Luna observava com certa impaciência o medo evidente nos olhos de William enquanto ele tentava atingir o inimigo.
— Ei, babaca! Pega isso! — exclamou Luna, irritada como sempre.
Ela arremessou dois bonecos na direção dele. Ainda nervoso, William os pegou com as mãos suadas, segurando-os pela barriga com certa insegurança.
— Eu quase deixei cair… você deveria ter avisado antes — disse ele, ansioso e um pouco ofegante.
— O importante é que conseguiu — respondeu Luna, cortando a conversa antes que ele pudesse continuar.
Sem perder tempo, Luna correu à frente. Com um movimento fluido da mão esquerda, fez o ar ao redor girar, concentrando-o como se manipulasse o próprio vento. Por um instante, perdeu o fôlego, mas manteve o controle, suportando o peso invisível do ar comprimido.
Com precisão, lançou o boneco como se fosse uma jogadora de basquete. O objeto girou no ar e atingiu o outro boneco, derrubando-o. Apesar disso, ele ainda se movia lentamente.
Aproveitando a brecha, Mark avançou sem hesitar. Pegou o boneco caído com uma única mão.
— Finalmente. Agora, silêncio — murmurou, colocando a adaga rente ao pescoço da criatura.
O boneco permaneceu imóvel, como se não conhecesse o conceito de medo, apenas obedecendo silenciosamente, sem esboçar qualquer reação.
Luna respirou fundo, permitindo que o ar preenchesse seus pulmões com mais calma. Queria manter a mente clara, sentir o ambiente ao seu redor com precisão. Mesmo em meio à tensão, ela buscava controlar o próprio ritmo.
— Agora só faltam dois deles — disse Luna, sentindo um calafrio subir pela espinha. O ar ao seu redor parecia congelar de repente, fazendo-a prender a respiração por instinto.
Ela expirou devagar, observando a névoa fria que escapava de seus lábios.
— Gente... olhem isso — alertou William, apontando para o alto.
No teto, pequenos flocos de neve começaram a cair. Tinham uma coloração incomum: levemente avermelhada, mesclada com um azul intenso, tão vívido quanto uma safira lapidada.
— Isso é normal por aqui...? — perguntou Mark, franzindo o cenho ao notar que as esferas nas mãos dos bonecos estavam mudando de cor, adquirindo um tom azul profundo.
O sistema de Mark apareceu logo em seguida, flutuando em frente a ele. Seu brilho era intenso, mas sua voz carregava uma inquietação perceptível.
『Finalmente. Após certos eventos, daremos início à terceira tarefa. O último guardião caiu... Que comece a prova final. Que suas almas resistam… ou apodreçam junto com os fracos.』
Um silêncio pesado recaiu sobre todos. Nenhum deles compreendia plenamente o que aquilo significava, mas a simples menção do fim de um guardião trouxe um arrepio coletivo.
Subitamente, o chão sob seus pés tremeu. Um brilho avermelhado, ainda que fraco, começou a se espalhar por todo o ambiente — chão, teto e paredes — como veias pulsando em uma criatura viva.
O sistema de todos ali brilhou intensamente, exibindo uma nova mensagem no ar diante dos olhos do grupo. Em letras vermelhas e pulsantes, surgiu a notificação:
『Tarefa Principal #3 – A Lua do Inferno das Almas Jogadas.』
Dificuldade: D+
Objetivo: Sobreviva por três dias enquanto a Lua Infernal tenta eliminar todos os participantes.
Prazo: #####
Recompensa: 1000 pontos.
Falha: Transformação em mortos-vivos sem consciência. Corpos poderão ser devorados por criaturas da escuridão.
Antes que alguém pudesse reagir, outra mensagem apareceu logo abaixo, em um tom mais sombrio:
『Nova Regra: A loja de alimentação será temporariamente fechada. Nenhum alimento poderá ser comprado durante este período.』
Um silêncio pesado tomou conta do grupo. O peso da missão e a ameaça da fome iminente começaram a se espalhar como uma sombra entre eles.
