Enquanto, do outro lado da fronteira, os rastros de Dorian ainda eram perseguidos com fervor por soldados de Thalgal, em Lunaris, os curandeiros já estavam a caminho do Castelo às pressas para tratar dos ferimentos do rei.
O sol mal havia tocado os telhados de Lunaris quando os curandeiros chegaram ao castelo. O som apressado dos passos ecoava pelas pedras antigas, e o cheiro de ervas medicinais tomou os corredores antes mesmo que eles cruzassem a porta do quarto.
Dorian estava deitado, ainda com o corpo tenso e os olhos abertos, apesar do cansaço evidente. Seu rosto estava pálido, manchado de poeira e sangue seco, e cada respiração parecia pesar toneladas.
— Sua Majestade — disse um dos médicos, se aproximando com respeito. — Precisamos começar o tratamento imediatamente.
Dorian apenas assentiu com um leve movimento de cabeça.
Com mãos ágeis e vozes baixas, os curandeiros começaram a limpar os cortes e feridas. Uma curandeira preparava uma infusão escura numa pequena tigela de cerâmica. Cedrik, que observava em silêncio, se aproximou ao vê-la soprar levemente o líquido quente.
— Tintura de papoula? — perguntou.
— Para aliviar a dor e ajudá-lo a descansar. — A mulher olhou para o rei. — Ele precisa disso para suportar o restante do tratamento.
Dorian ainda tentou protestar, mas seus olhos começaram a pesar logo após o primeiro gole. Os músculos se relaxaram, e a tensão em sua testa desapareceu aos poucos.
— Ele resistiu até agora por pura força de vontade — murmurou Cedrik, observando enquanto os curandeiros terminavam de enfaixar os ferimentos. — Mas nem mesmo um rei pode lutar contra a exaustão por tanto tempo.
Ao lado da cama, o bebê ainda dormia em paz, alheio ao caos que se erguia fora das muralhas.
E enquanto Lunaris cuidava de seu rei ferido, os ventos da guerra seguiam soprando.
Mas no silêncio do quarto, abafado pelo cheiro de ervas e murmúrios apagados, outra tempestade se formava — invisível, interna, feita de lembranças e sombras. Sob o efeito da tintura de papoula, o rei adormeceu... mas sua mente permaneceu inquieta.
No sonho, havia uma névoa espessa que cobria o mundo, e Dorian caminhava por ela como quem procura algo que não sabe o que perdeu. Passos ecoavam atrás dele, mas sempre que se virava, via apenas vultos se desfazendo ao longe. O chão era de pedra, depois terra, depois folhas secas. E então, silêncio.
À frente, uma árvore de tronco retorcido e folhas vermelhas balançava suavemente, como se esperasse por ele. Aos seus pés, um pequeno berço repousava, envolto por raízes e musgo. Dentro, uma criança. Sozinha. Chorando baixo, como se até no sonho tivesse medo de incomodar.
Dorian se aproximou devagar, o coração pesado com uma sensação que não sabia nomear. Quando seus olhos encontraram os da criança, algo se agitou em seu peito — um pressentimento, um nó que ele não sabia desfazer.
— Como você veio parar aqui? — sussurrou, sem esperar resposta.
A criança estendeu a mãozinha e segurou o dedo dele com força. Tão pequena, tão frágil… e ainda assim, havia algo de familiar naquele toque.
O choro cessou. Mas o vento mudou.
Sussurros começaram a se espalhar ao redor da árvore, vozes antigas, distorcidas, sussurrando segredos que Dorian não compreendia. Um trovão ecoou ao longe, e as folhas começaram a cair como lágrimas vermelhas. O berço desapareceu.
E, de repente, ele estava só.
Acordou com o corpo frio de suor e os olhos arregalados. Por um instante, não soube onde estava. Então viu as paredes do quarto, a luz fraca da manhã entrando pela janela, o som distante de passos no corredor.
Virou a cabeça.
O bebê ainda dormia ao seu lado, tranquilo.
Kadric.
Dorian fechou os olhos por um momento, tentando afastar a estranha angústia que o sonho deixara. Talvez fossem só os efeitos da papoula. Talvez não.
Mas uma pergunta insistia em sua mente:
Como, de fato, esse bebê chegou até mim?