter companhia. Mas não se engane, Kazuhiko...
Você ainda é um aprendiz com uma arma poderosa. Não confunda isso com domínio.
As pedras continuavam a cair. Algumas explodiam como mísseis. Outras... choravam sangue ao tocar o chão.
Wulfric: — Isso tá ficando fora de controle. A cidade está ruindo — e não foi a gente quem começou isso!
Zoya puxou seu mini-telescópio e expandia sua arma para virar um campo de dispersão ao redor do grupo.
Zoya: — Vamos recuar. Deixar o Viktor lidar com ele sozinho é loucura.
Andressa: — Não... Ainda não... Nós podemos fazer uma diferença.
Ela observava Viktor. Algo ali estava diferente. Não era apenas poder — era propósito. Zadiel não havia sido um arcanjo qualquer. Ele havia sido um juiz. Um portador de verdades silenciosas.
Ibrahim, ao lado de Arjun, olhava para o campo.
Ibrahim: — Não podemos ajudar diretamente... mas podemos dar cobertura.
Arjun ergueu o braço. Símbolos dourados começaram a se desenhar no ar, como circuitos rústicos.
Arjun: — Entendo o que você quer. Criaremos um selo de contenção. Se Hadad’El-Ra ultrapassar a barreira… todo o Saara pode se tornar uma cratera divina.
Viktor avançou.
Não correndo. Não voando. Marchando.
Cada passo dele fazia o chão retorcer em luz. As pedras que o cercavam eram cortadas antes de tocá-lo — não por força, mas por julgamento.
Hadad’El-Ra, enfim, falou:
Hadad’El-Ra: — Tu portas a luz de um esquecido. E ainda assim... és feito de carne impura.
Viktor: — E você... é feito de arrogância petrificada.
Eles se chocaram.
A explosão entre Viktor e Hadad’El-Ra rasgava o horizonte. A terra se curvava, as nuvens desciam como véus de poeira fervente. O mundo parecia sussurrar — ou gemer — sob o peso de dois juízos colidindo.
No topo do templo, o restante do grupo lutava para manter o equilíbrio. Rajadas de calor e ondas de energia ancestral pressionavam o ar, tornando cada respiração uma prova de fé e resistência.
Kazuhiko, de pé, observava sem piscar. Seus olhos refletiam o brilho da armadura de Viktor e, por um breve instante, pareciam estar tentando ver não o corpo… mas a alma por trás do guerreiro.
Kazuhiko (pensando): — Zadiel… Ele não desapareceu quando absorvi sua alma. Ela... apenas adormeceu?
Kokuei (em sua mente, calmo, quase filosófico): — Talvez nenhuma alma se vá por completo. Talvez este mundo seja feito de fragmentos de histórias não contadas, esperando a hora certa para voltarem à superfície.
Kazuhiko:
— E se essas histórias entrarem em conflito com quem carrega elas?
Kokuei(no pensamento):— Então o corpo vira palco. E a guerra... deixa de ser externa.
Lá embaixo, Viktor não recuava.
A energia de Zadiel o envolvia como uma segunda pele — translúcida, luminosa, viva. Mas por trás de cada golpe certeiro, havia um tremor nos olhos. Um questionamento não dito. A espada brilhava… mas o coração oscilava.
Hadad’El-Ra, por outro lado, não precisava mover os pés para causar destruição. Seus braços giravam como colunas de tempestade, e seu corpo se estendia como se cada parte estivesse viva. Cada soco era uma sentença. Cada palavra, uma praga.
Hadad’El-Ra: — Tu julgas com a luz de um anjo. Mas tua carne…grita por vingança.
Viktor: — Não grita. Ela se lembra.
E… mesmo assim, escolhi a luz.
Eles voltaram a se chocar.
Zoya, no alto, não conseguia conter o grito:
Zoya: — VIKTOR!!!
Mas ele não a ouviu.
Ou talvez tenha ouvido… e escolhido continuar mesmo assim.
Arjun, com o braço erguido, mantinha o selo de contenção em construção. Os circuitos dourados já se conectavam ao redor do campo de batalha como raízes espirituais. Ibrahim apoiava o indiano de perto, protegendo-o de qualquer instabilidade externa.
