As correntes em seus pulsos não o impediam de sonhar com a liberdade. Ainda assim, Dorian já não acreditava que a veria de novo. Os dias em cativeiro em Thalgal o haviam quebrado pouco a pouco, até restar apenas o reflexo de um rei — e de um pai.
Mas naquela noite, algo mudou.
Um ataque repentino, vindo de fora das muralhas, deixou a fortaleza em alerta. Um grupo de mercenários, provavelmente contratado por aliados de Lunaris, havia invadido os arredores de Thalgal. O caos abriu brechas que Dorian nunca pensou ter.
Um dos guardas que o vigiava — ferido, cambaleante — caiu no chão, deixando a porta entreaberta. Um segundo de hesitação, depois o instinto falou mais alto. Dorian correu, descalço, com os tornozelos machucados e o corpo exausto.
Passou por corredores tomados pela fumaça e ouviu gritos ao longe. Jogou-se pela lateral de uma ponte, caindo em um rio abaixo. A água gelada cortou sua pele como lâminas, mas o levou para longe — até o coração das florestas de Thalgal.
Foram dias escondido. A febre veio, o corpo vacilou, mas a vontade de voltar... essa o manteve vivo. Ele precisava voltar. Para o povo. Para o filho — se é que ainda estava vivo.
Foi quando, ao passar por uma trilha próxima a uma vila esquecida, ouviu um som familiar: um choro fraco, de bebê.
Algo dentro dele se apertou. Caminhou em direção ao som, quase sem forças. Encontrou uma pequena cabana de aparência abandonada. A porta estava entreaberta, e dentro, envolto em panos simples, um bebê chorava sobre uma cama de feno.
Dorian se aproximou, cauteloso. Quando o bebê virou o rostinho úmido em sua direção, seu coração parou por um segundo.
Os olhos. Aqueles olhos.
Não era apenas a cor — um âmbar dourado que parecia capturar a luz do sol — mas o brilho. O mesmo brilho que ele viu tantas vezes no olhar da rainha. A mesma cor rara que o hipnotizou no instante em que segurou seu filho pela primeira vez.
Por um instante, o tempo parou.
Dorian se ajoelhou, como se algo maior do que ele o puxasse. O bebê estendeu as mãozinhas trêmulas e segurou o dedo dele com uma força inesperada.
— Não pode ser... — murmurou, a voz embargada. — Mas... são os olhos da sua mãe.
Um nó apertou sua garganta. Lágrimas subiram aos olhos, silenciosas. Ele passou a mão pelos cabelos do bebê, sem saber ao certo o que sentia. Esperança, medo, saudade.
Era improvável. Talvez fosse apenas coincidência.
Mas aqueles olhos... estavam ali.
E com eles, a esperança de que talvez... só talvez... seu filho ainda estivesse vivo.
Ele envolveu o bebê com o cobertor que carregava, segurando-o com cuidado, e olhou para a estrada que levava de volta a Lunaris.
Mesmo sem provas, o coração de um pai falava mais alto. E ele escolheu acreditar.