Ato 60 - Entre Caos e Mentiras

Algo inesperado realmente aconteceu, o pai de Oliver estava ali, estava vivo, mas antes que o detetive podesse falar algo, os pecados entraram em contato.

Lethion — [Não... Sei... Não...] — Desconfiado.

Caelith — [Isso não me parece legal]

Panthar — [Se esse velho não for o pai do capitão, eu devoro ele!] — Exclamou com raiva.

Oliver — [Não se preocupem... Não vou abaixar minha guarda, então... No momento, só me deixem...]

Lustara — [Certo]

Raven — [Suas ordens!]

Oliver enxuga os olhos com o pano do sobretudo e respira fundo, ele não poderia confirmar que aquele era realmente seu pai, mas seu coração não parava de bater, ele estava feliz e não podia negar isso.

Oliver — Pai... Como?

Gideon — Hahaha... Parece que o meu garotinho cresceu de verdade... Depois entro em mais detalhes, deixe-me acostumar primeiro com esse local.

Oliver — C-Claro...

O detetive se levanta e respira fundo novamente, virando-se para os outros, ele apresenta seu pai.

Oliver — Beleza... Como eu posso dizer isso... Ele é... Meu pai.

Hestia desliza para perto de Gideon.

Hestia — Então você é o meu avô?

Gideon — Não sabia que eu tinha netas...

Melyris se aproxima mais lentamente, ainda tímida e atenta com a situação.

Melyris — Vocês realmente se parecerem.

Gideon — Pode se acalmar, garota...

Oliver — Olha... Pai, é meio difícil relaxar com a volta de alguém que tinha sido dado como morto, e além do mais, ser o senhor.

Gideon — Eu entendo, baixinho.

Quando Oliver iria tentar explicar a situação para acalmar todos, recebe uma mensagem de Noctarion.

Noctarion — [Você realmente confia nele?]

Oliver — [Relaxa... Eu vou usar a cultivação pra ver as memórias, se não for, não vou me segurar]

Noctarion — [Se você diz, então nesse caso, consideramos como uma boa notícia, eu acho]

Soryn — [Fico feliz por você, Oliver]

Oliver — [Obrigado, Soryn]

Noctarion — [Quando você entrou nessa conversa?] — Perguntouo rei dos dragões, confuso.

Soryn — [Meu bem... Eu conheço mais de magia do que você tem de dias em guerra]

Noctarion — [Isso me assusta...]

Voltando para o foco principal, Oliver encara aquela figura, talvez fosse seu pai, talvez fosse apenas um intruso, seu coração batia rápido, mas sua mente, permanência fria.

Oliver — Pai, faz um favor rápido pra mim?

Gideon — Claro...

O detetive cria um painel de mana em frente ao velho homem.

Oliver — Coloque sua mão aqui.

Gideon ergueu a mão calejada, lentamente, como se o peso dos anos estivesse concentrado nos dedos trêmulos.

Gideon — E lá vamos... Nós...

A palma tocou a superfície da tela de mana, e uma tênue onda de luz percorreu seus contornos.

No instante seguinte, a cultivação se ativou, era como se fosse um pacto silencioso.

As memórias se acenderam.

O passado caiu sobre todos como um rio furioso, e não houve como impedir.

A imagem se formou.

A chuva caía fina sobre os telhados desgastados de uma cidade onde o som das máquinas era abafado pelas despedidas silenciosas.

Gideon estava parado diante da porta.

Do lado de dentro, a mulher que um dia foi seu tudo, estava em uma cama, pálida, fraca, marcada pela maldição que os médicos não conseguiam nomear.

E ao seu lado, um garotinho.

Oliver.

Tão pequeno. Tão confuso.

Gideon — Eu volto... — foi o que ele disse.

Uma mentira dita entre lágrimas.

Ele nunca voltou.

Não por escolha.

Por covardia.

Ou por destino.

Logo após virar as costas e sair rapidamente do hospital, o mundo se desfez.

Não no sentido literal, mas em uma ruptura que nenhum ser comum teria notado.

Uma fenda surgiu.

Uma luz puxou seu corpo e mente para um plano onde a realidade era selvagem, instável, moldada por forças desconhecidas.

Criaturas de aparência impossível se arrastavam pelas planícies.

Gideon — Onde... Eu tô... — Se perguntava o velho homem, confuso.

Não havia lógica.

Não havia piedade.

Gideon sobreviveu.

Não por força.

Mas porque o coração dele queimava.

Queimava por arrependimento.

Por abandono.

Por amor.

E uma voz... uma que ninguém mais parecia ouvir... sussurrava em sua mente noite após noite.

Espere por ele... Um dia, ele virá...

Gideon quase desistiu muitas vezes.

Se arrastou entre ruínas.

Lutou contra feras que falavam em enigmas.

Carregou feridas, marcas, cicatrizes e, acima de tudo, o fardo de um pai que fugiu.

Ele nunca parou de se culpar.

Nunca parou de reviver o momento em que soltou a mão da mulher que o amava.

Nunca esqueceu os olhos de Oliver.

Aqueles olhos que diziam não me deixe.

