O LEÃO SE MACHUCA

É fantástico poder viajar! Aquela tranquilidade, o sentimento incrível que habita nossos corações e nos coloca em uma sinfonia maravilhosa de paz, serenidade e leveza. Pela primeira vez, eu ia para um lugar distante do meu pai, onde minha mãe e eu passaríamos as férias. Nunca imaginei sentir algo tão bom, uma sensação de liberdade, de poder aproveitar o momento. Aquele frio de Sapezal e os campos de soja transformavam a cidade em um imenso campo de futebol.

O mais curioso sobre minha personalidade é essa euforia de me sentir liberto, longe das restrições do mundo e daquela sinfonia sufocante de ordens: "Você tem que fazer isso", "Tem que fazer aquilo", como se eu não soubesse. Como se minha vida existisse apenas para cumprir os objetivos de outra pessoa. Quando criança, eu enxergava meu pai como um leão, sempre preparado para atacar qualquer ameaça que pudesse me assustar ou colocar em perigo. Eu me sentia incapaz de andar livremente, pois, a qualquer momento, algo poderia surgir. E, na minha cabeça, passar as férias longe dele era como se uma voz dissesse: "Você está livre, divirta-se!"

Eu podia bagunçar, fazer tudo que uma criança arteira quisesse. Mas, infelizmente, o mundo real não funciona assim. Há limites por diversos motivos que, até hoje, ainda não entendo completamente.

Certo dia, enquanto brincava com meu primo, o telefone tocou. Atendi e era meu pai. Ele perguntou por mim e por minha mãe, e, de repente, desabou em lágrimas. Era como se um leão tivesse acabado de perder um filho por não estar presente para protegê-lo. No mesmo instante, perguntei:

— Pai?

Rapidamente, ele pediu que eu passasse o telefone para minha mãe e, assim que o fiz, ele desligou. Fiquei sem entender aquela situação. Como um homem sério e de poucas palavras podia chorar de saudades? Para mim, aquilo era incompreensível. Afinal, meu pai biológico não chorou quando deixou minha mãe e eu à própria sorte.

Era como se, por um lado, um leão forte e poderoso devorasse seus próprios filhos para não gastar energia e força os protegendo. E, por outro, um leão, mesmo em desvantagem, lutasse com todas as suas forças até o último dia de sua vida para proteger aqueles que um dia o chamariam de pai. Um pai que, com seus ensinamentos e bravura, criaria seu filho com a mesma determinação.

Depois desse episódio, contei tudo para minha mãe. E então voltamos para casa.