Em um lugar coberto por névoa escura, pequenas esferas amarelas flutuavam lentamente pelo ar, como se fossem memórias esquecidas vagando sem rumo. Espalhados pelo chão plano e irregular, pedaços de lagunas antigas se misturavam ao vazio, dando ao ambiente um aspecto abandonado e misterioso.
A única iluminação vinha de uma luz suave e pulsante que alternava entre verde, roxo e vermelho. Não havia cheiro algum — apenas silêncio.
No centro daquele cenário surreal, uma cadeira velha e gasta chamava atenção. O menino, silencioso, se aproximou dela com passos leves. Seus olhos observavam tudo com cautela e curiosidade. Ao alcançar a cadeira, passou a mão sobre o encosto, sentindo a textura desgastada, e então se sentou lentamente.
— Então é aqui onde vocês ficam? — murmurou Takeshi criança, olhando para o espaço quase vazio à sua frente.
Foi então que, em meio à névoa, uma presença se revelou. A mulher de véu roxo surgiu silenciosamente, sua simples aproximação dissipando a névoa ao redor como se ela comandasse o próprio ambiente. Seus passos não faziam som algum, mas sua presença era pesada e inevitável.
Ela ergueu o dedo indicador com leveza e, com um olhar inquisidor, disse:
— Sim. Agora, você vai me responder... como você existe? — sua voz era suave, mas havia algo de ameaçador nela, como se a qualquer momento pudesse revelar algo terrível.
Com um simples gesto, ela moveu algo dentro da névoa.
A criança observou a movimentação ao redor com atenção. Um sorriso brincou em seus lábios antes de soltar, com uma calma provocativa:
— Pensei que você soubesse a resposta. Você entra nas informações, achei que já tivesse descoberto — ele soltou uma risada leve, quase inocente.
Na penumbra, a mulher de véu roxo sentiu a raiva subir discretamente. Ela não demonstrou em seu rosto, mas dentro de si, o incômodo crescia. A criança, alheia ou apenas indiferente, não notou — ou fingiu não notar.
Ela deu alguns passos à frente, seus pés mal tocando o chão enevoado, e comentou com um tom ambíguo:
— Fascinante. Você não é apenas uma parte dele… você tem sua própria consciência.
Então, algo começou a mudar.
As antigas lagunas ao redor começaram a se mover, girando lentamente como peças de um quebra-cabeça. Aos poucos, formaram uma mesa gigantesca no centro do espaço, ornada com cores vivas: azul, amarelo, verde e roxo, que pulsavam com uma energia estranha.
Pequenas velas surgiram nos quatro cantos da mesa, suas chamas azul-esverdeadas dançando silenciosamente no ar denso.
Ao centro, repousava uma taça pequena, simples, sem qualquer adorno. Nada em sua cor ou material chamava atenção — e exatamente por isso, ela se destacava.
O garoto encarou tudo com seriedade. Seus olhos fixaram na taça, como se algo dentro dele finalmente se conectasse. Com a ponta do dedo, tocou a superfície da mesa e sussurrou:
— Isso é um jogo sujo com ele… Finalmente entendi que lugar é esse.
Pegou uma das velas, observando sua chama instável, e a moveu com curiosidade, antes de continuar:
— Esse lugar é moldado com base no poder dele, não é? Mas também parece ligado à mente… aos pensamentos profundos dele.
A mulher sorriu, um sorriso tênue e intrigado. Ela se aproximou da mesa, mantendo os olhos fixos no garoto.
— Para uma criança… você é surpreendentemente inteligente — disse ela, passando o dedo delicadamente pela superfície da mesa, como se acionasse algo invisível.
O nevoeiro denso começou a emitir sons estranhos, como se algo estivesse se arrastando por entre a névoa. Um chiado baixo se intensificou até que, à esquerda da mesa, surgiu a lamparina do homem misterioso, flutuando suavemente.
A mulher de véu roxo virou-se com um leve sorriso no rosto, mas seus olhos denunciavam um incômodo sutil.
— Então você veio até aqui. Eu estava conversando com o nosso novo... companheiro — disse ela, com um tom amigável forçado, deixando claro que não estava muito satisfeita com a presença da criança.
O homem aproximou-se sem pressa, sua silhueta envolta pela névoa. Ele segurava a lamparina com uma das mãos e, com a outra — envelhecida, de dedos finos e unhas alongadas — tocou a superfície da mesa, fazendo um som seco ecoar pelo lugar.
— Parece que estavam se divertindo sem mim — comentou, com um tom neutro, mas carregado de intenções.