Ibrahim: — Este selo é forte… mas quanto tempo aguenta?
Arjun (concentrado): — Tempo o suficiente… se ele vencer rápido.
Gabriel, ao lado de Kazuhiko, murmurava orações em voz baixa, canalizando pequenas esferas de energia que mantinham a estabilidade dimensional local.
Gabriel: — O campo está tremendo demais. Se esse lugar ruir... Teremos uma ruptura em cascata no espaço espiritual de toda a África.
Ezra, parado, cruzava os braços e falava em voz baixa, para si mesmo:
Ezra: — Nunca pensei que aquele russo fedelho teria coragem de encarar um deus.
...Mas parece que a coragem... é hereditária.
Andressa olhava de esguelha para Ezra, confusa.
Andressa: — Hereditária?
Ezra, desviando o olhar: — Nada. Esquece.
Hadad’El-Ra abriu os braços, e uma chuva flamejante caiu do céu. Mas não era fogo comum. Era culpa materializada — cada gota, um peso emocional arrancado de milhares de almas perdidas. A dor espiritual fazia até a areia ranger sob a pressão.
Viktor cambaleou.
A fusão com Zadiel tremia. O braço monstruoso voltou a se contorcer levemente — como se fosse puxado de volta à sua natureza.
Kazuhiko, observando tudo, deu um passo à frente.
Kazuhiko: — Se ele cair agora… Zadiel vai tomar controle.
Kokuei: — Então você sabe o que precisa fazer, certo?
Kazuhiko (cerrando os punhos): — Sim. Mas ele ainda tem mais uma coisa que pode salvá-lo.
Kokuei: — E o que seria?
Kazuhiko: — Zoya.
Zoya, como se ouvisse a mente do irmão, agarrou o grimório com força e deu um passo à frente. Seus olhos estavam cheios, mas sua voz, firme.
Zoya:
— Viktor Petrov!
Você me prometeu que ia viver.
Você me prometeu que ia me perdoar!
Viktor ouviu.
No meio da dor. No meio do julgamento. No meio do caos… ele ouviu.
E por um instante, o braço monstruoso se acalmou. Zadiel… recuou.
A luz ao redor dele se tornou estável.
Viktor:— Eu ainda sou eu… Zoya… Eu vou te trazer o amanhã que a gente perdeu.
Ele ergueu a espada mais uma vez.
E avançou.
O brilho da espada de Viktor cortava o ar como uma sentença divina. A runa 𐤄𐤃𐤃 no peito de Hadad’El-Ra pulsava mais forte, respondendo com um calor quase insuportável, como se o deserto inteiro estivesse prestes a explodir.
Andressa: — Temos que aproveitar este momento agora! Kazuhiko, Ezra! Vocês é o que mais tem chances de fazer a diferença!
Assim que Andressa falava aquilo, Kazuhiko suspirava, tentando ignorar a gravidade espiritual, ele olhava diretamente pra Viktor, e assim, seu corpo se cobria com uma aura roxo de inveja, seus músculos cresciam subitamente, e assim, saltava da plataforma do templo com uma velocidade fulminante.
A areia nem teve tempo de ceder. Seu manto tremulava como se carregasse o peso do céu sobre os ombros, e os olhos vermelhos brilhavam com intensidade anormal.
Ezra, logo atrás, desceu com elegância quase preguiçosa, girando o corpo em pleno ar, até pousar com um joelho ao chão, o tapa-olho agora emitindo uma luz vermelha intensa.
Ezra: — Parece que a diversão me chama mais uma vez… Kazuhiko, você vai pelo flanco. Eu distraio ele com estilo.
Kazuhiko apenas assentiu.
Hadad’El-Ra rugiu.
Não com som. Mas com peso. Um peso que fazia o ar vibrar e o tempo se dilatar por um segundo.
A boca da entidade não se moveu. Mas a runa brilhou. E então, ele ergueu o braço direito, lentamente. De sua palma… uma pálpebra começou a se abrir.
Kazuhiko parou no ato.
Kazuhiko (pensando): — O que é isso…?
Ezra: — Não! Isso não é só energia... isso é um conceito! Fechem os olhos, rápido!
