— Demorou para acordar — disse Anika, com as pernas cruzadas e um olhar tranquilo.
Takeshi abriu os olhos lentamente, avistando-a sentada à frente da árvore, sob o céu estrelado. As estrelas cintilavam suavemente, e o vento leve fazia seus cabelos se moverem com delicadeza.
Ele se ergueu do chão, ainda um pouco atordoado, e logo percebeu que o braço que havia sido arrancado já não sangrava nem doía. Com a única mão que lhe restava, levou os dedos à cabeça, respirando fundo enquanto pensava:
“Pelo menos… eles estão a salvo, por enquanto.”
Uma leve dor de cabeça incomodava, mas o que realmente o perturbava eram os sentimentos embaralhados dentro de si — confusos, distorcidos, como se tudo estivesse fora do lugar.
Anika o observava em silêncio e, vendo seu esforço, aproximou-se com expressão preocupada.
— Não precisa forçar — disse ela, com gentileza.
— Pode ficar tranquila. Estou bem — respondeu ele, forçando um pequeno sorriso.
Mas, ao olhar atrás dela, seus olhos se fixaram em algo estranho: as esferas alaranjadas agora exibiam silhuetas de crianças… todas segurando discretamente as bordas das roupas de Anika.
— Essas coisas...? — Takeshi apontou com o que restava da mão.
Anika se virou lentamente e observou as figuras atrás dela.
— Ainda não sei ao certo... mas acredito que sejam algum tipo de espírito. E veja aquilo também.
Ela então apontou para a frente. Takeshi seguiu o olhar e viu algo inesperado: seu sistema, com a interface azul brilhante, estava flutuando e trocando provocações com Ethan. O sistema se movia de um lado para o outro, quase como se estivesse dançando, enquanto Ethan, furioso, socava a parede com raiva crescente.
“Isso não vai durar muito...” Takeshi sentia seus pensamentos se desmancharem pouco a pouco.
A raiva subiu repentinamente. Seus olhos tremiam, e ele moveu as pernas de leve, tentando reorganizar as ideias.
“A restrição não vai segurá-lo por muito tempo. Pela personalidade dele... é impulsivo, instável. Qualquer provocação pode ser o estopim.”
Ele manteve o olhar fixo adiante, ignorando completamente as palavras de Anika ao seu lado.
“Essa tarefa vai demorar. Ainda há a árvore... mas afinal, o que ela realmente faz?”
— Tá me escutando, idiota?! — Anika gritou, agora visivelmente irritada, com os punhos cerrados.
Takeshi apenas assentiu com a cabeça e se aproximou da árvore. Assim que chegou perto, sentiu uma pressão intensa irradiando dela. O chão sob seus pés brilhou com um dourado tênue, e uma sensação incômoda tomou conta de seu corpo.
Seus sentimentos, já confusos, se embaralharam ainda mais. Um sorriso involuntário surgiu em seu rosto, enquanto seus olhos se arregalavam, como se suplicassem por socorro silencioso.
Foi então que uma voz grave, masculina, ecoou em sua mente — firme e imponente, como se estivesse raspando por dentro de seus pensamentos.
— Como você descobriu este lugar?
Uma neblina dourada envolveu seu corpo, ondulando lentamente ao seu redor. Ela o tocava de maneira sutil, quase respeitosa, como se o examinasse. Após alguns instantes, a voz voltou:
— Você é diferente... Talvez seja daquele planeta esquecido.
Takeshi caiu de joelhos, pressionando a cabeça com força. As palavras da entidade ecoavam como trovões em sua mente, cada uma delas acendendo chamas invisíveis que percorriam todo o seu corpo.
— Vai me matar? Se for isso, sinceramente… não me importo mais.
A figura misteriosa ficou em silêncio por um instante, surpresa com a ousadia na voz de Takeshi.
— Para alguém comum… você é incrivelmente insolente.
Takeshi se levantou devagar, sem desviar o olhar. Seus pensamentos se alinharam como lâminas prestes a cortar o silêncio.
“Está na hora de usar… a minha nova habilidade. Visão da Noite.”
Assim que ativou o poder, a neblina dourada ao redor se dissipou instantaneamente, como se fosse queimada por sua presença. Em seu olho direito, uma energia escura começou a pulsar, e uma visão oculta se revelou.
Na base da árvore, escondida aos olhos comuns, surgiu a silhueta de algo… completamente diferente. Um ser disforme, enraizado no próprio tronco, jorrando um líquido negro viscoso que contrastava de forma gritante com o dourado ao redor.
— Aaaaah!... Maldito! — a voz reverberou com ódio e terror.
A árvore tremia, e a silhueta sombria recuava em desespero. Pela primeira vez, aquele ser sentia medo — um medo real e profundo.