A criança sentiu um arrepio peculiar — um calor gélido que percorreu sua espinha. Ele sabia, com uma certeza instintiva, que aquelas duas figuras estavam muito além dele. Seres que não pertenciam a nenhum nível comum.
Reajustou-se na cadeira, tentando manter uma postura firme. Cruzou os braços com calma, e seus olhos se tornaram afiados, carregados de desconfiança.
— Vocês só querem saber como eu existo, não é? — disse ele, tentando manter o controle. Não podia se dar ao luxo de revelar nenhuma fraqueza.
Os dois encararam a criança em silêncio. Apenas aquele olhar conjunto foi suficiente para tornar o ar ao redor mais denso, como se o próprio espaço estivesse se curvando à presença deles.
O homem girou lentamente sua lamparina, como sempre fazia — parecia ter um apego incomum por aquele objeto. Então, com a voz grave e arrastada, disse:
— Claro. Mas não é só isso. Queremos saber se você já existia desde a primeira tarefa.
A criança engoliu em seco. Ele não queria admitir que havia surgido apenas agora... Mas viu ali uma oportunidade. Um pequeno sorriso se formou em seus lábios e ele respondeu, com um tom provocativo:
— Eu posso responder. Mas só se vocês também me derem algumas respostas. Que tal uma troca justa? — ele quase riu, mas conteve a vontade.
O homem arqueou uma sobrancelha, surpreso.
— Você acha que pode barganhar conosco...?
Antes que ele continuasse, a criança ergueu a mão, tocando o queixo como se ponderasse, e o interrompeu:
— E, pelo jeito, vocês não têm acesso completo a nós. Se tivessem, já saberiam como eu existo. Aposto que também têm dúvidas sobre outras coisas nele... sobre por que escolheram ele — seus olhos brilharam por um instante. — Se querem respostas, terão que me dar algumas em troca.
A mulher e o homem se entreolharam, claramente surpresos. Não esperavam tamanha perspicácia. A maneira como ele analisava e se adaptava à situação era diferente — quase... mais afiada do que a versão adulta.
O que eles ainda não sabiam é que, por compartilhar a mesma essência de Takeshi, a criança tinha acesso às suas memórias, pensamentos e desejos. Contudo, também possuía sua própria consciência. Seu próprio modo de pensar.
A criança levou a mão à cabeça, pensativo, e então falou com firmeza:
— Vamos fazer assim. Se quiserem saber como eu existo, primeiro terão que me contar por que querem tanto o Takeshi adulto.
A proposta causou uma reação imediata. Ambos ficaram visivelmente incomodados, expressando sua irritação de forma contida. O acordo não os agradava nem um pouco.
Aproveitando o impacto, ele prosseguiu com voz séria:
— Por enquanto, o que eu quero saber é sobre os guardiões das tarefas, este lugar... e sobre a lua falsa. Se não aceitarem, posso simplesmente recusar qualquer outra negociação.
Mesmo sem saber exatamente a resposta sobre sua própria existência, ele decidiu usar isso como moeda de troca. Era uma jogada arriscada — mas inteligente.
Por mais diferentes que fossem, a criança sabia que precisava ajudar sua versão mais velha. Enquanto o Takeshi adulto era impulsivo e inexperiente, ele era observador, rápido e estrategista. E, mesmo que não fossem iguais... ainda eram o mesmo.
Os dois finalmente perceberam que aquela criança era mais do que aparentava — ele sabia negociar. Sabia observar. Sabia jogar.
A mulher ajeitou o véu com elegância e disse com um sorriso sutil:
— Muito bem... podemos aceitar. Mas, em troca, queremos saber sobre o seu corpo… e sobre a habilidade Verme dos Aspectos.
O ar ficou pesado de repente.
A criança travou por um instante. Aquela exigência mexeu com ele. “Seu corpo?” Ele não compreendia totalmente o que isso significava ali, mas sabia que era algo importante, algo sensível. Especialmente naquele mundo.
Disfarçando a tensão, ele mexeu os dedos dos pés sob a mesa, tentando manter a calma.
O homem da lamparina sorriu como se tivesse vencido uma rodada do jogo. Estava satisfeito por ter abalado a mente do garoto. E então, com um tom ainda mais sombrio, completou:
— Se não aceitar essa segunda parte… podemos incluir mais uma condição: queremos saber como você conseguiu entrar aqui.
A criança respirou fundo. Por dentro, seu pensamento era um redemoinho:
“Droga… esses dois são bons. Isso é um jogo mental. Calma. Vamos com calma. Isso é para a gente viver… para proteger ele… pensa direito.”