— Como vamos resolver a questão dos alimentos agora? — perguntou Mark, tentando chamar a atenção do seu sistema, com um olhar preocupado.
Luna apenas cruzou os braços sobre o estômago, sentindo um desconforto crescente diante da situação imposta pela nova tarefa. William engoliu em seco, tentando manter a calma.
— Parece que teremos que caçar do modo tradicional. Podemos usar este castelo como base por um tempo — disse William, esforçando-se para agir com racionalidade, mesmo com o medo evidente em seu rosto.
Luna caminhou em um pequeno círculo, observando o ambiente com atenção, antes de completar:
— Podemos sim… mas primeiro, precisamos lidar com esses bonecos.
Após isso, os bonecos começaram a se mover lentamente, tentando sair do lugar com passos desajeitados. As pernas se arrastavam de maneira tão atrapalhada que, por um breve instante, pareciam inofensivos — quase adoráveis.
A cena foi tão inesperadamente fofa que todos se esqueceram, por um momento, de que aquelas criaturas eram verdadeiras máquinas de matar.
“Queria poder levar um desses comigo…” pensou Mark, sentindo uma vontade repentina de fazer um cafuné em um deles
Ele balançou a cabeça logo em seguida, tentando afastar aquele pensamento absurdo.
Luna ajeitou o cabelo sob a luz fraca do teto, os olhos fixos nos bonecos imóveis à frente.
— Por enquanto, vamos cuidar deles. Depois veremos os outros que estão fora do castelo — disse, com firmeza na voz, embora o medo se ocultasse em seu tom. A ausência de Tsukiko a deixava inquieta, e o fato dela estar do lado de fora tornava tudo ainda mais preocupante.
— Como será que está o Layos...? — murmurou Mark para si mesmo, quase em um sussurro.
William, por outro lado, não sentia medo. Ele não conhecia bem aqueles que estavam ausentes, mas sua atenção estava nas reações dos companheiros. Luna tinha o rosto inclinado, os olhos baixos e os ombros levemente curvados. Mark tremia discretamente, os olhos marejados e as pernas instáveis.
William respirou fundo.
— Eles vão ficar bem. Vamos derrotar esses bonecos o quanto antes e nos apressar para encontrá-los.
…..
Enquanto isso, em algum lugar distante, com o chão feito de tijolos escuros e úmidos, alguém caía lentamente, imerso em uma escuridão profunda, incapaz de ver ao redor.
—... Ah? Morri de novo...? — murmurou Takeshi, a voz rouca e fraca, quase um sussurro que se perdia no vazio.
Takeshi se levantou do chão, levando a mão à cabeça ao sentir uma dor latejante e intensa.
— Eu não consigo me lembrar de nada... —
murmurou, tentando organizar os pensamentos. — Parece que bati a cabeça em um tronco de árvore…
Ele abriu os olhos com dificuldade, piscando várias vezes enquanto sua visão oscilava entre o escuro e o claro. Por alguns instantes, tudo parecia embaçado, quase preto, até que as imagens começaram a tomar forma novamente.
Ao olhar ao redor, notou que as paredes estavam incrivelmente distantes, como se o lugar fosse imenso. Elas eram marcadas por listras em azul e amarelo, formando padrões desconexos e estranhos.
Do teto, um líquido espesso e vermelho escorria lentamente, pingando no chão com um som abafado.
Era sangue.
— O que é aquilo? — murmurou Takeshi, não exatamente em choque, mas visivelmente confuso, incapaz de identificar ou expressar com precisão o que sentia.
Diante dele, um corredor sombrio se estendia, envolto por uma neblina densa e um silêncio quase opressor. O chão estava coberto por manchas de sangue seco e fresco, misturando-se em tons escuros que refletiam levemente à pouca luz que vinha de uma lâmpada trêmula pendurada no teto. O ar era pesado, com um cheiro metálico intenso.
A visão estava turva — fosse pela escuridão, pela fumaça, ou pela própria confusão mental — e ele mal conseguia distinguir os contornos das paredes. No entanto, um detalhe se destacou.
Havia algo frio e apertado em seus pulsos.