E mesmo assim, ele deixou...

Oliver — Então foi isso?

Gideon — Sim... Eu vivi esses últimos anos aqui... Comendo inúmeras coisas estranhas...

Oliver — Certo... Com isso eu confirmo que é realmente você...

Ao longe, Nyx, Raviel e Mizuki estavam preocupadas, não sobre o surgimento de Gideon, mas sobre o brilho que havia sumido nos olhos de Oliver.

Mas então, Lethion se aproximou do detetive, ele estava com um pequeno chapéu que escondia seus olhos e ao seu lado, panthar, com uma pequena mochila.

Oliver — Pra onde vocês vão exatamente?

Lethion — Atrás do... Pecado do... Orgulho...

Panthar — Barthan conseguiu coordenadas e tem quase certeza da localização dele.

Oliver — Vão só vocês dois?

Lethion — Não... Se preocupe..

Panthar — Mesmo sem sermos calamidades, estamos apenas um estágio antes, conseguimos sobreviver se tudo der errado.

Oliver — Se vocês dizem...

Panthar — Você esteve ocupado demais com outros assuntos, é nossa hora de trabalhar.

Oliver — E qual o motivo dos outros não irem?

Lethion — Nós... Temos assuntos... Pendentes...

Oliver — Entendi... Boa sorte então.

Panthar — CERTO!

Os dois pecados saem do local, Oliver se vira pros outros.

Raven — Nem vem.

Lustara — Foi idéia deles.

Klythos e Caelith continuaram calados, mas Oliver? Ele tinha um objetivo em mente, aproveitar esse momento com seu pai.

Mas suas esposas sabiam de uma coisa, o detetive não parecia estar realmente feliz.

Oliver — Ai pai... Quer fazer alguma coisa?

Gideon — Que tal... Pescar...

Oliver — Certo... A gente aproveita e faz algo diferente depois.

Os dois saem do lugar, mas na mente dos restantes que ficaram, tinha apenas um pensamento.

Isso não foi repentino demais? Qual a razão de toda essa pressa? Onde estava os brilhos nos olhos de Oliver?

Nyx estava afogada em seus pensamentos, Raviel girava frascos em seus dedos e Mizuki estava Silenciosa, tão silenciosa que nem sua respiração era possível ser escutada.

Hestia voltou para a sala de treino junto de Melyris.

O lago ao lado do reino, vasto como um mar tranquilo, refletia aquele cenário como um espelho encantado.

Suas águas eram tão claras que se podia ver os cardumes prateados deslizando por entre as plantas submersas, e ao longe, os rugidos graves dos dragões patrulheiros ecoavam entre os picos.

Gideon caminhava com passos curtos e lentos pela trilha de pedras que levava até a margem.

Ao seu lado, Oliver mantinha o ritmo, carregando uma cesta de vime com mantimentos e duas varas de pesca artesanais.

Ambos usavam roupas simples, mais leves que o usual, com os braços à mostra e a expressão suavizada por algo raro: a ausência de guerra, missões ou deveres.

Apenas pai e filho.

Gideon — Parece que vai ser um bom dia pra pescar. — Comentou, observando o céu limpo.

Oliver apenas sorriu, como se soubesse que qualquer dia ao lado do pai já era bom por si só.

Quando chegaram à beira do lago, varas foram fincadas no solo firme, as linhas lançadas com cuidado.

Silêncio.

Um silêncio confortável, quebrado apenas pelo som suave da água, dos insetos e das respirações profundas.

Gideon se sentou sobre uma pedra lisa, sentindo a brisa fria que vinha das montanhas.

Oliver, ao lado, tirou os calçados e mergulhou os pés na água, fechando os olhos por um instante.

O tempo passou devagar.

Os minutos pareciam se alongar, e nenhum dos dois se incomodava com a ausência de peixes.

Pelo contrário.

Estar ali, apenas... era suficiente.

Gideon contou histórias antigas, da juventude, dos erros, de como uma vez tentou pescar com as mãos e quase perdeu os dedos para uma criatura aquática com mais dentes do que senso.

Oliver riu baixo, deixando as memórias ruins se apagarem naquele instante.

Mais tarde, o sol começou a descer.

A primeira fisgada aconteceu com Oliver.

A vara arqueou, a linha tensionou, mas os olhos do detetive não tinham brilho.

Oliver — Parece que é um peixe digno do Reino Dracônico.

O peixe foi solto de volta à água.

Não vieram ali para caçar.

Vieram para lembrar.

Para sentir.

Ao final do dia, quando o céu já tingia-se de vermelho profundo e as primeiras estrelas brotavam timidamente no alto, os dois estavam deitados na grama úmida, lado a lado, olhando o firmamento.

Nenhuma palavra foi dita.

Nenhuma era necessária.

Naquele dia, o mundo lá fora podia esperar.

O lago os guardava.

O silêncio os acolhia.

Mas... A mente de Oliver voltou a pensar... Ele sabia que tinha algo mais ali... Era seu pai? As memórias eram verdadeiras? Ele sentia que sim, mas sua mente dizia que tinha algo a mais.

Em outro lugar, muito distante do reino.