Takeshi ainda não percebia, mas seus olhos haviam assumido um tom carmesim intenso. Um sorriso brotou em seus lábios… mas não era dele.
Era o sorriso de algo muito mistérioso. Muito mais cruel. Algo que despertava dentro dele com um brilho vermelho que cortava a neblina como uma lâmina viva.
A barreira ao redor se desfez num estalo seco, como vidro rachando no ar. Um grito gutural ecoou na escuridão.
— Quem é você?! — rugiu a entidade, sua voz vibrando como trovão.
Num instante, Ethan desapareceu da posição onde estava e surgiu diante de Takeshi, veloz como um raio. Mesmo com o medo atravessando seu peito, Takeshi manteve a calma. Olhou de relance para o sistema flutuando ao lado.
— Espada comum. — disse com firmeza.
Um brilho metálico surgiu em sua mão no mesmo instante.
Anika tentou reagir, mas seus olhos mal acompanharam o movimento. Sua voz escapou, quase abafada pela surpresa.
— Como assim, seu filho da…?
Mas já era tarde demais.
Takeshi sorriu — um sorriso frio e decidido. A lâmina estava cravada na barriga de Ethan antes que ele pudesse entender o que aconteceu. A espada era comum, pequena, sem encantamentos... e ainda assim, letal.
— Achou mesmo que eu acreditaria em vocês? — disse ele, com os olhos firmes e um tom de desprezo. — Vão se ferra.
Ele empurrou a espada com força, afundando-a mais fundo. Ethan gritou de dor, ajoelhando-se, surpreso e furioso.
“Como eu suspeitava… qualquer item comprado aparece diretamente na minha mão. Foi útil ter comprado algo tão simples na última hora.”
A loja ainda estava aberta em seu sistema. Takeshi usara o próprio sistema a seu favor, num movimento rápido e inesperado. Não era poder bruto… era estratégia.
Enquanto Ethan caía, tossindo sangue, Anika se aproximou em silêncio, surpresa com o golpe repentino e preciso.
Takeshi ergueu o olhar, encarando as esferas laranjas que flutuavam ao redor como olhos silenciosos.
— E vocês… vão mesmo continuar obedecendo a ele? — Sua voz saiu firme, cortante. — Anika, pegue essas coisas.
Ela hesitou por um instante, confusa. O tom de Takeshi estava diferente… havia algo sombrio por trás de suas palavras. Estava prestes a recusar quando ele falou novamente, com uma calma gélida:
— Isso deixaria sua mestra feliz, não deixaria? Vá… e pegue.
Anika engoliu seco. Sentia um frio percorrer a espinha. Mesmo assim, caminhou até as esferas. Quando tentou tocá-las, elas começaram a se debater, tentando escapar, mas não conseguiam se afastar de sua mão. Era como se estivessem vivas… e presas.
Enquanto isso, Takeshi se voltou para Ethan. O corpo do inimigo estava coberto de suor, os olhos arregalados de pavor. Ele tremia, os joelhos mal sustentando seu peso. A respiração era curta e desesperada.
— Ethan… vai mesmo morrer assim? De joelhos?
O silêncio cortante foi preenchido apenas pelo som ofegante de Ethan, até que ele murmurou, com a voz fraca, rachada pelo medo:
— …Não me mate…
Takeshi permaneceu imóvel, observando Ethan com um olhar inexpressivo. Não havia raiva. Não havia piedade.
Apenas silêncio.
"Pessoas assim… são sempre as primeiras a implorar." — pensou, com uma lucidez fria.
Uma lembrança atravessou sua mente como um relâmpago. Viu Akira, seu antigo amigo, ajoelhado diante do chefe, suplicando perdão por um erro no trabalho que jurava dominar. A arrogância de outrora havia sumido, substituída por lágrimas e desespero.
Era sempre assim. Quem grita mais alto no início, geralmente é quem mais teme o fim.
Um leve sorriso se formou nos lábios de Takeshi, enquanto seus olhos carmesim se acendiam com uma intensidade inquietante. Ele se aproximou, curvando-se levemente para encarar Ethan nos olhos.
— Então me diga… — sua voz era suave, porém carregada de um peso imenso — …você quer viver?
Ethan com a boca quase fraca e difícil de dizer algo
— É… lógico que eu quero.
O sistema azul dele apareceu do lado dele bastante feliz pela forma de Takeshi agora. Seus sentimentos estavam explodindo pelas ações de agora.
— Posso deixá-lo viver… — Takeshi disse com frieza, inclinando a cabeça levemente — se aceitar ser meu aliado. Vai escolher isso… ou prefere morrer aqui, como os outros?
Ethan, mesmo ensanguentado, com os lábios tremendo e o corpo em frangalhos, cuspiu sangue no chão.
— Eu nunca… vou me aliar a alguém como você…
Takeshi suspirou com desdém e voltou os olhos para o sistema, que o observava em silêncio.