Takeshi baixou os olhos devagar… e viu.
Algemas de ferro, pesadas e rústicas, presas firmemente aos seus braços.
— Ah… — sussurrou, num tom de frustração. — Fui preso de novo…
A realidade caiu sobre ele como um peso. O coração acelerou, mas sua mente tentava entender: onde estava? Por que estava algemado? E, acima de tudo… quem havia feito aquilo com ele desta vez?
Takeshi olhou ao redor, confuso e inquieto. O lugar estava em completo silêncio, e não havia sinal de mais ninguém.
— Agora sim... estou realmente ferrado. — murmurou para si mesmo, com a voz baixa e cansada. — Onde estão a Anika e o Ethan?
Ele tentou mover os braços, puxando as algemas com força, mas percebeu que era inútil. Estavam presas com firmeza, e pareciam feitas de um material resistente, difícil de romper.
Cansado, deu alguns passos cambaleantes à frente. Cada movimento parecia exigir mais do que seu corpo podia oferecer. Os membros estavam pesados, e a fraqueza se espalhava como uma névoa interna.
A tontura o fez parar por um instante.
“Não consigo lembrar... droga.” pensou, irritado.
Levantou a mão direita e a apoiou na cabeça, tentando aliviar a dor pulsante que latejava sem cessar. A memória lhe escapava como fumaça, e a dor parecia castigá-lo por isso.
Ele caminhava lentamente, ouvindo o som ritmado de seus próprios passos ecoando pelo chão — algo incomum naquele ambiente silencioso. A textura irregular dos tijolos sob seus pés começava a machucar os dedos, tornando cada passo um pequeno incômodo.
— Droga... Isso aqui parece aquelas ruas velhas do Japão — resmungou, a voz arrastada, enquanto bocejava.
Seus olhos pesavam de sono, e o rosto, inclinado para frente, denunciava o cansaço. A cada passo, a sensação de estar preso em um caminho infinito se tornava mais forte. Como se não houvesse fim, nem direção.
— Estou começando a pensar em desistir… — murmurou ele, exausto. — Ah… o que foi que eu acabei de dizer? — estava tão cansado que nem conseguia compreender direito seus próprios sentimentos ou reações.
Takeshi então avistou um objeto de formato triangular, parcialmente encoberto por folhas secas que pareciam ter sido arranjadas ali propositalmente, como uma camuflagem rudimentar. Tinha um tamanho mediano, talvez pouco maior que uma mochila comum, mas o que mais chamava a atenção era sua superfície: pegajosa, levemente grudenta ao toque, como se tivesse sido coberta por uma resina natural ainda fresca.
Ao redor do objeto, o chão de terra escura estava ligeiramente afundado, como se algo pesado tivesse permanecido ali por muito tempo. Pequenos olhos — minúsculos, quase invisíveis à primeira vista — brotavam discretamente do solo, fixando-se em Takeshi com uma atenção silenciosa e perturbadora.
A estrutura do objeto triangular parecia rígida, com uma pele acinzentada e dura, repleta de rachaduras finas como cerâmica envelhecida. Em sua parte superior, algo ainda mais estranho: duas pernas brancas, delgadas e encurvadas, lembrando as de uma ave — mas completamente imóveis, como se fossilizadas ali.
Takeshi franziu o cenho e se aproximou com cautela, tentando entender o que estava diante de si.
— O que… é isso? — murmurou, mais para si mesmo do que esperando uma resposta.
Foi então que notou, próximo à base do estranho objeto, um dedo. Estava mutilado, com a carne dilacerada e os ossos parcialmente à mostra. Ao lado dele, uma pequena poça de sangue seco manchava a terra.
Um calafrio percorreu sua espinha. A respiração ficou presa por um instante.
"Espera…" pensou, engolindo em seco. "Isso não pode ser só imaginação. Pernas… um dedo humano… será que… Ethan morreu?"
A possibilidade era brutal, mas fazia sentido diante do cenário. Cada detalhe diante de seus olhos parecia sussurrar uma verdade que ele ainda não estava pronto para aceitar.