Mas antes que a pálpebra se abrisse por completo, o céu escureceu subitamente.
Como se o próprio sol tivesse sido apagado.
A realidade parecia desenfocar.
O calor desapareceu. O som foi sugado.
E uma voz… antiga, rachada, impossível de localizar... preencheu o mundo.
???
Voz do Além: — Hadad... El... Ra...
Baixe teu olho... a nona já caminha, assim como as outras. Lembre-se do seu dever como uma praga, você deve julgar, não matar, pelo menos... Não ainda.
O corpo colossal de Hadad’El-Ra parou como se tivesse sido empalado pelo próprio tempo. Sua mão paralisou, e a pálpebra... recuou.
Ezra, por um momento, não conseguia se mexer. Seus dedos tremiam, a ponta do cigarro apagado em sua boca simplesmente desintegrou.
Ezra (sussurrando): — O que foi... isso?
Kazuhiko, ajoelhado, ainda com os olhos arregalados, sussurrava para si mesmo:
Kazuhiko: — O ar... morreu.
A luz voltou. Lenta. Vacilante.
Hadad’El-Ra recuava. Pela primeira vez… não por dano, nem por julgamento, mas por ordem.
Zoya, tremendo, se aproximava de Viktor, ainda envolto pela energia de Zadiel.
Zoya: — Viktor… você viu?
Viktor: — Não com os olhos.
Castiel e Gabriel se entreolhavam, em silêncio.
Gabriel: — Não era uma maldição.
Aquilo... Era uma advertência... Eu já tou vendo que essa missão vai ser muito difícil.
Kazuhiko, agora de pé, sentia as marcas dos pecados em suas costas vibrar. Não era um alerta físico. Era como se... uma memória estivesse tentando emergir, mesmo que ele nunca a tivesse vivido.
Kazuhiko (pensando): — Será que isso poderia ser o...?
Kokuei (em sua mente, sussurrando com voz baixa e incomum): — ...a escuridão final.
A única que não mata com dor... mas com o esquecimento.
Hadad’El-Ra, silencioso, olhou para o grupo.
E pela primeira vez... falou com reverência.
Hadad’El-Ra: — O tempo de vocês... ainda não foi medido. Mas... ele se aproxima. E nos veremos novamente... humanos.
E com um giro de corpo, ele se desfez.
Não como fumaça. Não como luz.
Mas como memória apagada.
Nada restou. Nem pegadas. Nem aura.
Somente o símbolo queimado no altar — 𐤄𐤃𐤃 — agora rachado.
Viktor caiu de joelhos.
A fusão com Zadiel recuava, mas o símbolo ainda brilhava levemente em seu peito.
Kazuhiko se aproximou dele.
Kazuhiko: — Você fez o impossível.
Viktor, ainda ofegante: — Não fiz sozinho...
Mas quem... era aquela voz?
Zoya: — E por que Hadad’El-Ra obedeceu?
Ezra, acendendo um novo cigarro, encarava o céu agora limpo.
Ezra: — Porque até as pragas… seguem uma ordem maior, ou tlavez... Não tenha sido o melhor momento dele ter lutado.
O silêncio após a tempestade era quase pior que o caos. O ar parecia imóvel, como se até o vento tivesse decidido não testemunhar o que quer que acabara de acontecer.
Wulfric, cambaleando, se encostou numa pilastra quebrada.
Wulfric: — Isso foi... foi um inferno. Mas, por algum milagre, estamos vivos.
Ibrahim, limpando o sangue seco da testa, murmurava em tom contido:
Ibrahim: — Isso não foi milagre. Foi advertência. Algo... mandou Hadad’El-Ra recuar. E seja lá o que for, não está do nosso lado.
Arjun se ajoelhava diante do altar agora rachado, examinando os fragmentos com as mãos brilhando em luz dourada.
Arjun: — A runa… não sumiu. Foi quebrada. Isso é pior. Significa que Hadad foi retirado à força... mas ainda existe.
Gabriel e Castiel se aproximavam, atentos.
Gabriel: — Uma retirada. Não uma derrota. Ele ainda está entre os véus.
Castiel: — E da próxima vez… talvez não tenhamos uma "voz" salvadora.