— Entendido — murmurou, com um tom impassível. — Então morra. Assim como seus amigos… todos fracos, todos insignificantes.
Ethan, tomado pela raiva, tentou levantar a cabeça com esforço, mas seu corpo já não respondia com firmeza. Tremendo, ele apenas rosnou em frustração.
Takeshi então voltou-se para a árvore imponente à sua frente, os olhos afiados como lâminas.
— E você… — disse em tom firme — agora me diga, quem é você de verdade?
A árvore permaneceu em completo silêncio. A silhueta que antes pairava sobre ela desabou lentamente, como se a essência tivesse sido drenada. O corpo etéreo caiu ao chão, dissolvendo-se em fragmentos escuros.
De repente, uma dor aguda atravessou o olho direito de Takeshi. Ele levou a mão ao rosto, fechando os olhos com força.
Quando voltou a abri-los, sua visão estava diferente. O ser que antes conseguia enxergar havia desaparecido… e agora tudo o que via através daquele olho era um vazio escuro e profundo.
O sistema azul brilhou intensamente e então transmitiu a mensagem mental com leveza:
『Essa habilidade possui essa penalidade. Não se preocupe, seu olhar permanecerá assim por enquanto.』
Takeshi assentiu com um suspiro contido.
— Obrigado pela informação.
Em seguida, voltou-se para Anika, que lutava para manter o controle das esferas alaranjadas que se moviam em alta velocidade entre seus braços.
— Anika, segure essas coisas com firmeza.
— Mas... — ela hesitou, os olhos fixos nas esferas agitadas.
Takeshi a encarou com seriedade, mas com um tom calmo e direto:
— Sei que parecem inofensivas, mas tome cuidado. Só... obedeça por agora. Prometo que não tenho intenção de machucar essas criaturas.
Mesmo desconfiada, Anika assentiu lentamente, sentindo o peso não apenas das esferas, mas também da confiança silenciosa que Takeshi depositava nela.
“Agora falta pouco. Só preciso entender qual é a verdadeira função dessa árvore.”
Takeshi se aproximou e tocou o tronco com firmeza. A energia ao redor parecia vibrar levemente ao seu toque.
— Vai cooperar de forma pacífica ou pretende seguir o mesmo caminho dos outros?
Anika observava em silêncio, hesitante, sem saber se devia interferir. Ao mesmo tempo, o sistema projetou uma imagem cômica de um cachorro, tentando aliviar a tensão:
『Anda logo, árvore esquisita. Aquele tal de Ethan ainda está vivo, acredita?』
— Eu sei… — Takeshi respondeu, sem emoção. — Mas tudo bem. Deixe que ele morra lentamente… pelo próprio sangue.
O sistema, com um tom quase sarcástico, continuou:
『Ainda acho impressionante que você tenha feito aquela compra no último segundo. Parece que começou a entender o básico do que pode fazer.』
Takeshi esboçou um sorriso discreto, os olhos ainda firmes na árvore à sua frente.
Takeshi levantou o olhar para o céu, fitando a estranha lua artificial que brilhava de forma opressora.
— Aquela lua falsa… — disse ele, com a voz firme. — Como podemos derrotá-la?
Por um momento, o silêncio reinou. Então, enfim, a voz profunda da árvore ecoou, como se viesse de dentro da terra.
— …Podem usar a minha energia — respondeu, em tom lento e grave. — Ou descer até o andar inferior do castelo. Mas saibam… lá existe uma porta extremamente resistente.
Takeshi estreitou os olhos, avaliando a distância até o castelo que se erguia ao longe, envolto em névoa e sombras.
— Vamos usar primeiro sua energia — decidiu, sem hesitação. — Depois, se necessário, exploramos o castelo.
Um sussurro fraco alcançou os ouvidos de Takeshi e Anika assim que se aproximaram de Ethan.
— Esqueça… isso… eu não quero morrer… por favor… me ajuda — disse ele, com a voz trêmula e embargada pela dor.
Takeshi o observou em silêncio por alguns segundos. Um pensamento cruzou sua mente, frio e direto:
“Como imaginei. Quando as pessoas conhecem a dor verdadeira, elas fazem qualquer coisa para evitá-la.”
Ele então se agachou, encarando Ethan de perto, e falou com calma, mas firmeza:
— Eu só vou te ajudar com uma condição… — seus olhos se estreitaram — …você precisa se tornar meu aliado. E me prometer que não vai tentar me matar.
O sistema de Takeshi compreendeu algo naquele instante. Antes mesmo de chegar a esse mundo, já existia dentro dele um lado sombrio — esquecido, oculto nas sombras da rotina e da falsa normalidade. Mas agora, naquele novo mundo, esse lado finalmente encontrava espaço para emergir… e talvez, fosse apenas o começo do que ele realmente era capaz de se tornar.