Ele permaneceu em silêncio por alguns segundos, memorizando cada detalhe. A tensão agora não estava apenas na mesa… estava dentro dele.
Mas ele não ia recuar tão fácil.
A criança abriu os olhos, um brilho inesperado de felicidade passando por eles. Então, com a voz firme, declarou:
— Tudo bem. Eu aceito. Prefiro responder à primeira proposta… sobre como entrei aqui e sobre meu corpo.
Por dentro, estava aliviado. Aquela escolha parecia a menos perigosa — por enquanto.
Os dois seres sorriram, satisfeitos com a resposta. Mas, antes que pudessem dizer qualquer coisa, a criança ergueu um dedo, interrompendo o momento.
— Mas… — ele sorriu de canto — ainda tem mais uma coisa. Vocês vão ter que me contar o que é essa taça.
Ele apontou para o objeto no centro da mesa, com uma expressão provocadora.
— Ela parece simples, né? Mas nada nesse lugar é simples. Então… podem falar dela.
O sorriso dos dois se desfez por um breve instante. Olhares trocados. Surpresa. Como se, de repente, tivessem se dado conta de que não estavam lidando com uma simples projeção ou fragmento… mas com alguém que, mesmo jovem, sabia muito bem o jogo que estava jogando.
E ele estava vencendo.
O homem olhou diretamente para ele, a lamparina tremulando em sua mão, e disse com um leve sorriso:
— Claro. Eu aceito suas condições. Você realmente é diferente… está longe de ser algo comum.
A criança apoiou a cabeça na mesa, descontraído, e respondeu com um riso leve:
— Que isso... não sou muito fã de elogios, sabia? — ele brincou, mantendo o tom provocador.
Apesar do tom casual, o clima continuava carregado.
A mulher lançou um olhar para a taça no centro da mesa e disse com firmeza:
— Já que aceitamos o acordo... vamos analisar seu corpo primeiro.
Assim que suas palavras ecoaram no ar, a atmosfera ficou densa, sufocante. A pressão aumentou de tal forma que parecia capaz de esmagar o pequeno corpo da criança ali mesmo.
De repente, uma mão invisível, envolta por uma aura roxa pulsante, atravessou o peito da criança. No instante seguinte, seu corpo começou a se fragmentar, como se estivesse coberto por rachaduras de vidro espelhado.
Mas então, uma aura multicolorida explodiu de dentro dele — linhas vivas de energia se entrelaçaram e repeliram a mão invasora com força. A pressão recaiu sobre a mulher, que cambaleou um passo para trás, surpresa.
Ela estreitou os olhos, impressionada.
— Pelo jeito... você realmente é algo novo. Nunca vi algo assim.
A criança respirou fundo, levando a mão ao peito, ainda sentindo a dor latejante da tentativa de invasão. Seus olhos se mantiveram firmes, decididos.
— Agora que já conseguiu o que queria… quero minha parte do acordo. Quero saber sobre os Guardiões da Tarefa.
O homem girou levemente a lamparina entre os dedos, lançando um olhar curioso para a mulher. Com a voz baixa e intrigada, perguntou:
— Eu não entendi o que você viu. Pode me explicar o que exatamente é... o corpo dele?
A mulher então apontou para a criança, os olhos fixos em sua forma, e respondeu:
— O corpo dele não é feito de matéria física comum. É composto pelas histórias que o Takeshi adulto viveu, pelos marcos que ele conquistou. Cada experiência moldou esse corpo. É por isso que... ele é tão grandioso.
A criança soltou uma risada baixa, cruzando os braços com um sorriso brincalhão.
— É meio estranho como você fala com tanta admiração de mim... adulto. Sabe, seria um crime se você gostasse de mim agora, já que eu ainda sou só uma criança.
O homem riu suavemente, claramente se divertindo com a ousadia da resposta. Seus olhos brilharam em um tom alaranjado intenso enquanto olhava fixamente para a criança.
— Eu acho que... só com essa resposta já deu pra entender como você existe.
A expressão do garoto mudou na hora. Um choque percorreu seu rosto enquanto um pensamento atravessava sua mente como um raio:
"É verdade... caramba, como fui burro agora. A resposta sobre meu corpo já diz tudo."
A criança engoliu em seco, percebendo que havia entregado mais do que queria. Tentou manter a expressão tranquila, mas o olhar dos dois seres à sua frente revelava algo claro: eles também tinham percebido.
O homem sorriu de forma contida, satisfeito. A mulher, por outro lado, apenas observava em silêncio, como se estivesse esperando o próximo passo.