A areia dançava ao sabor do vento noturno, fina como cinzas, arrastando-se pelo imenso deserto sob o manto escuro do céu.

Os pecados pararam de voar.

Panthar avançava com seus passos suaves e saltitantes, a forma de coelho distorcida pela presença densa de energia ao redor.

Lethion o acompanhava, deslizando silenciosamente sobre a areia como uma sombra felina, seus olhos semicerrados atentos a qualquer mudança no ar gelado da noite.

No horizonte, surgiu a silhueta do templo.

Gigantesco.

Imponente.

Esquecido.

A estrutura emergia do deserto como um cadáver de pedra antiga, coberto por musgo morto e rachaduras que contavam histórias de eras que nem mesmo os pecados lembravam direito.

Ambos pararam por um instante diante da entrada, seus olhos se cruzando.

Sem palavras.

Apenas um movimento de cabeça.

Um pacto silencioso.

E então, entraram.

O interior era frio, seco, o cheiro de poeira antiga misturado com algo que nem o tempo conseguiu apagar... O peso de uma presença que já não habitava mais ali, mas deixara marcas demais para ser esquecida.

Runas cobriam os pilares, pulsando fracamente.

Símbolos antigos, outros conhecidos, outros nem mesmo decifráveis.

Mas nada disso chamou a atenção dos dois.

Eles não vieram por curiosidade.

Vieram por instinto e respostas.

E foi isso que os guiou até uma sala oculta, escondida por trás de uma parede que cedeu com facilidade demais.

O espaço ali dentro era mais amplo do que deveria ser.

A luz que entrava pelas frestas das pedras iluminava o centro.

E lá estava.

Um mural pintado à mão, quase apagado pelo tempo, mas ainda feroz em presença.

A imagem de uma raposa colossal, rugindo contra algo ainda maior.

Uma criatura reptiliana de proporções inimagináveis.

De pé.

O torso erguido como o de um rei, as escamas negras refletindo o brilho das estrelas que não estavam ali.

A verdadeira forma do Pecado do Orgulho.

Lethion se aproximou em silêncio, os olhos arregalados.

No chão, abaixo da pintura, havia algo mais.

Uma frase entalhada.

Poucos poderiam lê-la.

Mas Lethion entendeu cada palavra como se tivesse sido dita em seu ouvido.

"Desde que conheci aquela humana... Eu não estou completo... Então... irei atrás do pedaço que me falta."

Um arrepio percorreu sua espinha.

Ele se virou de forma brusca.

Panthar já o encarava.

Não era surpresa no olhar da coelha.

Era compreensão.

E um aviso silencioso..

O orgulho não havia sumido...

Apenas estava com seu plano em ação...

Usando as marcas deixadas no braço do detetive, eles se teletransportam.

O mundo girou em silêncio.

E então, veio o impacto.

O ar mudou.

A luz mudou.

O cheiro...

Era o de cinzas vivas.

O Reino Dracônico, antes firme e indestrutível, estava em ruínas.

O céu, outrora vermelho, agora era coberto por uma fumaça densa, tingida de laranja pelas chamas que dominavam a paisagem.

Torres haviam desabado.

Estruturas milenares derretidas pelo calor brutal.

Dragões feridos lutavam para conter labaredas que não pareciam naturais, dançavam de forma consciente, como se perseguissem algo.

No horizonte, os campos que antes abrigavam festivais e treinamentos estavam tomados por crateras, buracos abertos no chão como feridas expostas, expelindo vapor e mana instável.

Panthar e Lethion não hesitaram.

Avançaram como sombras entre os escombros, desviando de chamas errantes e pedras em colapso.

Adentraram o castelo.

Ou o que restava dele.

As colunas estavam trincadas, o teto parcialmente desmoronado.

No coração do grande salão, a cena era ainda mais grave.

Raviel ajoelhada ao lado do corpo caído de Noctarion.

O peito do dragão fora perfurado com tamanha violência que a carne e os ossos ainda pareciam trêmulos, tentando se recompor enquanto Raviel canalizava energia e derramava liquido de seus fracos, com mãos trêmulas, lacrimejantes.

Hestia, com as mãos erguidas, sustentava uma das estruturas maiores do teto com pilares de gelo, a testa coberta de suor.

Suas pernas tremiam, mas ela não recuava.

Ela não podia.

Melyris ajudava criando pilares de Éter.

Do outro lado do salão, parada junto à janela quebrada, estava Nyx.

Imóvel.

Intocada pelas chamas, pelos gritos, pelo caos.

A brisa agitava os fios laranja de seu cabelo enquanto ela observava o mundo lá fora com olhos fixos.

Panthar notou seu olhar.

Curioso, se aproximou.

Seguiu o campo de visão dela.

E viu.

Entendeu na hora.

Era... uma presença.

Um vulto no horizonte que não pertencia a este plano.

Era como se o próprio desespero tivesse tomado forma.

O ar ao redor daquela figura se despedaçava como vidro, e a terra tremia sob seus passos.

Havia nome.

Havia descrição possível.

O pressentimento cruel e absoluto...

De que aquilo seria uma complementa...

Calamidade.