Kazuhiko ajoelhou-se ao lado de Viktor, que começava a recuperar o fôlego. O símbolo de Zadiel em seu peito diminuía de intensidade, mas ainda brilhava... como uma brasa de algo que não se apagaria.
Kazuhiko (olhando firme):— Você conseguiu resistir à uma das pragas. Isso não é só poder, Viktor. É destino.
Viktor (fechando os olhos): — É fardo, mas... por Zoya, por todos, eu vou carregar.
Até o fim.
Zoya sorriu levemente, limpando a lágrima discreta que se formou no canto do olho.
Ela não disse nada. Não precisava.
Ezra, soltando a fumaça do cigarro, olhou em direção ao leste.
Ezra: — Isso muda tudo. Essas pragas… são peças, e nós estamos no tabuleiro errado.
Andressa se aproximava do grupo, o tablet holográfico da Aetherbond vibrando com frequência instável.
Andressa: — Algo... se mexeu em Jerusalém. Um pico de energia enorme surgiu no mesmo instante em que Hadad desapareceu.
Gabriel: — As pragas não só marcham… elas se conectam. Cada uma que encontramos, acelera a próxima.
Erith-Zin: — De fato...
Aquela voz, sussurrada como poeira na garganta de um cadáver, ecoou por entre as paredes semi-destruídas do templo.
Do nada, o ar ficou mais espesso. O calor voltou a pesar. E uma nova movimentação na areia se fazia visível: espirais negras, como se criaturas minúsculas estivessem escavando por dentro do chão... vivas, famintas.
Zoya ergueu sua arma, virando-se lentamente:
Zoya: — ...Eu pensei que ele tinha ido embora.
Erith-Zin, agora em forma semi-física, surgia à beira de uma sombra torta nas colunas do templo. Seus olhos brilhavam com larvas que se retorciam, e sua pele parecia mais fina, quase translúcida, revelando um mapa de veias escuras correndo como raízes apodrecidas.
Erith-Zin: — Partir? Não. Apenas dei tempo para que o segundo selo fosse ativado...
Cada praga alimenta a próxima. E agora que o templo ardeu com o julgamento do Ra’gul… é a minha vez de colher os restos.
Wulfric: — Isso não é possível…
Erith-Zin (sorrindo com dentes quebradiços): — A praga não morre, não desaparece. Ela sempre volta, de uma forma inevitável.
Ezra, sério, apagou o cigarro na lateral de uma pedra rachada.
Ezra: — Eu odeio esses retornos. Sempre cheiram a tragédia.
Kazuhiko deu um passo à frente, os olhos focados:
Kazuhiko: — O que você quer?
Erith-Zin estendeu as mãos, e como se tocasse o próprio ar, pequenas moscas e piolhos começaram a emergir novamente do solo — desta vez com asas, desta vez... com olhos.
Erith-Zin: — Eu quero cumprir meu papel.
E o terceiro selo…é a infestação.
Do céu rachado, não veio fogo. Não veio luz.
Veio um rugido, surdo e orgânico, como um choro de mil bocas.
E então, do horizonte, uma nuvem negra se aproximava.
Não era fumaça.
Era vida.
Microscópica. Infectante. Devastadora.
Gabriel (erguendo o seu arco e flecha angelical): — Cuidado! Isso não é uma invasão comum — é uma possessão por toque!
Castiel (erguendo seu escudo angelical): — Protejam as rotas de respiração! NÃO deixem nada entrar pelos olhos ou narinas!
Ryuji puxava sua bandana, ajustando-a enquanto cortava as primeiras nuvens de insetos com sua lâmina.
Ryuji: — Inimigos que morrem com vento. Gosto disso.
Viktor, ainda ajoelhado, olhava para o céu se fechando novamente:
Viktor: — Isso não é só peste...
É lembrança. De um mundo que deixou de lavar as mãos de seus pecados.
Erith-Zin (abrindo os braços): — A terceira praga não mata imediatamente...
Ela consome.
Ela cresce.
Ela se instala.
Kazuhiko: — Não vamos deixar que ela atinja Jerusalém.
Erith-Zin (com os olhos vibrando): — Mas Jerusalém já foi atingida... Vocês são apenas os últimos a saber.
Kokuei (na mente de Kazuhiko): — Típico. As pragas não são apenas ataques... São ecos do que a humanidade sempre fingiu não ouvir.
Kazuhiko (pensando): — E se não podemos apagar esses ecos...
Erith-Zin: — Mais deles aparecem.
Kazuhiko: — ?!
Erith-Zin: — Ah perdão... Umas das minhas moscas é capaz de ler os pensamentos dos outros... E eu ouvi que tu tem uma outra voz interessante dentro da sua consciente... Interessante.
O silêncio que seguiu as palavras de Erith-Zin foi pesado como chumbo espiritual.
Kazuhiko estreitou os olhos, seu corpo tenso, cada músculo atento à ameaça invisível — mas o que vinha agora não era mais invisível. Era tangível, vivo e grotescamente inevitável.
O chão tremeu.
Do horizonte oposto, o céu começou a tingir-se de um vermelho profundo, como se o mundo estivesse sangrando ao contrário — não do céu para a terra, mas da terra para o céu.
Ezra retirou o cigarro da boca e o amassou nos dedos, sua voz agora grave.
Ezra: — Algo... muito errado... está vindo.
Gabriel franziu o cenho, estendendo a mão, seus dedos imersos em uma luz dourada. Quando ele invocou a visão celestial, sua aura explodiu num lampejo cego.
Gabriel: — Não... Não é possível... são três!
E então, a água da antiga cisterna próxima — uma fonte subterrânea esquecida que milagrosamente ainda pingava pelas rochas do templo — borbulhou.
O som de vida virou o som de agonia líquida.
O azul tornou-se vermelho.
Sangue.
Um odor fétido e espesso se espalhou, cobrindo o chão como um véu carmesim.
Zoya deu um passo para trás, em puro reflexo.
Zoya: — Isso é sangue...?!
Ibrahim, olhando para o chão empapado, respondeu sombrio:
Ibrahim: — É a primeira praga.
Do meio da névoa de ferro e podridão, uma silhueta começou a surgir.
Um ser de aparência emaciada, como se o próprio sangue que corria em suas veias tivesse sido substituído por algo ancestral. Seus olhos escorriam vermelhos, e o coração, visível no peito aberto, pulsava com cada batida do mundo morrendo.
???: — Vida e água... são sinônimos.
Mas o que nasce da impureza... só pode ser alimentado com dor.
Erith-Zin (sorrindo): — Ah... Amado A’Zebeth. O ciclo começa contigo.
Andressa (assustada): — Quem é esse...?
Erith-Zin: — A Primeira.
A Praga da Água Corrompida.
E então, antes que o grupo pudesse reagir... um rugido sibilante cortou o ar.
Milhares.
Não centenas.
Milhares de sapos.
Eles saíam das fissuras, dos poros das pedras, das sombras. Eram verdes, pútridos, inchados. Saltavam com a força de machados, gritando em uníssono como coros do fim dos tempos.
Ryuji: — Sapos?! Você tá de sacanagem comigo!
Castiel (erguendo seu escudo): — Não subestime! Cada criatura aqui é movida por um peso espiritual. Se tocar em você, pode roubar memórias.
Uma figura andava por entre os sapos — seu corpo curvado, sua pele semelhante a couro molhado. Olhos negros, sem pupilas. Um colar de dentes humanos ao redor do pescoço.
???: — Vocês se afastaram do caminho. Agora... os filhos do pântano cuidarão de lhes mostrar a rota da decomposição.
Ezra (sussurrando): — Segunda praga... os sapos.
Gabriel: — Não... Não são só pragas. São avatares. Entidades.
Eles se lembram do Egito.
Kazuhiko dava um passo à frente, sua mão tremendo levemente — não de medo, mas da vibração absurda da energia no ar. O próprio chão parecia envergonhado de carregar tantos pecados de eras passadas.
Erith-Zin, no topo das ruínas, abriu novamente os braços, como se recebesse irmãos de longa data.
Erith-Zin: — A’Zebeth e Grohgoth, meus companheiros de sofrimento.
Vocês vieram.
E agora...
O deserto vai começar a gritar.
Continua...